Angioedema hereditário: Experiência com icatibant em crises graves
INTRODUÇÃO
Os quadros clínicos de angioedema podem ser classificados,de uma forma geral,
de acordo com os mediadores envolvidos na sua fisiopatologia.
Assim, podemos ter quadros induzidos pela libertação de histamina (angioedema
histaminérgico ou alérgico), que são os mais frequentes, mas também podemos ter
quadros induzidos pela bradicinina (angioedema bradicininérgico, que inclui o
angioedema hereditário (AEH), o angioedema adquirido com défi ce de C1 inibidor
e o induzido por inibidores da enzima de conversão da angiotensina) ou quadros
induzidos por leucotrienos (angioedema induzido por anti-inflamatórios não
esteróides) ou ainda quadros induzidos por mecanismos desconhecidos (angioedema
recorrente idiopático)1.
O AEH é uma síndrome clínica caracterizada por episódios (crises) de edema
submucoso e/ou subcutâneo, transitório e recorrente, que podem atingir a pele,
as vias aéreas superiores ou o tubo digestivo2. Foi pela primeira vez descrito
por Milton em 1876, sendo Quincke que, em 1882, introduziu a expressão edema
angioneurótico. Seis anos depois Sir William Osler descreve o seu carácter
familiar, cunhando o termo edema angioneurótico hereditário3. É uma doença
com uma incidência de 1:10 000 a 1:50 000, autossómica dominante que se atribui
à deficiência de C1 inibidor (C1-INH) causada pela mutação no gene que codifica
o C1-INH, localizado no cromossoma 114. Estão descritos três tipos de AEH: tipo
1 (cerca de 85%) que se caracteriza por uma deficiência quantitativa e
funcional de C1-INH; tipo 2 (cerca de 15%) em que não existe défice
quantitativo mas existe deficiência funcional4; e tipo 3 (raro) que cursa sem
alterações quantitativas ou da função de C1-INH5.
Clinicamente, o AEH caracteriza -se por episódios recorrentes de edema
subcutâneo ou submucoso, não pruriginoso e não depressível, atingindo
predominantemente membros e genitais (95%), tubo digestivo (70 -80%),
estruturas da face (50%) e vias aéreas superiores (48 -78%)5-8. Como
desencadeantes mais frequentes destacam-se o trauma, infecções, stresse toma de
fármacos (estrogénios, inibidores da enzima de conversão da angiotensina e
antagonistas dos receptores da angiotensina), apesar de poder ocorrer
espontaneamente4,5. A duração média das crises é de cerca de 48 a 72 horas7.
O C1-INH é responsável pela regulação das cascatas proteolíticas do
complemento, coagulação e das cininas5.
Para além da inibição da activação da fracção C1 do complemento, o C1-INH é
também responsável pela inactivação da maior parte do factor XIIa, o qual cliva
a pré-calicreína em calicreína, que por sua vez cliva os cininogénios de alto
peso molecular e conduz à libertação excessiva de várias cininas, nomeadamente
a bradicinina9,10.
A bradicinina é um nanopéptido libertado na sequência da activação da via de
contacto que induz marcado aumento da permeabilidade vascular quando se liga ao
seu receptor nas células endoteliais vasculares (receptor B2 da bradicinina)5.
Durante as crises de AEH ocorre libertação aumentada de bradicinina, o
principal mediador responsável pela maioria dos sintomas: aumento da
permeabilidade vascular (podendo causar edema, ascite ou hipotensão) e
contracção do músculo liso não vascular (podendo causar dor mantida ou de tipo
cólica)9.
O tratamento do angioedema está bem sistematizado nas recomendações
internacionais em três vertentes fundamentais: 1) tratamento agudo das crises;
2) prevenção a longo prazo das crises; e 3) prevenção a curto prazo das crises,
antes de procedimentos médico-cirúrgicos. Os fármacos mais frequentemente
preconizados são os androgénios atenuados (danazol ou stanozolol), os
antifibrinolíticos (ácido tranexâmico ou ácido épsilon-aminocapróico), o
concentrado de C1-INH e o icatibant2,10 -12. Em crises graves, o tratamento de
emergência baseia -se na utilização do C1-INH endovenoso ou icatibant
subcutâneo13. O icatibant é um antagonista selectivo dos receptores B2 da
bradicinina, disponível em Portugal desde Novembro de 2009, que reverte o
aumento da permeabilidade vascular. Dois estudos de fase 3, randomizados, em
dupla ocultação e multicêntricos, denominados FAST (For Angioedema Subcutaneous
Treatment), FAST -1 (icatibant vsplacebo) e FAST -2 (icatibant vsácido
tranexâmico), mostraram a sua eficácia nas crises de AEH, nomeadamente na
redução do tempo até se obter alívio sintomático13,14.
Os autores descrevem a experiência com a utilização de icatibant no tratamento
de crises graves de AEH no Serviço de Imunoalergologia do Hospital de Santa
Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte (HSM), desde a sua introdução no mercado
nacional.
MATERIAL E MÉTODOS
Análise retrospectiva do processo clínico e entrevista telefónica aos doentes a
quem foi administrado icatibant para tratamento de crises agudas de AEH entre
Novembro de 2009 e Junho de 2011, com subsequente internamento no Serviço de
Imunoalergologia do HSM.
Foram avaliados os seguintes parâmetros: idade, género, raça, classificação do
AEH, caracterização da crise de AEH (clínica, avaliação por
otorrinolaringologia (ORL), exames complementares), terapêutica anteriormente
efectuada (em crises anteriores e de manutenção) e resposta ao icatibant (dose,
tempo até melhoria da sintomatologia, efeitos adversos e, nos doentes que
tinham feito anteriormente C1 INH, comparação da rapidez do início da acção
terapêutica). Adicionalmente também foi avaliado o tempo desde a admissão
hospitalar do doente até à administração subcutânea de icatibant.
São referidos os valores de estatística descritiva para as diferentes variáveis
(média, mediana, mínimo e máximo), calculados no softwareMicrosoft Excel® 2007.
RESULTADOS
Durante o período analisado (20 meses), 9 doentes internados no Serviço de
Imunoalergologia do HSM receberam icatibant para tratamento de crises graves de
AEH. Relativamente às características demográficas destes doentes, 5 eram do
género feminino, 7 de raça caucasiana (2 de raça negra) e a média de idades foi
de 30,5 anos (mediana 30 anos, idade mínima 25 e máxima 37 anos). Quanto à
classificação do AEH, 7 (78%) tinham AEH tipo 2 e 2 (22%) AEH tipo 1. Dois dos
doentes com AEH tipo 2 pertenciam à mesma família (irmãos), não se verificando
qualquer grau de parentesco entre os restantes.
Estes doentes foram internados através do Serviço de Urgência (8) ou do
Hospital de Dia (1) de Imunoalergologia com crises faringo -laríngeas (4),
faringo -laríngea e abdominal (1), abdominais (2) e mucocutâneas faciais ou da
lingua (2). O Quadro 1 resume o perfil clínico de todos os doentes. Dos
antecedentes pessoais destacam -se asfixia com necessidade de ventilação
mecânica em dois doentes (um com apresentação actual faringo-laríngea e um com
apresentação actual de crise abdominal) e apendicectomia branca numa das
doentes com apresentação abdominal.
Quadro 1.Caracterização clínica dos doentes
Todos os doentes com crises faringo -laríngeas ou com atingimento da face/
língua (7 doentes) foram avaliados em ORL. Dada a urgência do tratamento, em
todos os casos foi primeiro administrado o icatibant e só depois os doentes
foram observados na urgência de ORL (em média 1,7 horas depois da administração
de icatibant; mediana 1,5 horas, mínimo 1 hora e máximo 3 horas). Destes 7
doentes apenas 3 apresentavam alterações na laringoscopia indirecta, ausentes
na reavaliação ORL efectuada entre 6 a 24 horas depois.
O Quadro 2 resume o perfil terapêutico de todos os doentes. A média de tempo
decorrido entre a admissão hospitalar (Serviço de Urgência/Hospital de Dia) e a
administração subcutânea de icatibant foi de 2,44 horas (mediana 1 hora, mínimo
0,25 e máximo 10 horas). O caso de maior demora (10 horas) refere-se a uma
crise de angioedema exclusivamente abdominal, de início durante a madrugada,
que respondeu parcialmente à terapêutica com reforço da dose de androgénios
(que a doente efectuou autonomamente no domicílio) e antifibrinolíticos por via
endovenosa no Serviço de Urgência, tendo a doente inclusivamente conseguido
adormecer. Contudo, na manhã seguinte decidiu'se administrar icatibant face à
persistência do quadro doloroso abdominal, de intensidade significativa.
Quadro 2. Perfil terapêutico dos doentes
Todos os doentes necessitaram apenas de uma única dose de icatibant 30 mg
subcutâneo para o controlo das crises. Na entrevista telefónica, todos os
doentes reportaram, de forma retrospectiva, alívio sintomático significativo
nos primeiros 120 minutos (média 60 minutos; mediana 60 minutos, mínimo 10 e
máximo 120 minutos). Oito doentes associaram à administração deste fármaco
efeitos adversos locais, como dor ligeira e sensação de queimadura na parede
abdominal (Quadro 2), que consideraram ser toleráveis. Relativamente às
terapêuticas efectuadas anteriormente para tratamento de crises graves de AEH,
6 tinham realizado no passado androgénios, 5 antifibrinolíticos, um só tinha
recebido corticosteróides e anti-histamínicos e 4 doentes tinham recebido
concentrado de C1-INH, para crises com clínica semelhante. Destes últimos 4
doentes, 3 deles referiam, da comparação subjectiva e retrospectiva entre os
dois fármacos, uma percepção de um início de acção mais precoce do icatibant. O
quarto doente não conseguia recordar o início de acção terapêutica de C1-INH,
pelo que considerou impossível efectuar qualquer comparação com o icatibant a
este respeito.
Quanto a terapêutica de manutenção prévia, há a referir que 6 doentes tinham
anteriormente prescrita terapêutica regular com androgénios (stanozolol ' 3;
danazol ' 3). Os restantes três não se encontravam sob qualquer terapêutica de
manutenção: um tinha interrompido a terapêutica no mês precedente, atendendo à
pouca frequência das crises e os outros dois não tinham medicação de manutenção
por apresentarem baixa frequência de crises.
À data da alta todos os doentes foram medicados com androgénios diariamente.
DISCUSSÃO
No presente trabalho descrevemos a nossa experiência no tratamento com
icatibant de 9 crises graves de AEH (5 faringo -laríngeas, uma delas com
queixas abdominais associadas, 2 abdominais e 2 mucocutâneas da face/lingua) em
doentes internados no Serviço de Imunoalergologia do HSM.
Um dos pontos de interesse deste trabalho é o facto de se tratar da primeira
descrição, em Portugal, de uma série de doentes medicados com icatibant em
crises graves de AEH. Acresce ainda o interesse de se tentar estabelecer uma
auto -avaliação comparativa, ainda que subjectiva e retrospectiva, com
administrações prévias de C1-INH, já que não encontrámos quaisquer outros
trabalhos publicados na literatura que comparem, por qualquer forma, a eficácia
entre estes dois fármacos. Os principais pontos fracos deste trabalho são ter
uma casuística ainda reduzida e ser um estudo retrospectivo não controlado e
não randomizado.
Foram avaliados 9 doentes com crises graves de AEH, a maioria dos quais com
diagnóstico de AEH tipo 2. Tanto quanto sabemos, não existe nenhuma relação
entre o tipo de AEH e a gravidade da sua apresentação ou das suas crises, pelo
que pensamos que esta sobre'representação relativamente ao esperado (15% dos
casos) se poderá justificar apenas pela frequência elevada (40%) de casos de
tipo 2 que temos na casuística de doentes seguidos no nosso Serviço, para a
qual contribui a existência de duas famílias numerosas, com múltiplos membros
afectados.
Apesar de estar descrito que doentes do sexo feminino podem ter doença mais
grave devido ao efeito hormonal endógeno e, eventualmente, exógeno
(anticoncepcionais)15, não encontrámos neste estudo predominância significativa
do sexo feminino. A maioria dos doentes era de raça caucasiana, provavelmente
em relação com a maior prevalência de indivíduos desta raça na região em
questão, não estando descrita qualquer diferença entre raças ou grupos
étnicos5.
Todas as crises de AEH dos doentes deste estudo tinham, segundo o consenso
internacional de 201010, indicação para tratamento com icatibant, na medida em
que eram crises graves, na sua maioria faringo-laríngeas (55,5%), que podem
conduzir a asfixia, a qual pode ser responsável por uma taxa de mortalidade que
atinge os 30 a 50% nos doentes sem diagnóstico2,8. As crises graves
correspondem aos casos de edema a nível da face, língua, faringe, laringe e
vias aéreas superiores (que comportam risco de edema laríngeo) e aos casos de
edema abdominal doloroso (escala visual analógica de dor > 5), assim como aos
casos associados a choque hipovolémico2.
A presença de edema das vias aéreas superiores, objectivada na laringoscopia
indirecta, ocorreu em 42,8% dos casos (3/7 dos doentes em quem foi efectuada
laringoscopia indirecta). Este valor é semelhante aos 49,6% descritos por
Bork16. No entanto, há a referir que os dois doentes com queixas faringo-
laríngeas que não apresentaram alterações na observação ORL foram aqueles que
receberam mais precocemente a injecção de icatibant (aos 15 e 45 minutos). O
facto de a observação ORL só ter ocorrido após a administração do icatibant
pode ter contribuído para a normalidade dessa mesma observação.
Atendendo à boa resposta ao tratamento no passado com concentrado de C1-INH e à
gravidade dos doentes, dois deles com antecedentes de asfixia, a opção de
alterar a medicação para um novo fármaco pode ser acompanhada de algum receio
por parte de doentes e de médicos, nomeadamente quanto a uma eventual menor
eficácia. No entanto, no presente trabalho confirmou-se a eficácia do icatibant
nestas situações de crise grave de AEH.
Não existem na literatura muitos trabalhos que tenham avaliado a acção do
icatibant em crises de AEH faringo-laríngeo adequadamente documentadas. A este
respeito há a referir que encontrámos na literatura apenas quatro trabalhos que
referem explicitamente uma avaliação do icatibant no tratamento do edema
faringo -laríngeo. No primeiro, Bas e colaboradores reportaram a utilização de
icatibant num doente com crises recorrentes de AEH, quatro das quais com
atingimento laríngeo, em que o icatibant foi eficaz no alívio sintomático e
redução do edema com documentação por laringoscopia17. Quatro anos mais tarde,
Cicardi avaliou o icatibant em 11 doentes com edema laríngeo (integrados nos
estudos FAST -1 e FAST -2), reportando uma melhoria sintomática, na auto-
avaliação pelos doentes, entre 0,6 a 1 hora após a administração subcutânea de
icatibant (FAST -1 e 2, respectivamente), mas aparentemente sem haver qualquer
referência à observação por laringoscopia14. Recentemente, Csuka e
colaboradores reportaram melhoria sintomática nos primeiros 48 minutos e
resolução dos sintomas nas primeiras 6,8 horas após terapêutica com icatibant
em 6 doentes com doze crises de AEH, três delas com atingimento das vias aéreas
superiores18.
Boccon-Gibod e colaboradores, num estudo com 45 doentes com crises laríngeas e
abdominais (46% exclusivamente laríngeas, 10% laríngeas e faciais, 5% laríngeas
e abdominais e 5% laríngeas, abdominais e mucocutâneas), reportaram que a auto
-administração de icatibant foi eficaz na resolução de sintomas e bem
tolerada19.
No presente trabalho, os cinco doentes com crises faringo-laríngeas reportaram
igualmente alívio sintomático nas primeiras horas após administração do
icatibant. Acresce ainda que a documentação da melhoria faringo-laríngea não só
foi constatada através da avaliação sintomática subjectiva mas também por
reavaliação objectiva, através de laringoscopia indirecta efectuada entre 6 a
24 horas após a primeira laringoscopia, o que constitui indubitavelmente uma
mais -valia nessa documentação de eficácia.
As crises faringo-laríngeas podem evoluir para asfixia, com necessidade de
entubação orotraqueal, independentemente da terapêutica farmacológica
administrada. Em 2003, numa série de 123 doentes com 596 crises laríngeas, Bork
reportou seis doentes com necessidade de entubação orotraqueal por asfixia,
tendo sido necessária cricotomia em quatro16. Sete anos mais tarde, Cicardi
descreve no estudo FAST -1 um doente com necessidade de entubação orotraqueal
por crise laríngea 5 minutos após administração de icatibant14. Na presente
série nenhum doente necessitou de entubação orotraqueal.
Todos os doentes reportaram alívio sintomático após uma única dose de icatibant
30 mg subcutâneo, apenas associada a reacções adversas locais, pouco intensas e
bem toleradas.
Na literatura, o icatibant foi frequentemente associado (49 -
100%)12,13,16,18,20 a reacções adversas locais, como dor, edema, queimadura e
prurido e, em menos de 10% dos casos, a reacções sistémicas como náuseas, dor
abdominal, fadiga, tonturas, cefaleias, exantema e congestão nasal13,20.
Na nossa casuística, 88,9% dos doentes referiu dor e/ou sensação de queimadura
a nível da parede abdominal, que contudo foram de intensidade ligeira e
razoavelmente bem toleradas. Não se verificaram quaisquer efeitos adversos
sistémicos.
Um outro dos aspectos interessantes do presente trabalho resultou do facto de
se ter tentado obter uma comparação, ainda que subjectiva e retrospectiva e,
portanto, com todas as limitações daí decorrentes, entre a rapidez de acção do
concentrado de C1-INH e o icatibant.
Verificámos que três dos quatro doentes que já tinham feito ambos os fármacos
tiveram uma percepção de um início de acção mais rápido do icatibant. O outro
doente não foi capaz de dizer qual dos fármacos teria sido mais rápido a
actuar.
Na literatura está descrito que, após administração, o icatibant demora 30
minutos até atingir a concentração máxima plasmática (Cmax)14, enquanto o
concentrado de C1-INH demora 48 minutos21. No entanto, os primeiros sinais de
melhoria sintomática estão descritos após 20 a 30 minutos com ambos os
fármacos2,22. O icatibant tem uma semi -vida plasmática (t ½) de cerca de 1 a 2
horas19, enquanto o concentrado de C1-INH tem um t ½ de cerca de 30 a 40 horas,
variando em função do consumo de C1-INH2,21,23.
O custo da terapêutica depende do peso do doente (no caso do concentrado de C1-
INH) e da eventual necessidade de repetição da dose (possível em ambos os
fármacos, mas mais descrita com o icatibant). Para um indivíduo com 75 kg, o
preço total de uma administração subcutânea de 30 mg de icatibant é de 1352 ,
enquanto o da administração de concentrado de C1-INH endovenoso é de 1678
(preços segundo o sistema informático do HSM).
Nos doentes em estudo, o tempo entre a admissão hospitalar e a administração de
icatibant foi muito variável (15 minutos a 10 horas), com uma média de 2,44
horas após a admissão hospitalar. Contudo, o valor da mediana foi de uma hora,
o que consideramos ser bastante razoável. Este valor pode ser explicado pelo
facto dos doentes se fazerem acompanhar do cartão de identificação da doença e
por muitas das equipas de urgência serem constituídas por médicos do Serviço de
Imunoalergologia. No entanto, em dois casos a administração demorou 5 e 10
horas, o que realça a importância de manter um adequado grau de alerta e a
necessidade de formação contínua sobre esta patologia aos elementos das equipas
médicas de urgência.
Recentemente, a Agência Europeia do Medicamento (EMA) autorizou a auto -
administração do icatibant aos doentes que já tenham efectuado este tipo de
tratamento em crise aguda com sucesso, permitindo assim a disponibilidade de um
tratamento específico e imediato para os doentes de alto risco, exigindo-se que
haja previamente uma formação e um treino adequado para a técnica e decisão da
auto -administração. À semelhança do descrito para a auto-administração de C1-
INH17,24, é esperável que a auto-administração de icatibant possa ter um
resultado superior, comparativamente à sua administração hospitalar, atendendo
ao menor tempo até à administração de uma terapêutica adequada22. No entanto,
todos os doentes com crise laríngea têm indicação para se dirigirem ao Serviço
de Urgência, mesmo após a auto -administração do icatibant25. O estudo de fase
IIIb, actualmente a decorrer, EASSI (Evaluation of the Safety of Self-
Administration with Icatibant), que avalia a segurança, tolerabilidade local,
conveniência e eficácia da auto-administração de icatibant no tratamento de
crises agudas em 56 doentes com AEH, mostrou que a auto-administração é eficaz
na resolução dos sintomas e preferida pela maioria dos doentes (94,6%)26. Um
outro estudo, com 45 doentes com crises laríngeas ou abdominais, reportou que a
auto-administração de icatibant foi eficaz na resolução de sintomas e bem
tolerada, permitindo ganho de autonomia19.
Em resumo, o presente trabalho mostrou que a administração subcutânea de
icatibant, mesmo em dose única e em doentes com crises graves de AEH, teve um
bom perfil de eficácia e segurança no tratamento de crises faringo -laríngeas,
abdominais ou mucocutâneas da face/língua, e que se associou apenas a efeitos
adversos locais, ligeiros e razoavelmente bem tolerados. Adicionalmente, este
trabalho permitiu identificar doentes que, por terem respondido bem ao
icatibant mesmo em situações de crises graves, são candidatos possíveis aos
futuros programas de auto-administração, após educação adequada.
CONCLUSÕES
Descrevemos a utilização de icatibant em 9 doentes com crises graves de AEH
internados no Serviço de Imunoalergologia do HSM: 4 faringo -laríngeas, 1
faringo-laríngea e abdominal, 2 exclusivamente abdominais e 2 mucocutâneas da
face/língua. Todos os doentes necessitaram apenas de uma administração
subcutânea de 30 mg de icatibant, reportando alívio sintomático nos primeiros
120 minutos. A laringoscopia, efectuada por ORL em 7 doentes, revelou edema das
vias aéreas superiores em três deles, com posterior documentação da sua
reversão em reavaliação laringoscópica efectuada entre 6 a 24 horas depois.
Conclui-se que a utilização de icatibant no tratamento destas crises graves de
AEH foi eficaz e segura, encontrando-se associada apenas a efeitos locais
ligeiros e razoavelmente bem tolerados.