Caso estomatológico
Adolescente do sexo masculino, 13 anos de idade que frequenta a consulta de
Endocrinologia deste Centro Hospital e que foi referenciado há quatro meses, à
consulta de Estomatologia para observação, urgente, de lesão lingual de
aparecimento súbito, perceptível dois meses antes da consulta de
Endocrinologia, não dolorosa, de crescimento lento e por vezes sangrante com a
mastigação.
Antecedentes pessoais relevantes: obesidade.
Ao exame objectivo apresenta lesão vegetante do dorso da língua à esquerda, de
contornos irregulares, com múltiplas vesículas de tamanho e de coloração
variável, infiltrando os tecidos adjacentes parecendo prolongar-se para o
interior da língua. (Figura 1)
FIGURA 1
Face ao descrito:
Qual o seu diagnóstico? Qual a sua atitude?
COMENTÁRIOS
O caso clínico descrito trata de um LINFANGIOMA.
Foi descrito inicialmente por Redenbacher em 1828, permanecendo controversa a
sua definição(1). Alguns autores consideram-no uma malformação congénita do
sistema linfático, outros como um hamartoma congénito e outros ainda como um
tumor vascular benigno decorrente da proliferação de vasos linfáticos. A
definição menos controversa é de que se trata de um tumor benigno representando
uma malformação congénita do sistema linfático e composto por canais e espaços
vasculares contendo linfa. O linfangio-endotelioma é o tipo de linfangioma no
qual células endoteliais são os componentes dominantes. Pode ser classificado
como linfangioma capilar, linfangioma cavernoso ou linfangioma cístico.
A sua ocorrência é relativamente rara sendo observado principalmente nos dois
primeiros anos de vida. A região da cabeça e do pescoço é a mais frequentemente
atingida.
É uma lesão geralmente assintomática, manifestando-se por uma tumefacção
cística, indolor, aderente aos planos profundos, recoberta por pele normal e
com crescimento lento e tamanho variável.
Embora muito raro na cavidade oral, situa-se mais frequentemente na língua,
podendo manifestar-se sob uma forma localizada ou difusa(2). Nesta localização
apresenta um aspecto granular com múltiplas vesículas transparentes preenchidas
por linfa. Por vezes ocorre sangramento dentro destas vesículas, tornando-as
avermelhadas e hemorrágicas. Sem tratamento a língua aumenta de tamanho,
tornando-se protusa, seca e com fissuras profundas, o que pode dificultar a
mastigação, a deglutição e a fala, além de causar anormalidades ortodônticas e
distúrbios psicológicos.
Embora histologicamente benigno, o linfangioma pode infiltrar os tecidos
adjacentes e/ou estruturas vitais, causando complicações, algumas ameaçadoras
da vida. Há relatos de regressão espontânea, porém é uma forma rara de
evolução.
Existem vários métodos de tratamento dos quais se salienta a aspiração, incisão
e drenagem (tem um papel importante na descompressão de emergência, não sendo
considerado um tratamento definitivo), uso de laser para remoção da lesão,
embolização da lesão combinada com cirurgia nas grandes lesões, quimioterapia,
radioterapia.
A exérese cirúrgica tem sido o tratamento de eleição. A tendência infiltrativa
do linfangioma leva a recidiva frequente. As complicações cirúrgicas incluem
formação de hematoma, linfocelo, cicatrizes, infecção com ou sem formação de
abcessos, deiscência de sutura e lesão nervosa.
Neste caso foi feita a tentativa de exérese completa da lesão, que se revelou
um linfangioma cavernoso. O pós-operatório decorreu sem complicações.
Actualmente está bem não apresentando, para já, evidência de recidiva.