Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

EuPTCVHe0872-81782010000500001

EuPTCVHe0872-81782010000500001

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0872-8178
ano2010
Issue0005
Article number00001

O script do Java parece estar desligado, ou então houve um erro de comunicação. Ligue o script do Java para mais opções de representação.

Hemorragia digestiva alta associada ao consumo de ácido acetilsalicílico e de anti-inflamatórios não-esteróides em Portugal Hemorragia digestiva alta associada ao consumo de ácido acetilsalicílico e de anti-inflamatórios não-esteróides em Portugal Upper gastrointestinal bleeding associated with acetylsalicylic acid and non- steroidal antiinflammatory drugs in Portugal

Bento Albuquerque Charrua Consultor de Gastrenterologia; E-mail: bento.charrua@gmail.com

A importância dos anti-inflamatórios não esferóides (AINE) e do ácido acetilsalicílico (AAS) na patogénese das lesões gastroduodenais, percussoras das hemorragias digestivas altas (HDA), tem sido demonstrado através de várias publicações, quer nacionais quer estrangeiras.

Na génese desta complicação estão várias patologias, entre as quais as úlceras pépticas, que são a sua causa mais frequente, e as erosões gástricas. Aliás, entre 40% a 50% dos doentes, que tomam cronicamente AINES, terão erosões(1). No que se refere ao AAS existem descrições do seu efeito, ao nível da mucosa gástrica, desde muitos anos(2).

Como em Portugal estes fármacos são dos mais consumidos (3) , é natural que surjam várias HDA associadas ao consumo destes medicamentos. O impacto estimado, de determinada patologia, na saúde da uma comunidade, pode ser obtido calculando a percentagem de risco atribuído à população que representa e a proporção de indivíduos doentes que teriam ficado de boa saúde, se nenhum deles tivesse sido exposto a um factor de risco específico(4).

Este impacto foi descrito, numa meta-análise, publicada no fim da década de noventa e tinha em conta as úlceras pépticas referentes à população dos Estados Unidos da América. Neste estudo, acerca dos factores de risco das úlceras pépticas associadas ao uso de AINES, infecção por Helicobacter pylori (Hp) e consumo de tabaco, a taxa foi de 24%,48% e 23%,respectivamente(5).

Recentemente, foi publicado um trabalho onde se postulava que o risco de complicações gastrointestinais, associado ao consumo de AINES seria quatro a cinco vezes superior ao da população que não consome estes medicamentos. O mesmo estudo, também afirmava que este risco era, ainda, mais elevado nos idosos e doentes com antecedentes de úlcera péptica(6).

A patogenia da lesão da mucosa gástrica pelos AINES tem sido alvo de várias teses publicadas na literatura médica mundial.

A tese mais difundida está relacionada com a redução da síntese gástrica das prostaglandinas, através da supressão dos inibidores selectivos da ciclooxigenase (COX 1 e COX 2) e, também, por causa da irritação tópica. Estes factores levam ao decréscimo do fluxo sanguíneo, danos no epitélio e aumento do número de neutrófilos aderentes ao endotélio vascular. Todos eles, no seu conjunto, contribuem para a lesão da mucosa gástrica (7) .Torna-se, por isso, necessário ter cuidado com estes agentes, sobretudo nos doentes que, comcumitantemente, tomam doses baixas de AAS.

Com a constatação dos efeitos adversos dos AINES e AAS sobre a mucosa gastroduodenal, surgiram, como era de esperar, varias estratégias no sentido de diminuir estes efeitos.

As mais actuais, indicam como prioridades, dado o elevado custo dos fármacos, a intervenção junto dos grupos de indivíduos de maior risco: doentes com mais de 60 anos, indivíduos com antecedentes de queixas gastrointestinais prévias especialmente se associadas a doença ulcerosa, hemorragia, perforação e cirurgia gástrica prévia(8).

Assim sendo, a terapêutica preventiva deve ter em conta, além dos factores expostos, o uso de AINES selectivos na inibição da COX 2, protecção gástrica com inibidores da bomba de protões (IBP) e erradicação do Hp(9). A respeito desta última medida, convém salientar que, a relação entre Hp e AINES, na etiopatogenia da úlcera péptica ainda é controversa. Ficou bem estabelecido, na Reunião de Consenso de Maastricht, que Hp e AINES são factores de risco independentes, na patogenia da úlcera péptica e na hemorragia secundária da úlcera péptica (UP).

Os AINES devem ser considerados separadamente da aspirina neste tema(10).

No presente número do GE é publicado, por Gilberto Couto etal., um estudo retrospectivo e multicêntrico, onde os autores avaliam expressão e consequências da HDA associada ao consumo de AAS/AINE, no nosso país, durante o ano de 2006.

Para o efeito, escolheram nove Centros Hospitalares, que reflectem o que se passa numa população de cerca de 2,5 milhões de habitantes. Como método de trabalho, usaram a recolha de dados através da consulta dos processos clínicos, dos doentes internados por HDA. Nos Centros Hospitalares, escolhidos, foram englobados hospitais centrais e hospitais distritais, incluindo a Região Autónoma dos Açores, o que, a meu ver, valoriza bastante a amostra, pois, abrange grande parte do território nacional.

Na discussão e análise dos resultados, relativos à HDA associada ao consumo de AAS/AINES observa-se e uma incidência e mortalidade estimadas por número de consumidores/ano, inferior a outras series, inclusivamente às series oriundas de Espanha, país que tem uma população semelhante à nossa. Este facto não deixa de ser curioso, atendendo à idade, ao número de patologias associadas dos nossos doentes que consomem AINES, e, ainda, à elevada incidência de HP na população portuguesa. Pese embora o facto de a relação entre Hp e AINES, na etiopatogenia da UP, ser ainda controversa.

Esta aparente contradição, no que se refere à baixa incidência e mortalidade, pode estar relacionada com a forma utilizada na recolha dos dados.

Por outro lado, no que respeita à gastroprotecção, os dados referidos, apontam para uma taxa de quinze por cento de doentes que faziam protecção gástrica, inclusive naqueles que eram considerados de risco (idade superior a 65 anos e/ ou história de úlcera péptica). Estes números são parecidos com os de outras séries (11) e, de acordo com o inquérito efectuado junto dos médicos de Medicina Geral e Familiar, fica a ideia de que existe conhecimento, junto da população, no que se refere à necessidade de fazer gastroprotecção. Aqui chegados, poderão pôr-se algumas questões: se assim é, então porque é que são tão poucos a faze-la? Será que este facto se deve, únicamente, ao elevado custo dos medicamentos? Ou, por outro lado, terá que ver com argumentos pouco convincentes no sentido de demonstrar ao doente os verdadeiros benefícios da terapêutica de protecção? Os autores referem, ainda, que o Hp foi raramente testado, na endoscopia inicial. Como a grande maioria das HDA corresponderam a UP, tudo leva a crer que dada a elevada prevalência do Hp, nestas situações, e a baixa sensibilidade da biopsia na UP sangrante(12), a erradicação foi feita, de acordo com o estabelecido na Reunião de Consenso de Maastricht. Acresce, ainda, que, do ponto de vista clínico, não é possível distinguir entre as lesões associadas ao Hp ou aos AINE. Por isso, parece prudente, nestes casos, erradicar o Hp e suspender os AINE. Caso o doente tenha necessidade de voltar a tomar este tipo de medicamentos, deve ser usado um inibidor específico da COX2.

Finalmente, no que respeita à terapêutica endoscópica e à utilização dos IBP, parece claro que a terapêutica injectável, usada na hemostase local, associada à perfusão de IBP, em altas doses, é altamente eficaz. Aliás como tem sido descrito na maioria das publicações, sobre este tema. Merecem, ainda, realce os resultados conseguidos com o esomeprazol (13) , tanto mais que foram obtidos num ensaio randomizado.

Concluindo, parece-me que o trabalho apresentado demonstra que é possível fazer estudos que incluam vários Centros Hospitalares e revela a importância do consumo de AAS/AINE na patologia das complicações, de algumas lesões gastroduodenais. O facto da prevalência, da HDA e da mortalidade, ser inferior aos números relativos a outros países ocidentais, não me parece relevante e, poderá ter outra expressão se forem utilizados métodos distintos, na colheita de dados.

Passados cerca de quatro anos desde que começou o estudo PARAINES, haverá, certamente, algumas modificações, sobretudo no que se refere ao custo dos medicamentos e funcionamento dos Centros Hospitalares. Seria, por isso, muito interessante, a realização de mais ensaios, multicêntricos, que pudessem validar, ou não, os resultados obtidos neste estudo.


transferir texto