Checklist
Checklist
José Eduardo Mendonça Santos1
1Gastrenterologista; E-mail: josesantos@netcabo.pt.
O termo checklist, que se pode traduzir por Lista de Verificação, provém da
década de 30 do século passado, da força aérea norte-americana, quando se
percebeu que a complexidade crescente dos aviões provocava, devido a falhas de
concentração ou de memória, acidentes fatais, os quais se mostrou que eram
evitados com a criação de listas de verificação que devem ser rigorosamente
cumpridas.
Podemos definir checklistcomo a verificação metódica de todas as etapas de um
procedimento para que este se desenvolva com o máximo de segurança.
Apesar da inegável vantagem destas medidas para a aeronáutica tem sido
surpreendentemente lenta a disseminação para outros ramos; de qualquer modo, a
indústria mais especializada já as adoptou e hoje, até para ingresso nalgumas
universidades portuguesas encontramos, nos respectivos sites, checklistspara os
candidatos não omitirem qualquer dado importante que possa comprometer o seu
ingresso; também os bancos usam checklistspara coisas tão simples como abertura
de contas e até organismos oficiais, como a ARS Norte, apresentam checklistsno
seu relacionamento com o público através da internet.
Conexo com esta problemática temos, na Medicina, tudo o que se relaciona com o
Erro Médico1 e a Medicina Baseada na Evidência2, que tem despertado a atenção
de muitas figuras, de que cito, a título de exemplo e respectivamente, os
Professores José Fragata e António Vaz Carneiro2,3 além, naturalmente, do
trabalho da SPED que, em Novembro de 2008 levou a efeito um Simpósio intitulado
Qualidade em Endoscopia Digestiva. Da Formação à Prática: Que Futuro?, o qual
deu origem à publicação de um volume de normas de qualidade em endoscopia
digestiva, distribuída na 6ª Reunião Nacional de Endoscopia Digestiva,
realizada em Coimbra em Março de 2009.
A Organização Mundial de Saúde (WHO/OMS) publicou em 2008 guidelinespara
garantir a segurança dos doentes cirúrgicos em todo o Mundo e, no ano passado,
divulgou online (www.who.int/safesurgery) o Implementation Manual WGOSurgical
Safety Checklist 20094, coordenada por Atul Gawande, depois de vários estudos
desencadeados por um notável trabalho de Peter Provonost, que mereceu honras de
destaque no conhecido New Yorker5, e que demonstrou que, nas Unidades de
Cuidados Intensivos, a simples implementação de um rigoroso controlo do emprego
das clássicas medidas de desinfecção na colocação de cateteres venosos
centrais, causou uma baixa da mortalidade e das complicações, reduzindo
igualmente o tempo de internamento; evidentemente este controlo implicou a
designação de controladores, com poder para obrigar qualquer elemento a refazer
todo o procedimento quando falhasse algum passo.
Em Portugal, foi decidido implementar na generalidade das unidades do SNS, a
partir de 15 de Janeiro de 2010, com início no Hospital de Santa Marta, a
checklistde segurança cirúrgica, baseada na referida directiva da OMS.
Parece claro que é chegada a hora de aproveitar estas grandes lições na
Gastrenterologia, especialidade com inúmeras técnicas cada vez mais próximas ou
comuns à cirurgia, em que a intervenção roça, com frequência, atitudes de séria
complexidade e risco.
Na medida do possível, devemos minimizar, até ao limite, as possibilidades de
erro, conferindo todos os passos indispensáveis bem como verificando
previamente o material, as alterações de medicação (suspensão de anticoagulação
ou, pelo contrário, instituição de antibioterapia), etc. Não é demais recordar
que a institucionalização das checklistsna cirurgia permitiu constatar que
coisas tão simples e óbvias como a confirmação de que o doente a entrar para o
bloco é mesmo o que está marcado ou a identificação correcta do local de
intervenção, por exemplo, o lado de um ponto herniário, não eram frequentemente
confirmados.
Para além de nos ajudar a tratar melhor os nossos doentes, a implementação das
checklistspode-nos ajudar na defesa de processos judiciais que tenderão,
inevitavelmente, a aumentar sendo que um dos pontos a serem conferidos
(checados) será a confirmação da assinatura do consentimento informado, mas
também que, dentro do humanamente possível, tudo foi feito para minimizar os
riscos.
Obviamente será difícil a implementação das checklists, sendo esperadas, quase
garantidas, resistências, pelo que se sugere a sua entrada progressiva, com
ajuste dos itens indicados a cada instituição, mas partindo duma base geral e
universal. Mais do que nomear pessoas, devem-se utilizar as que se sintam
motivadas, tendo o apoio da Direcção de Serviço e da Administração do Hospital.
Devem ser incluídos os vários grupos, no caso concreto e para além dos médicos,
obrigatoriamente os enfermeiros e pessoal auxiliar, como o(s) secretário(s) de
unidade, etc, naturalmente em aspectos sectoriais das checklists, devendo
sempre haver um responsável /coordenador; não devemos esquecer as
especialidades que colaboram, directa ou indirectamente, como os anestesistas,
cirurgiões, radiologistas e anátomo-patologistas.
A checklistdeve ser o mais pequena e clara possível ' idealmente de 5 a 9
pontos concisos em cada segmento, cada um dos quais verificável num minuto. Um
segmento competirá ao secretariado ' marcação correcta do exame com todas as
indicações que se justifiquem, como vir acompanhado, trazer exames anteriores,
não só da especialidade mas gerais, como análises, ECG, etc, outro, prévio ao
início da sessão, será da competência dos enfermeiros de sala ' verificar se
está a postos tudo o que possa ser necessário, não só para as rotinas mas
também e principalmente para casos urgentes, como hemorragias (adrenalina,
polidocanol, etc, nas doses adequadas), outra dos gastrenterologistas,
confirmando a medicação habitual, história de alergias, patologias associadas
e, em exames programados, exactamente o que é esperado encontrar.
No final do exame, novamente deverão ser checados os procedimentos
subsequentes ' correcta rotulagem de frascos de biópsia, tempo sem comer ou
conduzir viaturas, cuidados gerais e retoma de medicação suspensa, nova
consulta, etc.
A verificação da checklistdeve ser verbal, ainda que com a colocação de um
sinal (V) no local respectivo.
É sempre aconselhado começar lentamente mas com passos seguros, com voluntários
motivados, sendo a disseminação progressiva, à medida que se consigam cativar
aderentes.
É tempo de avançar!