Carga da doença atribuível ao tabagismo em Portugal
Introdução
Os estudos da carga da doença têm como objectivo quantificar num índice global
os níveis de saúde de uma população e, em particular, os efeitos de uma doença
ou factor de risco. Neste estudo, a carga da doença e estimada através da
componente atribuível ao tabagismo dos anos de vida perdidos prematuramente
ajustados pela incapacidade (no original DALY – disability adjusted life
years), uma medida proposta e usada por instituições internacionais, como a
Organização Mundial de Saúde (OMS)
1
ou o Banco Mundial
2
.
O consumo de tabaco e hoje uma das maiores fontes de problemas de saúde nos
países desenvolvidos. A OMS estimou recentemente(1) que a nível mundial cerca
de 8,8% das mortes e 4,1% dos DALY nos países desenvolvidos e atribuível ao
tabagismo, sendo este um factor de risco majorpara o cancro do pulmão, outras
doenças oncológicas, doenças cardiovasculares e doenças respiratórias(2). Na
medida em que a prevalência do tabagismo e mais elevada nos países ricos, as
estimativas nesses países são ainda mais elevadas: no caso da Europa Ocidental,
a OMS estima que cerca de 14% da carga da doença seja atribuível ao tabagismo.
Este artigo reporta os resultados de um estudo da carga da doença associada ao
consumo de tabaco em Portugal, calibrado para os dados disponíveis para o ano
2005. Apresentamos estimativas da carga da doença total das doenças
relacionadas com o tabagismo e da carga da doença estatisticamente atribuível
ao tabagismo.
Por último apresentamos estimativas da carga da doença que seria evitável se
todos os fumadores deixassem o consumo de tabaco e passassem a ter os níveis de
risco estimados para as actuais populações de ex-fumadores.
Metodologia
A medida da carga da doença
A fim de sumariar os problemas de saúde de uma população, foram desenvolvidos
vários índices, sendo que os mais utilizados baseiam a unidade de medida da
carga da doença nos anos de vida saudável que se perdem devido a doença ou a
morte prematura. A carga da doença e estimada a partir dos indicadores de
incidência, prevalência, duração e mortalidade.
De todos os índices disponíveis, destaca-se o índice baseado numa metodologia
preconizada pela Organização Mundial de Saúde e pelo Banco Mundial denominada
DALY – disability adjusted life years– traduzida por anos de vida ajustados por
incapacidadee desenvolvida por Murray e co-autores3-5. Os DALY foram já
utilizados em Portugal para medir a carga da doença atribuível a
hipercolesterolemia6, numa contribuição que contem igualmente informação sobre
a metodologia e alguns detalhes da construção da medida. Os DALY podem ser
interpretados como uma medida do tempo de vida saudável perdido por uma
população devido a morte prematura e a redução da qualidade de vida decorrente
da morbilidade por esta aumentar o tempo vivido com incapacidades.
Prevalência corrente e passada do tabagismo
A principal fonte de informação sobre a prevalência do tabagismo em Portugal e
dada pelos inquéritos nacionais de saúde, sendo os inquéritos mais recentes o
de 1998 e o de 2005, que designaremos por INS987 e INS058, respectivamente.
O Quadro I, construído com base em dados dos INS98 e INS05, sumaria a
informação sobre prevalência de tabagismo na população portuguesa do
continente, com quinze ou mais anos de idade.
Quadro_I
– Prevalência do tabagismo na população portuguesa (Idade ≥15)
Globalmente, a proporção de fumadores na população com 15 ou mais anos em 2005
era de 20,2%, uma descida de 0,3% face a taxa correspondente para 1998. Essa
descida foi conseguida a custa de uma descida de 1,8% no tabagismo nos homens,
já que nas mulheres ocorreu um aumento da taxa de 9,5% para 10,3%. Por outro
lado, o Quadro I mostra que a proporção da população que nunca fumou se reduziu
em dois pontos percentuais, para 64,1%. Isto significa necessariamente que
houve um aumento de 2,3% na categoria dos ex-fumadores. Ou seja, apesar de uma
tendência masculina para fumar menos, a proporção da população que fuma ou já
fumou cresceu entre 1998 e 2005.
A distribuição das prevalências por sexo e grupo etário em 2005 podem ser
vistas nas Figs. 1 e 2 para homens e mulheres, respectivamente. As taxas de
prevalência femininas são substancialmente inferiores e os padrões de ciclo de
vida subjacentes a ambas as figuras não são qualitativamente semelhantes. Em
ambos os sexos o tabagismo cresce até ao grupo etário dos 25 a 34 anos,
declinando uniformemente a partir dessas idades, mas a prevalência do tabagismo
passado (ex-fumador) e uniformemente crescente com a idade nos homens, ao passo
que nas mulheres decresce a partir de idades superiores a 34 anos, tal como o
tabagismo.
Fig. 1 – Prevalência de tabagismo por grupos etários: Homens
Fig._2 – Prevalência de tabagismo, actual e passado: Mulheres
Isso permite a interpretação de que ao longo da vida uma elevada proporção de
homens, que nalguns grupos etários chega aos 65%, e fumador ou ex-fumador. No
caso das mulheres, a situação e bem diferente, dado que a prevalência corrente
ou passada de tabagismo mal ultrapassa os 30% no grupo com maior prevalência de
tabagismo ao longo da vida, entre os 35 e os 44 anos de idade.
Como veremos adiante, as características epidemiológicas dos ex-fumadores são
distintas, quer dos fumadores correntes quer dos nunca fumadores. O facto de
tal grupo estar a crescer como proporção da população vem reforçar a
necessidade analítica de o estudar separadamente. Uma análise da carga da
doença devida ao tabagismo só poderá ser exaustiva se contar, não apenas com o
tabagismo corrente, mas também com o tabagismo passado. Este último só se
poderia considerar irrelevante se a condição de ex-fumador fosse equivalente a
de nunca fumador em termos dos riscos corridos. Não e esse o caso, como se
mostra na secção seguinte, que aborda os riscos relativos de fumadores e ex-
fumadores para um conjunto de patologias importantes associados ao consumo de
tabaco.
Carga da doença e tabagismo
Uma vez explicitada a escolha feita quanto a metodologia de estimação da carga
da doença, e revistos os dados sobre a prevalência, resta descrever como se
estimam os DALY no caso do tabagismo.
O primeiro passo consiste em seleccionar as patologias mais relevantes
associadas ao consumo de tabaco e para as quais possamos dispor de dados
fiáveis. Estas patologias estão listadas no Quadro II, juntamente com a sua
codificação pelas duas classificações internacionais das doenças, a ICD 9 –
modificação clínica revista, e a ICD 10.
Quadro_II
– Códigos da ICD 9-CM e ICD 10 para doenças associadas ao tabagismo
Fonte: http://apps.nccd.cdc.gov/sammec/ e http://apps.nccd.cdc.gov/sammec/
show_risk_data.asp
O primeiro passo da análise relacionando a carga da doença com o tabagismo
termina com a estimativa da carga da doença para estas causas, o que a partida
permite igualmente avaliar a importância relativa destas doenças específicas no
conjunto de todas as doenças e outras causas de morte que afectam a população
portuguesa.
O segundo passo consiste em estabelecer a relação quantitativa entre o
tabagismo e as patologias indicadas. Para tal, iremos socorrer-nos dos
conceitos epidemiológicos de risco relativo e de risco atribuível a população.
Neste caso, o risco relativo (RR) e o rácio entre o risco de uma doença ou
morte para uma população exposta ao hábito tabágico e esse risco para uma
população não exposta. Estimativas do Center for Disease Control and Prevention
(CDC) dos EUA9 para fumadores e ex-fumadores podem ser encontradas no Quadro
III.
Quadro_III
– Riscos relativos para fumadores e ex-fumadores
Fonte: Centers for Disease Control and Prevention, Projecto “Smoking -
Attributable Mortality, Morbidity, and Economic Costs (SAMMEC)”, http://
apps.nccd.cdc.gov/sammec/show_risk_data.asp
O Quadro III mostra que apesar de o facto de deixar de fumar conduzir a
reduções substanciais nos riscos de contrair as doenças indicadas, os níveis de
risco para os “ex-fumadores” continuam mais elevados do que para os “nunca
fumadores.”
O rácio dos riscos relativos de “fumadores” versus“ex-fumadores” varia desde a
unidade até 3,2 para as patologias consideradas.
Mesmo que o risco relativo se vá reduzindo com o decorrer do tempo após deixar
de fumar, e até possa convergir com o dos nunca fumadores, em média esta
população tem um risco agregado maior do que os nunca fumadores.
Há varia características do Quadro III que vale a pena assinalar:
– A transição de fumador para ex-fumador diminui substancialmente os riscos
relativos, mas em geral as populações de ex-fumadores continuam a ter riscos
claramente superiores as populações de nunca fumadores;
– Há doenças em que os riscos relativos são extremamente elevados, acima de 10,
como e o caso do cancro do pulmão, o cancro dos “lábios, cavidade oral e
faringe”, o cancro da laringe e o caso das doenças respiratórias;
– Além dos homens terem maior prevalência do tabagismo, tem maiores riscos
relativos. Em 60% das situações ou patologias estudadas, o RR dos homens e
superior ao das mulheres, sendo este o caso em particular nos cancros do pulmão
e dos lábios, cavidade oral e faringe. Essa diferença verifica-se quer para os
riscos relativos de fumadores quer de ex-fumadores. Ou seja, mesmo que a
prevalência do tabagismo fosse igual em ambos os sexos, o tabagismo seria mais
gerador de doenças nos homens;
– A transição de fumador para ex-fumador tem impacto diferenciado nos riscos
relativos de acordo com as patologias e o sexo, mas em média a redução dos
riscos relativos é igual entre sexos.
Vejamos agora o risco atribuível a população. No caso mais simples, quando há
uma subpopulação com um factor de risco, a formula que define a fracção dos
casos de uma doença atribuível a esse factor de risco e bem conhecida10. A
percentagem dos casos de cada doença elimináveis, se fossem anulado o factor de
risco e dada pela fracção atribuível da população (FAP).Ao nível mais simples,
a FAP pode ser vista como uma redução percentual da incidência:
onde Ipe a incidência de uma doença na população total e Iue a incidência entre
os não expostos ao factor de risco. É possível deduzir uma forma mais útil
desta equação. Seja Pa proporção de uma população-alvo fumadora.
Seja RR o risco relativo de uma patologia ou seja RR=Ix/Iu, onde Ix e a
incidência entre os expostos. Podemos reescrever a FAP de acordo com a equação.
A FAP permite imputar ao tabagismo a fracção da carga da doença associada a
cada uma das patologias referidas. Por exemplo, no caso da doença cardíaca
isquémica, o risco relativo (RR) da população feminina fumadora com menos de 65
anos e de 3,08. Admitindo uma prevalência do tabagismo de 10,3%, então a FAP e
17,6%, ou seja, esta e a proporção da carga da doença isquémica nas mulheres
abaixo dos 65 anos imputável ao tabagismo.
O exemplo anterior não e directamente valido no presente caso, porque assume
que existe apenas um factor de risco. Como já foi referido, no caso do
tabagismo ha dois factores de risco diferenciados: ser fumador e ser ex-
fumador.
Como os factores de risco não se sobrepõem, por definição, dão lugar a duas
subpopulações, sendo possível deduzir a FAP neste caso:
sendo Pfe RRfrespectivamente a prevalência e o risco relativo dos fumadores e
Pexe RRexa prevalência e risco relativo dos ex-fumadores.
Neste caso, a FAP e interpretável como a proporção da carga da doença que
desapareceria se nunca se tivesse fumado em Portugal, o que representa uma
medida global da doença atribuível ao tabaco.
No entanto, adicionalmente, porventura ate sera mais interessante encontrar um
índice que permita responder a seguinte questão:
Se todos os fumadores actuais em Portugal desistissem de fumar, qual a fracção
da carga da doença que se estima iria desaparecer com essa
transição?Naturalmente, a diferença face ao caso anterior e que, em vez de
todos os riscos relativos se converterem na unidade, temos que o risco relativo
dos fumadores se converte no risco relativo dos ex-fumadores.
Estes últimos naturalmente não sofrem qualquer alteração no seu risco.
Designamos este índice por fracção redutível da população (FRP)e a fórmula
correspondente é
Tabagismo, evidencia e risco redutível
O conceito de risco redutível, entendido como a diminuição do risco para a
saúde após a cessação tabágica, traduzido pela redução da gravidade das
patologias associadas ao tabagismo, pelo menor numero de complicações ou
manifestações clínicas daquelas ou mesmo pela redução da mortalidade a elas
associada, encontra suporte cientifico na literatura medica.
Neste sentido, fizemos uma breve revisão e analise dirigida aos principais
grupos de patologias associadas ao consumo de tabaco, em particular a neoplasia
do pulmão, a patologia cardiovascular e a DPOC, identificando, embora de forma
não exaustiva, publicações que fornecessem evidencia cientifica para o conceito
supramencionado.
Neoplasia do pulmão
De entre os trabalhos publicados que relacionam a neoplasia do pulmão com o
tabagismo, verificando-se beneficio clínico da cessação tabágica, traduzido por
diminuição da incidência e redução do risco de desenvolvimento de neoplasia do
pulmão, destacamos:
– Ebbert JO et al11, que, analisando uma coorte de 37 078 mulheres ao longo de
14 anos (47011 pessoas/ano), quantificou o risco relativo global para
desenvolvimento de neoplasia do pulmão em fumadores e ex-fumadores em 5,6
quando comparado com nunca fumadores. Este risco reduz-se para 1,0 após mais de
30 anos de cessação tabágica, sendo de 3,7 para 21-30 anos e 11,6 para 0-
5 anos, apontando para um risco mantido mas decrescente por período longo após
a cessação que tendencialmente se aproxima da população nunca fumadora.
– Yun YH et al12, num estudo prospectivo de 6 anos envolvendo 437 976 coreanos
avaliou o risco absoluto de desenvolvimento de neoplasia do pulmão relacionado
com o tabagismo, verificando que a incidência daquela patologia foi
significativamente maior nos doentes fumadores (23,1/100 000 pessoas/ano)
quando comparada com os nunca fumadores e ex-fumadores (11,1 e 13,3,
respectivamente).
Este resultado esta em linha com a documentação de significativa redução do
risco relativo de desenvolvimento da doença com a cessação tabágica (21,7 para
os fumadores e 6,8 para os ex-fumadores).
Patologia cardiovascular
De entre os trabalhos publicados que relacionam a patologia cardiovascular, em
particular a doença coronária, com os hábitos tabágicos, verificando -se
beneficio clínico da cessação tabágica traduzido por redução do risco de
eventos coronários e da mortalidade, destacamos:
– Mohiuddin SM et al.13 mostram que a implementação de um programa activo de
cessação tabágica em doentes internados por doença cardiovascular aguda
conduziu a uma redução aos 2 anos de 44% e 77% no risco relativo de
hospitalização e morte, respectivamente, por causa cardiovascular. Este efeito
traduziu -se na diminuição de 9,2% na mortalidade por qualquer causa neste
grupo de doentes;
– Twardella T et al.14 estudaram o risco de evento cardiocerebrovascular
secundário em 1029 doentes após a primeira manifestação de doença coronária,
quantificando o hazard ratio(tomando como referencia os doentes que mantiveram
os hábitos tabágicos) em 0,26 para os não-fumadores; 0,51 para os ex -fumadores
e 0,42 para os doentes que denominaram recent quitters, concluindo que o
impacto da cessação tabágica no prognostico a longo prazo dos doentes com
doença coronária poderá ser maior do que o habitualmente considerado;
– Critchley JA e Capewell S15, numa revisão sistemática de 20 estudos,
envolvendo 12 603 fumadores com doença coronária (45% cessaram consumo de
tabaco, 55% mantiveram hábitos tabágicos) quantifica o risco relativo para
mortalidade por qualquer causa e enfarte agudo do miocárdio (EAM) nao fatal nos
doentes que cessaram o consumo em 0,64 e 0,68, respectivamente, tomando como
referencia os doentes que mantiveram os hábitos tabágicos. Verificaram que a
significativa redução dos riscos referidos e independente da idade e do sexo.
– Godtfredsen NS et al.16, num estudo de coorte prospectivo, analisou os
efeitos da redução e da cessação tabágica na incidência de EAM, abrangendo um
total de 19 423 doentes por um período de 22 anos (1976-1998), verificando que
a redução de 50% ou 33% do consumo de tabaco não estava associado a redução no
risco de EAM (hazard ratios1,14 e 1,06, respectivamente) quando comparados com
os doentes que mantiveram os seus hábitos tabágicos. Documentou contudo que a
cessação tabágica estava associada a uma redução do risco de EAM de 29% (hazard
ratio:0,71). Perfil semelhante foi encontrado relativamente ao risco de outros
eventos coronários.
Doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC)
De entre os trabalhos publicados que relacionam a DPOC com o tabagismo,
verificando-se beneficio clínico da cessação tabágica traduzido por redução da
degradação da função pulmonar, da mortalidade e dos internamentos hospitalares
por DPOC, destacamos:
– Scanlon PD et al.17, no seguimento por um período de 5 anos de um grupo de
5887 doentes, analisou a redução anual do FEV1 em três grupos de doentes:
doentes com cessação tabágica mantida; doentes com cessação intermitente e
doentes que mantém o consumo regular de tabaco. Verificou que no 1.o e 2.o
grupos a redução do FEV1 foi de 31 e 43 mL/ano, respectivamente, enquanto no
3.o aquele parâmetro foi de 62 mL/ano, concluindo que a redução do FEV1
corresponderia ao factor preditivo mais significativo da evolução da função
pulmonar após a alteração do statustabágico após 1 ano. Adicionalmente,
verificou que o factor preditivo mais significativo da evolução da função
pulmonar seria o statustabágico final, concluindo que há sempre beneficio na
cessação tabágica para os fumadores com evidencia de obstrução brônquica,
independentemente da maior intensidade dos hábitos tabágicos prévios;
– Pelkonen M et al.18 que, no seguimento de 30 anos de um grupo de 1711 homens
analisou a redução do FEV1 em doentes nunca fumadores; doentes ex-fumadores na
baseline; doentes que cessaram o consumo durante o seguimento; doentes com
interrupções intermitentes do consumo e doentes com consumo mantido; verificou
que o declínio médio anual do FEV1 aos 30 anos foi de 34,8 mL no 1.o grupo,
semelhante ao verificado nos grupos de ex-fumadores e fumadores que cessaram o
consumo durante o seguimento (36,1 mL e 35,8 mL, respectivamente), contrapondo
o valor médio de 51,8 mL/ano nos doentes em que não se verificou cessação
tabágica. Adicionalmente, foi quantificado o hazard ratiopara mortalidade de
todas as causas, com uma redução de cerca 30% para os doentes nunca fumadores
ou ex-fumadores, 20% para os casos em que a cessação tabágica ocorreu durante o
seguimento ou que foi intermitente, tendo como referencia os doentes que
mantiveram os hábitos tabágicos ao longo do seguimento;
– Pelkonen M et al.19, analisando a incidência cumulativa de DPOC num
seguimento de 40 anos, verificou que a incidência de DPOC foi de 19% nos
fumadores contínuos, contra 4,5% nos ex-fumadores, próxima dos 4% identificados
nos nunca fumadores. Documentaram igualmente um aumento de 2,4 anos na
sobrevivência mediana nos doentes que cessaram o consumo de tabaco, quando
comparada com os que mantiveram os hábitos tabágicos;
– Godtfredsen NS, et al.20, analisando o hazard ratiopara hospitalização por
DPOC numa população de 19 709 doentes dinamarqueses, com um seguimento médio de
14,4 anos, verificaram que, tomando como referencia os doentes que mantiveram
os hábitos tabágicos, a quantificação daquele risco para os ex -fumadores foi
de 0,30 (0,14 para os não fumadores), sendo que, nos doentes em que se
verificou uma redução do consumo, foi de 0,93, vincando a vantagem clínica
efectiva da cessação tabágica e questionando o beneficio da redução do consumo.
Partindo das estimativas das prevalências do tabagismo corrente e passado em
Portugal apresentadas no Quadro_I, bem como dos riscos relativos estimado pelo
CDC e apresentados no Quadro_III, o Quadro IV apresenta as estimativas para
Portugal da fracção atribuível e da fracção redutível no pais para o conjunto
das doenças relevantes.
Quadro_IV
– Fracção atribuível e fracção redutível
Os resultados no Quadro IV merecem três notas. A primeira e uma chamada de
atenção para a diferença substancial entre a fracção atribuível e a fracção
redutível para a generalidade das doenças relacionadas com o tabagismo,
situação cujo caso extremo e dado pela DPOC (bronquite, enfisema). Mesmo assim,
em media, cerca de 56% da carga da doença atribuível ao tabagismo e eliminável,
ou seja, desapareceria se todos os fumadores abandonassem o habito. A segunda
nota diz respeito a diferença entre sexos. Na maioria das doenças consideradas,
a fracção atribuível e a redutível dos homens e mais do dobro das fracções
correspondentes nas mulheres. Já vimos que tal situação radica, por um lado, na
maior prevalência do tabagismo entre os homens e, por outro, em riscos
relativos masculinos mais elevados.
Adicionalmente, temos que a fracção redutível como proporção da fracção
atribuível tem valores médios mais elevados nas mulheres. A terceira nota diz
respeito a evolução das FAP e FRP no tempo. Comparando as estimativas no Quadro
IV com as estimativas correspondentes baseadas no INS98 (não incluídas por
razões de espaço), vemos que para os homens ocorreu em média uma redução
proporcional das FAP na ordem de 1% e uma redução das FRP na ordem dos 5%. Isso
significa que a redução da prevalência do tabagismo mais do que compensou o
aumento do ex-tabagismo. Para as mulheres, e dado o aumento da prevalência do
tabagismo e do ex-tabagismo, ocorreu uma evolução de sinal contrário, com um
aumento percentual médio das FAP de quase 9% e das FRP de cerca de 6%.
Resultados para os DALY por morte
Carga da doença por mortalidade geral
Para obtermos resultados respeitantes a carga da doença na população portuguesa
escolhemos basear a analise num ano recente para o qual estivessem disponíveis
os dados necessários para a analise, tendo sido escolhido 2005.
Os dados de base sobre mortalidade foram retirados das Estatísticas da Saúde do
INE21 para 2005, as quais abrangem a população do continente, cujos efectivos
totais foram retirados das estimativas da população residente22. Em particular
usaram-se as estatísticas dos óbitos por causa de morte (CID -10: lista 2 –
Mortalidade geral – lista seleccionada – 80 causas) e sexo, segundo a idade (em
anos)(4).
O Quadro V contem a estimativa da carga da doença total devido a mortalidade
para Portugal continental no ano de 2005.
Quadro V – DALY por morte, 2005
Fonte: Portugal – Estimativas dos autores baseados nas Estatísticas da Saúde e
nas Estatísticas Demográficas para 2005 do INE e nas estimativas revistas da
OMS para a zona Europa A em 2002
(3)
De acordo com o Quadro V, em 2005 e devido a mortalidade prematura perderam-se
em Portugal continental 6493 anos de vida ajustados por incapacidade por cada
100 000 habitantes. Este valor mostra que houve algum progresso na redução da
carga global da doença por morte prematura, já que e 5,4% inferior a estimativa
correspondente para 2000 (6862)23. No entanto, quando comparados com a
estimativa da OMS para a media dos países mais ricos da Europa em 2002, os
valores são 12,5% mais elevados, pelo que ainda nao se convergiu com os
indicadores europeus nesta área.
A distribuição da mortalidade e dos anos perdidos por sexo e por grupo etário
encontram-se no Quadro VI e esta ilustrada na Fig.2.
Quadro VI – Óbitos e DALY por morte por sexo e idade em 2005
Os óbitos por idade e sexo representados na Fig._2 seguem um padrão conhecido,
reflectindo a composição da população por sexo e por grupos etários, bem como
as taxas de mortalidade especificas de cada subgrupo demográfico.
A carga da doença, medida pelos DALY, segue um padrão ligeiramente diferente,
já que uma morte tende a produzir tanto mais anos perdidos quanto mais
precocemente ocorre(5). Apesar disso, há uma carga pequena da doença com origem
no primeiro ano de vida devido as reduzidas taxas de mortalidade infantil. A
partir dos 15 anos, a carga da doença vais crescendo, atingindo um máximo no
grupo dos 70 a 74 anos para os homens e no dos 75 a 79 anos para as mulheres,
picos que antecedem os correspondentes picos de mortalidade. Até aos 75 anos a
carga da doença suportada pelos homens e substancialmente mais elevadas que a
das mulheres, invertendo-se a situação a partir dessa idade, muito fruto da
composição maioritariamente feminina da população.
Uma forma de ver a diferença entre sexos e comparar o número médio de DALY por
morte masculina (7,1 anos) com o mesmo rácio para a mortalidade feminina (5
anos).
Esta diferença decorre em parte de as mulheres morrerem em media com 79 anos,
ao passo que a idade media do óbito nos homens e de 72 anos.
Um ultimo aspecto relevante para capturarmos a diferença entre medir a carga da
doença simplesmente pela mortalidade e medir pelos DALY e que, em termos
relativos, a carga da doença medida por DALY e superior a medida pela
mortalidade para os grupos demográficos antes dos 75 anos, invertendo-se a
posição relativa em idades superiores a esse limiar.
Tabagismo, mortalidade e carga da doença relacionadas, atribuíveis e redutíveis
Um primeiro passo na quantificação da carga da doença devida ao tabagismo e
identificar a proporção da carga da doença total gerada pelas doenças
relacionadas com o tabagismo.
O Quadro VII apresenta esses dados para a população e por sexo. Nele vemos que
o conjunto de doenças identificado no Quadro_II e responsável por cerca de 49%
da mortes ocorridas em 2005 no continente e por 36% dos DALY, sendo as
respectivas proporções cerca de um a dois por cento mais baixas nos homens do
que nas mulheres.
Quadro_VII
– Óbitos e DALY por morte – Totais e relacionados com o tabagismo
A distribuição por sexo e grupos etários dos DALY gerados pelas doenças
relacionadas com o tabaco pode ser visto na Fig. 3.
Fig. 3 – DALY por morte por sexo e idade em 2005
A Fig. 4 elucida a natureza da relação entre a carga da doença por idade e a
carga da doença gerada por doenças relacionadas com o tabagismo. Ate aos 30
anos a proporção da carga da doença gerada por tais doenças e secundária,
crescendo a sua importância com a idade ate aos 85 anos, altura em que quase
60% da carga da doença e gerada pelas doenças relacionados com o tabaco
(listadas no Quadro_II).
Fig. 4 – DALY por morte das doenças relacionadas com o tabagismo, por sexo e
grupo etário
Fig. 5 – DALY por morte em 2005 para doenças relacionadas com o tabagismo,
proporções dos DALY totais por sexo e grupo etário (Fonte: Quadro_II)
Naturalmente, mesmo para as doenças relacionadas com o tabagismo (DRT),só parte
da respectiva carga da doença pode ser imputada ao tabaco. Aplicando as FAP
apresentadas no Quadro_IV para os dados da mortalidade por causa de morte,
estimamos a carga da doença atribuível ao tabagismo, com os resultados patentes
no Quadro_VII.
Para a totalidade da população 11,7% das mortes (12 615) e 11,2% dos DALY (73
675 anos) são atribuíveis ao tabaco. A Fig. 7 ilustra a distribuição dos DALY
atribuíveis e redutíveis por sexo e por grupos etários.Os números totais da
carga atribuível repartem-se de forma muito desigual entre os sexos, ja que
17,7% dos óbitos e 15,4% dos DALY masculinos são atribuíveis ao tabaco, ao
passo que tais proporções para o sexo feminino são 5,2% e 4,9%,
respectivamente. Estes números para a mortalidade atribuível são mais elevados
do que as estimativas anteriormente disponíveis para Portugal
(6)
, as quais apontavam para 14% das mortes masculinas e apenas 0,9% das
femininas. Nos homens recai 78,4% da mortalidade e 82,8% dos DALY atribuíveis
ao tabagismo. Em termos de grupos etários, os DALY redutíveis concentram-se
entre os 40 e os 80 anos, com os DALY redutíveis masculinos apresentando um
máximo nos 50 anos (e um pico secundário aos 70 anos), ao passo que os DALY
redutíveis femininos tem um máximo nos 75 anos.
Fig._6 – Tabagismo: DALY por morte atribuíveis e redutíveis
Fig. 7 – DALY por morte atribuíveis ao tabagismo para doenças relacionadas,
população total
Note-se que o conceito de carga da doença atribuível e correcto como métrica da
carga da doença devida ao tabagismo, mas e inadequado para medir o ganho máximo
de intervenções, já que estas tem de tomar como um dado adquirido a historia de
consumo de tabaco da população.
O Quadro_VII contem ainda estimativas da carga da doença redutível, ou seja, da
mortalidade e DALY que se poderiam eliminar se todos os fumadores se
convertessem em ex-fumadores. Estes dados são relevantes porque a carga da
doença redutível nos da o montante máximo de ganhos de saúde que poderia
ocorrer com intervenções de saúde, condicionalmente aos comportamentos passados
da população intervencionada.
As estimativas para Portugal em 2005 indicam que as mortes e os DALY seriam
redutíveis em cerca de 5,8% se deixasse de haver fumadores activos, o que
significa mais de 6200 mortes e de 38 000 anos de vida ajustados.
Uma questão relevante e saber qual e a repartição da carga da doença atribuível
e redutível por grupos de doenças. O Quadro VIII providencia essa informação.
Quadro VIII – DALY por morte, atribuíveis e redutíveis, por grupos de doenças
Quer para a carga da doença atribuível quer para a carga redutível, o cancro do
pulmão e claramente a doença quantitativamente mais importante. Já no que diz
respeito as outras doenças, as hierarquias da carga da doença atribuível e da
carga da doença redutível são diferentes. A Fig._6 ilustra a distribuição por
grupos etários e por grupos de doenças da carga da doença atribuível. Se a
população portuguesa nunca tivesse fumado, haveria uma redução de anos
ajustados perdidos sobretudo por redução da doença isquémica e de outras
neoplasias.
No caso de toda a população de fumadores desistir do habito, alem do cancro do
pulmão, os ganhos de saúde viriam sobretudo da redução da doença vascular
cerebral.
Resultados para os DALY por incapacidade
Dados, modelos e metodologia
Uma das grandes vantagens do indicadores DALY como métrica da carga da doença
face a simples mortalidade e que e possível estimar a carga da doença gerada
pela morbilidade.
As referencias já indicadas contem os detalhes técnicos, mas a ideia
fundamental e que o tempo vivido com uma doença contribui para os anos de vida
perdidos, na medida em que tal doença e incapacitante
(7)
. No caso da mortalidade, os anos de vida perdidos medem-se relativamente a uma
tábua de mortalidade de referencia, usada universalmente.
No caso da morbilidade, e necessário estimar a duração, ou seja, quantos anos
em media vivera um doente com o nível de incapacidade atribuído. Note-se que o
fim da duração se pode dar por morte ou por remissão, entendida como o fim do
estado de doença.
A estimativa da carga da doença por incapacidade requer um conjunto de dados
muito mais detalhado do que no caso da mortalidade. São necessários, para cada
doença, as estatísticas da incidência, duração e níveis de incapacidade por
sexo e por grupos etários.
Este elevado nível de complexidade torna extremamente difícil calcular os DALY
por incapacidade para todas as doenças, e uma tal tentativa estaria sempre fora
do âmbito do presente trabalho. Apesar de tais dificuldades, apresentaremos
estimativas da carga da doença por incapacidade para algumas das doenças mais
importantes relacionadas com o consumo de tabaco.
Nestes casos foi possível obter dados que, conjuntamente com alguma informação
da literatura e uma metodologia de estimação/modelização, possibilitaram as
estimativas dos DALY por incapacidade.
De notar que algumas doenças se caracterizam por níveis de incapacidade
pequenos devido a sua duração. Por exemplo. a pneumonia e a gripe são problemas
graves de saúde devido a mortalidade gerada pelos casos agudos, mas na medida
em que a duração media destes casos e limitada (tipicamente duas semanas) e na
medida em que a dimensão tempo e crucial no calculo da carga da doença por
incapacidade, acabaríamos por apurar valores negligenciáveis para DALY perdidos
por incapacidade.
Por esta razão, as estimativas da carga da doença por incapacidade concentram-
se em doenças crónicas ou de longa duração.
A carga da doença pela via da morbilidade foi estimada a partir de um conjunto
de dados parcelares. Foi possível encontrar dados para a incidência de a doença
coronária e do acidente vascular cerebral nas redes referenciação CV-DGS
referentes a 2004. Aplicamos estas taxa a população em 2005 para estimar a
incidência destas doenças nesse ano. Para os coeficientes de incapacidade e
para as durações nao ha estimativas em Portugal. Por esta razão, as estimativas
de tais valores assentam em referencias internacionais, em particular nos dados
do projecto de Carga da Doença da OMS, e devem ser vistas apenas como as
aproximações possíveis aos valores reais para o caso português.
A base de todo o trabalho feito nesta secção e o modelo DisMod II24, construído
por Barendregt para a OMS. O DisMod II e um modelo sofisticado de estimação de
indicadores epidemiológicos. Parte de dois inputsbásicos, a composição da
população por sexos e idades de um pais e as taxas de mortalidade geral para
cada grupo demográfico. Para Portugal utilizamos as já referidas estimativas da
população residente12 no continente para 2005, as quais se estendem
detalhadamente, ou seja, por ano de idade, ate aos 85 anos. Para as taxas de
mortalidade geral da população utilizamos os dados da tábua de mortalidade mais
recentemente publicada em Portugal25.
O modelo DisMod II sistematiza as relações entre um conjunto de indicadores
importantes para cada doença por grupos de idade e sexo: taxas de incidência,
taxas de prevalência, durações, taxas de remissão, taxas de fatalidade(8),
idade inicial da doença, risco relativo de mortalidade.
O modelo requer ser alimentado com um mínimo de três destas variáveis (por
grupos de sexo e idade) e a partir dessas três permite prever as outras. O
modelo e igualmente flexível para poder partir de um inputde mais de três
variáveis, ou seja, havendo algum grau de sobredeterminação da informação. Em
geral e impossível ter estimativas exactas, ou seja, há sempre erros, na medida
em que os diferentes dados raramente são perfeitamente compatíveis, o que e
natural porque, alem das estimativas dos parâmetros epidemiológicos serem
muitas vezes pouco precisas, quase sempre provem de fontes de informação
distintas. O fundamental e que estimativas do modelo são internamente
consistentes e externamente produzem indicadores muito aproximados a informação
parcelar usada como input. Uma das vantagens do modelo e poder dar um peso
distinto a cada tipo de informação, conforme o grau de fiabilidade que lhe e
associado. No presente caso, os dados de mortalidade tiveram geralmente um peso
maior do que outros, porque foram considerados mais fiáveis.
Epidemiologia das doenças relacionadas com o tabaco
No caso da DPOC, podemos retirar informação sobre prevalênciado INS058, bem
como taxas de mortalidadedas Estatísticas da Saúde do INE21. Sabemos que a taxa
de remissãodesta patologia e zero, pelo que já temos o mínimo de três dados
independentes que permitem estimar todos os parâmetros epidemiológicos
relevantes. Adicionalmente, ha estimativas de investigadores da OMS24 para as
durações por idade e sexo, diferenciadas por zonas do mundo. Recorremos neste
caso as estimativas para a Europa Ocidental (Europa Zona A, na terminologia da
OMS) como informação adicional inicial.
Contudo, verificamos que os dados do INS05 tem dois problemas no que aos dados
de prevalência diz respeito. O primeiro e que a DPOC reportada e
autodiagnosticada.
Os dados levam a crer, na nossa interpretação, que haverá um numero não
negligenciável de casos reportados como DPOC mas que corresponderão a episódios
agudos de outras doenças respiratórias. Por outro lado, como o diagnostico da
DPOC implica a realização de espirometria, os dados do INS05 provavelmente
reflectem o não reporte de alguma DPOC ainda não diagnosticada e, dai, o
reporte de uma taxa de prevalência de apenas 3,2%. Esta ideia esta em linha com
os resultados de Cardoso J et al.26 que identificaram uma taxa de prevalência
de DPOC de 5,34% numa amostra de 1384 indivíduos representativa da população
portuguesa.
Para ultrapassar estes problemas, utilizou-se a base de microdados do estudo
Pneumobil27
(9)
, estimando-se taxas de prevalência por grupos demográficos de sexo e idade.
Estas taxas de prevalência foram conjugadas com as estimativas da população
residente por sexo e idades para Portugal continental em 2005.
O modelo DisMod II processou toda a informação referida, obtendo-se um
resultado final com estimativas que se apresentam no Quadro IX. Elas resultam
de maximizar a coerência entre os dados, o que leva a que mesmo os dados que
alimentaram o modelo a partida sejam revistos. Reportaremos sempre estes dados
revistos e não os dados em bruto. Isto significa que há diferenças entre as
taxas de prevalência ou incidência apresentadas e as que se podem retirar
directamente das fontes usadas em cada caso. De notar que a prevalência
estimada da DPOC no grupo dos mais idosos e muito elevada, ja que atinge um em
quatro homens e uma em sete mulheres.
Quadro IX – Estimativas dos parâmetros epidemiológicos da DPOC
Quadro X – Estimativas dos parâmetros epidemiológicos do EAM
Quadro XI – Estimativas dos parâmetros epidemiológicos do AVC
No caso da doença coronária,voltamos a usar o modelo DisMod II, agora
juntamente com a incidência do enfarte do miocárdio nas redes referenciação CV-
DGS referentes a 2004, bem como a prevalência do enfarte agudo do miocárdio –
(EAM) nos dados do INS05
(10)
e as taxas de mortalidade por doença coronária obtidas nas estatísticas da
saúde.
Tal como no caso anterior, há diferenças entre as estimativas dos parâmetros do
modelo e as estimativas retiradas directamente dos dados, incluindo uma taxa de
incidência muito pequena, mas não zero, para idades muito baixas.
Para o caso do acidente vascular cerebralusamos uma metodologia semelhante e as
mesmas fontes para os dados do caso da EAM.
Os dados para o cancro do pulmãoforam provenientes de varias fontes. Como nos
demais casos, a mortalidadefoi retirada das Estatísticas da Saúde para 2005, a
incidênciaprovem de um documento técnico da OMS (citação do Livro da OMS) e as
taxas de fatalidade(ao primeiro ano) do Registo Oncológico da Região Sul28.
As taxas de remissãoforam estimadas como sendo o equivalente anualizado das
taxas de sobrevivência após os cinco anos do diagnostico. Utilizaram-se
adicionalmente como informação para validar o modelo os resultados de Yang P et
al.29.
Não encontramos dados referindo-se directamente a prevalência ou a duração em
Portugal, pelo que estes foram estimados pelo DisMod II a partir dos outros
disponíveis.
Os resultados podem ser encontrados no Quadro XII.
Quadro XII – Estimativas dos parâmetros epidemiológicos do cancro do pulmão
Os dados epidemiológicos dos outros cancros seleccionados como mais relevantes
para medir o impacto do tabaco (lábio, cavidade oral e faringe, laringe,
esófago, estômago e bexiga) foram sujeitos a um tratamento semelhante, com base
nas mesmas fontes de dados.
(11)
Os dados não se apresentam por uma questão de economia de espaço.
Estimativas para DALY por incapacidade
O resultado final da analise epidemiológica apresentada e um conjunto de dados
que permite calcular os anos de vida perdidos ajustados por incapacidade, em
particular as incidências e durações, sendo que outros dados, como as
prevalências, terão utilidade mais tarde, numa estimativa dos custos do sistema
de saúde atribuíveis ao consumo de tabaco.
No entanto, para calcular os DALY devidos a incapacidade gerada pela
morbilidade, falta ainda um conjunto de parâmetros, os pesos de incapacidade
correspondentes a cada doença. Os parâmetros usados foram os que a própria OMS
empregou na analise da carga da doença e foram retirados de
Mathers et al.(2002). O Quadro XIII exibe os pesos quantificando o grau de
incapacidade.
Quadro XIII – Pesos para cálculo dos DALY por incapacidade
No caso das neoplasias, considerou-se que a fase terminal corresponde aos
últimos três meses de vida. Considerou-se que para a doença cardíaca isquémica
a fase aguda inicial tem uma duração media de um mes, ficando depois o doente
com um nível de incapacidade correspondente a angina de peito. No caso do AVC,
consideramos uma duração de seis meses para a fase aguda inicial.
Para cada patologia o peso usado e uma media ponderada entre a duração na fase
aguda ou na fase terminal e a extensão da duração em fases menos agudas. A
media tem também em conta as probabilidades de remissão.
(12)
O resultado final dos cálculos esta exibido no Quadro XV, onde se encontra a
distribuição dos DALY gerados pela morbilidade por grupo demográfico e pelas
principais patologias. No total, a morbilidade gera um montante de 121 643
DALY, cerca de 19% do total dos DALY por morte e 49,5% dos DALY por morte para
as doenças relacionadas com o consumo de tabaco.
Uma análise simples do Quadro XIV mostra que a DOPC e responsável por 61% do
total dos DALY gerados por incapacidade no conjunto da doenças relacionadas com
o tabaco, sendo o AVC responsável por 27% e o EAM por 9%. A Fig. 8 apresenta de
forma mais intuitiva a importância relativa da DOPC no contexto da carga da
doença por incapacidade.
Quadro XIV – DALY por Incapacidade das doenças relacionadas com o tabagismo
Quadro_XV
– DALY por incapacidade atribuíveis ao consumo de tabaco
Fig. 8 – DALY por incapacidades das doenças relacionadas com o tabagismo
O conjunto das neoplasias estudadas tem uma pequena carga da doença por
incapacidade, em termos relativos apenas 2% do total.
Esta composição reflecte acima de tudo as durações, já que as neoplasias são
doenças de duração comparativamente curta, o que significa que a sua carga e
sobretudo por morte e não por incapacidade, ao passo que a DPCO e uma doença em
que o peso relativo dos DALY por incapacidade e muito maior, já que estes são
2,6 vezes maiores do que os DALY por morte para o conjunto das doenças
respiratórias consideradas e 6,5 vezes maiores do que os DALY por morte para a
DPOC propriamente dita.
A Fig. 9 ilustra a distribuição etária dos DALY por incapacidade.
Fig. 9 – DALY por incapacidade das doenças relacionadas com o tabaco, por sexo
e grupo etário
O passo seguinte e apresentar as estimativas dos DALY por incapacidade
atribuíveis ao consumo de tabaco e que são redutíveis, no sentido já usado no
caso dos DALY por morte. O Quadro_XV apresenta os resultados. O total de DALY
atribuíveis e de 72 126, cerca de 59% dos DALY por incapacidade, sendo 82%
gerados pela DPOC, 10% pelo AVC e 5% pelo EAM, ou seja, repete-se o padrão
identificado anteriormente de a DPOC ser, de forma muito dominante, a patologia
quantitativamente mais significativa. Por último, resta apresentar as
estimativas dos DALY por incapacidade redutíveis, o que e feito no Quadro XVI.
Quadro XVI – Tabagismo e DALY por incapacidade redutíveis
Os DALY redutíveis somam um total de 12 417 anos de vida perdidos, cerca de 10%
dos DALY por incapacidade gerados pelas doenças relacionadas com o tabaco.
Neste caso, nota-se uma grande redução da carga da doença face a atribuível,
sendo essa diferença proveniente sobretudo da DPOC. A razão para tal esta no
baixo nível da fracção redutível da DPOC.
(13)
Tabagismo e carga total da doença
Uma comparação mais detalhada entre a distribuição dos DALY por morte prematura
e por incapacidade e impossível devido a falta de dados sobre a incidência,
duração, etc., de todas as doenças consideradas nas causas de morte.
No entanto, podemos apresentar alguns resultados agregados para os casos ou
doenças estudados. Um primeiro resultado agregado e que a totalidade dos DALY
por incapacidade estimado para as doenças consideradas foi de 118 934, o que,
adicionado aos 245 682 estimados para os DALY por causa de morte, nos da um
total de carga da doença relacionadas com o consumo de tabaco de 364 616.
Quanto a parte das doenças relacionadas atribuível ao tabagismo, o Quadro XVII
apresenta as estimativas, com o total por sexo e por patologia, e a repartição
percentual entre DALY por morte e por incapacidade.
Quadro XVII – DALY totais atribuíveis ao tabagismo
A carga da doença atribuível ao tabagismo e 40% da carga total das doenças
relacionadas com o tabaco.
De acordo com o Quadro XVII, o tabagismo e responsável pela perda anual de 146
mil anos de vida ajustados pela incapacidade, sendo que a carga da doença
atribuível ao tabagismo e que não se deve a mortalidade e de 49% (72 126 DALY),
algo que se deve em grande parte a pesada carga da doença por incapacidade
devido a DPOC. No entanto, e de notar igualmente que a carga do AVC tem um
componente da incapacidade de 43%, uma quota muito substancial.
Finalmente, e relevante saber os ganhos potenciais máximos que se poderiam
obter se todos os portugueses desistissem de fumar.
O Quadro XVIII mostra a informação sobre a carga redutível.
Quadro XVIII – Tabagismo e DALY totais redutíveis
A carga redutível do tabagismo e de quase 52 mil DALY, ou seja, uma eliminação
completa do tabagismo em Portugal levaria a um ganho anual de 52 mil anos de
vida, sendo 76% deste total redutível proveniente de reduções de mortalidade
prematura e 24% de reduções dos níveis de incapacidade da população. Este
montante representa cerca de 14% da carga total das doenças relacionadas com o
tabaco.
Conclusões
A carga da doença e medida através do tempo de vida perdido por mortalidade
prematura ou pelo tempo vivido com incapacidade, bem como pelo grau de
severidade desta ultima.
Aplicando o conceito dos disability adjusted life yearsusado pela Organização
Mundial de Saúde e pelo Banco Mundial, apresentamos estimativas da carga das
doença para Portugal, globais no caso da mortalidade, e para as principais
doenças associadas ao consumo de tabaco no que diz respeito a carga da doença
por incapacidade usando dados baseados na população, mortalidade e prevalência
do tabagismo de 2005. Estas estimativas não incluíram mortos em incêndios
gerados pelo uso de tabaco, mortes de não fumadores devido ao fumo passivo e o
impacto do fumo na saúde materno-infantil.
Para as doenças relacionadas com o tabaco mais importantes estimamos que 40% da
carga de tais doenças seja atribuível ao tabaco, num total anual de 146 mil
anos de vida ajustados pela incapacidade. Este numero mede os ganhos de saúde
que se retirariam por comparação com uma situação onde os portugueses nunca
tivessem fumado. Um outro ponto de comparação, que designamos por carga
redutível, e o valor máximo dos ganhos de saúde que se poderiam obter se todos
os portugueses fumadores desistissem do habito.
A nossa estimativa e que a carga redutível anual do tabagismo seja de quase 52
mil anos de vida ajustados pela incapacidade.
Esta estimativa demonstra a relevância e prioridade que deverão ter politicas
de redução da prevalência do tabagismo na população portuguesa, antes de mais
não deixando criarem-se hábitos tabágicos, mas também incentivando e apoiando o
abandono do consumo de tabaco dos fumadores correntes.