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EuPTCVHe0873-21592010000500012

EuPTCVHe0873-21592010000500012

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0873-2159
ano2010
Issue0005
Article number00012

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Enfisema lobar congénito com apresentação neonatal: Revisão de quatro casos clínicos

Introdução O enfisema lobar congénito (ELC) não é um enfisema propriamente dito, isto é, não apresenta destruição das paredes alveolares que confluem para lesões císticas1. Trata-se de uma anomalia no desenvolvimento da parede da árvore pulmonar que origina hiperinsuflação de um ou mais lobos pulmonares anatomicamente normais, com consequente compressão das estruturas vizinhas1,2.

As crianças afectadas não apresentam, geralmente, sintomas ao nascimento. Na adaptação à vida extrauterina, com o início da respiração espontânea, surge a retenção de ar alveolar (air trapping) com distensão gradual2. Habitualmente, a progressão clínica é lenta e algumas crianças permanecem assintomáticas por período variável de horas a meses. Cerca de 50% das crianças afectadas desenvolve sintomas no primeiro mês de vida. Os sintomas iniciais são a taquipneia e a dispneia, seguidos de cianose quando agravamento da insuficiência respiratória. Alguns casos, 10% a 15%, apresentam evolução rápida para insuficiência respiratória e requerem toracotomia de emergência2.

Os autores procederam à revisão dos casos clínicos de ELC com apresentação neonatal, após pesquisa na base informática do serviço, nos últimos 10 anos, e apresentam quatro casos com boa evolução após tratamento cirúrgico.

Casos clínicos Entre 2007 e 2009 foram admitidos na unidade de cuidados intensivos neonatais quatro recém-nascidos de termo, nos quais foi confirmado o diagnóstico de ELC.

Três recém-nascidos vinham transferidos de outros hospitais com a suspeita diagnóstica de ELC e um recorreu ao serviço de urgência do nosso hospital.

Estes quatro casos, embora tenham sido admitidos nos últimos três anos, foram os únicos admitidos no serviço nos últimos 10 anos, isto é, em cerca de 4000 admissões. As características demográficas, a apresentação e evolução clínicas encontram-se representadas no Quadro I. Todos eles apresentavam dificuldade respiratória moderada. Em todos, a leitura retrospectiva das radiografias de tórax, efectuadas no primeiro dia de vida, permitia suspeitar deste diagnóstico, dado mostrar área de hiperinsuflação pulmonar localizada. O estudo efectuado, o tratamento e o seguimento encontram-se descritos no Quadro II. O estudo anatomopatológico das peças operatórias confirmou o diagnóstico nos quatro casos, tendo revelado hipoplasia da cartilagem da árvore brônquica em três casos (casos 2, 3 e 4 descritos nos quadros).

Quadro I Características demográficas e apresentação clínica

Quadro II Estudo, tratamento e evolução

Fig. 1 (Caso 1) Imagem radiológica de enfisema no lobo superior direito

Fig. 2 (Caso 2) Hipertransparência no campo pulmonar direito com atelectasia do lobo superior esquerdo e desvio do mediastino para a esquerda

Fig. 3 (Caso 3) Hipertransparência do lobo médio

Fig. 4 (Caso 4) Suspeita de enfisema lobar congénito no lobo superior direito

Fig. 5 (Caso 3) Imagens de enfisema lobar congénito do lobo médio por tomografia axial computorizada

Discussão A causa exacta do ELC é difícil de determinar e não é encontrada causa aparente em 50% dos casos2,3. A causa mais frequentemente identificada é um defeito congénito da cartilagem de suporte do brônquio do lobo envolvido. O defeito varia desde hipoplasia a ausência completa de cartilagem, resultando em colapso do brônquio e obstrução ao fluxo expiratório3. Em três dos casos foi possível a demonstração anatomopatológica de anomalia do desenvolvimento dos anéis cartilagíneos brônquicos. Um significativo número de lesões, quer endobrônquicas e potencialmente reversíveis (rolhões mucosos, tecido de granulação), quer compressões extrínsecas (massas mediastínicas, vasos sanguíneos aberrantes ou dilatados, cardiopatias congénitas e outras malformações mediastínicas) pode estar na origem do ELC2-4. Deste modo, uma avaliação ecocardiográfica, bem como broncoscópica, têm indicação antes de se proceder a uma lobectomia2. Com o advento da tomografia axial computorizada de alta resolução e a possibilidade de reconstrução tridimensional das imagens, a broncofibroscopia tem sido cada vez menos usada de rotina na avaliação do ELC, especialmente em doentes com apresentação neonatal clássica e dificuldade respiratória, dada a possibilidade de agravamento sintomático.

O ELC tem predomínio no sexo masculino (2 a 3:1) e na raça caucasiana2. O envolvimento unilobar é o mais frequente, com a seguinte ordem de distribuição: lobo superior esquerdo, 40% a 50%; lobo médio, 30% a 40%; lobo superior direito, 20%; lobos inferiores, 1%; múltiplos lobos, menos de 1%2,3.

Encontramos em todos os casos presentes envolvimento unilobar.

Embora não seja comum, estão relatados vários casos de diagnóstico pré-natal de ELC, mas na presente casuística em nenhum houve suspeita diagnóstica durante a gestação5. No entanto, as imagens pré-natais por ecografia ou ressonância magnética não permitem diferenciar de outras lesões como a malformação adenomatóide cística e o sequestro pulmonar. Após o nascimento, o quadro clínico e a evolução imagiológica definem o diagnóstico6.

O quadro clínico é caracterizado por graus diferentes de dificuldade respiratória, podendo incluir assimetria torácica, desvio do impulso apical cardíaco, diminuição do murmúrio vesicular e hipertimpanismo no local afectado1,2. O diagnóstico é feito, na maioria das vezes, pela radiografia simples de tórax, que revela hiperinsuflação lobar, desvio do mediastino, achatamento do hemidiafragma e compressão, ou mesmo atelectasia dos lobos adjacentes. É necessário que a imagem radiológica seja de boa qualidade técnica para que possa identificar as finas trabéculas do pulmão enfisematoso na área de hiperinsuflação e, assim, permitir diferenciar de situações de pneumotórax1,2. Não é raro algumas crianças serem submetidas a drenagem torácica, com o diagnóstico erróneo de pneumotórax hipertensivo1,7.

Chamamos a atenção para os aspectos radiológicos típicos de ELC, pelo facto de a tomografia computorizada não ser facilmente acessível em todos os centros.

Nesta série, apesar de a apresentação clínica e radiológica ser altamente sugestiva de ELC, houve atraso no diagnóstico, justificável pela raridade desta patologia, o que dificultou a interpretação das imagens iniciais, de qualidade técnica sofrível. Este problema é frequentemente relatado na literatura; a raridade e o carácter evolutivo, na maioria dos casos, leva à realização de radiografias de tórax seriadas, muitas vezes com erros na sua interpretação e no diagnóstico diferencial com outras anomalias pulmonares, nomeadamente com a malformação adenomatóide cística pulmonar congénita. Todos os doentes estudados efectuaram tomografia axial computorizada, para confirmação do diagnóstico e definição da extensão da lesão no pré-operatório, dado que esta, tal como a ressonância magnética, excelente informação quando a radiografia é duvidosa2. O cintilograma de ventilação-perfusão pode ter interesse nos casos envolvendo múltiplos lobos2,7. foi descrito um caso de ELC com retenção de líquido, em que o estudo imagiológico por ecografia torácica e tomografia axial computorizada revelou uma lesão sólida8.

A história natural do ELC é geralmente progressiva, levando a insuficiência respiratória, pelo que o tratamento de eleição é a lobectomia1,2. O ELC corresponde a cerca de 3,5% das afecções cirúrgicas do tórax na criança9. O recém-nascido e as crianças pequenas toleram bastante bem o procedimento1,2.

Nos casos de envolvimento multilobar, a ressecção cirúrgica acarreta maiores riscos e complicações a longo prazo, nomeadamente de escoliose, pelo que a decisão terapêutica é mais complexa e deve ser tomada em centros com maior experiência10.

Na última década, alguns grupos têm optado pela videotoracoscopia para ressecção de malformações pulmonares congénitas, no intuito de minorar o desconforto do doente e ter melhores resultados estéticos11. No caso concreto do ELC, a experiência é escassa e a execução técnica mais difícil, comparativamente a outras malformações pulmonares, pela maior dificuldade em induzir colapso pulmonar e obter visualização correcta, pelo que alguns autores abandonaram esta opção cirúrgica12.

Nos casos assintomáticos ou minimamente sintomáticos é possível manter atitude conservadora, sob vigilância médica adequada13-17. Embora no nosso centro outros casos tenham sido mantidos apenas sob seguimento regular em consulta, nesta série de doentes com apresentação neonatal, a gravidade da dificuldade respiratória não permitiu a opção não interventiva.

Os estudos de seguimento de três a 11 anos de Frenckner e Freyschuss, em doentes pós-lobectomia neonatal, demonstraram função pulmonar (volume residual, capacidade vital, capacidade pulmonar total e volume expiratório forçado no primeiro segundo) na ordem dos 90% dos valores esperados, com ausência de disfunção a longo prazo18. Adultos que sofreram lobectomia no período neonatal mostraram crescimento tecidular compensador, conferindo um excelente prognóstico para estas crianças19.

Em resumo, a presente casuística está de acordo com a literatura em quase todos os aspectos, nomeadamente no predomínio no sexo masculino, forma de apresentação, tempo variável do nascimento até ao diagnóstico, envolvimento unilobar e não identificação de causa evidente num dos casos.

O tratamento cirúrgico foi universal, devido à gravidade dos sintomas, e decorreu com complicação (neuropraxia do nervo frénico) num dos casos. Embora não tenhamos seguimento a longo prazo, as crianças encontram-se clinicamente bem, com bom desenvolvimento estatoponderal e psicomotor.

Fig. 6 HE 40X Arquitectura pulmonar preservada com aumento e dilatação dos alvéolos (caso clínico 1)

Fig. 7 HE 40X Morfologia anómala dos anéis cartilagíneos da árvore brônquica

Fig. 8 HE 40X Arquitectura pulmonar preservada com aumento e dilatação dos alvéolos (caso clínico 2)

Fig. 9 HE 40X Morfologia anómala dos anéis cartilagíneos da arvore brônquica (setas) e dilatação dos espaços alveolares (caso clínico 3)

Fig. 10 HE 40X Morfologia anómala dos anéis cartilagíneos da árvore brônquica (caso clínico 4)

Fig. 11 HE 40X Arquitectura pulmonar preservada com aumento e dilatação dos alvéolos (caso clínico 4)


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