Autonomia profissional dos enfermeiros
Introdução
A autonomia profissional tem sido, ao longo do tempo e da evolução da
enfermagem, um tema importante à compreensão da profissão, tanto na definição
dos seus desafios e objetivos como na forma como os enfermeiros se relacionam e
se apresentam para a equipa de saúde e para a sociedade em geral (Amendoeira,
2004).
Este assunto é atual porque, como considera Nunes (2003), o expoente máximo da
conquista da autonomia dos enfermeiros está relacionado com o regulamento do
seu exercício profissional e a criação da ordem com os seus estatutos e com o
código deontológico. A integração do ensino de enfermagem no ensino superior e
mais tarde no ensino universitário, o investimento na investigação, a qualidade
do empenho e desempenho dos enfermeiros e a aquisição de graus académicos mais
elevados, permitiram a afirmação da enfermagem nas suas dimensões académicas e
profissionais, assim como, a criação da ordem dos enfermeiros em 1998,
considerando o Estado que a enfermagem é uma profissão que merece
reconhecimento, suficiente, para se poder regular nos seus aspetos
deontológicos e disciplinares.
Não obstante todo o reconhecimento que a profissão tem das instituições
governamentais, do crescente número de enfermeiros licenciados, mestres e
doutores, da inclusão do curso de enfermagem no ensino universitário, da
visível melhoria dos cuidados de enfermagem prestados à população, fruto do
investimento da investigação nas ciências de enfermagem, não existe um retorno,
na mesma proporção, em relação à visibilidade social da profissão nem do
reconhecimento dos outros profissionais de saúde, o que não permite que os
enfermeiros consigam prestar cuidados de enfermagem realmente autónomos. De
acordo com Amendoeira (2004) a enfermagem constitui-se atualmente numa área de
saber útil à sociedade, a partir do desenvolvimento de um conjunto de
atividades que são essenciais à vida, mas que ainda não são reconhecidas como
fazendo parte de um campo autónomo de saber e de intervenção.
Tendo em conta todas estas condicionantes, dúvidas e a necessidade de
clarificar o conceito autonomia, considerou-se importante desenvolver este
trabalho. O facto de, passados tantos anos, com conquistas difíceis, com a
rápida evolução do conhecimento de enfermagem, com o contributo importante da
enfermagem para os ganhos de saúde e evolução do sistema nacional de saúde,
ainda não existir, dentro da esfera profissional e fora dela, o reconhecimento
merecido, fez com que o autor refletisse sobre a temática e tentasse
compreender o que falta para conquistar a autonomia profissional dos
enfermeiros.
Quadro teórico
Autonomia profissional em enfermagem: contextualização histórica.
A autonomia de uma profissão não se pode desligar de todas as condicionantes
que influenciaram o seu percurso, desde os primórdios até a atualidade. Em
particular, na profissão de enfermagem, a conquista da autonomia ainda não foi
atingida na sua plenitude. Existem fatores internos e externos à profissão que
foram limitando a definição da enfermagem como uma profissão autónoma,
interdependente com outras profissões no âmbito da saúde, mas com uma área de
conhecimentos próprios que permitem ter um campo de atuação autónomo.
De acordo com Nunes (2003), o delinear do percurso de Enfermagem em Portugal
não é uma tarefa fácil, tanto pela dificuldade de delimitar fronteiras próprias
e pelas múltiplas realidades que comporta, como pelas referências estrangeiras
que, a par e passo, se desenham no horizonte nacional. Ao longo da história de
enfermagem foram surgindo diferentes valores, fruto dos mais variados fatores e
condicionalismos político-sociais, económicos e culturais. Alguns desses
valores como a vocação e a subordinação ainda hoje subsistem a par da
emancipação e da autonomia (Ferreira, 2005).
É indiscutível que a enfermagem como profissão cresceu em muitos sentidos,
baseada em conhecimentos próprios, sedimentada pela investigação nos fenómenos
de enfermagem, dando-se a conhecer à população, com muita força de vontade de
todos os atores dentro da profissão mas com a sensação que, por muito que já
tenha sido feito, continua a parecer que ainda é pouco.
A autonomia profissional é um atributo essencial de uma profissão que luta por
um estatuto profissional completo mas é muitas vezes confundido com autonomia
pessoal, autonomia no trabalho ou um agregado destas autonomias. A autonomia
profissional define-se como a crença na centralidade do cliente quando se toma
decisões responsáveis, quer seja de forma dependente ou interdependente, que
refletem a defesa do cliente (Wade, 1999). A autonomia profissional em
enfermagem definida como a disposição compreendida pelos enfermeiros para agir
como uma profissão responsável e séria, enfatiza a dependência entre os
enfermeiros e os clientes. No hospital, a autonomia é um modo de organização do
trabalho com o objetivo de regulação social que exerce ela própria uma ação de
forma paradoxal entre a liberdade da iniciativa e o controlo inibidor. A
autonomia é a capacidade do enfermeiro cumprir as suas funções profissionais
numa forma auto-determinada enquanto cumpre os aspetos legais, éticos e
práticos da profissão.
A importância do processo de tomada de decisão.
Ser autónomo é assumir a responsabilidade das decisões tomadas. De acordo com
Jesus (1995) citado por Parreira (2004), nós manifestamos a nossa autonomia
quando prescrevemos, realizamos e avaliamos as intervenções como resposta a um
diagnóstico de enfermagem.
A conquista da autonomia leva a que os enfermeiros se confrontem com problemas
éticos e com a consequente necessidade de eles próprios tomarem decisões
complexas que exigem adequação aos princípios e valores éticos em geral e da
profissão em particular. A autonomia tem de se refletir em qualquer tomada de
decisão, inevitavelmente ligada à nossa capacidade, à nossa obrigação
profissional e ao compromisso e mandato social que assumimos. As mudanças no
aspetos de onde, como e quem presta cuidados torna claro a função do enfermeiro
e a base do poder de tomada de decisão cada vez mais importante na profissão. A
função que cada enfermeiro joga a cada momento nas decisões referentes aos
cuidados de enfermagem e gestão dos sistemas de enfermagem, é uma reflexão
diária da autonomia dos enfermeiros vista como estando acessível. A tomada de
decisão é um componente fundamental para a autonomia profissional do enfermeiro
e deve ser baseada nos conhecimentos de enfermagem e não nas emoções ou no
exercício de tarefas rotineiras. Os enfermeiros autónomos são responsáveis
pelas suas decisões e podem influenciar a profissionalização da enfermagem. Os
enfermeiros que integram com sucesso os comportamentos associados à autonomia
profissional em enfermagem nas suas crenças, percebem que têm controlo sobre o
seu ambiente de trabalho e sobre a sua profissão. Consensual é o facto das
decisões em enfermagem serem complexas, não só pelas características únicas de
cada doente, mas pelos múltiplos problemas, sinais e sintomas que necessitam
ser interpretados e também devido a situações de incerteza e ambiguidade com as
quais têm de lidar. Em enfermagem, a tomada de decisão assume especial
relevância. A atual complexidade e dinâmica da enfermagem, causada pelos
constantes avanços científicos e tecnológicos no campo da saúde e pelos dilemas
éticos e morais permanentes que se colocam, requerem que os enfermeiros sejam
capazes de tomar decisões complexas de forma autónoma. Tomar decisões em
enfermagem é também uma forma de caminhar para a profissionalização e para a
autonomia da profissão. Uma profissão só é autónoma quando consegue decidir e
responsabilizar-se sobre as decisões que toma e sobre os resultados que
consegue com essas decisões (Neves, 2002). A necessidade de decisões que
requerem autonomia, verifica-se em todas as situações do dia-a-dia, mesmo nas
que resultam de prescrição médica, sejam simples ou complexas, o que implica um
pensamento crítico e reflexivo. A tomada de decisão deve basear-se em valores
éticos, em conhecimentos e na experiência.
A imagem e a identidade de enfermagem
A identidade profissional é um processo de desenvolvimento que evolui ao longo
da carreira profissional dos enfermeiros. A identidade é fundamental para a
prática profissional de enfermagem. A identidade em enfermagem pode ser
definida como o desenvolvimento dentro dos enfermeiros de uma representação
interna da interação pessoa ' ambiente, na exploração das respostas humanas aos
problemas de saúde potenciais que elas vivem na atualidade. A identidade
profissional é fundamental à assunção das variadas funções dos enfermeiros
(Cook, 2003).
As enfermeiras e os enfermeiros têm dificuldade em ser reconhecidos e estão em
busca contínua da identidade, um pouco como se não tivessem à sua disposição um
conteúdo profissional considerado, por eles próprios, como suficientemente rico
e útil que poderia torná-los identificáveis e, portanto, reconhecíveis na
sociedade (Hesbeen, 2000). No que diz respeito à identidade profissional, os
enfermeiros não têm desempenhado o seu papel próprio no quotidiano da
profissão. A construção do papel próprio possui relação com a construção da
identidade profissional, o que significa a explicitação do que é específico do
enfermeiro, ou seja, o saber e o fazer que caracterizam a enfermagem. Isso,
contudo, não é uma negação à interdisciplinaridade, mas o seu reforço, na
medida que, a partir do próprio, a enfermagem possa dar contribuições
pertinentes e singulares à equipe de saúde e prestar uma assistência de
qualidade à sociedade. É importante que os enfermeiros promovam a sua imagem. É
preciso dar visibilidade ao sucesso dos cuidados de enfermagem, dar-nos a
conhecer à população. De acordo com Caldeira (2001) os conceitos enraizados e
ligados ao passado histórico da profissão vão-se lentamente desvanecendo e
perdendo força no meio social. Para a conquista plena do reconhecimento e
valorização da profissão de enfermagem, por parte dos cidadãos e, sobretudo, o
reconhecimento dos cuidados de enfermagem, os enfermeiros terão que refletir
sobre o seu desempenho e desenvolver estratégias de mudança que os vão
qualificar e valorizar, fundamentando assim a autonomia e identidade
profissional pretendida.
O elevado número de profissionais faz da classe de enfermagem uma profissão
particularmente visível e operante na sociedade, com especial representação e
responsabilidade política, social e cívica na prestação dos cuidados de saúde e
na respetiva conceção, planeamento e gestão (Pedrosa, 2004).
A necessidade de valorizar o conteúdo dos cuidados de enfermagem antes mesmo de
valorizar os profissionais que os exercem, por mais evidente que possa parecer,
não é tarefa fácil. Depara-se no interior da própria profissão, com dois
grandes fenómenos associados, por um lado, a representação que os enfermeiros
têm de si próprio e da sua profissão e, por outro, aos efeitos induzidos pelo
processo de profissionalização. Os enfermeiros procuram dar uma imagem da sua
profissão que é efetivamente condicionada e influenciada pelo contexto
profissional e social em que trabalham.
Metodologia
Este estudo é de tipo descritivo e correlacional, com o recurso a técnicas de
análise quantitativa, recorrendo a uma amostragem não probabilística acidental.
Foram distribuídos 400 questionários a enfermeiros que trabalham nos Hospitais
da Universidade de Coimbra, nos serviços de Medicina III Homens e Mulheres,
Psiquiatria Homens, Neurocirurgia, Cirurgia III Homens e Mulheres, Medicina
Intensiva, Bloco Operatório Central, Urgência. No final obtivemos um total de
150 respostas de participantes, que concluíram o questionário integralmente.
Em conformidade com o problema a investigar, os objetivos e as questões com ele
relacionadas, e ainda com a revisão teórica e a experiência profissional, foram
formuladas as seguintes hipóteses: verifica-se correlação entre a idade e o
nível de autonomia profissional percebido pelos enfermeiros; verifica-se
correlação entre o tempo de serviço e o nível de autonomia profissional
percebido pelos enfermeiros; verifica-se correlação entre o número de serviços
em que trabalhou e o nível de autonomia profissional; os enfermeiros que se
manifestam mais satisfeitos com a sua profissão revelam também uma maior
perceção de autonomia profissional; os enfermeiros que manifestam uma maior
facilidade de tomar decisões no seu quotidiano de trabalho expressam também a
perceção de um maior nível de autonomia profissional; verifica-se diferença de
perceção do nível de autonomia profissional entre enfermeiros do sexo masculino
e do sexo feminino; verifica-se diferença de perceção do nível de autonomia
profissional dos enfermeiros, em função do local de trabalho em que exercem
funções; verifica-se diferença de perceção do nível de autonomia profissional
dos enfermeiros, em função das habilitações académicas; verifica-se diferença
de perceção do nível de autonomia profissional dos enfermeiros, em função da
sua categoria profissional.
A primeira parte do instrumento de colheita de dados integra a caracterização
sóciodemográfica da amostra, onde se inclui questões relacionadas com a pessoa
em estudo como: idade, sexo, habilitações académicas, local de trabalho,
categoria profissional, tempo de serviço, número de serviços onde trabalhou. No
final existem duas questões onde se pretende saber o nível de satisfação com a
profissão e o nível de facilidade que a pessoa tem em tomar diariamente
decisões. A segunda parte é constituída por uma escala tipoLikert, para a
medida do nível de autonomia profissional percebida pelos enfermeiros em
contexto de trabalho. No decurso da pesquisa em bases de dados, encontrámos um
instrumento de medida da autonomia profissional em enfermagem, NURSING ACTIVITY
SCALE (NAS), que, embora fosse um questionário desenvolvido na Inglaterra, se
adaptava à nossa realidade. Foi realizado o contacto com a autora, a Professora
Doutora Karen Kelly Schutzenhofer, através de correio eletrónico, que
disponibilizou o seu questionário assim como os instrumentos necessários à sua
interpretação. Foi-lhe dado conhecimento que se iria realizar a tradução para
Português ao que a autora não colocou qualquer objeção. Existem várias técnicas
para se traduzir um instrumento de medida e mantê-lo fiel ao original: uma é o
processo de retroversão, outra é a técnica bilingue, existe, também, a comissão
de aproximação e o procedimento do teste preliminar. O processo de tradução com
retroversão é um método bastante utilizado que mantém a equivalência entre a
versão original e a traduzida (Behling e Law, 2000 citado por Cha, Kim e Erlen,
2007). Neste método é recomendado um processo interativo de traduções
independentes e retroversões por uma equipa de tradutores. Um tradutor bilingue
traduz o instrumento do original para a língua pretendida. Posteriormente as
duas versões são comparadas para a equivalência de conceitos. Quando é
encontrado um erro na retroversão outro tradutor tenta traduzir novamente esse
termo. Este procedimento contínua até a equipa de tradutores concordar que as
duas versões do instrumento são idênticas e não existem erros no seu sentido
(Cha, Kim e Erlen, 2007, p.388). O modelo descrito pelos autores Cha, Kim e
Erlen, (2007) foi integralmente seguido pelo autor, que constitui para o efeito
um demorado processo, com a colaboração de peritos e nativos de língua inglesa
(Tabela 1).
TABELA 1 ' Dados descritivos relativos à variável autonomia
Esta escala desenvolvida pela autora para medir a autonomia profissional dos
enfermeiros é uma escala tipo Likert, constituída por 30 questões sendo que as
respostas possíveis para cada uma delas: muito improvável atuar desta forma,
improvável atuar desta forma, provável atuar desta forma, muito provável atuar
desta forma. Cada questão apresenta um peso" diferente sendo que existem
questões com ponderação 1, ou seja, que indicam um baixo nível de autonomia,
ponderação 2 um nível médio de autonomia e o nível 3 refletem um nível elevado
de autonomia. Os itens são sensíveis às questões de enfermagem e medem ações de
enfermagem realizadas durante a sua prática diária. A autora distingue na sua
escala 3 níveis de autonomia que se reportam a valores dentro dos seguintes
intervalos: entre 60-120 baixo nível de autonomia profissional, entre 121-180
corresponde a um nível médio de autonomia e os valores entre 181 e 240 dizem
respeito a um elevado nível de autonomia. A escala revelou um alfa de Cronbach
de 0,881, revelando por isso uma boa consistência interna. De acordo com a
tabela 2, todos os valores da correlação do item com o total da escala são
superiores a 0,30 exceto os itens 5,18 e 28.
TABELA 2 ' Distribuição dos participantes segundo as características
sociodemográficas
Resultados
A amostra em estudo é constituída por 150 participantes embora tenham sido
entregues 400 questionários.
Em relação à idade verifica-se que os indivíduos tinham idades compreendidas
entre os 24 e os 58 anos, sendo a idade média 36,4, com o desvio padrão de 8,25
anos.
Observando os dados, verifica-se que a maioria dos participantes no estudo é do
sexo feminino, concretamente 70, 67%, 71%.
Em relação às habilitações académicas, verifica-se que o grande grupo se
encontra nos licenciados (71,33% dos participantes) sendo que neste estudo não
existiu nenhum participante com o grau académico de doutor.
No que diz respeito ao local de trabalho, o maior grupo de participantes
desempenha as suas funções no bloco operatório central (cerca de 21%) e o menor
grupo no serviço de medicina intensiva (7,33%).
Ao abordar a categoria profissional, observa-se que 60% são enfermeiros
graduados sendo este o maior grupo. O menor grupo é o dos enfermeiros chefes
com 2,66% de participantes.
Em relação ao tempo de serviço, verifica-se que o número máximo de anos de
serviço é de 38 anos, o mínimo de 2 anos, com um desvio padrão de 7,95 anos.
Finalmente, quando referimos o número de serviços onde os participantes
trabalharam desde o início da sua vida profissional, temos como intervalo o de
1 serviço e 23 serviços, com um desvio padrão de 2, 75. No que diz respeito ao
objetivo identificar o nível de autonomia percebida pelos enfermeiros no seu
contexto de trabalho, chegou-se à conclusão que, neste estudo, os participantes
apresentaram um intervalo de autonomia de 113 como valor mínimo e 240 como
valor máximo com uma média de 178,88. Tendo em conta os dados fornecidos pela
autora, Schutzenhofer (1988), a nossa amostra encontra-se dentro do nível médio
de autonomia.
Em relação ao objetivo que consistia em analisar a correlação entre o nível de
autonomia percebida pelos enfermeiros no seu contexto de trabalho e as
variáveis (idade, tempo de serviço, número de serviços em que trabalho, grau da
satisfação com a profissão de enfermagem e capacidade de tomar decisões na
atividade profissional) observamos que, em relação à hipótese, se verifica
correlação entre a idade e o nível de autonomia profissional percebido pelos
enfermeiros. Podemos concluir que os resultados vão no sentido de não confirmar
a hipótese formulada, ou seja, na nossa amostra não existe relação entre a
idade e o nível de autonomia (rs=0,13;p=0,113). Podemos observar que o grupo
que apresentou níveis superiores de autonomia foi na faixa etária dos 50-59
anos, ou seja, o grupo que inclui os indivíduos mais velhos.
Analisando a hipótese verifica-se correlação entre o tempo de serviço e o
nível de autonomia profissional percebido pelos enfermeiros", conclui-se que os
resultados vão no sentido de não se confirmar a hipótese, ou seja, não se
verifica correlação entre o tempo de serviço e o nível de autonomia
profissional (rs=0,08;p=0,33).
Relativamente à hipótese verifica-se correlação entre o número de serviços em
que trabalhou e o nível de autonomia profissional podemos concluir, tendo em
conta os resultados, que não se verifica correlação entre o número de serviços
em que se trabalhou e o nível de autonomia profissional (rs=0,07;p=0,41).
Para a hipótese colocada se os enfermeiros que se manifestam mais satisfeitos
com a sua profissão revelam também uma maior perceção de autonomia
profissional", verificamos que os enfermeiros que se manifestam mais
satisfeitos com a sua profissão revelam também uma maior perceção de autonomia
profissional (rs=0,30; p=0,00)
Na hipótese se os enfermeiros que manifestam uma maior facilidade de tomar
decisões no seu quotidiano de trabalho, expressam também a perceção de um maior
nível de autonomia profissional", podemos concluir que os nossos resultados vão
no sentido de confirmar a hipótese formulada, logo, que os enfermeiros que
manifestam uma maior capacidade de tomar decisões no seu quotidiano de
trabalho, expressam também a perceção de um maior nível de autonomia
profissional (rs=0,30;p=0,00).
Em relação a analisar as diferenças no nível de autonomia percebida pelos
enfermeiros no contexto de trabalho, em função das variáveis (sexo,
habilitações académicas, local de trabalho, categoria profissional)chegamos às
seguintes conclusões: tendo em conta a hipótese verifica-se diferença de
perceção do nível de autonomia profissional entre enfermeiros do sexo masculino
e do sexo feminino", pode-se concluir que os resultados não vão no sentido de
confirmar a hipótese formulada, ou seja, que em relação ao sexo não se verifica
uma diferença de perceção do nível de autonomia (t=1,25; p=0,56).
Analisando a hipótese verifica-se diferença de perceção do nível de autonomia
profissional dos enfermeiros, em função das habilitações académicas"pode-se
afirmar que, tendo em conta os resultados, nesta amostra existe diferença de
perceção do nível de autonomia em função das habilitações académicas
(F=3,21;p=0,02).
No que diz respeito à hipótese verifica-se diferença de perceção do nível de
autonomia profissional dos enfermeiros, em função do local de trabalho em que
exercem funções", constatou-se que se verifica diferença de perceção do nível
de autonomia tendo em conta o local de trabalho (F=2,36; p=0,03).
Na hipótese colocada verifica-se diferença de perceção do nível de autonomia
profissional dos enfermeiros, em função da sua categoria profissional"chegamos
à conclusão que existe diferença de perceção do nível de autonomia os
enfermeiros em função da sua categoria profissional (F=3,95;p=0,01).
Discussão
Em relação ao objetivo que consistia em analisar a correlação entre o nível de
autonomia percebida pelos enfermeiros no seu contexto de trabalho e as
variáveis (idade, tempo de serviço, número de serviços em que trabalho, grau da
satisfação com a profissão de enfermagem e capacidade de tomar decisões na
atividade profissional), observamos que: formulada a hipótese verifica-se
correlação entre a idade e o nível de autonomia profissional percebido pelos
enfermeiros", podemos concluir que os resultados vão no sentido de não
confirmar a hipótese formulada, ou seja, na nossa amostra não existe relação
entre a idade e o nível de autonomia (rs=0,13;p=0,113). Embora o nosso estudo
tenha chegado a estes resultados, a maioria dos trabalhos encontra resultados
que indicam o sentido contrário como é o caso de Pankratz (1974) e
Schutzenhofer (1988) que referem que, nos seus estudos, a autonomia
profissional em enfermagem é influenciada por variáveis como a idade. Nos
estudos realizados com esta variável, um deles, realizado por Papathanassouglou
et al. (2005) refere que, em relação à autonomia, os enfermeiros mais novos e
com menos tempo de curso apresentavam níveis maiores de autonomia.
Analisando a hipótese verifica-se correlação entre o tempo de serviço e o
nível de autonomia profissional percebido pelos enfermeiros", conclui-se que os
resultados vão no sentido de não se confirmar a hipótese, ou seja, não se
verifica correlação entre o tempo de serviço e o nível de autonomia
profissional (rs=0,08; p=0,33)
Embora com a nossa amostra não se tenha concluído que existe relação entre
estas variáveis, os estudos consultados referem o contrário. Os anos de
experiência na unidade de cuidados intensivos influenciam a perceção da
autonomia profissional (Papathanassoglou et al., 2005). Vários estudos referem
que a autonomia profissional em enfermagem, é influenciada por variáveis como
os anos de experiência (Schutzenhofer, 1988; George et al., 2002). Wade (1999)
refere que existe uma relação forte entre autonomia pessoal e profissional no
estudo de Lach (1992) que pode ter refletido a influência da experiência e
tempo de serviço.
Relativamente à hipótese verifica-se correlação entre o número de serviços em
que trabalhou e o nível de autonomia profissional", podemos concluir, tendo em
conta os resultados, que não se verifica correlação entre o número de serviços
em que se trabalhou e o nível de autonomia profissional (rs=0,07;p=0,41). Dos
estudos realizados sobre a autonomia não existiu nenhum que tivesse incluído a
variável (número de serviços). Considerou-se importante colocar esta variável
para tentar entender se, ao trabalhar em serviços diferentes, com realidades
diferentes e, logo, enriquecendo-se com experiencias diversas, se podia
relacionar com a autonomia profissional. Embora não tenha existido relação
entre a variável (número de serviços e a autonomia), isso não pode tornar-se
impedimento para realizar mais estudos com esta variável.
Para a hipótese colocada se os enfermeiros que se manifestam mais satisfeitos
com a sua profissão revelam, também, uma maior perceção de autonomia
profissional", verificamos que os enfermeiros que se manifestam mais
satisfeitos com a sua profissão revelam também uma maior perceção de autonomia
profissional (rs=0,30; p=0,00). Nesta hipótese, os estudos vão ao encontro do
resultado do nosso estudo. Num estudo realizado por Silva et al. (2009), no que
se refere à satisfação profissional dos enfermeiros da pesquisa, o componente
mais escolhido foi autonomia, ou seja, o aspeto que os enfermeiros
referenciavam como o que mais influenciava a sua satisfação profissional, era a
sua autonomia profissional. Como refere esta autora, potenciar a autonomia dos
enfermeiros permite alcançar uma maior satisfação no seu trabalho diário. De
acordo com Campos (2005), a autonomia foi considerada como o componente mais
importante pela equipa de enfermagem para a sua satisfação profissional. Refere
também que estes dados são consistentes com os estudos realizados por outros
autores como Matsuda (2002) e Lino (2004). Sendo o maior componente da
satisfação no trabalho, a promoção da autonomia dentro da enfermagem pode ter
peso considerável no recrutamento e estratégias de retenção. A autonomia foi
também considerada como um dos dois fatores essenciais para os enfermeiros se
manterem no seu local de trabalho, e como fator positivo para que o enfermeiro
se comprometa com a sua instituição de trabalho e queira lá ficar (Kramer,
2003).
Na hipótese se os enfermeiros que manifestam uma maior facilidade de tomar
decisões no seu quotidiano de trabalho expressam também a perceção de um maior
nível de autonomia profissional", podemos concluir que os nossos resultados vão
no sentido de confirmar a hipótese formulada, logo, que os enfermeiros que
manifestam uma maior capacidade de tomar decisões no seu quotidiano de
trabalho, expressam também a perceção de um maior nível de autonomia
profissional (rs=0,30;p=0,00).
Papathanassoglou et al. (2005) refere que resultados de baixa autonomia estão
relacionados com baixa capacidade de tomar decisões. Como refere Nunes (2006),
a autonomia profissional está diretamente relacionada com o aspeto da tomada de
decisão no que diz respeito aos cuidados de enfermagem. A decisão na prática
clínica da Enfermagem exige maior responsabilidade e autonomia de julgamento e
de decisão do enfermeiro, além de qualidade de informação, de raciocínio e de
decisão clínica.
Em relação a analisar as diferenças no nível de autonomia percebida pelos
enfermeiros no contexto de trabalho, em função das variáveis (sexo,
habilitações académicas, local de trabalho, categoria profissional), chegamos
às seguintes conclusões: tendo em conta a hipótese verifica-se diferença de
perceção do nível de autonomia profissional entre enfermeiros do sexo masculino
e do sexo feminino", pode-se concluir que os resultados não vão no sentido de
confirmar a hipótese formulada, ou seja, que em relação ao sexo não se verifica
uma diferença de perceção do nível de autonomia (t=1,25; p=0,56). Considerou-se
ser oportuno colocar esta variável já que, de acordo com outros estudos, o sexo
dos participantes influencia a perceção da autonomia profissional. Nesta
variável, a maioria dos estudos também não vai de encontro ao resultado do
nosso estudo. Num estudo realizado por Papathanassoglou et al. (2005), os
homens apresentam um nível mais elevado de autonomia do que as mulheres. Isto
pode estar relacionado com o facto de que muitos estudos sugerem que os homens
conseguem construir carreiras de maior sucesso com estatuto mais elevado como
investigadores e gestores. Como vimos durante a fundamentação teórica, um dos
aspetos que leva a que a conquista da autonomia seja um processo lento e com
vários obstáculos, é o facto de a enfermagem ser uma profissão
predominantemente feminina. Não obstante ao que foi referido neste estudo, pode
verificar-se uma ordenação média ligeiramente superior no sexo feminino
(F=180;M=176).
Analisando a hipótese verifica-se diferença de perceção do nível de autonomia
profissional dos enfermeiros, em função das habilitações académicas", podemos
referir que, tendo em conta os resultados, pode-se afirmar que nesta amostra
existe diferença de perceção do nível de autonomia em função das habilitações
académicas (F=3,21;p=0,02). Esta é uma hipótese cujo resultado vai de encontro
a outros estudos consultados. Uma educação académica avançada está fortemente
associada com a autonomia No estudo realizado por Papathanassoglou et al.
(2005), os enfermeiros com um nível superior de formação apresentavam níveis
mais elevados de autonomia no que diz respeito à tomada de decisão e
competências técnicas. Ballou (1998) refere existir uma ligação muito forte
entre o nível educacional e o exercício da autonomia.
No que diz respeito à hipótese verifica-se diferença de perceção do nível de
autonomia profissional dos enfermeiros, em função do local de trabalho em que
exercem funções", o nosso estudo verificou que se regista diferença de perceção
do nível de autonomia tendo em conta o local de trabalho (F=2,36; p=0,03). Os
autores consultados referem que existe relação entre o local onde os
enfermeiros trabalham e o seu nível de autonomia (Pankratz, 1974). Wade (1999)
refere que, nos estudos que realizou, tendo em conta a autonomia profissional
dos enfermeiros, chegou à conclusão que o facto de se trabalhar em serviços
diferentes afeta a forma como se perceciona a autonomia, logo, leva a que
exista relação entre o local de trabalho e a autonomia profissional. Este facto
pode dever-se, como refere Papathanassoglou et al. (2005), ao facto de que, em
cada serviço, os profissionais apresentarem métodos e modelos de trabalho
diferentes, com experiencias diferentes e também porque existe uma contaminação
entre profissionais na forma como trabalham. Isto pode justificar essa
diferença em relação à perceção de autonomia.
Na hipótese colocada verifica-se diferença de perceção do nível de autonomia
profissional dos enfermeiros, em função da sua categoria profissional",
chegamos à conclusão que existe diferença de perceção do nível de autonomia
pelos enfermeiros em função da sua categoria profissional (F=3,95;p=0,01). No
estudo de Schutzenhofer (1988), os enfermeiros gestores apresentavam um valor
mais elevado de autonomia que os enfermeiros prestadores de cuidados. Quando os
valores dos enfermeiros especialistas eram comparados com o dos prestadores de
cuidados, os especialistas apresentavam valores mais elevados de autonomia.
Neste estudo aos profissionais com uma preparação avançada sustentam melhor a
autonomia. Os enfermeiros nos cargos de gestão apresentam uma atitude mais
progressista tendo em vista a autonomia dos enfermeiros (Pankratz, 1974). O
facto de, à medida que se vai progredindo na categoria profissional se ir
aumentando as responsabilidades e as competências, poderá justificar existir
uma diferença de perceção da autonomia entre os enfermeiros e os enfermeiros
seus superiores hierárquicos.
Conclusão
Considerou-se este trabalho extremamente importante, não só pela sua inovação,
já que não existem em Portugal muitos estudos sobre a autonomia profissional e,
porque, nos estudos internacionais consultados, algumas variáveis estudadas
nesta investigação nunca tinham sido abordadas. Também porque permitiu, com a
autorização da sua autora, criar uma escala que vai possibilitar conhecer os
níveis de autonomia dos profissionais de enfermagem pelo país. Conhecendo os
resultados poder-se-á refletir e atuar em conformidade.
O trabalho de tradução foi um processo complexo, com várias traduções e
retroversões até chegarmos ao instrumento de colheita de dados utilizado. Mas
foi também um processo necessário já que não existiam em português escalas para
avaliar a autonomia. Consideramos importante que, a partir deste trabalho,
surjam outros e que, com os seus resultados e conclusões, se possa construir,
de forma sustentada, uma profissão de enfermagem autónoma. Emerge deste
trabalho a importância de se realizar mais estudos sobre a autonomia,
especialmente a nível nacional, já que a produção de conhecimentos nesta área
ainda é insuficiente. A que existe aborda apenas teoricamente os problemas
relacionados com a autonomia e sua evolução mas não estuda toda a sua
envolvência contextual, nem todas as variáveis que a condicionaram e que
continuam a ser um obstáculo a uma profissão tendencialmente autónoma.