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EuPTCVHe1646-21222012000400010

EuPTCVHe1646-21222012000400010

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1646-2122
ano2012
Issue0004
Article number00010

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Trocanterite tuberculosa

INTRODUÇÃO A tuberculose continua a ser uma das principais causa de morte em todo o Mundo devido a doença infeciosa, sendo que a sua prevalência continua a aumentar, particularmente em países subdesenvolvidos[1]. Em Países desenvolvidos, os factores predisponentes mais importantes são a infeção pelo vírus da imunodeficiência humana[2,3] e a idade. Outro importante fator são as forma de M. Tuberculosis resistentes à terapêutica[1, 4].

Em mais de 85% dos casos de Tuberculose, o sistema respiratório é afetado. A localização osteo-articular não é frequente[5]. Em 20.000 novos registo de tuberculose extra-pulmonar de 22 países observou-se que em 19% dos casos eram atingidos o osso ou a articulação[6], sendo multifocal em 72,2% [7]. Quando a sua disseminação é osteo-articular, o grande trocanter é afectado em apenas 1- 2% dos casos[5,8,9].

O diagnóstico de uma trocanterite tuberculosa é difícil e desafiante, uma vez que os sinais clínicos são inespecíficos, o estudo radiológico inicialmente é pouco útil e são raros os casos que se apresentam com um volumoso abcesso peri- articular. Para obter o diagnóstico, frequentemente são necessárias técnicas mais invasivas assim como o recurso a estudo microbiológico e anátomo- patológico.

CASO CLÍNICO Doente do sexo masculino, 85 anos de idade, com antecedentes patológicos de pleuresia 65 anos, internado pelo Serviço de Urgência por quadro de queixas arrastada de dor e edema localizados à face anterior do terço proximal da coxa esquerda (Figura_1), sem história traumática associada. Analiticamente apresenta uma PCR de 2,27 mg/dL e VS de 35 mm/hora (sem outras alterações significativas). O estudo ecográfico revela um coleção heterogénea com parede moderadamente espessada e a radiologia convencional da bacia (Figura_2) levanta a suspeita de se tratar de uma lesão lítica localizada ao grande trocanter esquerdo. A TC (Figura_3) confirma a presença de uma lesão osteolítica associada a uma coleção líquida multi-loculada com calcificações e a biópsia guiada por TC revela no estudo anátomo-patológico a presença de um processo inflamatório crónico granulomatoso inespecífico. Na RNM (Figura_4) observam-se várias coleções abcedadas na espessura dos músculos da coxa e interrupção da cortical ao nível do grande trocanter e por Angiogragia (Figura_5) constata-se que a lesão osteolítica é vascularizada pela artéria ilíaca interna.Perante a ausência de diagnostico, realiza um cintigrama ao esqueleto e um PET (Figura 6), que levanta a suspeita de se tratar de uma massa neoplásica maligna com envolvimento ganglionar secundário.

Figura_6

Dada a evolução da tumoração ao nível da coxa esquerda, que se encontrava sob tensão, e a indefinição diagnostica, é submetido a drenagem, limpeza e biópsia cirúrgica aberta com colheita de um tecido granulomatoso com uma substância caseosa-esbranquiçada para estudo anátomo-patológico e bacteriológico.

O estudo anátomo-patológico revela a presença de um processo inflamatório crónico granulomatoso, com granulomas do tipo tuberculóide, alguns com necrose central, e a presença de células gigantes do tipo Langerhans. A pesquisa de micobactérias no pus do abcesso é positiva para Mycobacterium tuberculosis complex (por Quantiferon®-Tb Test). Encaminhado para o Serviço de Luta Anti- Tuberculosa, inicia terapêutica quádrupla (Isoniazia, Etambutol, Pirazinamida e Rifampicina). Inicialmente apesenta diminuição da tumoração e dos sinais inflamatórios, porém e após 2 meses de terapêutica tuberculostática e bactericida, re-inicia quadro álgico referido à anca esquerda e edema local, que condiciona nova cirurgia (limpeza cirúrgica, sequestrectomia e bursectomia).

Após 6 meses de terapêutica tuberculostática e bactericida e com 2 anos de follow-up pós-operatório, o doente mantém-se assintomático clínica e radiologicamente.

DISCUSSÃO A tuberculose extrapulmonar pode originar-se por: 1) disseminação canalar, associada a tuberculose pulmonar ativa, particularmente de longa evolução e sem tratamento; 2) disseminação linfática e/ou hemática por ocasião da primoinfecção, usualmente não associada a tuberculose pulmonar activa e 3) extensão da lesão para estruturas adjacentes (contiguidade).

A tuberculose osteoarticular resulta da disseminação do bacilo de Koch de um foco ativo ou não de uma qualquer parte do organismo[10]. A tuberculose óssea normalmente atinge a porção anterior dos corpos vertebrais e a metáfise dos ossos longos. Teale[11] foi o primeiro a descrever a trocanterite tuberculosa em 1870.

É atual a discussão sobre se a anormalidade inicial é a osteíte trocantérica ou a infeção de uma das bursas. Alvik[12] e mais tarde Ahern[13], defendem que a disseminação seria da bursa para o osso. Segundo Lampe[14] a lesão começa ao nível do grande trocanter devido à presença de foci enquistados. Lindahl, Ahlberg e McNeur[14, 9,15] acreditam que a lesão primária pode ser tanto na bursa como no osso.

A trocanterite tuberculosa é uma entidade relativamente rara, estando descrita em apenas 1-2% dos casos de tuberculose óssea[5,8,9], apresentando uma marcada tendência à recorrência[15].

A lesão óssea típica causa destruição, rarefacção e sequestro. A calcificação de tecidos moles revela a actividade da doença nos tecidos circundantes. Um padrão lítico com destruição do trocanter ocorre se não tratada.

O tratamento deve ser iniciado o mais rapidamente possível com o objetivo de "salving the hip"[17]. Sendo a trocanterite tuberculosa extra- articular, especial cuidado deve ser tido no sentido de evitar iatrogenia intra-operatória e a sua disseminação articular por abordagem cirúrgica.

A apresentação clínica da tuberculose do grande trocanter é frequentemente vaga e um abcesso frio surgindo na região trocantérica pode estar tanto presente medial ou mais comummente lateralmente[8, 18]. Ainda assim, a principal dificuldade no diagnóstico de uma infeção tuberculosa da bursa trocantérica continua a ser a sua falta de inclusão na lista dos diagnósticos diferenciais.

Após a suspeição diagnóstica, o estudo por TC ou RNM, onde frequentemente se verifica uma lesão lítica com comunicação justacortical abcedada são fortes fatores preditores de tuberculose óssea. Nestes casos, a biopsia associada a estudo microbiológico e anátomo-patológico permitem a confirmação do diagnóstico[5].

Um diagnóstico precoce é extremamente importante pois 90-95% dos pacientes chega a atingir uma função proxima do normal quando este é efectuado[19, 20].

Após o diagnóstico, o tratamento mais indicado assenta na remoção cirúrgica do tecido infetado (bursa e ósseo)[19, 20]. Paralelamente um esquema de quimioterapia durante 4-18 meses deve ser associado[19, 20], sendo que a sua data de inicio e duração são tema de controversia.

O objetivo deste caso clínico é o de chamar a atenção para esta entidade clínica pouco comum e para a sua suspeição diagnostica. Salienta-se assim a importância da inclusão da tuberculose óssea no diagnóstico diferencial de pacientes com bursite trocantérica resistente ao tratamento conservador, assim como aqueles com sintomatologia osteoarticular de longa duração.

Apesar de rara, a tuberculose óssea é uma realidade, devendo todos nós estarmos alerta para esta doença uma vez que o resultado final em muito se relaciona com o seu diagnóstico precoce.


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