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EuPTCVHe1646-21222013000200003

EuPTCVHe1646-21222013000200003

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1646-2122
ano2013
Issue0002
Article number00003

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Importância da ecografia no rastreio e diagnóstico precoce da displasia do desenvolvimento da anca

INTRODUÇÃO A Displasia do Desenvolvimento da Anca (DDA) abrange um espetro de anomalias anatómicas da articulação coxo-femoral consequentes de um desvio no seu normal desenvolvimento durante o período embrionário, fetal ou infantil. Apesar de a maioria das crianças afetadas evoluir para uma resolução espontânea durante os primeiros meses de vida, o diagnóstico precoce desta patologia é fundamental para a instituição de um tratamento adequado, cujo sucesso depende da idade em que é iniciado, e redução da incidência de complicações a longo prazo[1-3]. A melhor estratégia para o rastreio neonatal da DDA permanece controversa, sendo alvo de intenso debate internacional. A discussão geralmente compara o rastreio clínico, centrado nas manobras de Ortolani e Barlow, ao rastreio ecográfico [2, 4-6].

Historicamente, a radiografia pélvica antero-posterior era usada na avaliação da anca na criança. Contudo, durante os primeiros 4-5 meses de vida, o seu valor é limitado devido à composição predominantemente cartilagínea da articulação coxo-femoral. A ecografia possibilita a avaliação, de forma não invasiva, da morfologia e estabilidade da anca durante este período, e o seu uso tem sido promovido com o intuito de melhorar a acuidade diagnóstica da DDA [7, 8]. Todavia, para além das questões económicas, a possibilidade de sobrediagnóstico e consequente sobretratamento que podem decorrer do uso da ecografia são desvantagens que muitas vezes limitam a sua aplicação[9].

Os moldes em que a ecografia deve ser aplicada no rastreio e diagnóstico precoce da DDA continuam por esclarecer: em alguns países europeus (nomeadamente, Alemanha, Áustria e Suíça), todas as crianças são rastreadas ecograficamente durante o período neonatal, enquanto nos Estados Unidos e em vários centros do Reino Unido é adotado um método seletivo, em que apenas as crianças com forte suspeição de DDA são avaliadas ecograficamente[6, 10]. O objetivo desta revisão é reunir e sintetizar a informação mais recentemente publicada acerca do contributo da ecografia no rastreio e diagnóstico precoce da DDA e da estratégia a adotar para otimizar a sua utilização.

MÉTODOS Efetuou-se uma pesquisa na base de dados MEDLINE (PubMed) com os termos MeSH "congenital hip dislocation" e "ultrasonography", limitada a artigos escritos em Português ou Inglês, referentes a investigação realizada em humanos e publicados entre janeiro de 2000 e dezembro de 2011.

Desta busca resultaram 149 artigos, 16 dos quais foram rejeitados por não estar disponível o seu abstract. Após leitura dos 133 títulos e abstracts restantes, excluíram-se 81 artigos de acordo com os critérios de exclusão: abordagem restrita a casos de DDA associados a outros distúrbios neuromusculares em idade pediátrica; caracterização do perfil ecográfico das ancas em subpopulações específicas; uso exclusivo da ecografia na monitorização e avaliação dos resultados terapêuticos; estudo dos preditores ecográficos do sucesso terapêutico; indisponibilidade do texto integral. As listas bibliográficas de todos os estudos e revisões incluídas foram manualmente revistas e 37 artigos foram adicionados aos 52 previamente selecionados.

DEFINIÇÃO Displasia do Desenvolvimento da Anca substituiu a tradicional designação de Luxação Congénita da Anca, após reconhecer-se que muitos recém-nascidos com exame da anca normal desenvolviam doença da anca durante o primeiro ano de vida [11, 12]. DDA é atualmente o termo usado para descrever um espetro de anomalias anatómicas nas quais existe uma relação anormal entre a cabeça femoral e o acetábulo[13]. Este espetro inclui: ancas instáveis (subluxáveis ou luxáveis por manipulação); ancas subluxadas (deslocação incompleta com contato parcial entre a cabeça femoral e o acetábulo); ancas deslocadas ou luxadas; e ainda, displasia ou malformação acetabular (qualquer alteração no desenvolvimento do fémur e/ ou acetábulo)[14, 15].

EPIDEMIOLOGIA A DDA é a anomalia congénita do aparelho músculo-esquelético mais frequente na criança[16]. A sua verdadeira incidência pode apenas estimar-se, dado que não existe um método gold standard de diagnóstico e aqueles que estão disponíveis podem levar a resultados falsos positivos ou negativos[12, 17, 18]. A maioria dos países desenvolvidos apresenta incidências de 1,5 a 20 casos de DDA por cada 1000 nascimentos, dependendo, em parte, do método de diagnóstico utilizado [3, 16,  19-25]. Ortiz-Neira[26], a partir dos 31 estudos incluídos na sua meta-análise, registou uma prevalência de 1,9% em crianças com idade inferior a 6 meses.

A anca esquerda é mais frequentemente afetada[5, 26, 27], provavelmente devido à posição anterior occipital esquerda que a maioria dos recém-nascidos adota durante a vida intrauterina[28]. Nesta posição a anca esquerda encontra-se posteriormente contra a coluna vertebral da mãe, limitando potencialmente a abdução[28, 29]. Em cerca de 20% dos casos a DDA apresenta-se bilateralmente [16].

ETIOLOGIA A etiologia exata da DDA não é conhecida. Fatores ambientais e genéticos parecem atuar como influências externas e internas, respetivamente[11, 28]. O posicionamento do feto in útero e da criança durante a infância, apresentação pélvica ao nascimento, oligohidrâmnios, gestações múltiplas, macrossomia e uso de vestuário apertado/ "enfaixamento" são os fatores externos mais importantes[20, 28]. A presença de um acetábulo raso e acentuada frouxidão do tecido conetivo capsular, com resistência diminuída da anca à luxação, são reconhecidas influências internas[13]. O contributo genético é provavelmente o fator mais importante, sugerindo uma elevada heritabilidade consistente com uma forte suscetibilidade genética para o início da doença, mas não necessariamente para a sua progressão ou severidade[11, 13].

APRESENTAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICO Anamnese e Fatores de Risco Na maioria dos casos de DDA não são identificáveis fatores de risco[30, 31], verificando-se a presença de um ou mais fatores de risco em apenas cerca de 30% das crianças afetadas[4, 19]. O género feminino, apresentação pélvica ao nascimento e história familiar (DDA confirmada em um familiar em primeiro grau ou em mais que um familiar afastado) são os fatores mais consistentemente associados ao diagnóstico de DDA[1, 19, 20, 26, 32-35]. Deformidades congénitas do (em especial, o calcaneovalgo), raça caucasiana, primiparidade, oligohidrâmnios, torcicolo congénito e prematuridade relacionam-se também, embora menos solidamente, ao desenvolvimento da doença[5, 19, 26, 32, 36, 37].

Apenas uma em cada 75 crianças com fatores de risco apresenta DDA [4]. Assim, um exame físico minucioso deve sempre complementar a respetiva anamnese [31].

Exame Físico O exame clínico da criança, dirigido ao diagnóstico de DDA, centra-se sobretudo na realização das manobras de Ortolani e Barlow, introduzidas no rastreio neonatal desta patologia por Von Rosen[38] e Barlow[39], respetivamente.

A manobra de Ortolani tem como objetivo reposicionar uma cabeça femoral luxada.

Na posição supina e com a pelve estabilizada, a anca é fletida a 90º e suavemente abduzida enquanto os dedos indicador e médio do examinador seguram o grande trocânter e o polegar apoia na face interna da coxa[8]. Num teste positivo, é sentida a cabeça femoral a reposicionar-se no acetábulo[12, 15]. Na manobra de Barlow, experimenta provocar-se a luxação/ subluxação de uma anca instável: com a anca aduzida e fletida a 90º, o examinador segura distalmente a coxa e empurra-a no sentido posterior. O teste é positivo quando a cabeça femoral desliza posteriormente[1, 2].

A reprodutibilidade das manobras de Ortolani e Barlow depende da elasticidade capsular e ligamentosa da articulação coxo-femoral[8]. O desenvolvimento do tónus muscular e diminuição da lassidão capsular, por volta do 2º-3º meses de vida, tornam estes testes úteis apenas em crianças com menos de 12 semanas de idade[15]. "Clicks" agudos são muitas vezes palpáveis ou audíveis durante o exame da anca e resultam do atrito entre tecidos moles e as proeminências ósseas[8, 13]. Estes "clicks", benignos, desaparecem com o decorrer do tempo e devem distinguir-se dos "clunks" produzidos durante a manobra de Ortolani, quando a cabeça femoral é reduzida, ou durante a luxação/ subluxação sentida durante o teste de Barlow[1, 2].

Distinguir uma verdadeira luxação ou subluxação dos "clicks" benignos requer prática e experiência, pelo que ambos os testes exibem um elevado grau de dependência do examinador[13].

Após os 3 meses de idade, a limitação da abdução (provavelmente secundária à contratura dos músculos adutores) é um sinal clínico importante associado à patologia, especialmente se unilateral, da anca[1, 6, 29]. Ambas as ancas devem avaliar-se simultaneamente e, com as coxas e joelhos fletidos, a maioria das crianças consegue uma abdução completa. O movimento assimétrico deve alertar o examinador para um potencial problema[11-13, 15].

O encurtamento da coxa, um sinal sugestivo de DDA, pode identificar-se pelo teste de Galleazzi[11, 12, 15]. Na criança, em decúbito dorsal e com as ancas e joelhos fletidos a 90º, a altura de cada joelho é comparada[8, 13]. Um aparente encurtamento femoral unilateral pode significar luxação da anca ou, mais raramente, anomalias do fémur[8, 13]. Resultados falsos negativos ocorrem na presença de patologia bilateral ou quando a pélvis não está nivelada devido à presença da fralda[11].

Embora não existam sinais patognomónicos, podem ainda fazer suspeitar de DDA os seguintes achados: discrepância no comprimento dos membros inferiores; achatamento da nádega ipsilateral e assimetria das pregas cutâneas inguinais e nadegueiras[11, 13, 29]. Contudo, nenhum destes sinais é particularmente sensível ou específico[16]. A assimetria das pregas inguinais, por exemplo, está presente em 25% das crianças sem patologia, tornando-se assim, quando isolada, um achado clínico pouco importante[10, 40].

Em crianças mais velhas, o diagnóstico clínico de DDA é frequentemente mais simples[11]. Após o início da marcha, os sinais físicos tornam-se mais óbvios: um típico coxear indolor e a criança vulgarmente anda em bicos de pés no lado afetado[29, 41]. Não é comum observar-se um atraso na idade de início da marcha[6, 11], embora cerca de 20% das crianças afetadas não a inicie antes dos 18 meses, em contraponto aos 5% estimados para a população normal[41].

Inversamente ao que ocorre com as ancas instáveis ou luxadas/ subluxadas, nos casos de displasia acetabular os sinais físicos anormais podem estar ausentes, tornando o seu diagnóstico mais delicado. O único sinal pode ser um desconforto com a movimentação extrema, particularmente a abdução e rotação interna. O adolescente pode claudicar e/ ou queixar-se de dor ou desconforto após a marcha [10, 40, 41].

Radiografia Na infância precoce, o acetábulo predominantemente cartilagíneo e a cabeça femoral não ossificada fazem da radiografia um método imagiológico pouco sensível e com resultados insatisfatórios[42]. Após os 4-5 meses de idade, com o desenvolvimento ósseo, a radiografia pélvica antero-posterior apresenta a DDA como um atraso na ossificação do acetábulo ou como uma displasia com ou sem luxação/ subluxação da cabeça femoral[1, 32]. Uma posição estandardizada, para obtenção de imagens exatas e reproduzíveis, é crucial para um diagnóstico correto[11].

Medições a partir de linhas projetadas na radiografia antero-posterior ajudam a caracterizar a relação entre a cabeça femoral e o acetábulo[15]. A linha de Hilgenreiner, uma linha que interseta ambas as cartilagens trirradiadas, e a linha de Perkins, traçada ao longo da margem lateral do acetábulo e perpendicular à linha de Hilgenreiner, dividem a anca em quadrantes[42]. O núcleo de ossificação da cabeça femoral, quando presente, deve localizar-se no quadrante inferior-medial. Nas ancas displásicas ou luxadas o núcleo de ossificação localiza-se, em geral, no quadrante superior-lateral[11] (Figura 1).

O índice acetabular, uma medida da "profundidade" do acetábulo, representa o ângulo formado entre a linha de Hilgenreiner e uma linha traçada entre as margens súpero-lateral e infero-medial do acetábulo[6]. Este ângulo diminui gradualmente com a idade em consequência do modelamento do acetábulo pela cabeça femoral e da maturação e desenvolvimento ósseo ao longo do bordo súpero-lateral do acetábulo. Nas primeiras semanas de vida, as ancas displásicas apresentam geralmente um ângulo >30º[43].

Numa anca não patológica, a linha de Shenton representa um arco contínuo de ligação entre a metáfise femoral medial e o bordo inferior do ramo superior do púbis. A desarticulação da cabeça femoral com o acetábulo e a interrupção da linha de Shenton sugerem DDA[15].

Ultrassonografia (US) A capacidade do exame ecográfico demonstrar anomalias não detetadas clínica ou radiograficamente tem sido bem estabelecida[44]. A sua aptidão para visualizar os componentes predominantemente cartilagíneos da anca nos primeiros 4-5 meses de vida[11] torna-a um método particularmente útil durante esse período, revelando-se mais sensível que a radiografia nas crianças até aos 4-6 meses de idade[10, 13]. Habitualmente, a partir dos 12 meses, a cabeça femoral suficientemente ossificada impede uma boa representação ecográfica do acetábulo [45]. Para além do contributo no diagnóstico, a US é também recomendada na monitorização das crianças com DDA tratadas conservadoramente[15, 28, 45].

Um estudo prospetivo[21] mostrou que a indicação para tratamento conservador em crianças com idade superior a 3 meses não deve basear-se exclusivamente em achados ecográficos. Atendendo à diminuição no número de casos desnecessariamente tratados, os autores defendem que, a partir desta idade, devem ser avaliadas radiograficamente todas as suspeitas de DDA.

OPÇÕES TERAPÊUTICAS Resultados anormais na avaliação da anca devem ser identificados e corrigidos prontamente, dado que a janela de oportunidade para iniciar um tratamento efetivo é estreita[11]. O objetivo primário do tratamento é conseguir uma redução concêntrica e estável da anca que permita o desenvolvimento normal da articulação[10, 41]. A maioria das ancas instáveis, havendo alinhamento entre a cabeça femoral e o centro do acetábulo, apresentam uma tendência para estabilizar espontaneamente por volta das 2-6 semanas de idade[34, 41, 46]. As ancas que permanecem luxadas ou patologicamente instáveis, a maioria das quais apresenta displasia ecográfica, necessitam de tratamento imediato[11, 40]. A estratégia terapêutica e sua duração dependem da idade da criança e da severidade da DDA[41, 47].

A armadura de Pavlik, uma ortótese dinâmica que impede a extensão e adução da anca, constitui o tratamento de eleição para a DDA em crianças com menos de 6 meses de idade[13, 47]. Até aos 6 meses, a imobilização com talas de abdução estáticas pode também ser utilizada para se conseguir e manter a redução da anca[10, 11]. A ortótese deve permanecer sempre colocada, permitindo o estiramento dos ligamentos capsulares e dos músculos adutores que estavam contraídos, havendo a possibilidade de a ajustar à medida que a criança cresce e a anca estabiliza [8, 10, 11]. A criança deve ser acompanhada clínica e ecograficamente (ou por radiografia, após os 4-5 meses de idade), variando a frequência com a patologia a ser tratada, até que a anca se apresente clinicamente estável e a US mostre uma anca anatomicamente normal e estável ou minimamente imatura[11]. O uso da armadura de Pavlik é controverso, ou mesmo contraindicado, em crianças com mais de 4,5-6 meses de idade, quando a luxação é irredutível (Ortolani negativo) e nos casos em que recusa ou incumprimento por parte dos pais[11, 48]. O tratamento com armadura de Pavlik ou com talas de abdução iniciado antes das 6-8 semanas de vida tem uma maior probabilidade de ser bem-sucedido[1, 39, 48]. As talas de abdução estáticas podem ter maior sucesso quando o problema major é a instabilidade mas, particularmente em casos de luxação fixa, o risco de danificar a cabeça femoral vulnerável e em desenvolvimento é considerável. Assim, o seu uso deve ser criterioso[11, 41].

O uso de "fraldas triplas" durante o período neonatal não é atualmente recomendado[49, 50].

Em crianças com idade superior a 6 meses, é habitualmente necessária uma redução fechada sob anestesia ou, quando a anca se mantém irredutível ou não foi conseguida uma redução concêntrica, uma abordagem terapêutica cirúrgica[13, 29]. As crianças que necessitam de cirurgia surgem a partir de dois grupos: aquelas em que o tratamento conservador atempado não teve êxito e os casos tardiamente diagnosticados nos quais uma abordagem conservadora se preveja ineficaz[41, 51]. A cirurgia mais comum envolve a tenotomia dos adutores ou do músculo psoas com estabilização dos tecidos moles da articulação. Tanto a redução fechada como a cirurgia devem seguir-se de um período de imobilização, durante 3-4 meses, com gesso pelvipodálico[41]. Quanto mais velha é a criança, maior é a probabilidade de um procedimento mais invasivo ser exigido[10]. A partir dos 18-24 meses de idade, é muitas vezes necessária uma osteotomia pélvica e/ou femoral para normalizar a anatomia e orientação da anca e promover a congruência e estabilidade da articulação[10, 41].

Todas as intervenções terapêuticas, cirúrgicas ou não-cirúrgicas, estão associadas a possíveis efeitos iatrogénicos, de entre os quais a necrose avascular da cabeça do fémur é a mais nociva das complicações[5, 34, 48, 52].

Compressão e paralisia temporária do nervo femoral, úlceras de pressão e subluxação do joelho foram também descritas[13, 20, 48].

Estudos observacionais sugerem uma elevada taxa de resolução espontânea da DDA durante os primeiros meses de vida[53, 54], pelo que a verdadeira eficácia da intervenção terapêutica não é conhecida[1,2,6].

DIAGNÓSTICO TARDIO E PANORAMA A LONGO PRAZO A deteção precoce e tratamento atempado da DDA são cruciais, dado que pode estar comprometido o normal crescimento e desenvolvimento da anca[55]. Um atraso no diagnóstico pode exigir um tratamento mais complexo e com maiores taxas de insucesso[11]. Alterações degenerativas prematuras da articulação coxo-femoral, anomalias da marcha e dor lombar crónica são potenciais sequelas a longo termo da DDA, dependendo do tipo e duração da instabilidade não tratada, do tratamento e idade em que foi instituído e da presença de necrose avascular(1, 12). Na sua forma mais severa, a DDA é uma das mais importantes causas de incapacidade na criança[13]. É responsável por até 9% de todas as cirurgias de substituição da anca e até 29% dessas substituições em idades inferiores a 60 anos[56].

A definição de diagnóstico tardio não é unânime, sendo defendidos limites entre as 4 semanas[22, 37] e os seis meses de idade[4, 25]. Viere[48] considera tardio um diagnóstico após as 6-8 semanas, visto que a taxa de sucesso do tratamento conservador baixa significativamente após esta idade[48].

A probabilidade de ancas clinicamente estáveis e sem anomalias ecográficas se tornarem patológicas tem sido consensualmente aceite como nula, tornando prescindível o seguimento destas crianças[10, 40, 57]. Todavia, Rafique[57] reportou um caso de DDA com apresentação tardia, aos 12 meses, apesar de um exame ecográfico normal e ancas estáveis ao exame clínico terem sido obtidos ao dia pós-natal.

RASTREIO O sucesso de um programa de rastreio é definido por vários critérios e o debate internacional mantém-se para apurar em que medida o rastreio da DDA os cumpre [58]. O objetivo principal do rastreio é reduzir a prevalência de diagnósticos tardios, conhecido que a deteção precoce permite o tratamento atempado, reduzindo a necessidade de intervenção cirúrgica e o risco de displasia residual[11]. Evitar as intervenções cirúrgicas em idade pré-escolar é um ponto de referência importante para melhores resultados[3] e a incidência de primeiras cirurgias tem sido usada para avaliar a eficácia dos programas de rastreio em vários estudos[59]. As estratégias para o rastreio da DDA, particularmente o método a utilizar e a população a ser rastreada, são ainda controversos, devido em parte ao fato de a história natural desta doença ser pouco compreendida[14, 60, 61]. Três métodos estão descritos[9, 31]: 1) Rastreio clínico (anamnese e exame físico) em todas as consultas de rotina. 2) Rastreio ecográfico, ou radiográfico, seletivo nas crianças com anamnese ou sinais clínicos suspeitos. 3) Rastreio ecográfico (ou radiográfico) universal, para além da avaliação clínica.

Duas autoridades reconhecidas, a American Academy of Pediatrics (AAP)[62] e a US Preventive Services Task Force (USPSTF)[63], apresentaram diferentes orientações para o rastreio e acompanhamento das crianças com DDA.

A AAP recomenda um exame físico minucioso, efetuado por profissionais adequadamente treinados, a todos os recém-nascidos e em todas as consultas de rotina durante o primeiro ano de vida. Quando o exame neonatal apresenta resultados negativos ou equivocamente positivos, devem considerar-se os fatores de risco. A avaliação ecográfica não-seletiva é desaconselhada, justificando-se apenas, entre as 4 semanas e os 6 meses de idade, nas crianças com fatores de risco ou exame físico duvidoso. Tendo as raparigas com história familiar positiva para DDA ou aquelas com apresentação pélvica ao nascimento o risco mais elevado de desenvolver DDA (44/1000 e 120/1000, respetivamente), a ultrassonografia às 6 semanas de idade (ou radiografia aos 4 meses) é recomendada nestes casos. Atendendo à elevada incidência de anomalias da anca detetadas em todas as crianças nascidas em apresentação pélvica, esta estratégia pode ser considerada em ambos os sexos[49].

As diretrizes da USPSTF são mais recentes e alguns estudos originais não tinham ainda sido publicados aquando da divulgação das indicações da APP. A USPSTF considerou haver evidência científica insuficiente para recomendar uma estratégia de rastreio para a DDA como medida preventiva de consequências adversas: o rastreio clínico quanto o ecográfico identificam recém-nascidos com risco acrescido de desenvolver DDA, mas os benefícios do diagnóstico e intervenção terapêutica precoces não são claros devido à elevada taxa de resolução espontânea desta condição[63].

A preferência pelo rastreio ecográfico universal, como estratégia para reduzir ou mesmo eliminar a incidência de casos tardios, assenta na constatação de que na maioria das crianças com DDA não são identificados fatores de risco[13, 31].

Além disso, vários estudos apontam falhas à utilização seletiva da US na deteção precoce de todos os casos da doença[4, 36, 52, 64, 65].

Dois ensaios clínicos randomizados compararam a eficácia dos diferentes métodos de deteção precoce da DDA[7, 37]. Rosendahl[7] comparou as três estratégias de rastreio e, embora verificasse uma menor prevalência de casos tardiamente diagnosticados nas crianças sujeitas a rastreio ecográfico universal, esta diferença não foi estatisticamente significativa. O mesmo estudo mostrou ainda que o rastreio ecográfico universal resulta em maiores taxas de tratamento e follow-up. Holen[37] comparou o rastreio ecográfico universal ao seletivo (casos de alto risco). Examinadores experientes realizaram tanto os exames clínicos como as ultrassonografias e, embora tenham surgido mais casos tardiamente diagnosticados no grupo sujeito a rastreio seletivo, esta diferença não foi estatisticamente significativa. A vantagem oferecida pelo rastreio ecográfico torna-se evidente apenas quando comparado com o exame clinico executado por examinadores não experientes[37]. No seu modelo de análise e decisão sobre a utilidade do rastreio na DDA, Mahan[2] concluiu que o rastreio clínico de todos os recém-nascidos e o uso seletivo da US naqueles que apresentavam risco de desenvolver a doença, constitui a estratégia ótima associada a uma maior probabilidade de ter uma anca não-degenerativa aos 60 anos de idade.

ULTRASSONOGRAFIA DA ANCA Considerações Gerais O uso da US no exame neonatal da anca foi iniciado e desenvolvido por Graf[53, 66], mais de três décadas. Novick[67] introduziu o estudo da anca no plano transverso e Harcke et al[68] desenvolveram a avaliação ecográfica dinâmica da anca.

A US da anca na criança emprega uma técnica de leitura em tempo-real, permitindo que o movimento das estruturas anatómicas seja diretamente observado [44]. Vários tipos de transdutores, incluindo o linear, o setorial e o convexo, podem ser usados[68]. Apesar de tanto os transdutores setoriais quanto os convexos permitirem visualizar uma anca deslocada, distorções geométricas podem motivar erros de diagnóstico, particularmente quando se trata de uma anca displásica[44]. O uso destes transdutores deve, assim, limitar-se a avaliações qualitativas. Atualmente, os requisitos para a garantia de qualidade exigem o uso de transdutores lineares, devendo as medições da morfologia da anca fazer- se unicamente com base em imagens obtidas por este tipo de sondas[29, 44, 45].

O transdutor de mais elevada frequência, capaz de dar profundidade suficiente para visualizar a face medial do acetábulo, deve ser utilizado[29, 45, 68]. Uma frequência de 7,5 megahertz é mais adequada para crianças até um mês de idade, enquanto 5,0 megahertz são preferíveis em crianças entre um mês e um ano de idade, quando o centro de ossificação é habitualmente muito grande e não permite a visualização das características do acetábulo[44, 53].

Roovers[69] avaliou a precisão diagnóstica da US. Com o intuito de aferir a capacidade de deteção precoce da DDA, obteve uma sensibilidade de 88,5% e especificidade de 96,7%. Resultados sobreponíveis foram obtidos por outros autores[70, 71]. Estudos comparativos mostram que a avaliação ecográfica é mais sensível que o exame físico no diagnóstico precoce da DDA[33, 72], identificando anomalias que não são detetadas clinicamente[33, 44]. Se a decisão de tratar tiver em conta o resultado da US, para além dos sinais clínicos, o número de casos tratados pode ser reduzido em mais de 40%[73].

Vantagens A US oferece vantagens evidentes quando comparada aos restantes métodos imagiológicos[61]. Desde logo, ao contrário da radiografia simples, distingue os componentes cartilagíneos do acetábulo e cabeça femoral das restantes estruturas de tecido-mole adjacentes[53, 70]. Assim, devido à ossificação incompleta durante a infância precoce, a US torna-se mais sensível que a radiografia nas crianças com menos de 4-6 meses de idade[13]. Em segundo lugar, a US em tempo-real permite uma avaliação em múltiplos planos que determina com clareza a posição da cabeça femoral em relação com o acetábulo, fornecendo o mesmo tipo de informação obtida pela artrografia, tomografia computorizada ou ressonância magnética, mas com menor custo[66]. Terceiro, apesar de mais dispendiosa que a radiografia simples, a US não requer sedação e não envolve radiação ionizante[53, 66, 70]. Por fim, contrariamente a outras técnicas, permite observar as alterações na posição da anca provocadas pelo movimento[40, 44].

Técnicas Ecográficas Diferentes abordagens ecográficas para avaliar a anca na criança são usadas atualmente. O método estático proposto por Graf[53, 66] e a técnica dinâmica descrita por Harcke[68] são os mais utilizados[6, 74].

A técnica de Graf assenta na avaliação de imagens coronais[66], obtidas a partir de uma abordagem lateral quando a criança está na posição de decúbito lateral e com a anca fletida a 15º-20º[45]. Este método enfatiza as características morfológicas da articulação coxo-femoral, particularmente a profundidade do acetábulo cartilagíneo e a posição da cabeça femoral em repouso, classificando o estado da anca com base na medição de ângulos acetabulares[44, 53]. A partir da imagem coronal obtida, 3 linhas são projetadas[53]: uma linha ao longo do plano da parede lateral do ílio; uma linha paralela ao bordo cartilagíneo do acetábulo, desde a sua extremidade lateral até ao labrum; e uma linha ao longo do plano da convexidade óssea do acetábulo (desde a margem ilíaca inferior, na fossa acetabular, até à extremidade lateral do bordo ósseo do acetábulo) (Figura_2). O ângulo alfa (a), uma medida da concavidade acetabular, forma-se na interseção da linha paralela à parede lateral do ílio e a linha projetada ao longo do plano da convexidade acetabular óssea. Em ancas instáveis, quanto menor este ângulo, maior é a probabilidade de luxação. O limite inferior considerado normal para o ângulo a são 60º[49, 53]. O ângulo beta (ß), calculado entre a linha paralela à parede lateral do ílio e a linha paralela ao bordo cartilagíneo do acetábulo, reflete o grau de cobertura da cabeça femoral pelo bordo cartilagíneo. Um ângulo ß <55º é considerado normal e um ângulo ß >77º indica eversão do labrum e/ ou subluxação da anca[49, 53]. Os achados ecográficos classificam-se segundo os denominados tipos de anca[53], de acordo com o desenvolvimento da ossificação acetabular. As medições dos ângulos confirmam o diagnóstico indicado pela descrição morfológica e proporcionam um parâmetro quantitativo para comparação dos resultados[18, 44] (Quadro_I). Ancas morfologicamente normais possuem um risco marginal de desenvolver displasia durante a infância tardia[44, 72].

Dados sobre o curso natural da displasia ligeira sugerem que este tipo de ancas tende a normalizar espontaneamente[20, 44, 72].

Quadro_I

Pretendendo simplificar a análise ecográfica da anca baseada no método de Graf, Rakovac[75], em 2011, desenvolveu um novo parâmetro: o "L value". O seu estudo mostrou uma correlação estatisticamente significativa entre a classificação de Graf e os valores do "L value", evidenciando ainda uma melhor concordância interobservador obtida com o novo parâmetro.

A abordagem dinâmica, com uma análise em múltiplos planos, avalia a anca em diferentes posições provocadas pelas manobras de Ortolani e Barlow[6]. Apesar de permitir avaliar o desenvolvimento acetabular, esta técnica evidencia sobretudo a estabilidade da anca e a posição da cabeça femoral[68]. Ancas instáveis com morfologia normal não requerem geralmente tratamento imediato, visto que na maioria dos casos se desenvolvem normalmente[43, 72].

A percentagem da cabeça femoral que é coberta pelo bordo ósseo do acetábulo, outra medida da forma ou profundidade acetabular[46], constitui, segundo Terjesen[54], o parâmetro mais importante a ser avaliado na criança com DDA, independentemente da sua idade. Com a cabeça femoral centrada, uma percentagem <47% nos rapazes e <44% nas raparigas considera-se patológica(13, 19). Numa anca instável, para além de displásica, esta percentagem varia e a medição pode ser falaciosa[10, 11].

A dificuldade em determinar a orientação topográfica exata de um plano ecográfico individual é considerada um inconveniente, sendo difícil estabelecer quando o acetábulo está a ser visualizado num plano oblíquo ou na orientação frontal correta[44]. O exame ecográfico é tecnicamente satisfatório quando o osso ilíaco é mostrado como uma linha reta bem definida, indicando que a sonda está perfeitamente alinhada com o centro do acetábulo[57]. Um dispositivo de posicionamento, moldado para acomodar o tronco, a pelve e as pernas, é muito útil para colocar a criança numa posição confortável e desejada, permitindo obter imagens ótimas e reproduzíveis[44, 53].

Críticos do método morfológico de Graf apontam variações inter- e intraobservador que influenciam na análise dos resultados[76]. Vários estudos mostraram que, quando levado a cabo por profissionais treinados, a variabilidade nas medições não é um fator importante e uma uniformização, com resultados reproduzíveis, é facilmente estabelecida[27, 52, 77-80]. A abordagem dinâmica parece mais propensa à subjetividade por parte do observador[44].

Independentemente da técnica, estática ou dinâmica, a US da anca é uma modalidade operador-dependente[72, 76-78]. Assim, visando diminuir as taxas de diagnóstico tardio e sobretratamento, vários autores defendem a utilização conjunta de ambos os métodos[50, 51, 60, 72].

Influência do Rastreio Ecográfico na Estratégia e Resultados Terapêuticos Além da maior sensibilidade que o rastreio ecográfico apresenta quando equiparado ao rastreio clinico, vários estudos destacam o maior número de casos precoces detetados com esta estratégia[20, 23, 25, 26, 42]. O diagnóstico atempado permite um tratamento imediato, limitando a sua duração e melhorando os resultados atingidos(3, 7). Roovers[69] mostrou que 67% das crianças sujeitas a rastreio ecográfico não-seletivo são referenciados antes das 13 semanas de idade; uma proporção bastante superior aos 29% conseguidos pelo rastreio clinico. Contudo, esta estratégia não alcança ainda a erradicação total dos casos tardios de DDA[25, 69].

As estratégias baseadas no uso da US, particularmente o seu uso não-seletivo, podem associar-se a um aumento na taxa de utilização de talas de abdução[10, 28, 81, 82]. Um maior número de casos tratados na população universalmente rastreada por ecografia aponta a possibilidade de sobretratamento como consequência do rastreio[69]. A prevenção do sobretratamento pode conseguir-se com o adiamento da realização da US até à 4ª-8ª semana de vida[20, 33, 36, 41, 65, 83], idade em que se encontram normalizadas a maioria das ancas patológicas no período neonatal. Este adiamento tem, contudo, um efeito negativo na idade em que é feito o referenciamento das crianças e, consequentemente, na idade em que é iniciado o tratamento[69]. Teoricamente, pode ser perdida a oportunidade de rastreio em alguns casos[40, 52].

A utilização da US, particularmente o rastreio ecográfico universal, associa-se a um maior número de resultados favoráveis (aspeto radiológico após maturação óssea) assim como uma maior proporção destes resultados conseguidos sem recurso à cirurgia[4, 25, 84]. Contudo, subsiste um maior risco de potenciais efeitos iatrogénicos no conjunto das crianças com rastreios falsos positivos[81]. Num estudo que avaliou os primeiros 5 anos após introdução de um programa de rastreio ecográfico universal na Alemanha, von Kries[59] concluiu que a implementação deste programa diminuiu o número de primeiras intervenções (reduções abertas ou osteotomias) de um número previamente estimado de 1 por 1000 nascimentos para 0,26 por 1000 nascimentos. Num estudo caso-controlo publicado em 2011, o mesmo autor concluiu que a US universal, como complemento do rastreio clinico, reduziu a taxa de intervenções cirurgicas em 52%[85]. A mesma estratégia de rastreio, implementada em 1991 na Áustria, reduziu consideravelmente o número de osteotomias pélvicas e acetabuloplastias, atingindo, no ano de 2004, o valor de 0,13 por 1000 nascimentos[83] Abordagem Custo-efetividade Os vastos recursos inerentes a um programa de rastreio ecográfico têm impedido a sua implementação em muitas áreas do mundo[44]. Para comparar a efetividade dos diferentes métodos de deteção precoce da DDA e quantificar as diferenças na utilização de recursos e os custos implicados em cada uma das estratégias, é necessário considerar vários aspetos importantes: o número de consultas e o número e tipo de especialistas na área da saúde envolvidos; o número de ecografias e radiografias realizadas; o número e tipo de ortóteses usadas e a duração da sua aplicação; o número e duração de hospitalizações e o número e tipo de cirurgias associadas[49, 56, 86]. O equipamento médico e treino dos clínicos são investimentos necessários e relevantes quando está subjacente a utilização da US[87].

Brown[88] evidenciou que as estratégias baseadas no uso da US são mais eficazes em termos de resultados favoráveis alcançados (ausência radiológica de luxação/ subluxação aquando da maturação óssea) e necessidade de recurso a tratamento cirúrgico. A eficácia relativa entre a US seletiva e o rastreio clinico foi pouco divergente, dependendo sobretudo dos critérios de definição de risco e da experiência do clinico que realiza o exame físico. As estratégias que contemplam o uso da US apresentaram-se, contudo, mais dispendiosas.

Clegg[86] e Thaler[89] mostraram que a introdução de um programa de rastreio ecográfico universal diminuiu significativamente o número de crianças com necessidade de tratamento cirúrgico, permitindo que, quando necessária, a cirurgia ocorresse em idade precoce e a intervenção fosse menos invasiva. Ambos os estudos obtiveram custos totais equiparáveis quando contrapuseram as diferentes estratégias para o rastreio da DDA. Thaler observou ainda uma diminuição no número de casos tratados com talas de abdução nas crianças sujeitas a avaliação ecográfica.

Elbourne[55], num ensaio clinico randomizado abrangendo 629 crianças com instabilidade da anca diagnosticada clinicamente no período neonatal e acompanhadas durante um follow-up de dois anos, avaliou a eficácia e os custos integrais da ultrassonografia quando comparada ao exame clinico isolado.

Concluiu que o uso da ultrassonografia nestas crianças permite uma redução no número de casos tratados com talas de abdução, não se associando a um maior risco de desenvolvimento anormal da anca, maiores taxas de tratamento cirúrgico ou aumento significativo dos custos relacionados aos serviços de saúde. Com base na mesma população, Gray[90] conduziu uma análise económica prospetiva e confirmou que a utilização da ultrassonografia nos recém-nascidos com instabilidade clínica da anca diminui significativamente os custos relacionados ao tratamento conservador. Mostrou existir também uma redução nos custos associados ao tratamento cirúrgico e custos totais, embora sem significado estatístico.

Numa análise custo-benefício para explorar uma justificação económica para a introdução do rastreio ecográfico universal na Croácia, Bralic[87] previu que os custos associados ao tratamento dos casos tardios de DDA, detetados clinicamente, seriam 1,6 vezes superiores aos custos relacionados à implementação de um programa de rastreio ecográfico não-seletivo, confirmando assim a eficiência desta estratégia.

NOTAS FINAIS Genericamente, o objetivo das estratégias de diagnóstico para a DDA é detetar todos os casos numa idade precoce, com um custo razoável e evitando o sobrediagnóstico. O resultado final deve ser a eliminação dos casos tardios que podem ser desastrosos para o doente. O ponto basilar de um diagnóstico precoce parece alicerçar-se no exame objetivo minucioso e repetido da criança durante o primeiro ano de vida[49]. O treino dos profissionais e aperfeiçoamento técnico são determinantes, e apontados como o primeiro passo a adotar, na diminuição do número de casos falsos-negativos e aumento da taxa de deteção do rastreio clínico[22, 40]. Vários autores defendem que, quando o exame clínico neonatal é efetuado por profissionais experientes, a taxa de diagnósticos tardios é baixa e, neste contexto, o rastreio ecográfico universal pouco acrescenta em termos de eficácia ao rastreio ecográfico seletivo[11, 81, 83].

Numa revisão sistemática da qualidade da informação publicada em estudos relacionados ao uso da US no diagnóstico da DDA, Roposch[74] concluiu que existe escassa evidência acerca da acuidade diagnóstica e dos benefícios deste teste em termos de efeitos a longo prazo, havendo uma tendência para sobreinterpretar os resultados. Assim, é claramente necessário melhor investigar acerca da acuidade diagnóstica da US[74]. A US da anca praticada na comunidade é improvável que atinja os elevados níveis de fiabilidade e concordância intra- e interobservador reportados em alguns estudos, dado que o examinador terá provavelmente menos experiência e treino que os examinadores que participam nos ensaios clínicos[30]. Outra das falhas apontadas é o inadequado seguimento dos recém-nascidos com rastreio negativo, falsamente assumindo que nenhuma destas crianças irá desenvolver DDA. Um follow-up prolongado de uma coorte, necessário para a validade de um estudo, é raramente incorporado na maioria dos protocolos devido à óbvia dispendiosidade[31].

A necessidade de estudos multicêntricos para melhor compreender a história natural da DDA e o efeito de um diagnóstico precoce na estratégia e resultado terapêuticos é unanimemente reconhecida[40, 82]. Dado que o número de casos de DDA que necessita de tratamento cirúrgico é reduzido, os ensaios clínicos randomizados para avaliar o efeito do rastreio ecográfico na taxa destas intervenções necessitam de avaliar um grande número de crianças para encontrar resultados significativos[31]. O uso da US na DDA deve ter em conta vários aspetos, incluindo os custos sociais de um programa de rastreio e os custos associados aos casos tardiamente diagnosticados. É recomendado que cada país avalie independentemente esta questão, uma vez que existem inúmeras variáveis significativas entre cada país[40].


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