Fratura coronal do osso ganchoso
INTRODUÇÃO
A fratura do osso ganchoso é uma lesão rara, correspondendo a 2-4% das fraturas
do carpo, sendo uma patologia pouco descrita na literatura[1]. Pode atingir o
corpo ou a apófise (sendo esta mais frequente). O ganchoso é um osso que ajuda
a promover a estabilidade dos 4º e 5º metacarpianos e qualquer alteração na sua
geometria pode resultar em artrose cárpica ou impotência funcional com perda de
mobilidade e de força de preensão[2].
A lesão coronal ocorre quando o 4º e 5º metacarpianos sofrem uma carga axial ou
subluxam posteriormente[1]. A imagem da radiologia cárpica convencional pode
ser obscura e pouco esclarecedora pois o fragmento ósseo não é facilmente
visível. O diagnóstico diferencial deve sempre incluir as fraturas/luxações do
piramidal ou de qualquer outro osso do carpo limítrofe. Outros critérios para
suspeitar desta lesão são a fratura da base do 4º metacarpiano com encurtamento
concomitante desse mesmo raio e uma disparidade evidente entre a clínica e os
exames de imagem obtidos. As lesões coronais normalmente apresentam
instabilidade e necessitam consequentemente de fixação interna[3]. A
radiografia do punho com 30º de pronação é a melhor incidência para
caracterizar a fratura, o seu desvio ou mesmo a luxação articular inerente[1, 4
- 6]. Em caso de dúvida ou para estudo e planeamento pré-cirúrgico a tomografia
axial computorizada deve ser realizada.
CASO CLÍNICO
Doente do sexo masculino, 26 anos de idade, empregado da construção civil. Sem
antecedentes médicos ou cirúrgicos e sem medicação habitual antes do
traumatismo. Deu entrada no Serviço de Urgência com história de traumatismo
axial do punho com três semanas de evolução tendo, na altura, sido imobilizado
no mesmo Serviço com tala de gesso antebraquipalmar com o punho em posição
neutra e flexão metacarpofalângica. Apresentava três semanas depois clínica de
dor mantida na região cubital do punho, diminuição da força de preensão e
compressão do nervo cubital.
Radiologia do punho (face e perfil): fratura da base do 4º metacarpiano (Figura
1). Pela manutenção das queixas foi requisitada uma Tomografia Axial
Computorizada que descreveu uma fratura coronal do osso ganchoso e da base do
4º metacarpiano (Figura_2).
Figura_1
Figura_2
O doente foi submetido a osteossíntese do ganchoso com dois parafusos e
libertação do canal de Guyon.
Na avaliação aos 4 meses após cirurgia o doente encontrava-se satisfeito com o
resultado obtido, sem dor local, um score DASH de 78 pontos, com força de
preensão mantida, sem clínica de compressão cubital, tendo retomado a sua
atividade profissional (Figura_3).
Figura_3
DISCUSSÃO
Este caso clínico está de acordo com os descritos na literatura, até no que diz
respeito ao atraso no diagnóstico. Como são lesões raras ou raramente
diagnosticadas, as referências bibliográficas não são muitas. Mesmo assim
encontra-se uma proposta de classificação por Cain et al[7]: tipo Ia -
luxação ou subluxação carpometacárpica sem fratura do ganchoso; tipo Ib -
igual à primeira com fratura/avulsão do osso ganchoso; tipo II - luxação
com fratura cominutiva da vertente dorsal do ganchoso; tipo III - luxação
com fratura coronal do ganchoso (equivalente ao caso descrito).
Quanto ao tratamento proposto estão descritas várias formas: conservador,
redução e fixação com fios de Kirschner, redução e osteossíntese com parafusos.
O tratamento conservador apresenta várias contraindicações com exceção do tipo
Ia, como sendo a necessidade de imobilização prolongada, a dificuldade evidente
de reavaliação com possibilidade de perda de redução e consequentemente maior
risco de instabilidade, pseudartrose e desenvolvimento de artrose pancárpica.
As lesões tipo II e III devem ser tratadas cirurgicamente, dependendo o método
de tratamento do timing cirúrgico, sendo possível a fixação, a osteossíntese ou
mesmo a artrodese carpo-metacárpica[8].
As descrições de atraso no diagnóstico vão de dias a meses[9]. A suspeita
diagnóstica deve sempre levar em conta o mecanismo lesional, a dor e
deformidade na região cubital do carpo, a instabilidade (difícil de avaliar), a
fratura concomitante da base do 4º metacarpiano e a dissociação clínico-
imagiológica. Uma referência ainda para as fraturas isoladas do ganchoso, tão
raras que se deve suspeitar da presença de um osso ganchoso bipartido, sendo
aconselhável obter imagens do punho contralateral.