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EuPTCVHe1646-69182014000300006

EuPTCVHe1646-69182014000300006

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1646-6918
ano2014
Issue0003
Article number00006

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Tratamento cirúrgico do hiperparatiroidismo primário não familiar

INTRODUÇÃO E OBJETIVO O hiperparatiroidismo primário (HPTP) carateriza-se pela hiperfunção de uma ou mais glândulas paratiróides resultando na secreção aumentada de hormona paratiroideia (PTH) e consequente hipercalcemia (1-3). É a causa mais comum de hipercalcemia 1, a segunda indicação mais frequente para a intervenção do cirurgião endócrino 4 e a terceira endocrinopatia mais frequente, afetando 0,2%-1% da população, sendo mais frequente em mulheres (relação 3:1) (5, 6). A incidência aumenta com a idade, atingindo o pico em mulheres dos 50-60anos (6).

Nas regiões de deficiência de vitamina D a incidência e morbilidade parecem ser superiores 2. Tem-se verificado o aumento da prevalência, sobretudo nos países desenvolvidos, provavelmente devido à introdução de rastreios bioquímicos de rotina com doseamento de cálcio, sendo a grande maioria dos doentes diagnosticados precocemente (3, 7-11). Existem três entidades patológicas no HPTP esporádico: adenoma único, 85-90% dos casos, hiperplasia ou adenoma multiglandular, 9-15% (duas glândulas em 2-12% dos casos, três glândulas em <1- 2% e quatro ou mais em <1-1,5%) e carcinoma em <1% 6, (12-14). Apenas 5% dos pacientes com doença multiglandular têm um síndrome familiar associado 15. A estratégia ideal para o diagnóstico e tratamento do HPTP, sobretudo em casos assintomáticos, tem sido discutida em conferências internacionais de HPTP (3, 16, 17). A mais recente realizou-se em 2008 e consistiu numa revisão das guidelinespreviamente estabelecidas (8, 14, 18-20). Neste evento, concluiu-se que os riscos de progressão da doença e desenvolvimento de complicações renais, cardiovasculares e neuropsiquiátricas do HPTP esporádico assintomático, fazem com que a cirurgia esteja indicada na maioria dos casos, desde que haja um diagnóstico bioquímico claro (14). A cirurgia representa a única forma de tratamento curativo, sendo um método seguro, custo-efetivo, com taxa de cura elevada e morbilidade peri-operatória reduzida (1, 3).

Pretende-se com este trabalho fazer uma revisão da abordagem cirúrgica do hiperparatiroidismo primário não familiar.

MATERIAL E MÉTODOS A pesquisa bibliográfica foi realizada em Dezembro de 2012 na base de dados onlineda PubMed (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/), utilizando a seguinte query: Primary Hyperparathyroidism /surgery (Major) OR Hyperparathyroidism, Primary/therapy (Major). A pesquisa foi limitada a artigos publicados nos últimos 5 anos, escritos em língua inglesa ou portuguesa. Desta pesquisa resultaram 286 artigos. Após leitura do título e do abstract foram selecionados 72 artigos. Foram definidos como critérios de inclusão estudos com dados apropriados sobre técnicas de localização pré-operatória, monitorização intra- operatória da PTH e tratamento cirúrgico do HPTP. Foram excluídos artigos que estivessem fora daqueles critérios (hiperparatiroidismo secundário e terciário, tratamento médico, HPTP normocalcémico, casos clínicos, recorrência/reoperação, grupos etários restritos, grávidas, neoplasia múltipla endócrina (MEN 1 e MEN2), HPTP familiar isolado (não MEN), patologia tiroideia concomitante ou com comorbilidades associadas como mieloma múltiplo). Foram revistos e incluídos artigos da Pubmedmais antigos quando referidos frequentemente, e, portanto, com impacto nas normas de orientação clínica.

CLÍNICA E DIAGNÓSTICO A apresentação clínica típica (que se verifica cada vez menos, mas não é demais referi-la pois ainda doentes que, apesar de a terem, não têm logo o diagnóstico) carateriza-se por alterações ósseas (osteoporose, dor óssea, fraturas osteoporóticas); renais (nefrolitíase, insuficiência renal); gastrointestinais (doença ulcerosa péptica, obstipação, pancreatite); neuromusculares (fraqueza e atrofia muscular); cardiovasculares (hipertensão arterial) e sintomas inespecíficos (fadiga, depressão, dor e queixas vagas) (3, 21, 22, 23, 24). Obnubilação mental profunda e coma são complicações raras mas graves de hipercalcemia severa (3).

Nos pacientes com manifestações clínicas sugestivas de HPTP deve ser doseado o cálcio sérico (3). O diagnóstico é confirmado pela demonstração de hipercalcemia persistente (ou níveis de cálcio sérico ou ionizado normais altos) na presença de níveis normais inapropriados ou elevados de PTH (3, 18, 19). Um doente com HPTP assintomático apresenta níveis séricos de PTH elevados em combinação com níveis séricos de cálcio normais ou elevados, após todas as causas de HPTP secundário terem sido excluídas (11). No contexto clínico adequado pode ter interesse o estudo genético (25).

EMBRIOLOGIA E ANATOMIA É fundamental a compreensão da embriologia e anatomia das glândulas paratiróides dada a complexidade anatómica e possibilidade de localização ectópica do tecido paratiroideu.

As glândulas paratiróides inferiores têm origem na bolsa faríngea e migram caudalmente juntamente com a glândula tiróide para se localizarem posteriormente ao seu pólo inferior. Podem ser encontradas no ligamento tiro- tímico, timo, tiróide, mediastino anterior e bainha carotídea. (1, 26, 27) As glândulas paratiróides superiores têm origem na bolsa faríngea e migram cefalicamente para se localizarem ao nível da cartilagem cricóide, postero- medialmente ao pólo superior da tiróide. Estas apresentam localização ectópica com menos frequência dado o seu percurso mais curto ao longo do desenvolvimento. Podem ser encontradas no espaço retro-faríngeo, retro- esofágico, traqueo-esofágico, tiróide e mediastino posterior. (1, 26, 27) Aproximadamente 2,5% a 22% dos indivíduos apresentam glândulas supranumerárias (28).

INDICAÇÕES CIRÚRGICAS A cirurgia representa a única possibilidade de tratamento curativo (3, 22, 23).

É segura e tem taxa de cura elevada e morbilidade reduzida (14). É a estratégia mais custo-efetiva tanto em casos sintomáticos como assintomáticos sendo, no geral, superior à observação e tratamento farmacológico (29-31). No entanto, alguns estudos sugerem ser igualmente seguro observar doentes assintomáticos durante vários anos, reservando a cirurgia apenas para quando surgirem sinais ou sintomas (2, 23). Num estudo randomizado Rao e col. (32) concluíram que após a cirurgia ocorre normalização dos níveis séricos de cálcio e PTH com consequente aumento da densidade de massa óssea e benefícios sociais e emocionais modestos. É claro que algumas destas divergências resultam do facto de não ser clara a distinção entre doentes sintomáticos e assintomáticos (muitas vezes após a cirurgia do HPTP verifica-se que afinal o doente era sintomático).

A demonstração do aumento da densidade óssea e normalização do metabolismo ósseo (22, 23, 33, 34), da redução de fraturas (35) e da formação de cálculos renais (23), da melhoria dos sintomas neurocognitivos (36-38) e psiquiátricos (39), juntamente com a eficácia e segurança das técnicas cirúrgicas, favorecem a paratireoidectomia no tratamento do HPTP assintomático. (1, 18, 40). Os benefícios da cirurgia a nível cardiovascular são mais evidentes em doentes com fatores de risco (7, 33, 41, 42), com melhoria significativa do perfil tensional em hipertensos (43, 44), melhoria da disfunção microvascular coronária (19), e resolução de algumas alterações ecocardiográficas (45).

Nos casos assintomáticos, indicação cirúrgica quando se verifica pelo menos um dos seguintes parâmetros: nível de cálcio sérico mais de 1mg/dl (>0,25mM/l) acima do limite superior do normal; taxa de filtração glomerular <60 ml/min; idade <50anos; T-score<-2,5 em qualquer local, incluindo o antebraço e/ou fratura patológica prévia, pois é factor de risco majorpara nova fratura. Por ser uma doença que cursa com clínica insidiosa e subjetiva com sintomas neurocognitivos e cardiovasculares, acredita-se que as guidelinessejam demasiado conservadoras, podendo deixar escapar casos que poderiam beneficiar de cirurgia (38, 44, 46). A Associação Americana de Endocrinologistas Clínicos e a Associação Americana de Cirurgiões Endócrinos 3 defendem que o tratamento cirúrgico deve ser considerado e recomendado em todos os pacientes assintomáticos com HPTP que tenham uma esperança de vida razoável e fatores de risco anestésico e cirúrgico aceitáveis. O tratamento médico com bifosfonatos, estrogénios e calcimiméticos, deve ser apenas considerado nos casos de alto risco (2, 18, 47).

TÉCNICAS DE LOCALIZAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA As técnicas de localização pré-operatória não têm papel no diagnóstico, sendo apenas úteis para localização anatómica de glândulas patológicas e auxiliares na escolha do tipo de cirurgia (14). Não uma técnica de localização perfeita sendo as mais usadas a ecografia cervical e a cintigrafia com sestamibi, que permitem a localização precisa de adenomas únicos na grande maioria dos casos (1, 14, 48). A sensibilidade da ecografia na deteção de adenoma único varia entre 72-89% (1, 13, 49). A cintigrafia é útil na deteção de adenomas pequenos e localizados posteriormente com sensibilidade na deteção de adenoma único que varia entre 80 e 95% (1, 13, 49, 50). A sensibilidade de ambos os métodos diminui na presença de doença multiglandular (1, 13). Estudos sem localização devem constituir um alerta para a possibilidade de doença multiglandular (51).

Está documentado que resultados da ecografia e cintigrafia com sestamibi concordantes aumentam a sensibilidade da localização para 94-99% (52, 53), apesar de haver concordância em apenas 50-60% dos casos (54). Atualmente, um consenso crescente de que ambas as técnicas devem ser realizadas dado o maior sucesso da paratiroidectomia quando os estudos são concordantes (55). Embora haja experiência na utilização apenas da ecografia com bons resultados (56, 57), nós preferimos efetuar a ecografia e a cintigrafia em todos os casos.

A ressonância magnética e a tomografia computorizada são importantes na identificação de doença ectópica no caso de persistência da doença após cirurgia (1,14). A angiografia e a cateterização venosa seletiva para doseamento de PTH são excecionalmente usados (14).

MONITORIZAÇÃO INTRA-OPERATÓRIA DA PTH A monitorização intra-operatória da PTH, que utilizamos sempre, é o método mais útil e mais usado pela maioria dos profissionais na confirmação da identificação correta das glândulas patológicas e eventual cura do HPTP (14, 59). Permitiu que a paratireoidectomia seletiva tenha taxas de cura comparáveis à exploração bilateral (> 97%) (60, 61). Os níveis de PTH pré-operatórios não permitem diferenciar um adenoma, da hiperplasia ou adenomas múltiplos, não ajudando a selecionar de forma fiável pacientes com adenoma único para cirurgia de abordagem seletiva (62). Dada a curta semi-vida da PTH (3-5min), o seu doseamento pré-operatório, pré-excisional e pós-excisional permite determinar o sucesso cirúrgico (1). De acordo com os critérios de Miami, o sucesso cirúrgico é definido pela diminuição de pelo menos 50% dos níveis de PTH relativamente ao valor mais elevado (pré-incisão/pré-excisão) 10 minutos após remoção de todas as glândulas anormais (54, 63, 64). Apesar de Kivela et al (65) terem concluído num estudo randomizado que o propofol não interfere com os valores da PTH, não havendo evidência para a sua evicção, Hong et al (66) sugerem que a colheita pré-operatória da PTH deve ser realizada antes da indução anestésica de forma a evitar elevações da PTH relacionadas com a anestesia. Pedimos sempre ao anestesista para não usar o propofol nos nossos doentes. A cura com normalização dos valores de PTH ocorre em 97% dos doentes (13,22).

No entanto, na presença de doença multiglandular, a cura verifica-se em menos casos e é mais difícil de estabelecer, com variação dos níveis de PTH que descem inicialmente, mas posteriormente podem subir (64). É por isso que se considera dois doseamentos pós excisionais fundamentais no diagnóstico intra- operatório de cura (67, 68, 69). Dada a elevada sensibilidade, quando os estudos (ecografia e cintigrafia) são concordantes, muitos cirurgiões recomendam uma abordagem seletiva sem necessidade de monitorização intra- operatória da PTH. Por outro lado, se o estudo pré-operatório não é esclarecedor ou concordante deve proceder-se ao doseamento intra-operatório da PTH (55, 59).

Nos pacientes em que não foi possível a localização pré-operatória, como não maior probabilidade de envolvimento de determinada glândula, está indicada a monitorização intra-operatória da PTH após identificação da ou das glândulas patológicas, o que pode evitar a exploração desnecessária das restantes (72, 73).

Em algumas circunstâncias (deficiência em vitamina D3) pode haver persistência de valores ligeiramente elevados de PTH com valores de cálcio normais, com normalização após a correção adequada e sem risco acrescido de recidiva do HPTP (61, 74, 75).

ESTRATÉGIA CIRÚRGICA , essencialmente, dois tipos de abordagem cirúrgica: a abordagem bilateral com identificação de todas as glândulas e a abordagem seletiva (apenas da ou das glândulas patológicas previamente identificadas). Esta última inclui a paratiroidectomia seletiva aberta e a paratiroidectomia endoscópica e vídeo- assistida (76). Estes procedimentos mais recentemente também se podem aplicar à exploração bilateral das paratiroides. As técnicas endoscópicas puras com abordagem axilar ou areolar, bem como a cirurgia robótica, são técnicas muito invasivas pois implicam uma disseção extensa (ficam portanto fora do que se designa por cirurgia mini-invasiva).

O tipo de abordagem depende do cirurgião, da sua experiência e das condições e meios disponíveis (77).

ABORDAGEM BILATERAL A taxa de cura elevada (> 95%-98%) e baixa taxa de complicações (<4%) (78, 79) faz da exploração bilateral o tratamento gold standard(1, 80, 81, 82,83). A exploração bilateral está indicada na presença de MEN, HPTP familiar isolado, terapia com lítio, irradiação da cabeça e do pescoço, carcinoma da paratiróide, localização pré-operatória de duas ou mais glândulas hiperfuncionantes, falha na localização pré-operatória, falha na verificação dos critérios de Miami, hiperparatiroidismo secundário ou terciário e patologia tiroideia concomitante (1, 22, 27). Os pacientes com HPTP e adenoma duplo são sujeitos a exérese completa das glândulas afetadas (27). Não necessidade de remover o timo cervical nos casos esporádicos (25). Em pacientes que tenham as quatro glândulas afetadas pode fazer-se paratireoidectomia total de 3 glândulas e subtotal da quarta, ou total de todas com auto-transplante (1, 15, 27). Na paratireoidectomia subtotal, uma pequena porção da glândula deverá ser enviada para análise anátomo-patológica para confirmação de tecido paratiroideu. Além disso, deve colher-se tecido paratiroideu para autotransplante ou criopreservação. após visualização das 4 glândulas é que se decide qual ou quais se devem ressecar, de acordo com o seu tamanho e viabilidade (15).

Habitualmente, é preferível conservar as glândulas inferiores pois no caso de recorrência, haverá menor risco de lesão das estruturas adjacentes, devendo ficar marcadas com sutura não reabsorvível ou clipe cirúrgico para identificação mais facilitada (15, 27). Se a viabilidade da glândula restante for questionável pode considerar-se a realização de autotransplante (da glândula ou parte, aparentemente mais normal) no músculo esternocleidomastoideu (casos esporádicos) ou no músculo braquioradial (casos familiares) (15).

Aquando da resseção subtotal, devem evitar-se danos na cápsula da glândula para evitar a implantação de tecido paratireoideu no local cirúrgico e possibilidade de paratiromatose subsequente (15). A colocação de clipe grande metálico ao longo da glândula pode minimizar o risco para a propagação e a remoção completa da/s glândula/s deve ser alcançada com dissecção suave e laqueação do pedículo vascular (15). Pode haver necessidade de exploração das regiões onde é mais comum a localização ectópica de glândulas (1, 22). Se mesmo após a exploração destas regiões não forem atingidos critérios de cura bioquímica, o procedimento é concluído sendo feita mais tarde nova exploração, depois de realizar SPECT com sestamibi, tomografia computorizada e/ou ressonância magnética que localizem a glândula alterada (1). Na presença de tecido ectópico no mediastino pode ser necessária a realização de timectomia, esternotomia parcial ou completa, toracoscopia vídeo-assistida, toracotomia ou paratiroidectomia mediastínica assistida por robot (1, 22).

ABORDAGEM SELETIVA A abordagem seletiva inclui duas categorias major: a paratiroidectomia seletiva aberta, e as técnicas endoscópica, vídeo-assistida e robótica (14, 49, 84, 85).

São contra-indicações para a sua realização situações em que está indicada exploração bilateral como história familiar de HPTP, síndromes familiares, bócio multinodular e terapia com lítio (4). Alguns autores recomendam a paratiroidectomia seletiva apenas em doentes com dois estudos de localização pré-operatória concordantes (77), o que é também a nossa prática optando pela técnica vídeo-assistida, ou seletiva aberta.

Paratiroidectomia seletiva aberta A paratiroidectomia seletiva tem atualmente taxas de sucesso elevadas dados os avanços nas técnicas de localização pré-operatória e nos meios intra- operatórios (1, 14, 60, 86).

As vantagens da paratiroidectomia seletiva aberta incluem: maior satisfação cosmética devido a incisões menores, menos dor pós-operatória, tempo da cirurgia e hospitalização reduzido, rápida recuperação pós-operatória, menor risco de lesão do nervo laríngeo recorrente, menor hipocalcemia pós-operatória e taxas de sucesso comparáveis com a abordagem bilateral (1, 55, 80, 86, 87, 88). A taxa de cura é de de 95%-98%, a taxa de complicações de 1 a 3%, a taxa de complicações sérias inferior a 1% e a lesão do nervo laríngeo recorrente de 0,8% dos casos, comparáveis à exploração bilateral (14, 21, 60, 88). Em cerca de 11% dos casos pode haver necessidade de fazer uma exploração bilateral (60).

A monitorização intra-operatória da PTH é utilizada regularmente por alguns cirurgiões, como nós, embora possa ser feita seletivamente com taxas de sucesso de 96% (53, 89, 90). Ou seja, em doentes com estudo de localização concordante em 2 métodos é lícito fazer a paratiroidectomia seletiva sem qualquer doseamento intra-operatório de PTH.

A paratiroidectomia seletiva aberta pode ser realizada com anestesia geral ou local. Dado que na maioria dos doentes a cura implica remoção de apenas uma glândula, muitos cirurgiões optam por anestesia local/ regional (14, 22). A incisão é de 2 a 5 cm dependendo do biótipo do doente e da localização da glândula, sendo desejável a resseção sem rotura da cápsula (1,14, 49).

Paratiroidectomia endoscópica e vídeo-assistida A paratiroidectomia endoscópica foi desenvolvida por Gagner e envolve a realização de pequenas incisões incluindo uma na incisura supra-esternal onde é inserido o endoscópio e insuflado CO2 a uma pressão de 10mmHg (91). Os músculos infra-hioideus são desviados lateralmente e a tiróide antero-medialmente permitindo a disseção e excisão do adenoma (1). Apresenta taxa de cura elevada, excelentes resultados cosméticos, melhoria da dor pós-operatória e menor necessidade de analgésicos (22). No entanto, para além de exigir uma longa curva de aprendizagem, as dificuldades até agora descritas incluem: rotura da cápsula da paratiróide, visualização limitada do nervo laríngeo recorrente, taquicardia, hipercapnia, acidose respiratória, enfisema subcutâneo e embolia gasosa (22).

A técnica vídeo-assistida desenvolvida por Miccoli consiste na realização de uma incisão transversal de 1,5cm-2cm na incisura supra-esternal (92). O espaço para trabalhar é criado através da retração dos músculos infra-hioideus lateralmente e do lobo tiroideu ipsilateral, sendo o adenoma identificado, dissecado e excisado. O sucesso da cirurgia também é avaliado pelo doseamento da PTH (critérios de Miami). No caso de persistir a elevação da PTH, a exploração unilateral ou bilateral pode ser realizada com esta técnica (1, 93).

Se a exploração unilateral vídeo-assistida falhar procede-se à exploração bilateral convencional (1). Apesar da paratiroidectomia vídeo-assistida permitir taxa de cura elevada (96-100%), tempo de cirurgia reduzido, menor dor pós-operatória e grande satisfação do paciente, requer a presença de mais dois assistentes e pode estar associada a uma longa curva de aprendizagem (94).

Ambas as técnicas possibilitam em geral uma boa visualização das estruturas anatómicas, por vezes limitada pelo tamanho da incisão sobretudo quando os adenomas possuem uma localização mais profunda (1, 95). Permitem a exploração mediastínica quando os adenomas têm localização ectópica (1).

A exploração bilateral vídeo-assistida do pescoço é segura e efetiva e não apresenta diferenças significativas no tempo de cirurgia comparativamente com a paratireoidectomia seletiva com monitorização de PTH intra-operatória, podendo assumir ainda papel relevante quando se pretende a realização deste procedimento minimamente invasivo sem os custos acrescidos que a monitorização da PTH implica (97, 98). Isto significa que estas técnicas permitem a abordagem bilateral considerada o gold standard,embora como se percebeu, a paratiroidectomia seletiva nos casos indicados tenha resultados semelhantes.

A técnica vídeo-assistida tem a vantagem de usar instrumentos convencionais e é relativamente mais fácil de aprender em relação às técnicas endoscópicas puras (95). Nos casos de adenoma em localização mais profunda ou posterior ao lobo tireoideu onde está intimamente ligado ao nervo laríngeo recorrente, a técnica endoscópica pode ter vantagens (95).

Estas técnicas têm o inconveniente de exigir treino, uma curva de aprendizagem lenta e necessidade de instrumentos específicos para a sua realização eficaz e segura (1).

CIRURGIA ROBÓTICA DO PESCOÇO A cirurgia robótica do pescoço é a opção mais recente na cirurgia da cabeça e do pescoço. Relativamente às técnicas de cirurgia minimamente invasiva, esta apresenta as vantagens de proporcionar um resultado cosmético melhor, sem cicatriz no pescoço, melhor visualização tridimensional ampliada e maior liberdade de movimento com instrumentos multiarticulados. No entanto, é uma técnica extensamente invasiva e com custos acrescidos (1).

COMPLICAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS Apesar de a cirurgia ser curativa na maioria dos casos de adenoma único, as principais causas de insucesso do tratamento cirúrgico (elevação dos níveis de cálcio e PTH durante os 6 meses após a cirurgia) são: localização ectópica das glândulas anormais, ou incapacidade do cirurgião em identificá-las, e doença multiglandular (86).

As complicações pós-operatórias são semelhantes nos diferentes tipos de abordagem (exploração bilateral e cirurgia seletiva, aberta ou mini-invasiva) e incluem: lesão do nervo laríngeo recorrente, hematoma e hipocalcemia pós- operatória (49).

Constituem fatores de risco para a hipocalcemia pós-operatória: exploração bilateral, cirurgia prévia do pescoço, tiroidectomia simultânea, peso do adenoma e nível de PTH pré-operatório elevado.(99) Um decréscimo superior a 85% na PTH está associado a um maior risco de hipocalcemia pós-operatória (100). Em centros experientes, as lesões do nervo laríngeo recorrente registaram-se em 0,99% e 0,77%, e a hipocalcemia em 0,49% e 0,10% dos pacientes submetidos a exploração bilateral e exploração seletiva respetivamente (achados estatisticamente não significativos).

CONCLUSÃO O HPTP é uma doença endócrina comum e é a principal causa de hipercalcemia na comunidade. Atualmente, o diagnóstico é feito, na grande maioria dos casos, numa fase assintomática, baseada no doseamento de cálcio. O objetivo do tratamento cirúrgico consiste na normalização dos níveis de PTH e consequentemente do cálcio, e reversibilidade dos sintomas, com a mínima morbilidade associada. A imagiologia da paratiróide não tem qualquer papel no diagnóstico, mas deve ser usada para localização pré-operatória da glândula ou glândulas hiperfuncionantes. A ecografia e a cintigrafia são as técnicas mais usadas. De uma forma geral, o doseamento intra-operatório da PTH é usado quando os estudos de localização pré-operatória são não concordantes ou não fazem qualquer localização, não apresentando qualquer benefício nos casos de concordância. O tratamento cirúrgico é o tratamento de escolha para todos os doentes sintomáticos e casos selecionados de doentes assintomáticos, havendo quem defenda que a cirurgia deve ser considerada em todos os doentes assintomáticos com uma esperança média de vida razoável e risco cirúrgico mínimo.

Sendo a maioria dos casos de HPTP causados por adenoma único, a exploração bilateral, durante muito tempo considerado o procedimento de escolha, tem vindo a ser substituída. Os avanços nas técnicas de localização pré-operatória e o doseamento intra-operatório rápido da PTH têm permitido a realização da exploração seletiva com resultados comparáveis. Tendo em conta os benefícios na duração da cirurgia, custo-efetividade e menor curva de aprendizagem do cirurgião, a paratireoidectomia seletiva aberta é o tratamento de escolha para o HPTP esporádico devido a adenoma único. A paratireoidectomia vídeo-assistida pode ter bons resultados na dor pós-operatória e a sua duração pode ser comparável à cirurgia minimamente invasiva aberta quando realizada por um cirurgião experiente. Desta forma, pode ser considerada em centros especializados com melhores recursos e pode ser a técnica ensinada à futura geração de cirurgiões.

Apesar dos avanços da tecnologia e a tendência em usar cada vez mais a cirurgia seletiva (aberta ou endoscópica ou vídeo-assistida), quem continue a acreditar que não nada que substitua a visualização das quatro glândulas, o que não implica fazer cirurgia aberta, pois pode ser feito por cirurgia endoscópica ou por cirurgia vídeo-assistida. A escolha da técnica deve ser feita caso a caso, baseada na experiência e disponibilidade de recursos do cirurgião e instituição.


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