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EuPTCVHe1646-706X2012000300002

EuPTCVHe1646-706X2012000300002

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1646-706X
ano2012
Issue0003
Article number00002

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Trombose venosa profunda e sua relação com trombofilias e neoplasias: estudo retrospectivo

INTRODUÇÃO A trombose venosa profunda (TVP) é uma patologia com uma elevada incidência e que acarreta uma elevada morbi-mortalidade. Para além da ocorrência frequente de síndrome pós-trombótico, poderá também levar à ocorrência de tromboembolismo pulmonar que, por sua vez, poderá ser fatal ou resultar em hipertensão pulmonar crónica.[1] [2] Trata-se de uma doença multifactorial, assentando a sua etiologia em factores genéticos, adquiridos e ambientais, e que, frequentemente, co-existem num mesmo indivíduo.[3] Por vezes, representam a primeira manifestação de outras doenças, nomeadamente trombofilias ou neoplasias. [4] São conhecidos numerosos factores de risco, nomeadamente a idade avançada, intervenção cirúrgica recente, traumatismo, imobilização prolongada, neoplasia, trombofilias, SAF, história de pacemaker ou catéter venoso central (CVC), gravidez, toma de contraceptivos orais, terapêutica hormonal de substituição, doença inflamatória intestinal, entre outros...[5, 6, 7] A TVP é, frequentemente, passível de ser prevenida, pelo que, dever-se-à, sempre que possível e justificado, apostar na sua profilaxia.[8] Tendo em conta a elevada morbi-mortalidade que acarreta, o seu diagnóstico precoce é também fundamental, assim como a determinação da sua etiologia por forma a prevenir eventos futuros e, como foi referido, para diagnosticar patologias que até então ainda não haviam sido reconhecidas.

Com a elaboração deste estudo retrospectivo, os autores tiveram como objectivo avaliar os resultados obtidos nos protocolos instituídos no seu Serviço para despiste de trombofilias e neoplasias em doentes com o diagnóstico de TVP. Isto para, por um lado, e dados os elevados custos que implicam, ter noção se se justifica a sua aplicação e, por outro, caso se justificasse a sua aplicação, rever quais os exames incluídos nesses protocolos que são efectivamente relevantes em termos clínicos.

MATERIAL E MÉTODOS Para a elaboração deste estudo retrospectivo procedeu-se à consulta dos processos hospitalares de todos os doentes com idade igual ou inferior a 50 anos, internados no Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular dos Hospitais da Universidade de Coimbra, entre 01 de Janeiro de 2006 e 31 de Dezembro de 2010, com o diagnóstico de TVP e, em seguida, analisaram-se, entre outras, variáveis epidemiológicas, factores de risco e os resultados obtidos através dos protocolos para despiste de trombofilias e de neoplasias.

Dos protocolos constava a realização dos seguintes estudos/exames: > Hemograma com Plaquetas > Tempos de Protrombina e de Cefalina Caolino > Fibrinogénio, PDF, Factor V, Factor VIII, Plasminogénio, Antitrombina III, Proteínas C e S > Velocidade de sedimentação > Anticorpos anti-fosfolipídicos > Anticorpos anti-citoplasmáticos e ANCA > Homocisteinémia > Crioglobulinémia > Factor Reumatóide > Risco trombótico Factor V Leiden Factor V H1299R Protrombina GA 20210 Factor XIII V34L Fibrinogénio beta G/A-455 PAI 4G/5G Glicoproteínas GP3A MTHFR C677T MTHFR A1298C ACE Ins/Del APO B R3500Q Apo E ' (alelos 2, 3 e 4) > Estudo do Complemento > Proteinograma Electroforético > Determinação do Grupo Sanguíneo > Bioquímica > Serologias (VIH, hepatites) > Radiografia torácica > Electrocardiograma > Ecografia (em situações mais específicas) > TAC (em situações mais específicas)

RESULTADOS De um total de 89 doentes, 64 (71,9%) eram do sexo feminino e 25 (28,1%) do masculino. A média de idades foi de 33,3 ±10,0 anos, sendo que a idade mínima foi de 15 anos.

| GRÁFICO 1 | Distribuição etária

Em termos de localização da TVP, verificou-se um claro predomínio a nível ílio- femoral esquerdo.

| GRÁFICO 2 | Localização da TVP. MS esq ' membro superior esquerdo; MS dto ' membro superior direito; VCI ' veia cava inferior

Relativamente a factores de risco, 78,7% dos doentes apresentavam, pelo menos, um factor de risco, sendo que o mais prevalente foi a toma de contraceptivos orais, seguindo-se o consumo de tabaco. 14,6% dos doentes haviam tido, pelo menos, um episódio prévio de trombose venosa profunda e esse havia sido, na maioria dos casos, no mesmo membro. De salientar também que sete doentes (7,9%) apresentavam história familiar positiva para TVP/TEP e dois (2,2%) tinham pais consanguíneos.

| GRÁFICO 3 | Factores de risco. CVC ' catéter venoso central

No que diz respeito ao tratamento, apenas uma doente não foi submetida a heparinoterapia ab initium (heparina de baixo peso molecular ou heparina não fraccionada) durante o internamento por história recente de cesariana complicada por volumoso hematoma retroperitoneal, tendo-lhe sido colocado um filtro temporário na veia cava inferior. Em nove doentes (10,1%) foi também realizada fibrinólise sistémica com alteplase e numa doente efectuada trombectomia venosa. Setenta e um doentes (79,8%) tiveram alta com indicação para manter anticoagulação oral e a totalidade indicação para manter contenção elástica.

Durante o internamento foram diagnosticados cinco tromboembolismos pulmonares (5,6% dos doentes), um deles com necessidade de realização de fibrinólise.

O protocolo de despiste de trombofilias e de neoplasias foi realizado em 65 doentes (73,0%).

Após revisão de bibliografia actualmente disponível acerca de trombofilias considerou-se que nem todos os estudos realizados no nosso Serviço teriam relevância em termos clínicos, pelo que se consideraram como relevantes apenas os seguintes factores: [3,9-24] > Factor V de Leiden > Protrombina G20210A > PAI 4G/5G (apenas quando em homozigotia e em associação a outro factor) > Deficiência de antitrombina III > Deficiência de proteína C > Deficiência de proteína S > Aumento do factor VIII > Hiper-homocisteinémia > Anticoagulante lúpico > Anticorpos anti-cardiolipinas > Anticorpos anti-ß2-glicoproteína-1 Posto isto, verificou-se que a alteração mais prevalente na nossa população de doentes foi o aumento do factor VIII, seguido da heterozigotia para o factor V de Leiden.

| GRÁFICO 4 | Resultados

Para além das trombofilias congénitas e dos casos de SAF, foram também diagnosticados um caso de gamapatia monoclonal, um de neoplasia do pulmão e outro de cordoma do sacro.

Em resumo, dos 65 doentes a quem foram aplicados os protocolos, em 41 (63,1%) identificou-se uma trombofilia congénita, dois casos de SAF, um de gamapatia monoclonal, um de neoplasia do pulmão e outro de cordoma do sacro. Apenas em 19 doentes (29,2%) não se identificou nenhuma trombofilia congénita, SAF ou neoplasia.

Em termos de orientação ulterior, o doente a quem se diagnosticou a neoplasia do pulmão foi orientado para Consulta de Pneumologia, o doente do cordoma do sacro para Consulta de Ortopedia e dos restantes doentes, 49 (75,4%) foram orientados para a Consulta de Hematologia. Dos doentes orientados para esta última consulta, 40 (81,6%) tiveram indicação para fazer anticoagulação oral por um período igual ou superior a 12 meses.

DISCUSSÃO No nosso estudo observou-se um predomínio de doentes do sexo feminino (71,9%) provavelmente porque na faixa etária estudada (doentes com idade igual ou inferior a 50 anos), as mulheres apresentam factores de risco que são exclusivos do género feminino, ie. a toma de contraceptivos orais e a gravidez.

[25] Em termos de critérios de internamento, foram internados no nosso Serviço todos os doentes com TVPs proximais cuja área de residência pertencia aos então Hospitais da Universidade de Coimbra. Casos de TVPs mais distais, menos graves e, quando assegurado o devido acompanhamento, efectuaram o tratamento em ambulatório. Por este motivo, se justifica que a localização mais frequente da TVP tenha sido a nível ílio-femoral. Dentro das TVPs ílio-femorais, 79,5% destas envolveram o membro inferior esquerdo, o que está de acordo com a literatura onde tem sido descrito que estas são cinco vezes mais frequentes à esquerda do que à direita e que tal se relaciona com a compressão da veia ilíaca esquerda pelas artérias ilíaca direita e quinta lombar. [26] Uma elevada percentagem dos doentes (78,7%) apresentava, pelo menos, um factor de risco e em 14,6% havia história de, pelo menos, um episódio prévio de TVP, o que reforça a necessidade de apostar nas prevenções primária e secundária desta entidade que acarreta uma elevada morbi-morbilidade.

Durante o internamento foram diagnosticados cinco tromboembolismos pulmonares, os quais provavelmente terão ocorrido sob terapêutica anticoagulante/ fibrinolítica instituída.

Constatou-se que se realizaram estudos que, à luz dos dados actualmente disponíveis na literatura, não têm relevância clínica, o que acarretou custos desnessários e levou a que, após a elaboração deste estudo, se alterassem os protocolos.

Embora na literatura venha descrito que a trombofilia congénita mais prevalente na raça branca é a mutação do factor V de Leiden, no nosso estudo esta ocupou a segunda posição, precedida pelo aumento dos níveis plasmáticos do factor VIII.

Dos doentes a quem foram aplicados os protocolos, apenas em 29,2% não se identificou nenhuma trombofilia congénita, SAF ou neoplasia. De salientar, mais uma vez, a elevada percentagem de trombofilias congénitas (63,1%), assim como a identificação de dois casos (3,1%) de SAF, um (1,5%) de gamapatia monoclonal, um (1,5%) de neoplasia do pulmão e outro (1,5%) de cordoma do sacro.

Dos doentes estudados, 75,4% foram orientados para a Consulta de Hematologia, sendo que 81,6% deles tiveram indicação para fazer anticoagulação oral por um período igual ou superior a 12 meses e, em alguns casos, foram também convocados os familiares de doentes para realização de estudos para despiste de trombofilias.

CONCLUSÕES Tendo em conta a elevada prevalência de polimorfismos genéticos que conferem risco trombótico acrescido e os não raros casos de SAF e de neoplasias ocultas presentes nesta população de doentes, considera-se que, apesar dos elevados custos, se deverá continuar a fazer o despiste deste tipo de patologias. No entanto, os protocolos deverão ser actualizados periodicamente por forma a evitar custos desnecessários.


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