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EuPTCVHe1646-706X2014000200008

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variedadeEu
ano2014
fonteScielo

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Ruptura: Apresentação invulgar de aneurisma popliteu

Introdução O aneurisma popliteu surge particularmente em homens, de idade superior a 60 anos1, com múltiplos factores de risco ateroscleróticos, nomeadamente, a hipertensão arterial e o tabagismo. É o aneurisma periférico mais frequente e pode surgir em associação com aneurismas em outra localização, nomeadamente na artéria poplíteia contra-lateral (64%)2.

Apesar de 40% serem assintomáticos, a isquémia aguda ou crónica do membro inferior por trombose ou embolização distal e a clínica de compressão de estruturas nobres do escavado popliteu, são as formas de apresentação mais comuns3. A ruptura é extremamente rara (cerca de 2%) e pode associar-se a perda de membro (em média 27% revisão de séries)3,4.

Caso clínico Homem de 66 anos, fumador, hipertenso, com insuficiência renal crónica (estadio 4), cardiopatia isquémica e disrítmia, sob anti-coagulação em ambulatório com varfarina. Foi admitido num Hospital Distrital por quadro de instalação súbita de dor, edema e extensa equimose da coxa esquerda.

Apesar de hemodinamicamente estável apresentava anemia grave (Hb 6,5 g/dL), creatinémia de 7,6 mg/dL e INR de 2,8. Permaneceu internado com o diagnóstico de hematoma espontâneo da coxa (no contexto de anti-coagulação) e agudização da função renal, sob terapêutica médica e suporte transfusional. Por agravamento sintomático do membro foi transferido ao dia para o Serviço de Urgência do Centro Hospitalar Lisboa Norte para avaliação por Cirurgia Vascular.

Objectivamente apresentava extensa sufusão hemorrágica, associada a volumosa massa pulsátil dolorosa no terço distal da coxa e escavado popliteu esquerdos, com parésia do (fig._1). Apesar da ausência de pulsos distais, não apresentava clínica de isquémia aguda do membro, atribuindo-se o deficit neurológico do ao efeito compressivo do hematoma sobre o nervo ciático popliteu externo.

A avaliação por ecoDoppler mostrou ruptura de aneurisma popliteu supra- genicular esquerdo com 7 cm de diâmetro (fig._2), permeabilidade da artéria popliteia distal, trifurcação e segmentos proximais das artérias tibiais. A necessidade de cirurgia urgente, a insuficiência renal crónica em estadio avançado e a possibilidade de planear a revascularização com o estudo por ecoDopplerdescrito, suportaram a decisão de intervir sem outros exames complementares, nomeadamente, com contraste endovenoso, como a angioTC.

Abordou-se por via interna a artéria popliteia desde o canal de Hunter até à sua trifurcação, com secção dos músculos e tendões da face interna do joelho.

Após clampagem proximal e distal, respectivamente, das artérias femoral superficial e popliteia infra-genicular (fig._3), procedeu-se a drenagem do extenso hematoma, abertura do saco aneurismático, endoaneurismorrafia proximal (artéria femoral superficial) e distal (artéria poplíteia supra-genicular) com identificação e laqueação complementar dos ramos colaterais (figs._4, fig._5 e 6).

Realizou-se reconstrução vascular por bypassfemoral superficial-popliteia infra-genicular com veia safena interna contra-lateral invertida com laqueação complementar da artéria popliteia infra-genicular justa-anastomótica (fig._7).

A angiografia de controlo intra-operatória mostrou exclusão aneurismática, ausência de defeitos anastomóticos e compromisso do sector crural por provável embolização distal assintomática prévia (fig._8).

Durante o pós-operatório o estudo complementar mostrou aneurisma popliteu supra-genicular contra-lateral e aneurisma da aorta abdominal, respectivamente, de 1,7 e 4 cm de diâmetro.

Aos três meses de follow-up o doente deambula autonomamente, apesar de deficit neurológico residual do esquerdo, mostrando o estudo por ecoDoppler a revascularização permeável e sem complicações (fig._9).

Discussão O aneurisma popliteu é o aneurisma periférico mais frequente, manifestando-se classicamente por sintomas de isquémia (aguda ou crónica) ou decorrentes do efeito compressivo de estruturas do escavado popliteu (nervosas ou venosas)2,3.

A embolização distal de conteúdo trombótico do saco aneurismático ou a sua trombose são as complicações mais conhecidas. A presença destas pode acarretar risco de perda de membro e comprometer o resultado dos procedimentos de revascularização, pelo que alguns autores defendem uma atitude de intervenção precoce electiva nos aneurismas assintomáticos2,5.

Ilig concluiu, após análise de 16 séries com 1910 aneurismas, que a ruptura é uma manifestação muito invulgar, com uma incidência estimada de 2,1% (40/1910).

Apesar da incidência das complicações previamente descritas manterem-se constantes nas últimas séries, a ruptura tem tendencialmente diminuído (11% antes de 1970 e 1% depois de 1980)4. O declínio observado deve-se provavelmente ao aumento do diagnóstico e tratamento de aneurismas assintomáticos associado à generalização do estudo arterial por ecoDoppler.

O quadro clínico de ruptura depende da sua localização e dimensão. A apresentação mais comum é a de tumefacção dolorosa no escavado popliteu, associada a sufusão hemorrágica ou hematoma. O efeito compressivo do hematoma sobre a veia popliteia pode causar edema do membro e trombose venosa profunda4.

A neuropatia compressiva do nervo ciático ou dos seus ramos pode resultar em parésia do , como apresentava o doente deste caso clínico (fig._1)6. A formação de fístula arterio-venosa por ruptura aneurismática para a veia poplíteia está também descrita7.

A ruptura pode exigir tratamento emergente, quando associada a isquémia aguda grave do membro ou a choque hipovolémico causado pela hemorragia grave. Este último é minimizado pela capacidade de contenção da hemorragia pelo compartimento músculo-tendinoso popliteu.

O diagnóstico pode ser confirmado por ecoDoppler, TC, Ressonância Magnética ou angiografia convencional/ subtracção. O ecoDopplercontribui para o diagnóstico diferencial de forma célere e não invasiva. O exame de eleição provavelmente será a angioTC4, detectando a presença do aneurisma/hematoma, suas relações com as estruturas vizinhas e possibilitando, através do estudo arterial proximal ao aneurisma e do run off,o planeamento da estratégia cirúrgica. Actualmente a angiografia convencional/subtracção tem um papel mais limitado e pode contribuir para os casos em que é necessário óptima apreciação do run off para selecionar um targetdistal para bypass no sector crural ou nas artérias do , além da sua utilização intra-operatória no controlo após revascularização.

O tratamento cirúrgico mais comum é a abordagem por via interna da artéria poplíteia, laqueação proximal e distal do aneurisma e revascularização através de bypasscom veia safena interna. O controlo proximal pode ser efectuado por clampagem directa ou utilização de técnica de torniquete3. O saco aneurismático deve ser aberto, permitindo a laqueação selectiva de colaterais prevenindo o back flow bleeding.

Com a utilização crescente de técnicas endovasculares no tratamento dos aneurismas popliteus electivos, têm sido descritos casos de sucesso, em doentes selecionados com ruptura e alto risco operatório, através de implantação de stentscobertos (Hemobahn/Viabahn®W. L. Gore and Associates, Flagstaff, AZ, USA)7,8.

Os resultados precoces e tardios da revascularização convencional em contexto de ruptura são pouco conhecidos, mercê da raridade desta entidade clínica, mas provavelmente serão inferiores aos obtidos no tratamento de aneurismas popliteus assintomáticos4,5.

Conclusão A ruptura de aneurisma popliteu é uma forma de apresentação extremamente rara e pouco descrita na literatura.

Ao mimetizar diagnósticos alternativos (trombose venosa profunda, hemartrose, entre outros), é necessário um elevado índice de suspeição clínica, assumindo o ecoDopplerum papel importante na confirmação diagnóstica.

A intervenção vascular é mandatória para controlo da hemorragia, revascularização e descompressão compartimental.


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