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EuPTCVHe1647-21602014000100006

EuPTCVHe1647-21602014000100006

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1647-2160
ano2014
Issue0001
Article number00006

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Quedas em idosos com perturbações mentais residentes em unidade de saúde de longa duração

Introdução A população europeia envelhece e embora não sendo uniformemente, o índice de envelhecimento na União Europeia (27 países), em 2011 o valor médio foi de 113, variando entre 154,9 (Alemanha) a 54,6 (Islândia) segundo os indicadores de 2011 (Pordata, 2013).

A maior longevidade predispõe à morbilidade, coexistindo várias entidades numa pessoa: a pluripatologia. De entre as situações, destacam-se as doenças do foro mental, as cárdio cérebro vasculares, as oncológicas, as articulares doenças crónicas e incapacitantes que obrigam à polimedicação, estratégia não isenta de riscos. As repercussões da restrição da mobilidade e da dependência física e mental inauguram o ciclo da fragilidade, sendo que essas pessoas ficam mais sujeitas a episódios de queda não intencional (Gilbert et al., 2012).

A prevalência de queda varia entre os países, assumindo valores de 28% a 35% nos indivíduos com mais de 65 anos e valores entre 32% a 42% nos que têm mais de 70 anos (WHO, 2007). Nos grupos que vivem em residências de longo termo, a prevalência vai de 30% a 50%. No entanto, muitas vezes a incidência de queda é avaliada a partir da assistência hospitalar e negligenciada nas outras situações (Gilbert et al., 2012) seja por falta de controlo institucional seja porque os idosos não a reportam por esquecimento. autores que apontam a maior incidência nas mulheres (Morris, 2007) mas outros nos homens por causa da maior co morbilidade (WHO, 2007). A causa é multifatorial, com fatores intrínsecos ou extrínsecos que atuam sinergicamente ou, como na classificação da Organização Mundial de Saúde (WHO, 2007), fatores biológicos (idade, sexo, doenças crónicas, declínio nas capacidades física, cognitiva e afetiva); comportamentais (polimedicação, falta de exercício, calçado inadequado e abuso de álcool); ambientais (edifícios em mau estado; pisos e escadas irregulares; falta de varões de apoio, e iluminação deficiente) e socioeconómicos (baixo rendimento; más condições habitacionais; falta de interação social, acesso limitado aos serviços de saúde e sociais, precários recursos da comunidade). A limitação física e a necessidade de consumir medicação psicotrópica elevam o risco de queda (Carter, Kannus & Khan, 2001; Chan et al., 2013; Lavsa et al., 2010; Quach, Yang, Berry & Newton, 2013) e levam à repetição das mesmas. As pessoas com alterações cognitivas (Pitkälä, Savikko, Poysti, Strandberg, Laakkonen, Marja-Liisa, 2013), de balanço corporal e do equilíbrio têm o risco acrescido (Chen, Van Nguyen, Shen & Chan, 2011) que ganha expressão no pior desempenho das AVDs. A marcha lentificada também se associa às quedas. Num estudo sobre fatores de risco de queda em doentes psiquiátricos com grupo de controlo, Chan e outros (2013) verificaram diferenças estatisticamente significativas nos grupos, sendo pior nos: mais idosos; nos com co morbilidade, nos desorientados, nos com alterações de consciência e com restrição da mobilidade. Acresce-se o que Lavsa e outros constataram de que a polimedicação era um fator de risco embora não a idade, o sexo e a doença (Lavsa et al., 2010).

As consequências das quedas verificam-se a nível físico, emocional e funcional, podendo levar à morte, mas também têm elevado peso socioeconómico (Gilbert et al., 2012; WHO, 2007) e altos custos assistenciais (Gama, Conesa e Ferreira, 2008; Gates, Fisher, Cooke, Carter & Lamb, 2008) pelo que se repercute na qualidade de vida. Por isso, impõe-se a prevenção de quedas como melhor estratégia (Moyer, 2012) com abordagem multifatorial e multidisciplinar, com avaliação regular e sistemática que inclua o trabalho postural estático e dinâmico, o reforço muscular adaptado a cada pessoa, o ensino e orientação sobre técnicas de segurança e estilos de vida e a mobilização dos fatores ambientais e socioeconómicos (Gilbertet al., 2012) No entanto, ser mais vulnerável e viver numa instituição obriga a que se organize o trabalho daqueles que cuidam, de modo a proporcionar contactos de qualidade na área afetiva e da socialização (Mallidou, Cummings, Schalm & Estabrooks, 2013; Beauchet, Dubost, Revel-delhom, Berrut & Belmin, 2010), suavizando a intervenção instrumental. O enquadramento apresentado justifica que se queira conhecer os fatores associados ao risco de queda assim como determinar a sua prevalência nas pessoas institucionalizadas com alterações mentais.

Metodologia População São 80 pessoas idosas com perturbação mental (universo/amostra), residentes numa USLD de um hospital do Centro de França. É um estudo transversal, descritivo e correlacional.

Instrumento de colheita de dados Seguiu-se um guião composto por ficha com dados sociodemográficos; Escala Aggir para a dependência/ independência; avaliação do estado mental (atenção, coerência; comportamento adequado, orientação espacial e temporal); presença de doença; número de medicamentos; ocorrência de queda e instituição de medidas de segurança. A variável em estudo é a prevalência de queda das pessoas idosas com perturbação mental, verificada através do registo escrito do acontecimento. A grelha Aggir (autonomie, gérontológique, groupes iso-ressources) (Robbins, 2008) avalia as capacidades da pessoa idosa na realização das atividades físicas, mentais, domésticas e sociais. A pontuação obtida classifica a dependência em 6 grupos a que corresponde um determinado nível de cuidados para satisfazer os atos essenciais da vida quotidiana. Os graus de dependência do Aggir vão de 1 a 6, ou seja, do pior nível para a independência (6).

Procedimentos Os dados foram colhidos seguindo o guião, por enfermeiros previamente preparados. O estudo decorreu no ano de 2012 e não foram alteradas as rotinas diárias de prestação de cuidados. Respeitaram-se os princípios éticos que norteiam a investigação com pessoas.

O tratamento estatístico é descritivo e correlacional com modelos de análise categórica (Pestana e Gageiro, 2009; Pestana e Gageiro, 2008).

Resultados É uma população envelhecida onde a maioria é: mulher 76,3%; viúva 62,5%. A média de idade é 83,05 anos e 50% tem entre 76 e 90,5 anos. A prevalência das quedas é 25% e não varia nem com a idade nem com o sexo. Os quadros ilustram os resultados. Apesar do risco de queda ser 7% maior nas mulheres, as diferenças não são estatisticamente significativas, para o sexo nem para estado civil. Em relação à antiga atividade profissional, a maioria foi doméstica e os menos representados foram agricultores. As quedas variam significativamente com as profissões e com o sexo. Conforme teste Rácio da Verosimilhança (LR): quem menos cai são os homens que outrora pertenceram aos quadros técnicos e os que fizeram parte dos agricultores. Quem mais cai são as mulheres domésticas (Quadro_nº_1).

Quanto ao número de medicamentos prescritos e os episódios de queda verifica-se com uma confiança de 95% que os residentes têm uma média de 7,5 a 9,2 medicamentos prescritos. Observa-se que os residentes que têm mais episódios de queda tomam em média menos 0,6 medicamentos do que os que não caem, embora essa diferença não seja estatisticamente significativa. Esta conclusão é igual para ambos os sexos.

Sobre as doenças psicológicas, psiquiátricas e neurológicas de que padecem verifica-se que a maioria não tem doença psicológica nem psiquiátrica (82,5%) embora haja 17,5% que sugere a sua presença nos registos clínicos. Na influência da doença psiquiátrica nos episódios de queda, encontram-se diferenças, sendo que quem tem a doença tem um risco de cair 1,69 vezes superior. A distribuição das doenças neurológicas indica que 45% (Mantel Haenszel Common odds ratio, (p=0.052) é afetada por este tipo de doenças e que as mulheres com este diagnóstico têm o risco de cair 1,3 vezes mais (Quadro_nº 2)

Na análise do estado mental (atenção, coerência do discurso, adequação do comportamento, orientação espacial e temporal) constata-se que a maioria, 47,5%, tem atenção captável e que a atenção varia na razão inversa das quedas.

Os que têm atenção não captável, 22,5%, caem 4,2 vezes mais do que aqueles cuja atenção se pode captar e 1,27 vezes mais do que aqueles que por alguns momentos conseguimos a sua atenção (30%). E aqueles cuja atenção se pode captar por alguns momentos caem 3,3 vezes mais do que aqueles cuja atenção está preservada na plenitude.

A maioria dos residentes, 52,5%, não tem um discurso coerente e existe forte associação com as quedas. Aqueles que têm sempre coerência do discurso, 32,5%, ou que têm pelo menos alguma coerência, 15%, são os que têm menor número de quedas, não se distinguindo entre si. Apenas os que não têm coerência do discurso, 52,5%, têm um risco de queda 7,4 vezes superiores aos restantes.

no que se refere à adequação de comportamento, a maioria dos residentes, 48,8%, não o tem e existe forte associação entre o comportamento desadequado e os episódios de queda. Apenas os que têm comportamento desadequado, 48,8%, têm um risco de queda 7,8 vezes superior aos restantes. Os que têm sempre comportamento adequado, 33,8%, ou pelo menos algumas vezes adequado, 17,5%, são os que têm menor número de quedas, não se distinguindo entre si.

Em relação à orientação espacial, a maioria, 52%, tem desorientação, sendo que se associa fortemente com as quedas. Os que não estão orientados espacialmente, 52%, têm um risco de cair 4,8 vezes superior aos restantes e, aqueles que têm sempre, 43,8%, ou têm pelo menos algumas vezes orientação em relação ao espaço, 3,8%, são aqueles que têm menos número de quedas, não se distinguindo entre si.

O mesmo se passa com a variável orientação temporal em que a maioria, 53,8%, não está orientada. A associação é forte entre a orientação temporal e as quedas. Os que não têm orientação temporal, 53,8%, têm um risco de queda 6,5 vezes superior aos outros. Quem tem sempre orientação temporal, 53,8%, ou tem alguma vez ,16,3% são os que caem menos, não se distinguindo entre si.

Assim, em relação ao estado mental observa-se que a orientação preservada, a coerência do discurso, o comportamento adequado a orientação espacial e temporal estão menos associados ao risco de cair do que os seus opostos (Quadro nº_3).

As doenças existem, embora com baixa prevalência, realçando-se as cardiovasculares, metabólicas e músculo-esqueléticas, embora não tenham influência nas quedas.

O grau de dependência prediz o risco de queda, sendo que a escala Aggir sugere que todas as variáveis que a compõem são entendidas como medindo o mesmo conceito, conforme consistência interna de alfa de Cronbach =0,937. As oito variáveis podem ser resumidas com qualidade num único índice que explica 70,9% da informação dessas variáveis que a integram. Embora se observem dois comportamentos: quem menos cai (os mais autónomos) são os que têm valores mais elevados nas dimensões do vestir, deslocar-se ao exterior e eliminação urinária. Quem mais cai (os menos autónomos) são os que têm valores mais baixos nas dimensões de comer e de deslocar-se no interior. Estas diferenças não são significativas nem com as quedas nem com o sexo.

Em relação aos aspetos instrumentais, verifica-se que a maioria (80%) não se serve de um alimento ou da travessa na mesa e que quem não se serve tem um risco de cair 1,27 vezes superior ao dos que são capazes de fazê-lo, qualquer que seja o sexo.

Embora a USLD não avalie o risco para a primeira queda, a maioria dos residentes tem medidas acrescidas de proteção das quedas depois de ter tido o primeiro episódio. Verifica-se que quem tem medidas de segurança tem 1,24 mais quedas registadas do que os que não têm essas medidas, sejam homens ou mulheres.

Discussão A população é muito idosa e a maioria dependente e com perturbação mental.

Estas características, associadas ao tipo de residência, atestam a sua fragilidade e vulnerabilidade para cair. As doenças crónicas de evolução lenta estão presentes com maiores registos na doença neurológica, em aproximadamente metade da população e nas psiquiátricas e psicológicas em número inferior. As situações têm relação com as alterações mostradas na coerência do discurso, no comportamento e na orientação temporo espacial, sendo menos frequente a perturbação da atenção. As variações ao nível da atenção normalmente estão associadas a condições cerebrais patológicas que têm implicações na consciência de si, interferindo no modo de perceber a realidade e de poder agir sobre ela com consciência e cidadania. Tais condições são comuns nas doenças cerebrovasculares e têm grande implicação na aprendizagem e na velocidade de processamento da informação.

Verifica-se no presente estudo um elevado consumo de medicamentos tal como verificado por outros autores. Contudo, ao contrário do que seria de esperar, quem cai mais toma menos medicamentos embora a diferença não seja significativa. Pode acontecer que quem toma menos medicação se mobilize mais e esse seja o risco associado, o que vai de encontro ao que Carter e colaboradores referem quando afirmam que a limitação física associada à medicação psicotrópica eleva o risco de queda (Carter, et al2001). Acresce-se que o tipo de medicação, psicotrópicos, cardiotónicos e analgésicos estão associados a quedas e neste estudo o consumo médio de medicação é elevado, ultrapassando as médias sugeridas noutros estudos (8,8).

 A prevalência de queda é elevada (25%) e embora abaixo dos valores propostos pela OMS (WHO, 2007), pode estar-se face a uma situação de subnotificação, apontada por diversos autores (Gilbert, et al, 2012).

 As mulheres têm apresentado, noutros estudos, mais elevada prevalência de queda (Morris, 2007); neste, não se encontrou a diferença, embora os homens que foram quadros técnicos ou agricultores tenham risco menor de cair. Os fatores de risco comportamentais mostram-se nas funções cognitivas deficitárias, que podem acompanhar as doenças cerebrovasculares e afetar todas as áreas do comportamento, inclusive, diretamente, o funcionamento cognitivo, o que compromete as estratégias de aproximação, planeamento, desenvolvimento de atividades cognitivas entre outras, situação verificada neste estudo (Nagamatsu, Munkacsy, Liu-Ambrose & Handy, 2013). A vida social fica alterada quando compromisso das funções executivas predispondo ao isolamento social. Constata-se o papel fundamental destas funções no risco de queda e a fornecerem evidência de que lesões do hemisfério direito podem potenciar aquele risco (Nagamatsu et al., 2013). O declínio da capacidade mental, nas diferentes dimensões, tem subjacentes as patologias referidas e presentes em maioria nesta investigação.

O padrão de fatores de risco sugere uma complexa interação de fatores pessoais e comportamentais nas quedas dos idosos com doenças mentais, sendo que são recomendadas pesquisas sobre o desenvolvimento de procedimentos de triagem multifatoriais e intervenções adaptadas individualmente para evitar a queda (Enkelaar, Smulders, van Schrojenstein Lantman-de Valk, Weerdesteyn & Geurts, 2013). No mesmo sentido aponta Chen, o que se partilha, de que a monitorização do risco é uma estratégia proativa em vez de reativa, ainda mais adequada quando estudos que associam o aumento do risco para a queda às dificuldades nas capacidades física e mental (Chen et al., 2011).

Conhece-se a poderosa associação entre a incapacidade funcional e a mortalidade (Idland, Pettersen, Avlund & Bergland, 2013) e neste estudo o grau de dependência prediz o risco de queda. um padrão hierárquico de declínio e quem menos cai são os mais autónomos em atividades que exigem mais potencial e o contrário também se verifica, isto é, os que caem mais têm mais limitações nas atividades menos complexas. Assim, identifica-se um padrão hierárquico de deterioração funcional (Idland, et al., 2013) e reconhece-se que aqueles que ainda têm energia para uma caminhada, ainda que lentificada, estão em menor risco, retardando em certa medida o círculo vicioso da redução da atividade física, perda da função física e início da incapacidade.

Limitações do Estudo A avaliação dos fatores de risco é limitada pelo que seria útil abranger os fatores socioeconómicos e ambientais e medir de modo mais compreensivo o risco de queda, incluindo o equilíbrio e a força. Apurar a medicação consumida permitirá prever fatores específicos relacionados com os consumos farmacológicos.

Conclusão Os idosos com perturbação mental têm elevada prevalência de quedas e os fatores de risco são múltiplos, requerendo abordagens complexas e multidimensionais na prevenção.

Implicações para a Prática Estabelecer programas de monitorização do risco de queda e controlar os fatores, tem forte implicação para a prática, pode minorar os custos pessoais e em geral da sociedade com reflexo na qualidade de vida das pessoas mais velhas e institucionalizadas.


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