Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

EuPTCVHe2182-51732013000100010

EuPTCVHe2182-51732013000100010

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN2182-5173
ano2013
Issue0001
Article number00010

O script do Java parece estar desligado, ou então houve um erro de comunicação. Ligue o script do Java para mais opções de representação.

Rastreio de Diabetes Mellitus tipo 2 e o seu impacto na mortalidade CLUBE DE LEITURA Rastreio de Diabetes Mellitus tipo 2 e o seu impacto na mortalidade Screening for type 2 diabetes and its impact on population mortality Joana Monteiro Interna de Medicina Geral e Familiar, USF Santa Clara, ACES Póvoa do Varzim/ Vila do Conde

Simmons RK, Echouffo-Tcheugui JB, Sharp SJ, Sargeant LA, Williams KM, Prevost AT, et al. Screening for type 2 diabetes and population mortality over 10 years (ADDITION-Cambridge): a cluster-randomised controlled trial. Lancet 2012 Nov 17; 380 (9855): 1741-8.

A Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2) constitui um importante problema de saúde pública e a elevada proporção de casos não diagnosticados, número de doentes com complicações à data do diagnóstico e longa fase de latência da doença são argumentos importantes a favor de um rastreio. Apesar de, por si, não contribuir para dano psicológico ou falsa segurança dos pacientes, as dúvidas quanto ao benefício de um rastreio de base-populacional da DM2 persistem.

Embora alguns estudos previssem uma diminuição da mortalidade global e relacionada com diabetes, até à data não existia evidência clara para fundamentar esta hipótese. Este estudo tem por objeto descrever a mortalidade encontrada num ensaio clínico aleatorizado por clusters de rastreio em doentes com alto risco de DM2 não diagnosticada em unidades de cuidados de saúde primários (CSP) de Inglaterra.

Métodos O ADDITION-Cambridge é um estudo de rastreio e intervenção na DM2 em CSP que incluiu a participação de pacientes com idade entre 40-69 anos, de 63 unidades de cuidados de saúde primários da região Este de Inglaterra aleatorizadas na proporção 1:3:3 por um de três grupos: sem rastreio (grupo controlo; 5 unidades), rastreio seguido de tratamento intensivo dos doentes com diagnóstico de DM2 (28 unidades) e rastreio seguido de tratamento convencional dos doentes com diagnóstico de DM2 (27 unidades). Foi calculado um score de estimativa de risco de DM2 não diagnosticada com base na idade, sexo, índice de massa corporal (IMC) e prescrição de corticosteroides e anti hipertensores.

No grupo de rastreio, os indivíduos foram convidados a realizar determinação da glicemia ocasional, hemoglobina glicosilada (HbA1c) e, posteriormente, glicemia capilar em jejum seguida de prova de tolerância à glicose oral, avaliação do IMC, perímetro abdominal, pressão arterial e perfil lipídico.

Os participantes diagnosticados com DM2 foram em seguida orientados de acordo com o regime estipulado para a unidade a que pertenciam: tratamento intensivo (estratégias de educação na gestão da hiperglicemia, pressão arterial e colesterol, início de terapêutica medicamentosa e promoção de estilos de vida saudáveis) ou convencional (segundo as recomendações atuais do UKNHS).

O outcome primário foi mortalidade por todas as causas e os outcomes secundários foram morte por doença cardiovascular, morte por cancro, outras causas e mortes relacionadas com a diabetes.

Resultados As unidades onde o rastreio foi realizado tinham um tamanho de lista inferior, menor prevalência bruta de diabetes, menos médicos e enfermeiros em relação à média de Inglaterra e serviam uma população aparentemente menos necessitada.

Foram considerados elegíveis 20 184 e, dos 16 047 do grupo selecionado para rastreio, 11737 compareceram. Foi feito o diagnóstico de DM2 a 466 participantes com uma duração média de follow-up de 9,6 anos. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na mortalidade por todas as causas entre o grupo de rastreio e de controlo (HR 1,06, IC a 95% 0,90-1,25; p=0,46). A DM2 foi listada entre outras causas de morte em 91 pacientes e não foram encontradas diferenças significativas entre grupos na mortalidade relacionada com a diabetes (HR 1,26; IC a 95% 0,75-2,10).

Discussão Neste estudo de base populacional do Reino Unido, a mortalidade global durante um período médio de 9,6 anos não foi diminuída por um rastreio de DM2 em pessoas com elevado risco de diabetes não diagnosticada. Da mesma forma, o convite à realização do rastreio não se associou à redução de mortalidade por todas as causas, mortalidade cardiovascular ou relacionada com diabetes num período de 10 anos.

A proporção de novos casos de diabetes pode ter sido demasiado pequena para ser demonstrada uma diferença e, em populações com taxas de diabetes não diagnosticada superiores, o benefício do rastreio na mortalidade poderá ser maior. Para além disso, a prevalência de diabetes não diagnosticada pode ter sido previamente sobrestimada, uma vez que esta doença foi citada como causa de morte em apenas 90 dos certificados de óbito e esta subnotificação pode também ter levado à diminuição do efeito do rastreio. Apenas uma etapa de rastreio foi realizada e, com o rastreio repetido, admite-se que o benefício poderá ser maior. A amostra foi representativa da população da Região Este de Inglaterra apesar de a população ser socioeconomicamente superior à média.

Como conclusão, o convite à realização de uma etapa de rastreio de DM2 em indivíduos de alto-risco numa unidade de CSP do Reino Unido poderá beneficiar a minoria com doença detetável mas não se associou à redução de mortalidade global ou relacionada com diabetes num período de 10 anos.

COMENTÁRIO A DM2 é uma doença com um impacto significativo na sociedade, cuja prevalência tem vindo a aumentar, associada ao aumento da obesidade e fatores de risco cardiovascular.1 Estudos nacionais2 e internacionais3-5 mostram que um elevado número de casos se encontra por diagnosticar. O rastreio e diagnóstico de DM2 é relativamente fácil e acessível, sendo uma medida popularmente aceite. Enquanto que os benefícios e potenciais danos do tratamento da diabetes foram largamente estudados, esta é a primeira vez que o seu rastreio foi avaliado num ensaio clínico.

Uma revisão recente da Cochrane põe em causa os benefícios dos rastreios de base populacional ao verificar que a avaliação regular de saúde com vista ao aconselhamento e realização de rastreio de doenças (incluindo diabetes) não mostrou diminuir a morbilidade ou mortalidade globais, apesar de aumentar o número de casos detetados.6 Estes achados são reforçados pelo presente estudo no qual, mesmo em indivíduos de alto risco, não foram detetadas diferenças de mortalidade, embora a morbilidade não tenha sido estudada pelos autores, o que poderia ter trazido dados determinantes para a recomendação ou não de rastreio em populações selecionadas.

Até à data, os dados existentes sobre os potenciais ganhos em saúde com a realização de programas de rastreio baseavam-se em modelos computadorizados que simulavam a progressão da diabetes, mas que tinham a limitação de terem por base estudos que incluíam apenas indivíduos com diabetes e excluíam aqueles que não desenvolviam doença.

A mais-valia do presente estudo foi ter incluído população com e sem doença e, por este motivo, poder reportar taxas de mortalidade com base na população.

Trata-se de um estudo metodologicamente correto, com um desenho de estudo adequado aos objetivos embora condicionado pela intenção de avaliação dos resultados de tratamento intensivo versus convencional. O período de follow-up de 10 anos traz importantes informações, embora, tendo em conta que o outcome é a mortalidade, possa condicionar também a magnitude dos resultados obtidos e justificar parcialmente a ausência de diferenças significativas verificada.

Outro fator importante a ter em conta na interpretação dos resultados deste estudo é a baixa taxa de diabetes diagnosticada de novo (3%), que reforça o resultado positivo das estratégias de prevenção cardiovascular implementadas ao nível dos CSP, mas põe em causa a aplicabilidade das conclusões a populações com prevalências superiores de doença não diagnosticada (relembre-se que em Portugal a estimativa é de 43,6%).2 Torna-se aparente, tendo em conta estes resultados, que o benefício do rastreio populacional da diabetes terá sido sobrestimado ao longo dos últimos anos e, embora este estudo aleatorizado, de boa qualidade metodológica, não seja suficiente para sustentar uma alteração da prática clínica, levanta a possibilidade de o benefício ser significativo apenas em populações selecionadas, de alto risco, e quando os testes se acompanham de uma avaliação e intervenção mais global nos fatores de risco cardiovascular, repetida ao longo do tempo.


transferir texto