Acessibilidade e utilização dos espaços verdes urbanos nas cidades de Coimbra
(Portugal) e Salamanca (Espanha)
I. INTRODUÇÃO
Os espaços verdes urbanos (EVU), mais do que meras funções de embelezamento das
cidades, têm outros objectivos, como possibilitar a prática de actividade
física e relaxamento, potenciando a coesão social e intergeracional (Pikorta et
al., 2003; Humpel et al., 2004; Kim e Kaplan, 2004; Thorsson et al., 2004; Knes
e thorsson, 2006; tzoulas et al., 2007; Foster et al., 2007; Seeland et al.,
2009). a mudança de percepção sobre a utilidade dos EVU aparece em meados do
século XX, com a inclusão destes espaços entre as competências do planeamento
urbano, e consequente responsabilização pela sua gestão e manutenção, vertida
nas competências da administração local (sanesi e Chiarello, 2006; Fonseca et
al., 2010; Madureira et al., 2011; gómez, 2013).
De facto, numa sociedade em que a população valoriza cada vez mais o bem-estar,
a saúde (física e mental) e a ocupação dos tempos livres, a oferta de um espaço
verde próximo da residência e do local de trabalho - proporcionando convívio,
contacto com a natureza, prática de actividade física, entre outras - é, cada
vez mais, um direito, tornando-se, não raras vezes, uma exigência dos cidadãos.
no entanto, para adequar os EVU às necessidades da população, é necessário
conhecer as suas características (localização, dimensão, segurança, limpeza,
manutenção, sinalização, equipamentos, adequação à prática de actividades
desportivas, etc.), as quais influenciam a utilização e a frequência da
utilização, para além de terem importantes impactes no âmbito da saúde pública
(tzoulas et al., 2007; Santana et al., 2007a, 2008, 2010). a literatura
científica que identifica os benefícios directos e indirectos dos EVU no
ambiente urbano com consequências no bem-estar e na saúde física e mental das
populações é vasta. Por exemplo De Vries et al. (2006), Maas et al. (2006) e
Santana et al. (2007b) evidenciaram a importância destes espaços na prática de
actividade física, no relaxamento e na saúde mental, com impactes no índice de
Massa Corporal, na saúde auto-avaliada e na longevidade. Outros investigadores
concluíram que, para além de melhorar a qualidade do ar e atenuar o efeito da
poluição e da "ilha de calor urbano" (Whitford et al., 2001; alcoforado e
andrade, 2007; Vasconcelos e Vieira, 2007; Leal et al., 2008), a utilização
desses espaços potencia a capacidade de concentração e disciplina das crianças
nas actividades do dia-a-dia, principalmente na população feminina (taylor et
al., 2001), aliviam o stress urbano (Ulrich, 1984; Nielsen e Hansen, 2007) e a
fadiga, com consequências na diminuição da agressividade e da violência (Kuo e
Sullivan, 2001; Doyle et al., 2006), e influenciam até a capacidade de
relacionamento com os vizinhos e os sentimentos de pertença a um lugar (bairro,
cidade) (Kim e Kaplan, 2004).
No entanto, nem todos os EVU têm este impacte. Segundo Van Herzele e Wiedemann
(2003), a dimensão pode modificar a distância e o tempo que uma pessoa está
disposta a percorrer para o alcançar; além disso, a satisfação dos utilizadores
depende das oportunidades que cada um oferece. Segundo Magalhães (1992), em
Portugal, a Direcção geral do Ordenamento do território e Desenvolvimento
Urbano (DGOTDU) definiu as distâncias a que os EVU se devem localizar,
relativamente à residência, associando o aumento da distância ao aumento da
áreai. é igualmen- te definido como desejável ou adequado o valor médio de 10m2
de EVU/habitante na respectiva área de influência (Magalhães, 1992; Santana et
al., 2007a, 2010). A acessibilidade geográfica é, de facto, relevante na sua
utilização e frequência de uso (Hillsdon et al., 2006; Coombes et al., 2010).
Nilsson et al. (1997), referem estudos suecos que demonstraram que, quando a
distância a um espaço verde é superior a 300 metros, uma em cada quatro pessoas
deixa de o utilizar diariamente.
Coimbra e Salamanca são cidades associadas aos rios que as atravessam e às suas
Universidades, as quais, em grande medida, são responsáveis pelo dinamismo dos
EVU, como é revelado por alguns autores (Ganho, 1996; Rochette, 2004; Leal et
al.,2008; Pêgoet al,2010). Contudo, em nenhuma das duas cidades há estudos que
avaliem a utilização, frequência e percepção dos utilizadores.
No presente artigo apresenta-se a distribuição dos EVU públicos e a sua maior
ou menor adequação às necessidades da população, comparando as cidades de
Coimbra e Salamanca. avalia-se a acessibilidade geográfica, o tipo, a
frequência e os motivos de utilização e, ainda, de que forma a administração
local tem respondido às novas exigências dos cidadãos.
II. COIMBRA E SALAMANCA: ENQUADRAMENTO
Coimbra e Salamanca são duas cidades semelhantes na sua génese: situadas na
metade ocidental da Península Ibérica (Coimbra, na região Centro de Portugal;
Salamanca, na Comunidade autónoma de Castela e Leão), são atravessadas por
rios, ambos com direcção este-oeste e possuem as universidades mais antigas de
cada País (fig._1).
Tanto a Universidade de Coimbra como a de Salamanca alavancam a actividade
económica e social das cidades em que se inserem, para além de atraírem uma
população estudantil relevante, com impactes na morfologia urbana. A
Universidade de Coimbra tinha 21 510 alunos inscritos no ano lectivo 2009/2010
(UC, 2010) e a de Salamanca 26 251 no ano lectivo 2010/2011 (USAL, 2011)ii.
Apesar de serem cidades históricas, os indicadores geo-demográficos são
distintos: em Coimbra residem 98.197 habitantes (INE-PT, 2011), numa área de 5
870 ha e em Salamanca 153 472 pessoas (INE-ES, 2011) que ocupam 1 463 ha, sendo
as densidades populacionais, respectivamente de 1 672 hab/km2 e de 10 490 hab/
km2. A forte concentração da população em Salamanca traduz-se numa densidade
que é 6 vezes superior à de Coimbra.
A tabela_I destaca alguns indicadores das duas cidades.
O conceito de espaço verde urbanoiii e de dimensionamentoiv requerido pelos
instrumentos de gestão do território são distintos nos países em estudo. O
mesmo se verifica quando se analisa a política local para os EVU.
Em Coimbra encontram-se em vigor dois instrumentos de gestão territorial que
norteiam o papel dos EVU na cidade: o Plano Director Municipal (PDM) - plano da
1.ª geração aprovado em 1994 - e o Plano Estratégico da Cidade de Coimbra
(PEC), aprovado pela assembleia Municipal em 2010. apesar do hiato existente
entre ambos, as áreas de intervenção e a política relativa a eles são
semelhantes: a concentração de grandes EVU junto ao rio e o aproveitamento de
áreas marginais ou residuais, situados em zonas de vale, adjacentes a linhas de
água, para construção de corredores verdes. O PEC indica que os EVU de pequena
dimensão têm vindo a registar adesão da população, sugerindo que o investimento
neste tipo de estruturas, é uma resposta eficaz à necessidade da população
desfrutar de EVU e espaços de convívio comunitário na proximidade das áreas
residenciais. no entanto, em Coimbra os espaços continuam a concentrar-se junto
ao rio.
Em Salamanca está em vigor o Plano Geral de 2007 (PGOU 2007), cujo objectivo é
acabar com os déficits de EVU nalguns bairros da cidade, pelo que se propõe o
incremento da estrutura verde através da integração das hortas urbanas e
espaços florestais localizados na periferia. estas actuações confirmam a
trajectória que começou com o Plano Geral de 1984 (PGOU, 1984) e que
impulsionou a criação de 18 EVU espalhados pela cidade.
III. METODOLOGIA
A realização deste estudo teve por base dois pressupostos de análise
territorial para as cidades de Coimbra e Salamanca: i) Delimitação das cidades
e dos centros históricos; ii) Definição de EVU. Para responder ao primeiro
pressuposto utilizaram-se, para Coimbra, os limites estabelecidos para o centro
histórico da cidade no Plano Director Municipal (PDM). Para Salamanca, a
delimitação da cidade foi calculada com base nas parcelas com descontinuidades
espaciais inferiores a 200 m de solo não urbano, segundo a metodologia de nello
e Muñoz (2004), enquanto o limite do centro histórico de Salamanca corresponde
às antigas muralhas da cidade, fixado no Plan General de Ordenación Urbana
(PGOU).
Tendo em conta o facto de ambos os países aplicarem conceitos distintos na
classificação do que é ou não um espaço verde urbano, optou-se por aplicar um
critério comparável, que pode ir além do estabelecido na legislação. Nesse
sentido, seleccionaram-se os EVU com um mínimo de 0,9 ha, nos quais é possível
realizar actividades lúdicas ou desportivas; de acordo com a metodologia
definida por Gómez (2012, 2013). A literatura (Canosa et al., 2003; Van Herzele
e Wiedemann, 2003; Santana et al., 2007a) tem revelado que o espaço verde
urbano com dimensão igual ou superior a 0,9 ha responde a algumas funções,
nomeadamente lazer, desporto ou passeio, justificando a maior parte das visitas
dos utilizadores desses espaços públicos.
Após a selecção dos EVU, analisou-se a respectiva génese e distribuição nas
duas cidades. foi também avaliada a acessibilidade da população, com recurso a
ferramentas de sistemas de informação geográfica, segundo dois processos: i)
Determinação da área de influência de cada EVU público (buffering), utilizando
uma distância de 400 metros, para dimensões entre 0,9 e 10 ha e de 800 metros,
para EVU de dimensão superior (segundo metodologia de Van Herzele e Wiedemann,
2003); e ii) identificação da distância (spatial join), em linha recta, entre o
centróide de cada bairro ou subsecção estatísticav e o EVU mais próximo
(segundo metodologia de Santana et al., 2008; 2010).
No presente estudo, a unidade geográfica de análise utilizada foi o Bairro, no
caso de Salamanca, e a subsecção estatística em Coimbra, por representarem a
desagregação territorial de menor dimensão utilizada nos respectivos Censos.
Para se analisar a utilização dos EVU pelos cidadãos foi aplicado um inquérito
aos seus utilizadores, segundo a metodologia aplicada por gómez (2012), baseada
nos estudos de Chiesura (2004), isto é, aplicou-se um ratio de 2,56 inquéritos
por hectare de espaço verde. Deste modo, obteve-se uma amostra de 540
utilizadores, dos quais 269 em Coimbra e 271 em Salamanca. este inquérito, para
além de focar as características individuais dos utilizadores (idade, género,
escolaridade, profissão e local de residência), procurou definir um padrão de
utilização (frequência de utilização, horário de visita, proximidade à
residência, tempo e modo de deslocação) e avaliar as razões de procura dos EVU
(motivo da utilização, sensações produzidas pelos espaços e tipos de
constrangimentos à utilização).
IV. AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS VERDES URBANOS EM COIMBRA E SALAMANCA
1. Génese dos espaços verdes nas duas cidades
A distribuição dos EVU nas cidades em estudo é bastante distinta (fig._2).
Salamanca tem 26 EVU com uma distribuição pulverizada por toda a cidade,
totalizando 100 ha. a cada salmantino correspondem 6,4 m2 de espaço público
tratado. em Coimbra contam-se 9 EVU públicos, com dimensão superior a 0,9 ha,
na maioria concentrados próximo do centro histórico de Coimbra, totalizando
105,1 havi e um ratio de 10,7 m2 por habitante.
Apesar das diferenças identificadas quanto à sua distribuição nas duas cidades,
são visíveis três etapas na génese dos EVU públicos, referenciadas por sanesi e
Chiarello (2006), que são, aliás, comuns à maioria dos países mediterrâneos
(fig._3): 1) na cidade histórica ou medieval, com ruas estreitas e irregulares
e pequenos becos e ruelas, onde praticamente não existe qualquer EVU excepto
alguns jardins históricos de dimensão muito reduzida; 2) na cidade construída
nos séculos XVIII e XIX, onde os EVU dominam ao longo de avenidas e em algumas
praças (que testemunham a sua génese: ordens religiosas e universidade); e 3)
na área urbana construída no final do século XX, com espaços residenciais bem
definidos e onde se têm construído novos EVU, de acordo com as exigências da
legislação e respondendo à estratégia delineada pelos municípios.
Este tipo de evolução dos EVU observa-se nas duas cidades: 18 dos 26 de
Salamanca e 4 dos 9 EVU de Coimbra surgiram nos últimos 30 anos. Os EVU
construídos antes deste período têm a sua génese associada às Universidades e
às Ordens religiosas. em Coimbra, a Universidade foi a responsável pela
criação, no século XViii, do Jardim Botânico que, durante muito tempo, foi a
maior estrutura verde pública na cidade. a Universidade foi, também, a
impulsionadora de um parque verde com mais de 9 ha em Salamanca, construído no
final do século XX (espaço verde urbano da faculdade de Comunicação). as ordens
religiosas tiveram, igualmente, papel preponderante na construção destes
espaços públicos: em Salamanca, quatro EVU (Campo de São Francisco, Parque dos
Jesuítas, Parque Picasso e Parque Verde Urbano das Salesas) e em Coimbra apenas
um (Parque de Santa Cruz, também conhecido por Jardim da Sereia).
2. Distribuição e acessibilidade
Apesar da clara distinção na génese dos EVU, as diferenças entre as duas
cidades são bem visíveis: em Coimbra, a maioria concentra-se próximo da cidade
histórica; em Salamanca, há dispersão pelo território da cidade, sendo
preferencialmente, na periferia do centro histórico ou junto dos novos espaços
de crescimento urbano (fig._4).
O carácter extensivo do crescimento da cidade de Coimbra tem fragilizado, ao
longo dos últimos anos, a relação de proximidade entre a população e os EVU,
por estes não acompanharem a distribuição da população pelo território. se se
considerar que a acessibilidade decresce com a diminuição da mobilidade em
modos de deslocação suaves (entre a origem e o destino), a distribuição dos EVU
pelo território - próximo dos potenciais utilizadores - é condição essencial
para uma efectiva utilização destes espaços públicos. O inverso também é
verdadeiro, facto visível na cidade de Coimbra.
Analisando a distribuição da população e dos EVU nas duas cidades, verificam-se
níveis de acessibilidade muito diferentes: em Salamanca 82,6% da superfície
urbana encontra-se na área de influência de um delesvii, estimando-se que 23
991 residentes tenham acessibilidade geográfica prejudicada por viverem fora
dos limiares identificados anteriormente. Em Coimbra apenas 21,7% da área da
cidade tem boa acessibilidade aos EVU, tendo sido contabilizadas 62 341
residentes com má acessibilidade aos EVU (fig._4). este facto é o resultado da
localização, concentrada, dos EVU públicos próximo do centro da cidade (seis
dos nove), coincidindo com a área de menor densidade populacional, ficando
assim uma grande área residencial muito afastada desses espaços. em 4 433
hectares da cidade, há 59 192 residentes que ficam a mais de mil metros dos EVU
e 28 130 residentes a mais de dois mil metros (fig._5). Pelo contrário, em
Salamanca, eles estão distribuídos por toda a cidade, constituindo-se como uma
rede que confere aos residentes níveis de acessibilidade e frequências de
utilização elevadas (fig._4). Por isso, há apenas 1 043 residentes a uma
distância superior a 2 500 metros dos EVU, correspondendo a uma área de 73,4 ha
(fig._5).
3. Perfil dos utilizadores
Os salmantinos utilizam mais os EVU do que os conimbricenses, pois 62% deles
frequenta-os em média, mais de 5 vezes por semana, enquanto em Coimbra eles não
chegam a 15% dos inquiridos, tendo a maioria deles afirmado que os frequenta
apenas uma ou duas vezes por semana (fig._6).
O perfil dos utilizadores dos EVU em Coimbra e Salamanca é também distinto. em
Coimbra, quase metade são jovens, com idades compreendidas entre os 18 e os 30
anos (45,3%) representando a população sénior pouco mais de 5%. em Salamanca,
os jovens são também o grupo mais representativo (32,1%) mas a população sénior
tem maior expressão do que em Coimbra (20,3%), principalmente do sexo
masculino, com 15,3% dos inquiridos (fig._7).
A distribuição por género é semelhante nas duas cidades, embora o número de
homens inquiridos seja maior (fig._7). também em termos do horário de
utilização se verificam semelhanças (fig._8). O período que concentra mais
utilizadores é a tarde: 57,3% dos conimbricenses e 53,2% dos salmantinos
visitam os EVU entre as 16 e as 20 horas. no entanto, se em Salamanca mais de
um terço dos inquiridos referiu utilizá-los de manhã, com principal destaque
para a população sénior, em Coimbra são poucos os seus frequentadores neste
horário, pois 21 % dos inquiridos prefere o período entre as 14 e as 16 horas,
quando decorre o descanso pós almoço em Espanha, estando EVU salmantinos
praticamente vazios (só 4,2% dos inquiridos).
4. Tempo de deslocação e motivo de utilização
São várias as motivações que levam a população a deslocar-se a um espaço verde
- prática de desporto, relaxamento, passeio, etc. - mas as motivações são
distintas em Coimbra e em Salamanca (fig._9).
A distância a percorrer entre a residência e o parque é importante em
Salamanca: três em cada quatro inquiridos referiram ser a proximidade à
residência o motivo de escolha dos EVU, ao passo que em Coimbra esta
percentagem é muito menor (16,7%). De facto, quando se questionou a duração da
deslocação entre a residência e o EVU mais próximo, apenas 18% dos inquiridos
referiu morar a menos de 5 minutos, enquanto em Salamanca esse valor sobe para
54,5% (fig._10).
Em Coimbra, mais de metade dos inquiridos referiu demorar entre 5 a 15 minutos
(55,6%) deslocando-se de carro (57,2%), o que é inevitável dada a distância a
vencer. apenas 30% dos inquiridos em Coimbra referiu ter lá chegado a pé, tendo
3,3% utilizado transporte público (2,6% - autocarro; 0,7% - comboio). estes
valores traduzem a dificuldade sentida pelos conimbricenses para aceder aos
EVU, uma vez que, como se referiu, quase 80% da cidade tem acessibilidade
reduzida a estes espaços.
A escolha do EVU, em Coimbra, faz-se em função das actividades a realizar e não
pela proximidade à residência, contrariamente ao observado em Salamanca. em
Coimbra pratica-se desporto ou passeia-se (87%). Embora com valores mais
baixos, estas actividades também foram assinaladas por uma grande quantidade de
salmantinos (67,2%). Em Coimbra segue-se o "relaxamento" (42,4%), o "contacto
com a natureza" (29,7%) e o "sentimento de escapar da cidade" (12,3%). Em
Salamanca, o "relaxamento" foi, também, uma justificação muito importante para
as visitas. Contudo, o "contacto com a natureza" e o "sentimento de escapar da
cidade" são menos expressivos do que em Coimbra. a possibilidade de passear com
as crianças motivou um em cada quatro inquiridos, em ambas as cidades.
As características dos EVU também influenciam a decisão da visita e a escolha
do espaço a visitar. O tipo de vegetação existente, o grau de limpeza, os
equipamentos que oferece e a dimensão motivaram 60,3% dos inquiridos em Coimbra
e 43,5% em Salamanca.
As sensações reportadas pelos visitantes dos EVU, no dia da entrevista, são
semelhantes nas duas cidades: dois em cada três inquiridos afirmaram que quando
os visitam "sentem-se bem em contacto com a natureza"; tendo o sentimento de
liberdade sido reconhecido por 45,4%, em Coimbra e 36,9%, em Salamanca (fig.
11).
Verificou-se ainda que a sensação de felicidade durante a permanência no EVU, é
superior em Salamanca (um em cada três inquiridos), seguido, em ambas as
cidades, pelo "sentimento da aventura" e do "(re)encontro consigo próprio".
estas respostas permitem concluir que eles são percepcionados como lugares onde
as pessoas se sentem bem e se "pode escapar/fugir do stress urbano". todavia,
para mais de 4% dos inquiridos é, também, paradoxalmente, um lugar de
insegurança e de medo, o que pode desmotivar futuras deslocações a EVU.
5. Sugestões para alteração das características dos espaços verdes
Em Salamanca, 64,2% dos inquiridos referiram a necessidade de maior rigor na
manutenção e limpeza dos EVU, desejo manifestado em Coimbra por 42% dos
frequentadores (fig._12). Verificou-se que em Salamanca, o mobiliário urbano,
os equipamentos e a vegetação estão deteriorados.
Este facto poderá estar associado, por um lado, à deficiente gestão destes
espaços por parte das autoridades locais e, por outro, aos comportamentos
destruidores ou mesmo violentos de alguns utilizadores. Cerca de 8% dos
inquiridos referiu a urgência da intensificação da vigilância, de forma a
reduzir o vandalismo. Verificou-se, ainda, que a presença de cães, na maioria
sem trela, se traduz em inquietação ou insegurança (12,2%).
Em Coimbra, para além da manutenção e limpeza dos EVU, foi referida a
necessidade de aumentar a quantidade e qualidade dos equipamentos (34,6%), da
vegetação (17,1%) e da sinalética (12,6%). apesar das diferenças entre as duas
cidades, na apreciação das características dos EVU, existe uma percentagem
apreciável de cidadãos que considera não ser necessário alterar ou melhorar
esses espaços, principalmente em Coimbra.
V. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E CONCLUSÕES
Este trabalho permitiu aprofundar o conhecimento dos EVU das duas cidades da
Península ibérica, podendo vir a ser útil no seu planeamento, pois foi a
primeira vez que se desenvolveu um estudo com estas características nas cidades
de salamanca e Coimbra.
A maior parte dos EVU de Coimbra tem mais de cem anos tendo nas últimas décadas
sido construídos apenas quatro de dimensão adequada para serem incluídos nesta
investigação, localizados maioritariamente nas margens do rio Mondego. De
facto, a política local dos últimos vinte anos pautou-se pela concentração de
grandes áreas de espaço verde junto ao rio, aproveitando as suas margens. Em
Salamanca foram construídos dezoito EVU nas últimas três décadas, acompanhando
o crescimento da cidade para novos bairros e incrementando de maneira destacada
as infra-estruturas verdes mostrando uma trajectória positiva impulsionada pelo
planeamento urbano regional que, mesmo assim, não foi capaz de solucionar os
déficits herdados de etapas anteriores.
De facto, a aposta do Município de Coimbra tem sido recentrar a cidade no rio,
dando primazia à concentração dos EVU nesta área e não necessariamente à
proximidade da população, o que tem consequências nos níveis de utilização. a
opção de Salamanca foi semelhante, valorizando as zonas ribeirinhas dos rios e
riachos, para expansão presente e futura da infra-estrutura verde, mas estas
actuações foram acompanhadas por uma sistemática criação de EVU públicos em
novos bairros, segundo as normas do urbanismo regional.
Coimbra apresenta um ratio de EVU por habitante superior ao de Salamanca embora
apenas satisfaça as necessidades de proximidade a cerca de 30.000 residentes,
contrariamente ao que se observa em Salamanca (cerca de 130.000 habitantes têm
boa ou muito boa acessibilidade). A dispersão da população, por um lado, e a
concentração dos EVU, por outro, justifica a acessibilidade e a utilização que
observamos em Coimbra, muito diferente de Salamanca. a proximidade da
residência ou do local de trabalho é uma das principais razões de utilização
dos EVU em Salamanca, o que não acontece em Coimbra. Por outro lado, nenhuma
das cidades atinge o valor global desejável para a estrutura verde urbana - 40
m2/habitante - defendido por diversos autores (Magalhães, 1992; Tzoulas et al.,
2007; Santana et al., 2007), nem o valor adoptado por diversos países
desenvolvidos (Wang, 2009) - 20 m2/habitante. apenas Coimbra ultrapassa
ligeiramente o rácio definido pela Organização Mundial de saúde e a Organização
das nações Unidas para agricultura e alimentação (Kuchelmeister, 1998) - 9 m2/
habitante.
A distribuição dos EVU condiciona a acessibilidade geográfica dos residentes
nas cidades analisadas, o que foi confirmado pelas respostas dos cidadãos sobre
o tempo que demoravam a chegar ao EVU mais próximo da residência. em Coimbra,
as longas distâncias entre a residência e os EVU obrigam à utilização de carro,
condicionando a utilização e a frequência de utilização desses espaços
públicos. em Salamanca a utilização do carro nessa deslocação é muito menor e
há maior frequência de utilização dos EVU. no entanto, as sensações dos
inquiridos relativamente ao seu uso são semelhantes em ambas as cidades,
predominando "o contacto com a natureza" e o "sentimento de liberdade".
Comparando os resultados obtidos nos inquéritos em Coimbra e Salamanca com o
trabalho que Chiesura (2004) realizou num parque da cidade de amsterdão
(Holanda)viii, verifica-se que as populações inquiridas apresentam hábitos
distintos. Para os utilizadores do Vondelpark, em Amesterdão, as
características do espaço não são o principal motivo, mas sim a possibilidade
de "descomprimir do ritmo de vida", procurando o "relaxamento", "escapando ao
ritmo acelerado da cidade" e recuperando o "contacto com a natureza". A
percentagem destes motivos é dupla quando comparado com a de Coimbra e tripla
relativamente ao verificado em Salamanca. Por outro lado, em amsterdão os EVU
são menos utilizados para a prática de desporto ou passeio, pois eles são
sobretudo frequentados para se apreciar a vegetação e a natureza. não obstante,
os frequentadores de EVU das três cidades têm sentimentos semelhantes quando se
referem ao contacto com a natureza.
Embora os problemas sentidos em Coimbra e Salamanca sejam diferentes foram
identificados aspectos a necessitar de melhorias, com destaque para a
necessidade de reforçar, nas duas cidades, a manutenção e a limpeza e,
adicionalmente em Salamanca, a segurança.
No que diz respeito à acessibilidade geográfica, será necessário (re)desenhar
uma rede de EVU distribuída pela cidade, principalmente no caso de Coimbra. De
facto, verificou-se que, nesta cidade, com densidade populacional seis vezes
inferior à da Salamanca, a população fica mais distante geograficamente do EVU.
Em síntese, é tão importante conhecer a oferta de EVU (m2/habitante) como a sua
distribuição pelo território, pois ambas determinam a utilização e a frequência
de utilização de EVU. O exemplo de Coimbra mostrou, por um lado, que o
indicador tradicional de EVU por habitante é insuficiente, por ignorar as
barreiras e constrangimentos ao seu acesso e utilização, bem como a distância a
vencer entre o local de residência ou de trabalho e o EVU, o que mostra a
necessidade de rever o seu planeamento. A presença de verde na cidade, com
distribuição, dimensão (superior a 0,9 ha) e enquadramento suficiente para a
prática diária de actividades lúdicas ou desportivas, deve ser entendida como
um dos elementos da morfologia urbana estreitamente ligada à distribuição da
população no território. São por isso necessárias intervenções que potenciem as
funções do EVU no tecido urbano e o reconhecimento e valorização das múltiplas
tipologias de verde neles presentes.