Anne Buttimer, prémio internacional de geografia “Vautrin Lud” 2014
NOTÍCIA
Anne Buttimer, prémio internacional de geografia “Vautrin Lud” 2014
Anne Buttimer, winner of the Vautrin-Lud International prize 2014
Maria João Alcoforado1 Hugh Clout2
1Presidente do Júri do Prémio Vautrin-Lud em 2014, Centro de estudos
geográficos, instituto de geografia e Ordenamento do território, Universidade
de Lisboa, Portugal. e-mail: mjalcoforado@campus.ul.pt
2Membro do Júri do Prémio Vautrin-Lud. University College, London, e-mail:
hughdclout@aol.com
Anne Buttimer acaba de receber o Prémio internacional de geografia “Vautrin
Lud” 2014. Este galardão, por vezes chamado Prémio nobel de geografia, foi-lhe
atribuído no 25º festival de geografia, que anualmente tem lugar em st. Dié-
des-Vosges (França). Foi seleccionada pelos “grandes eleitores” (geógrafos de
reconhecido mérito de vários países do mundo) e eleita por unanimidade pelo
júri internacional do prémio Vautrin-Lud, que assim presta justa homenagem à
carreira geográfica ecléctica e inovadora de Anne Buttimer, bem como às suas
múltiplas actividades em prol da ciência e à sua forte e generosa
personalidade.
Nascida em Cork, na irlanda, Anne Buttimer concluiu em 1965 o doutoramento em
Seattle, nos estados Unidos, no quadro das suas funções como dominicana,
explorando na tese os fundamentos conceptuais e metodológicos da geografia
social. Como domina várias línguas, fez carreira em diversas partes do mundo.
Desde 2003 é Professora emérita da University College Dublin e membro de
diversas academias (entre as quais a Academia Europaea, da qual é vice-
presidente, além de responsável pelas ciências socias). Foi vice-presidente e
depois presidente da União geográfica internacional (UGI), membro da
associação de geógrafos americanos e da Royal Geographical Society. recebeu
prémios em diferentes países, tendo sido recentemente reconhecida como Lifetime
Achievement Honorsda associação de geógrafos americanos.
Anne Buttimer tem uma prodigiosa actividade de pesquisa e é autora de avultado
número de livros e artigos de grande qualidade, tratando de temas tão variados
como a geografia social, urbana e cultural, o desenvolvimento sustentável, a
história do pensamento geográfico, a dimensão humana das “alterações globais”.
Os seus livros estão traduzidos em muitas línguas. A sua perspectiva da
geografia é holística e, embora seja por vezes considerada uma geógrafa
“humana”, procura estudar os problemas do território tendo em conta a sua
totalidade, agregando ao “espaço social” a natureza, por um lado, a noosfera e
o pensamento dos habitantes por outro. Anne Buttimer introduziu a ideia de
valor na aprendizagem geográfica, defendendo que a actividade académica deve
ser encarada do ponto de vista humanístico. O seu livro “sociedade e meio na
tradição geográfica francesa”, publicado em 1971, ilustra os seus contactos com
a escola francesa de geografia. Jacqueline Beaujeu-Garnier foi uma das suas
mentoras.
Destacar-se-ão alguns aspectos do seu percurso, uma vez que os pormenores do
seu vasto Curriculum Vitæ estão disponíveis na internet.
Quando trabalhou na Escócia (entre 1968 e 1970), sobre o planeamento de
habitações para trabalhadores de classes sociais desfavorecidas, que tinham
sido realojados, recorreu a métodos inovadores como inquéritos sobre a
percepção do meio, redes de interacções e sentido de pertença a um território.
Uma contribuição importante de Anne Buttimer para a História e a filosofia da
Ciência (em particular o pensamento e a prática da geografia) foi o projecto
“Diálogo internacional”, em colaboração com o Professor sueco Torsten
Hägerstrand, na Universidade de Lund. Esta pesquisa, desenvolvida entre 1978 e
1988, foi ao mesmo tempo inovadora e enriquecedora. Em conjunto com os seus
colaboradores, entrevistou mais de 200 colegas de 35 países acerca das
respectivas obras, métodos de trabalho e vida pessoal “com o objectivo de
procurar alguns denominadores comuns nessas carreiras, procurar formas de
compreensão mútua e tentar melhorar as formas de comunicação entre peritos em
ciências humanas e biofísicas”. As entrevistas publicadas revelam uma grande
riqueza científica, mostram diferentes pontos de vista sobre a geografia, a
filosofia da ciência e a História do pensamento geográfico, continuando ainda
a ser utilizadas para ajudar a compreender a intra e a interdisciplinaridade.
São de lembrar ainda as entrevistas a prestigiados colegas, que estão
disponíveis na internet no canal da UGI, as quais continuam a ser utilizadas
por investigadores, professores e estudantes.
Anne Buttimer dedicou-se também à análise das interacções entre ciência e
políticas de organização do território. Cite-se por exemplo o estudo sobre a
dimensão humana das alterações globais, no quadro de um questionário sobre os
usos da floresta, levado a cabo por suecos e canadianos (1988-1991). nos anos
seguintes coordenou dois projectos europeus “a paisagem e a vida: escalas
apropriadas para um desenvolvimento sustentável” e “ambiente e desenvolvimento
na europa periférica”, onde foram discutidos problemas sobre a escala de
aplicação das políticas europeias, assim como o sentido da linguagem e da
política cultural na promoção de melhores relações entre investigadores e
planeadores e entre investigadores e população.
Muito do tempo e da energia de Anne Buttimer foram dedicados à UGI, sobretudo à
Comissão de História e Pensamento geográfico, à qual pertence desde 1968.
Juntamente com outros membros, promoveu a evolução das bio-bibliografias
tradicionais para análises contextualizadas e reflexões críticas sobre a
História da disciplina e a profissão de geógrafo. Foi vice-presidente desta
comissão (1996-2000) e depois presidente (2000-2004). Nos anos de presidência
viajou muito, tendo apreciado particularmente os contactos com jovens
geógrafos de países emergentes. A UGI beneficiou de facto muito com a sua
energia e criatividade. Como presidente tentou criar condições para
“discussões cara a cara”, como reconheceu há dois anos em Colónia, quando se
dirigia a investigadores de geociências, na tentativa de fazer progredir o
conhecimento do planeta (em boa parte durante o “ano do Planeta terra”).
Em suma, Anne Buttimer é uma geógrafa de renome mundial, uma personalidade
inspiradora para muitos colegas, não só de geografia. Conseguiu ser inovadora
em muitas fases da sua carreira científica, estimulou a reflexão sobre a
prática geográfica, introduziu a noção de valor na vida científica e mostrou
que a conduta pessoal influencia e predispõe para certas escolhas no trabalho
geográfico. Divulgou o papel da geografia na organização e planeamento do
território e na resolução de problemas actuais como o desenvolvimento
sustentável e as alterações climáticas. as suas publicações e conferências
orientaram muitas gerações de cientistas. a atribuição do prémio Vautrin-Lud é
uma forma de a comunidade científica internacional lhe agradecer a sua
extraordinária dedicação ao trabalho do geógrafo e de a felicitar pela prática
da geografia como um ramo “humanístico” do conhecimento, pelas suas valiosas
publicações e pelos resultados inovadores alcançados.
Anne Buttimer has received the Vautrin-Lud International Prize for Geography in
2014. This prize, often known as the ‘Nobel Prize of Geography', was awarded
during the 25thInternational Festival of Geography that was held, as every
year, at Saint-Dié-des-Vosges in eastern France. The prize-winner was selected
unanimously by the Vautrin-Lud jury, whose members acted on the advice of
geographers from around the world who served as electors. This prize honours
the career of an illustrious geographer whose work has been innovative in
several ways and recognizes her service to science and her generous, strong
personality.
Anne Buttimer was born in Cork (Ireland) and took her doctoral degree at
Seattle (USA) in 1965, when she was a sister in the Dominican order. In her
thesis, Anne explored the conceptual and methodological foundations of social
geography. Her facility in several languages has assisted her career throughout
the world. She has been professor emeritaat University College Dublin since
2003 and is a member of several academies, including theacademia europaea,
which she is vice-president with responsibility for social sciences. She has
been a member, vice-president and then president of the International
Geographical Union, and is also a member of the Association of American
Geographers and a fellow of the Royal Geographical Society. She has received
scholarly prizes from many countries, including the recent award of the
Lifetime Achievement Honours of the Association of American Geographers.
Professor Buttimer is a remarkably active researcher and has written an
impressive number of books and articles on varied topics, including social
geography, urban and cultural geography, sustainable development, the history
of geographical thought, and the human dimension of ‘global change'. Her books
have been translated into several languages. Her approach to geography is
holistic and, while she is often considered to be a human geographer, she has
always sought to study spatial problems from a broad point of view, including
‘social space'. Her approach ranges from study of the natural world, on one
hand, to the ‘noosphere'and the ideas of human beings, on the other. She
introduced the idea of values in geographical education, and argued that
academic activity must be seen from a humanistic point of view. Her book on
‘Society and Milieu in the French Geographic Tradition' (1971) revealed her
contact with the French school of geographers, with Jacqueline Beaujeu-Garnier
being one of her mentors.
A number of interesting features of her life path may be highlighted, her
curriculum vitae being available on the interneti.
She is interested in empirical studies of ‘the human experience of space and
mobility'. From 1968 to 1970, she worked on housing issues in Scotland that
were to do with members of the impoverished working class who were resettled
away from their old homes in the slums. In so doing, she developed new
approaches to research, including environmental perception, networks of
interaction, and the sense of belonging to a particular place.
One of the greatest contributions of Anne Buttimer to the history and
philosophy of science (particularly of geographical thought and practice) has
been the ‘International Dialogue' project, undertaken with Professor Torsten
Hägerstrand of the University of Lund in Sweden. Undertaken between 1978 and
1988, this exercise was both innovative and enriching. Anne and her
collaborators interviewed over 200 colleagues from 35 countries about their
work, working methods and lives, with the aim of trying to ‘discover several
common denominators in varied careers, seek the bases of mutual understanding,
and arrive at better communication between experts in the social sciences and
in the biophysical sciences'. These published or videotaped interviews are of
great scientific interest. Revealing diverse points of view about geography,
philosophy of science, and the history of geographic thought, they are still
used to assist intra- and inter-disciplinary understanding. Many interviews of
famous colleagues are available on the internet through the ‘IGU ChAnnel', and
are viewed by researchers, teachers and students.
Anne has directed her attention to the inter-relations of scientific knowledge
and the practice of spatial planning. An example is provided by her work on the
human dimension of global change, especially through her enquiry into the use
of forest land in Sweden and Canada (1988-91). Subsequently, Anne directed two
European projects on ‘Landscape and Life: appropriate scales for sustainable
development', and ‘Environment and development on the periphery of Europe',
where questions of scale in the application of European policies were raised,
as well as the meaning of language and cultural policies in promoting better
relations between researchers and planners, and between researchers and
citizens.
Anne has dedicated much of her knowledge, time and energy to the International
Geographical Union. She has been a member of the commission on the History of
Geographic Thought since 1968. With several colleagues, she has encouraged a
shift away from traditional bio-bibliographies toward contextualized analyses
and critical reflections on the history of the discipline and on the craft of
being a geographer. She was elected vice-president (1996-2000) and then
president (2000-2004) of the IGU. During her presidency,
She travelled a great deal and especially appreciated the contacts she was able
to make with young geographers in emerging countries. The IGU greatly
benefitted from her creative energies. One of her presidential objectives was
to create occasions for ‘face to face discussions', as Anne said at the
International Geographical Congress in Cologne in 2012, between different
researchers in the ‘geosciences' (namely geologists and geophysicists as well
as geographers) to advance knowledge of the planet (partially in the context of
the ‘Year of Planet Earth').
Anne Buttimer enjoys a global reputation for having inspired many colleagues,
and not only geographers. At the various stages of her career, she has
introduced innovations, stimulated thought about the practice of geography,
advanced the notion of ‘values' into scientific work, and demonstrated how an
individual's biography influences the choices and working practices undertaken
by geographers. She has also emphasised the role of geography in spatial
planning and in solving problems, such as those associated with sustainable
development and climate change. Her publications and lectures have guided
several generations of scholars. By awarding her the Vautrin-Lud Prize, members
of the international geographical community express their thanks for her
remarkable devotion to the geographer's craft, and also for her many
innovations, her publications, and her practice of geography as a ‘humanistic'
branch of knowledge.
NOTAS
i www.ucd.ie/gpep/people/professorAnnebuttimer/; http://www.ae-info.org/ae/
User/Buttimer_Anne/CV