A importância do determinismo ambiental para a realização de alianças
estratégicas por subsidiárias estrangeiras
INTRODUÇÂO
Desde Hymer (1976), o interesse sobre as multinacionais tem crescido
fortemente. Recentemente, os estudos têm focalizado as subsidiárias de
multinacionais e os fatores inerentes a sua gestão (Paterson e Brock, 2002).
Dentre esses fatores se destacam as relações da subsidiária com parceiros de
negócios, fornecedores e ambiente competitivo (Birkinshaw, 2001; Coudounaris et
al., 2009; Seno-Alday, 2010).
Birkinshaw (2001) realizou uma revisão da literatura dos estudos mais
relevantes num período de trinta anos sobre as atividades e responsabilidades
das subsidiárias e identificou o crescimento de correntes promissoras e
distintas de estudos, dentre as quais estão a abordagem das redes e os
relacionamentos com as subsidiárias.
Em pesquisa semelhante, Coudounaris et al. (2009) analisaram quinze anos de
publicações na Management International Review e evidenciaram os artigos mais
influentes dentre os quais destaca um estudo sobre as joint ventures
(modalidade de aliança estratégica).
Uma revisão sobre a literatura de negócios internacionais, compreendendo os
últimos cinquenta anos de publicações no Journal of International Business
Studies, permitiu a Seno-Alday (2010) identificar importantes subáreas a serem
melhor investigadas, dentre as quais se destacam os estudos das forças
ambientais que influenciam as práticas empresariais. A autora esclarece que o
campo de negócios internacionais carece de estudos que aprofundem questões
sobre a adaptação e sobrevivência das empresas em ambientes estrangeiros.
Argumenta ainda que é esperado, para a próxima década, um aumento nas pesquisas
relativas a alianças estratégicas e redes de negócios. Isso porque, apesar da
vertente de estudos sobre joint ventures internacionais ter seu lugar demarcado
e um corpo de pesquisadores dedicado para o entendimento da temática (Paterson
e Brock, 2002; Aharoni e Brock, 2010), por outro lado, um importante tema de
estudo tem sido subestimado pelos pesquisadores no campo da estratégia de
subsidiárias: os fatores que propiciam as alianças estratégicas realizadas por
subsidiárias no país estrangeiro.
As multinacionais necessitam cada vez mais de intensificarem seus esforços para
criar, transferir, disseminar e aplicar conhecimento (Forsgren, 2008). No
entanto, as multinacionais não dispõem de todo o conhecimento na matriz ou nas
suas subsidiárias, pois estes se encontram dispersos em empresas ao redor do
mundo (Doz et al., 2001). Para tanto, por meio de suas subsidiárias, as
multinacionais buscam realizar parcerias estratégicas com empresas de
diferentes países como fonte de conhecimento (Santos et al., 2004). Trata-se de
uma configuração estratégica em que o conhecimento não decorre somente da
matriz nem das próprias subsidiárias, mas pode ser proveniente de alianças
estabelecidas em mercados estrangeiros. Configuração essa chamada de estratégia
meta nacional (Doz et al., 2001). A esse respeito, Aharoni e Brock (2010)
argumentam que a aprendizagem conjunta e além das fronteiras constitui um
quadro de evolução global para a multinacional. Em particular, os autores
referem-se às alianças como uma forma especial de troca e intercâmbio de
aprendizagem em termos de co-exploração e exploração de cooperação.
Logo, diante da proeminência da estratégia meta nacional é importante entender
quais fatores exercem influência na formação das alianças estratégicas
praticadas por subsidiárias estrangeiras. Seguindo os paradigmas das
investigações sobre as subsidiárias, os fatores que influenciam a estratégia
das subsidiárias podem ser divididos em fatores relacionados à gestão das
subsidiárias, na relação entre matriz e filial e ao determinismo ambiental
(Birkinshaw, 2001).
A preocupação com a influência do determinismo ambiental repousa na suposição
de que as subsidiárias teriam maior propensão a formar alianças estratégicas
quanto melhores as condições do contexto competitivo nacional (Porter, 1990) e
internacional (Rugman e D'cruz, 1993; Moon et al., 1998) e maior a inserção na
rede de negócios no estrangeiro (Andersson et al., 2002).
Assim, o objetivo principal deste artigo é analisar como as condições do
contexto competitivo nacional (Porter, 1998, 1990), do contexto competitivo
internacional (Rugman e D'Cruz, 1993; Moon et al., 1998) e das redes de
negócios (Andersson et al., 2002) favorecem o desenvolvimento das alianças
estratégicas praticadas por subsidiárias estrangeiras. A hipótese central é a
de que todos esses fatores influenciam positivamente o desenvolvimento de
alianças estratégicas realizadas por subsidiárias estrangeiras no país
hospedeiro.
A presente pesquisa contribui para o campo dos estudos em estratégia
internacional, dada a carência de estudos a respeito da realização de alianças
estratégicas realizadas por subsidiárias estrangeiras (Seno-Alday, 2010;
Aharoni e Brock, 2010). Além disso, a pesquisa aprofunda a discussão do modelo
meta nacional (Doz et al., 2001), evidenciando a importância da aliança
estratégica como uma estratégia para o incremento do conhecimento em empresas
multinacionais.
REFERÊNCIAL TEÓRICO
As estratégias clássicas de empresas multinacionais são as estratégias global,
múlti doméstica e transnacional (Bartlett e Ghoshal, 1992). A primeira é
pautada pela integração global das atividades, a segunda explora a adaptação
local e a terceira combina a adaptação e integração em conjunto com a inovação
global dispersa nas áreas funcionais das subsidiárias, os centros de
excelência. Enquanto a estratégia global e múlti doméstica estabeleceram o
paradigma dominante dos estudos da década de 1980, na década de 1990, a
estratégia transnacional ganhou fôlego com o artigo de Bartlett (1986).
O grande diferencial da estratégia transnacional é a inovação dispersa (Nohria
e Ghoshal, 1997). Algumas subsidiárias, por executarem atividades de inovação
global, assumem o mandato mundial para determinadas funções (Cantwell e
Mudambi, 2005). O pressuposto lógico é: uma vez que a subsidiária adquire
importância estratégica, ela passa a comandar uma função regional ou global,
portanto a unidade não somente recebe conhecimento e capacidades da matriz e de
outras unidades corporativas, mas também passa a ser responsável pelo
desenvolvimento de capacidades organizacionais que devem ser implantadas não só
no país da subsidiária, mas em outros lugares do mundo que estão sob o mandato
da subsidiária. Em outras palavras, a subsidiária passa a ser responsável por
desenvolver e transferir o conhecimento para todas as outras subsidiárias sobre
as quais tem mandato podendo, muitas vezes, englobar alguma função da própria
matriz.
Embora o modelo transnacional seja complexo e abrangente, tentando reunir a
força centrífuga da orientação estratégica das empresas multinacionais, o mesmo
apresenta lacunas dado o seu período de elaboração e a evolução dos estudos em
estratégia internacional.
Uma dessas lacunas é a inserção das empresas em redes de negócios globais como
fonte de conhecimento e competências. A estratégia transnacional aborda apenas
a rede da multinacional e não dá muita atenção à possibilidade de a empresa
adquirir seus recursos fora da rede interna, seja por meio de parceiras,
alianças ou atividades de offshoring (Santos et al., 2004).
Em razão dessa possibilidade, dentre outras, surge o modelo estratégica meta
nacional. Segundo Doz et al. (2001), o desafio das multinacionais é desenvolver
uma aprendizagem global. Na estratégia meta nacional, a multinacional tem noção
de que a vantagem competitiva não é criada somente na matriz ou em algumas
subsidiárias mais importantes, mas também em diferentes subsidiárias, mesmo
naquelas que há pouco eram subsidiárias típicas globais ou múlti domésticas.
Isso contradiz a teoria de subsidiárias com papéis determinados (Bartlett e
Ghoshal, 1992) e suporta a teoria evolutiva do desenvolvimento de competências
em quaisquer tipos de subsidiárias, sem que o reconhecimento ou a autorização
sejam conferidos à subsidiária (Birkinshaw e Hood, 1998).
O objetivo já não compreende apenas buscar conhecimentos numa região e
transportá-los a outras (transferência de competências através dos centros de
excelência), nem mesmo um padrão único e global desenvolvido por um centro de
excelência. Em vez disso, a estratégia meta nacional concentra-se em descobrir
pontos de conhecimento ao redor do mundo (Doz et al., 2001), sendo que esse
conhecimento nem sempre está dentro da matriz ou subsidiária, mas está em
empresas do ambiente competitivo. Logo, cabe à multinacional comprar ou
estabelecer alianças estratégicas com essas empresas para adquirir esse
conhecimento. Se, por um lado, a aquisição garante a internalização imediata do
conhecimento existente, ela pode comprometer o desenvolvimento de novas fontes
de conhecimento pela mudança do estilo de gestão e da relação com os atores do
ambiente e da rede. Por outro lado, embora a aliança envolva questões de
integração entre as empresas, ela garante que a empresa continue a fazer
usufruto das condições do ambiente e da rede de negócios que, de outra forma, a
subsidiária ao entrar por greenfield investments demoraria um longo tempo para
desenvolver.
Nesse contexto, as alianças estratégicas podem desempenhar papel fundamental ao
tornarem possível o acesso a certos recursos e conhecimentos distantes, ao
invés da detenção desses recursos ou vultosos investimentos em pesquisas e
desenvolvimento tornando-se, assim, um fator de sucesso, com vantagem
competitiva e redução de riscos. Assim, torna-se fundamental a compreensão das
alianças e sua importância para tornar a empresa presente em todo o globo e
para o desenvolvimento de competências.
Alianças estratégicas realizadas por subsidiárias estrangeiras
Seguindo a cartilha da dissonância que permeia em muitos dos temas discutidos
pela comunidade científica, a teoria sobre as alianças estratégicas também
carece de uniformidade. No entanto, há entendimento sobre a sua importância
tanto para o desenvolvimento de vantagens competitivas quanto para a diminuição
de deficiências e fraquezas das empresas. Característica marcante de uma
aliança estratégica é a independência entre as empresas envolvidas na parceria
(Dussauge e Garrette, 1999; Yoshino e Ragan, 1996; Inkpen, 2008). Kogut (1991)
observa que muitas empresas optam pela aliança como uma forma de reduzirem as
incertezas ao explorarem mercados incertos. Entretanto, muitos pesquisadores
têm enfatizado a importância do canal de aprendizagem, o acesso a novas
tecnologias e a internalização de novas competências possibilitada pela aliança
colaborativa (Inkpen, 2008; Kogut e Zander, 1992; Doz e Hamel, 2000; Lewis,
1992; Lorange e Roos, 1996; Barney e Histerly, 2008; Chung et al., 2006; Giroud
e Scott-Kennel, 2009). A essência da relação cooperativa é, portanto, a
possibilidade concreta de que a união dos parceiros seja capaz de gerar uma
sinergia que, em isolamento, não poderia ser obtida (Dyer e Singh, 1998).
Seguindo a perspectiva da aprendizagem, vislumbra-se que é pouco provável que
uma subsidiária detenha todas as capacidades organizacionais previstas na
cadeia de valor (Porter, 1986). Logo, as alianças poderiam complementar as
capacidades que não podem ser desenvolvidas internamente (Cavusgil et al.,
2010). As alianças atendem às carências de competências que a empresa apresente
ao longo de sua cadeia de valor, através do compartilhamento de atividades com
outras empresas que agreguem maior valor ao seu produto e acentuem a vantagem
competitiva. Tanto é que Giroud e Scott-Kennel (2009) afirmam que o
relacionamento e interação via alianças entre as subsidiárias estrangeiras e as
empresas locais geram impacto no sucesso e desenvolvimento de capacidades
organizacionais.
Portanto, dada a importância das alianças estratégicas praticadas por
subsidiárias como fonte de inovações e capacidades organizacionais, cabe
investigar quais fatores influenciam na sua formação. Como relatado, neste
artigo os esforços são direcionados para entender a influência dos fatores do
ambiente competitivo e da rede de negócios.
O contexto competitivo nacional
As discussões a respeito da competitividade nacional consideram que além das
vantagens comparativas (Ricardo, 1996), o país deve ser capaz de atrair
investimentos diretos estrangeiros (IDE), intensivamente e de qualidade, como
consequência de sua vantagem nacional. Ademais, a prosperidade nacional é
criada e não herdada, de maneira que os fatores de produção mais importantes
são construídos (Porter, 1998; Dunning, 1988). Para fomentar esta atração de
recursos é importante que o país seja base de uma indústria intensiva em
conhecimentos e competitividade global, que exista nele um ambiente que atenda
ao conjunto de requisitos que, isolados e sistematicamente, permitem a
construção da vantagem nacional sustentada.
Nesse sentido, há quatro atributos de um país que moldam o ambiente no qual as
empresas locais competem e que promove ou impede a criação da vantagem
competitiva. São eles: as condições dos fatores de produção; as condições da
demanda; os setores correlatos e de apoio a estratégia, estrutura e rivalidade
das empresas. Eis as quatro arestas que Porter (1990) chama de «diamante da
vantagem nacional» e devem ser consideradas como as condições ambientais
essenciais para países que querem ser competitivos e inovadores.
Estando presentes em sintonia e funcionando como um sistema, as quatro arestas
do diamante nacional propiciam um ambiente competitivo adequado para a criação
de valor e inovações. Isto atrai as subsidiárias estrangeiras que vêm em busca
das vantagens que o diamante oferece, e assim, internalizam competências e
inovações que o ambiente estrangeiro lhe proporciona (Porter, 1998; Frost,
2001; Frost et al., 2002; Doz et al., 2001).
A partir do entendimento dos fatores contidos no diamante nacional (Porter,
1998) é possível inferir que, sendo o diamante da vantagem nacional
satisfatório, interessante e atraente, então as empresas pertencentes a este
cenário são bem estruturadas e estão em patamar de elevada competitividade.
Logo, é de se esperar que as subsidiárias possam agregar valor ao realizarem
alianças com empresas desse ambiente competitivo. Assim, propõe-se a primeira
hipótese:
Hipótese 1:Quanto melhores as condições do contexto nacional (diamante
nacional) no Brasil, maior a possibilidade das subsidiárias estrangeiras
realizarem alianças estratégicas para criação de valor.
O contexto competitivo internacional
A economia global tem exigido que muitos dos fatores que compõem a vantagem
competitiva sejam encontrados não somente dentro das fronteiras nacionais, como
também fora delas. Torna-se então interessante o estudo não somente do diamante
da competitividade em contexto nacional, como também em contexto internacional.
Embora o modelo do diamante de Porter (1998) seja amplamente reconhecido por
explicar a competitividade nacional, não é suficiente para abarcar todas as
situações, como demonstram alguns estudos (Rugman e D'Cruz, 1993; Moon et al.,
1998). Estes autores salientam que o modelo original do diamante de Porter
(1998) é incompleto, por não incorporar de forma adequada as atividades das
multinacionais.
Moon et al. (1998) ao compararem os diamantes nacionais e internacionais da
Coreia do Sul e Singapura, constataram que a Coreia do Sul possui um diamante
nacional mais robusto que o de Singapura que, em contrapartida, possui um
diamante internacional melhor que o dos sul coreanos. Com base na economia de
ambos os países, os autores concluíram que tanto os determinantes nacionais
quanto os internacionais são importantes para a competitividade. Estes estudos
avançaram a teoria e foram denominados como «diamante duplo». Em conformidade
com esses estudos, uma multinacional deve basear-se não somente nas condições
do contexto competitivo nacional, mas também no contexto internacional.
O modelo do diamante duplo (Rugman e D'Cruz, 1993; Moon et al., 1998) propõe
extensões ao modelo original do diamante (Porter, 1990), argumentando que a
nova abordagem do diamante duplo permite a comparação dos diamantes nacional e
internacional, revelando as diferenças e possibilitando uma melhor visão
estratégica. Rugman e D'Cruz (1993) argumentam ainda que o modelo do diamante
nacional é principalmente destinado a explicar as fontes de vantagem
competitiva nacional possuída pelas economias de países avançados, mas é
limitado em explicar os níveis e mudanças dinâmicas das economias nos países
emergentes como o México e o Brasil. Entender e usufruir do duplo diamante é o
primeiro passo em direção ao sucesso em escala global da empresa. Há um
encorajamento para se olhar além das fronteiras do país, utilizando-se as
ideias do modelo do diamante. As multinacionais podem ser influenciadas pela
competitividade, tanto pelo diamante em seu país natal, como também em outros
países.
A verificação de que os fatores nacionais que permitem a vantagem competitiva
também podem ser encontrados fora do país, possibilita às empresas procurarem
por «diamantes» além de suas fronteiras. Desta forma, torna-se interessante
medir não somente a influência do determinismo ambiental nacional, como também
do internacional. Assim, propõe-se a segunda hipótese:
Hipótese 2: Quanto melhores as condições do contexto internacional (diamante
internacional), maior a possibilidade das subsidiárias estrangeiras realizarem
alianças estratégicas.
Redes de negócios
Redes de negócios são conjuntos de organizações interligadas por meio de
vínculos, em geral diversos, sendo compostos por nós (empresas) e por laços
(relacionamentos) que interligam os nós (Lazzarini, 2008). A definição de
vínculos suscita a necessidade de compreender a dinâmica das relações e como
estas se traduzem contextualmente em interações, fluxos de capital,
conhecimento e pessoas.
Andersson et al. (2002) apontam diferenças entre dois tipos distintos de
relacionamento com a rede. Em um extremo essas relações podem ser de longa
duração, sendo a relação baseada na confiança mútua. No outro extremo, a
relação pode ser encurtada devido a fatores econômicos, havendo a possibilidade
de mudança repentina de parceiro. Estando a relação contida no primeiro extremo
(longa duração), isto significa que há um elevado enraizamento (embeddedness)
entre os parceiros da rede, ou seja, os parceiros conhecem-se há muito tempo,
têm adaptado o seu comportamento comercial e costumam trocar informações a
respeito do mercado. A este relacionamento os autores chamam de enraizamento de
negócio. Em outras palavras, a rede de negócios é fruto do relacionamento
comercial da subsidiária com os parceiros de negócios, tais como: fornecedores,
instituições de pesquisa, empresas de propaganda, dentre outros.
Assim, a rede externa de negócios da qual faz parte uma subsidiária pode
influenciar na construção das suas vantagens competitivas de duas maneiras:
primeiro, pode ser assumido que a subsidiária, tendo acesso aos recursos da
rede, terá um impacto na competitividade em seu mercado; segundo, sendo
possível a transferência dessas capacidades para outras unidades da rede
interna da multinacional, o acesso à rede externa acaba por representar uma
fonte de conhecimento e capacidades para toda a multinacional (Andersson et
al., 2002). O pressuposto é o de que, a partir da ligação/relacionamento, as
subsidiárias estrangeiras exerçam poder e influência mas, contudo, que os
parceiros locais também possam ganhar com a criação do vínculo (Meyer, 2004;
Giroud e Scott-Kennel, 2009). Nesse sentido, a inserção em redes de negócios
poderia colaborar para um relacionamento técnico de troca de conhecimento que
constituiria uma aliança estratégica, pois mais que uma parceria comercial, o
relacionamento técnico consiste na interdependência entre as empresas em termos
de produto e desenvolvimento de processos de produção. Um alto grau de
enraizamento técnico significa que as duas organizações são altamente
interdependentes em termos tecnológicos e trocam conhecimento e capacidades,
logo constituem alianças estratégicas. Portanto:
Hipótese 3: Quanto melhor a relação com as empresas da rede de negócio, maior a
possibilidade das subsidiárias realizarem alianças.
METODOLOGIA
A pesquisa foi realizada por meio da aplicação de um survey. O instrumento de
coleta de dados utilizado foi o questionário fechado (Newman, 2006; Collis e
Hussey, 2006; Creswell, 2009). O universo da pesquisa foi escolhido com base no
porte das empresas em termos de faturamento utilizando, para isso, o universo
das 1200 maiores empresas multinacionais de capital estrangeiro que atuam no
Brasil, obtido com base no faturamento das empresas cedido pela Análise
Editorial que pública o anuário Análise Comércio Exterior.
Os dados do estudo em questão foram coletados por meio de questionários via e-
mail com acompanhamento telefônico para o principal executivo da subsidiária
(presidente, CEO, vice-presidente). Embora tenham sido enviados 1200
questionários para as subsidiarias, após o contato telefônico verificou-se que
o mailing continha alguns endereços repetidos e contatos equivocados. Dado esse
fato, o número de subsidiárias de nosso universo de pesquisa foi reduzido para
1012 empresas. Desses, retornaram 181 questionários, sendo que 9 foram
excluídos por preenchimento incompleto ou errado. Desse modo, a amostra da
pesquisa é de 172 empresas, um percentual de 17% de respostas. Esse percentual
era o esperado e equivalente, por exemplo, à pesquisa de Oliveira Jr. et al.
(2009) que pesquisou as subsidiárias estrangeiras no Brasil com base, também,
nas maiores em termos de faturamento.
Das empresas respondentes, 50% entraram no Brasil antes da década de 1990, 30%
na década de 1990 e 20% na atual década. A origem das multinacionais é
predominantemente europeia (58%), seguido pelas multinacionais oriundas da
América do Norte (29%). O modo de entrada preferido foi o greenfield
investiments (58%) perante as aquisições e fusões. Dessas empresas, 43% têm
mais de 500 funcionários e 57% menos de 500 funcionários. As empresas atuam
predominantemente no setor industrial (77%), seguido pelo setor de serviços
(21%) e somente 3% no setor de agronegócios.
Constructos
Todas as variáveis estão medidas numa escala de Likert (Newman, 2006), de cinco
pontos, tendo-se num extremo o valor «1» indicando «discordo totalmente, ruim
ou baixa» e, noutro, o valor «5» indicando «concordo totalmente, excelente ou
muito alta», em conformidade com cada questão.
O constructo dependente «alianças estratégicas» foi baseado em Doz et al., 2001
e formado pelas seguintes variáveis: a) a nossa subsidiária tem larga
experiência com parcerias e alianças estratégicas com nossos fornecedores; b) a
nossa subsidiária tem uma longa história na preparação e desenvolvimento de
parcerias no passado; c) desenvolver parcerias é uma prática comum da nossa
subsidiária; d) a nossa subsidiária está sempre procurando por oportunidades de
fazer novas alianças e parcerias estratégicas; e) a nossa subsidiária considera
parcerias e alianças estratégicas assuntos de vital importância para o nosso
negócio. O Alpha de Cronbach é de 0,901.
Os constructos independentes são: contexto competitivo nacional ' diamante
nacional, contexto competitivo internacional ' duplo diamante e redes de
negócios.
O contexto competitivo nacional (Porter, 1990) é formado pelas seguintes
variáveis: a) tamanho da demanda de mercado no Brasil; b) a exigência dos
consumidores brasileiros incentiva a criação de novos produtos; c) intensidade
da competição no Brasil; d) velocidade na inovação de competidores brasileiros;
d) fornecedores e parceiros brasileiros. O Alpha de Cronbach é de 0,667.
O constructo do contexto competitivo internacional (Rugman e D'Cruz, 1993; Moon
et al., 1998) é formado pelas seguintes variáveis: a) tamanho da demanda de
outros países; b) a exigência dos consumidores de outros países incentiva a
criação de novos produtos; c) Intensidade da competição mundial; d) velocidade
na inovação de competidores mundiais; e) fornecedores e parceiros mundiais. O
Alphade Cronbach é de 0,760.
O constructo de redes (Andersson et al., 2002) é formado pelas seguintes
variáveis: a) o nosso relacionamento com os nossos principais fornecedores é
caracterizado por ser uma relação de longa duração; b) o nosso relacionamento
com os nossos principais fornecedores é caracterizado por um alto nível de
confiança mútua; c) os nossos principais fornecedores nunca tentam alterar os
fatos apenas com a finalidade de conseguir concessões; d) os nossos principais
fornecedores nunca se comprometem a fazer coisas sem que venham a cumprir o
prometido; e) os nossos principais fornecedores normalmente compartilham
conosco importantes informações sobre o mercado e vice e versa; f) nós
confiamos nos nossos fornecedores no sentido de que eles irão entregar conforme
o prometido e dentro do prazo determinado; g) nós confiamos nos nossos
fornecedores no sentido de que eles irão entregar dentro do padrão de qualidade
prometido. O Alpha de Cronbach é de 0,810.
Todos os constructos apresentam normalidade (KMO) ao nível de significância
0,05.
Variáveis de controle
Uma das variáveis de controle é o tempo de existência da subsidiária (dummy 0
para empresas que entraram antes do ano 2000 e 1 para as empresas que entraram
depois de 2000). A variável modo de entrada é outra dummy de controle (0 para
aquisição e 1 para greenfied). A terceira variável de controle é o tamanho da
empresa (dummy 0 para empresas com menos de 500 funcionários e 1 para empresas
com 500 ou mais funcionários).
RESULTADOS
A Tabela_1 apresenta os dados da correlação e as médias e desvios padrão dos
constructos. As subsidiárias fazem uma avaliação positiva, porém moderada
(entre três e quatro numa escala de cinco pontos) do contexto nacional,
internacional e da relação com redes. As subsidiárias também avaliam
positivamente as alianças estabelecidas com as empresas parceiras, porém essa
avaliação positiva ainda é moderada tal como para os demais constructos.
As correlações entre as variáveis independentes são significantes, porém
fracas. Satisfaz inicialmente um dos pressupostos da regressão que é a
inexistência de correlação forte entre as variáveis independentes.
Inicialmente, os resultados mostram que a aliança estratégica está
correlacionada com todas as independentes. O diagnóstico da ausência de
multicolinearidade é comprovado através do teste de tolerância VIF (Tabela_2)
inferior a cinco, garantindo a ausência de multicolinearidade entre as
variáveis (Maroco, 2010).
Com a finalidade de testar as hipóteses e avaliar o poder explicativo das
variáveis independentes na constituição da variável dependente, foi realizada
uma regressão linear múltipla para o constructo dependente «alianças
estratégicas». A Tabela_2 apresenta os resultados gerados pelo modelo de
regressão linear múltipla. O modelo 1 apresenta a relação de dependência com as
variáveis de controle. Os modelos 2, 3 e 4, além das variáveis de controle,
acrescem respectivamente os constructos do contexto competitivo nacional,
contexto competitivo internacional e redes. Finalmente, o modelo 5 apresenta a
modelagem com todas as variáveis em conjunto.
O resultado mostra que a formação de alianças estratégicas depende das
condições favoráveis do contexto competitivo nacional e internacional e da
presença de bons parceiros na rede de negócios. O poder de predição é de
aproximadamente de 21% sendo que, ao comparar os modelos 1, 2 e 3, verifica-se
que o constructo «rede de negócios» exerce um peso maior no poder de predição.
As variáveis de «controle de tempo de existência» e «modo de entrada» não se
apresentam como significantes para a formação da aliança estratégica. Por sua
vez, quanto maior o tamanho da empresa, maior a possibilidade da empresa
realizar alianças estratégicas.
Portanto, os resultados confirmam as hipóteses H1, H2 e H3 apresentadas. Logo,
é possível estabelecer as seguintes afirmações: Quanto melhores as condições do
contexto nacional no Brasil, maior a possibilidade das subsidiárias
estrangeiras realizarem alianças estratégicas para criação de valor; Quanto
melhores as condições do contexto internacional, maior a possibilidade das
subsidiárias estrangeiras realizarem alianças estratégicas; Quanto melhor a
relação com as empresas da rede de negócio, maior a possibilidade das
subsidiárias realizarem alianças.
DISCUSSÃO
Os resultados mostram que, em geral, as condições do ambiente de negócio têm
influência direta na formação de alianças estratégicas por parte das
subsidiárias estrangeiras localizadas no Brasil. Desse modo, confirma a
hipótese central de que todos os fatores do ambiente influenciam positivamente
o desenvolvimento de alianças estratégicas, realizadas por subsidiárias
estrangeiras no país hospedeiro.
Os resultados confirmam que o contexto competitivo nacional propulsiona a
formação de alianças estratégicas por parte das subsidiárias. De um lado,
confirma o framework original de Porter (1990), que afirmava a importância do
ambiente competitivo para o desenvolvimento de inovações nas empresas nele
instaladas. Contudo, o resultado apresenta uma extensão pouco discutida em
relação ao modelo proposto. Em vez da empresa por si própria criar as inovações
como forma de internalizar e proteger o conhecimento auferido, os resultados do
presente artigo mostram que as subsidiárias buscam, também, auferir e explorar
esse conhecimento por meio de alianças estratégicas. A proposição é que esses
arranjos estruturais permitem às subsidiárias internalizar, de forma mais
rápida, as competências e inovações que o ambiente estrangeiro lhes
proporciona. Como as empresas do contexto são bem estruturadas e estão em
patamar de elevada competitividade, existe maior probabilidade dessas empresas
serem alvos de parcerias que agreguem valor às subsidiárias estrangeiras.
Adicionalmente, os resultados confirmam que não só o ambiente nacional é
importante, mas também o contexto competitivo internacional. Muitas das
alianças podem ser realizadas com empresas de outros países, principalmente se
essas são parceiros da multinacional em outros países. Desse modo, o resultado
suporta a argumentação de que os limites nacionais podem ser extrapolados pelas
empresas, quando elas fazem uso dos diamantes de outros países (Moon et al.,
1998; Rugman e D'Cruz, 1993). Além disso, o resultado fornece pistas da maneira
como as empresas fazem uso do diamante duplo. As alianças de uma subsidiária
brasileira com uma empresa argentina que faz uso de um diamante localizado na
Argentina, explica como o contexto competitivo internacional pode ser útil para
que uma empresa no Brasil, faça uso de conhecimentos e inovações que,
dificilmente, seriam desenvolvidas no Brasil, em virtude da não existência de
um diamante específico para aquela determinada atividade.
Além dos fatores estruturais do contexto nacional e internacional, o resultado
mostra que o enraizamento da subsidiária na rede de negócios propicia elevar a
relação para um relacionamento técnico de troca de conhecimento a ponto do
estabelecimento de alianças estratégicas. Desse modo, quanto melhor a relação
na rede, maior a possibilidade das subsidiárias formarem alianças estratégicas,
o que confirma os pressupostos da teoria das redes, que prega a evolução
estratégica das subsidiárias, não somente em razão das decisões internas, mas
dos laços estabelecidos com os parceiros de negócios (Forsgren, 2008). Contudo,
o resultado pressupõe que o centro da criação de valor (inovação e
conhecimento) não necessariamente precisa estar localizado dentro da
subsidiária, mas pode ser acessado com um parceiro da rede externa o que, em
outras palavras, extrapola os limites de centros de excelência (Andersson e
Forsgren, 2000; Frost et al., 2002) para uma dimensão além das fronteiras da
corporação.
Finalmente, os resultados mostram que as grandes subsidiárias estão mais
propensas a esses movimentos de alianças estratégicas. Essa constatação
encontra respaldo nas evidências de Oliveira Jr. et al. (2009), que mostram que
as grandes subsidiárias, além de terem uma melhor avaliação do ambiente
nacional, estão proporcionalmente mais envolvidas com atividades de inovação
global. Logo, sendo as alianças uma das possíveis fontes de aprendizagem, a
procura das grandes empresas tende a ser maior dado o fato de elas
continuamente terem de alimentar as suas competências internas, para manter sua
posição competitiva dentro da competição interna (Birkinshaw e Lingblad, 2005).
CONCLUSÂO
O artigo mostrou que as condições do contexto competitivo nacional e
internacional, assim como a inserção na rede de negócios, influenciam
positivamente o estabelecimento e manutenção de alianças estratégicas
realizadas por subsidiárias estrangeiras.
A temática abordada no artigo e o resultado auferido contribuem para o
incremento de um campo ainda pouco debatido: as alianças estratégicas
realizadas por subsidiárias estrangeiras (Seno-Alday, 2010; Aharoni e Brock,
2010). Embora exista um campo profícuo de estudos sobre alianças globais e
joint ventures, são escassos os estudos sobre as características e os fatores
que determinam a realização de alianças por subsidiária e que verificam o
impacto desse arranjo estratégico no sucesso e desenvolvimento de capacidades
organizacionais para as subsidiárias e multinacionais (Giroud e Scott-Kennel,
2009). Desse modo, ainda que o presente estudo apenas pressuponha o impacto das
alianças diretamente nas inovações, o resultado atesta que os fatores do
ambiente externo têm influência positiva na formação das alianças. Novos
estudos podem investigar a formação de alianças estratégicas realizadas por
subsidiárias, e o impacto exercido pelos fatores da relação matriz e
subsidiária e do ambiente interno da própria subsidiária.
Além disso, o estudo apresenta importante contribuição para o entendimento das
estratégias organizacionais realizadas por multinacionais. A constatação da
realização de alianças estratégicas afirma a evolução das estratégias
transnacionais para meta nacionais (Doz et al., 2001). Embora date de uma
década a apresentação do modelo meta nacional, a maior parte dos estudos ainda
foca a configuração transnacional como solução para a busca de conhecimento e
inovação por parte das multinacionais. O resultado do artigo permite levantar o
pressuposto de que as alianças estratégicas que estão sendo elaboradas não
somente procuram reduzir custo, mas tendem também a prospectar inovação e
conhecimento além das fronteiras da firma. Portanto, se o debate da estratégia
transnacional era entender os fatores e propulsores do desenvolvimento de
inovações nas subsidiárias, o presente artigo abre o debate para que se entenda
como e quais fatores propiciam a formação de alianças estratégicas e como o
conhecimento e inovação resultante dessas alianças seja internalizado na rede
corporativa interna.
Ademais, o presente artigo faz uma importante contribuição para os estudos que
investigam a operação das multinacionais em mercados emergentes. A formação das
alianças estratégicas por parte das subsidiárias evidencia os pressupostos de
que a multinacional de país desenvolvido pode obter sucesso nos mercados
emergentes a partir da exploração das alianças estratégicas com as empresas do
país hospedeiro ou de outros países emergentes (London e Hart, 2004). Essas
alianças permitiram suplantar problemas que as multinacionais de países
desenvolvidos não conseguiriam solucionar por conta própria.
Primeiro, as alianças seriam essenciais às multinacionais para auferirem
inovações específicas dos mercados emergentes que somente podem ser acessadas
por parceiros que entendem o modelo de negócios reinante nesses mercados
(Eyring et al., 2011). Segundo, as alianças serviriam para as multinacionais
suplantarem ou explorarem os vazios institucionais que encontram ao operar em
mercados emergentes (Khanna et al., 2010). Terceiro, as alianças poderiam
servir para explorar as externalidades positivas geradas por empresas do país
hospedeiro, ou mesmo por empresas multinacionais que atuam nesses países
(Meyer, 2004). Por fim, as alianças estratégicas poderiam inserir melhor as
empresas na rede de relações com os grupos de interesse, uma vez que essas
relações nos mercados emergentes são complexas e por vezes obscuras (Haley e
Haley, 2006).
Assim, uma vez que este artigo estabelece que as alianças de subsidiárias em
mercados emergentes são influenciadas pelo contexto nacional, internacional e
pela relação com a rede de negócios, futuros estudos, ao invés de identificarem
os fatores que impactam na formação de alianças, podem investigar como essas
alianças proporcionam a inovação, ou suplantam os vazios institucionais, ou
fazem uso mais eficiente das externalidades, ou ainda como inserem melhor a
empresa na relação com os grupos de interesse.
Limitações do estudo
As limitações do presente artigo se referem principalmente em relação à escolha
das variáveis para a composição do modelo de gestão. As variáveis que formam os
constructos independentes «contexto nacional», «internacional» e «redes» são
constituídas por percepções das próprias subsidiárias a respeito do ambiente.
Outra maneira que pode evitar o viés social embutido na percepção é montar os
constructos de diamante nacional, internacional e redes por meio de dados
secundários. Em verdade, essa tentativa foi empreendida inicialmente, porém não
executada devido a escassez dessas informações para cada setor analisado e para
a localidade das 172 empresas. Uma estratégia é procurar subsidiárias
específicas de certas localidades e setor, que tenham os dados secundários
disponíveis, e analisar as hipóteses aqui levantadas para verificar se existe a
confirmação das mesmas.