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EuPTHUAp1645-44642009000400002

EuPTHUAp1645-44642009000400002

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioHumanities
Great areaApplied Social Sciences
ISSN1645-4464
ano2009
Issue0004
Article number00002

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Limites da utilização da ética e da RSE como estratégia empresarial

Independentemente da realidade de cada país/economia ou sector de actividade, onde continua a existir um maior ou menor número de casos de empresas socialmente irresponsáveis (Smith-Hillman, 2007), a Responsabilidade Social das Empresas (RSE) é um desejo ou vontade política declarada, reforçada por uma tendência de interesse crescente por parte das instituições do Estado (Projecto Ser PME Responsáveldo IAPMEI), instituições internacionais (Comissão Europeia ' Livro Verde, 2001; ONU ' Global Compact), organizações não governamentais/ONG (RSE Portugal ou GRACE), imprensa, empresas (de concorrência e de consultoria em RSE) e investigação científica.

Liedekerke e Dubbink (2008) sublinham que a investigação no âmbito da RSE, sendo o tópico-chave da área da Ética dos Negócios, floresceu paradoxalmente mais na Europa do que nos EUA.

Grande parte da literatura da Ética dos Negócios e as convicções dos responsáveis de muitas das empresas sugerem, pois, que a ética e a RSE podem ser lucrativas (Jose e Thibodeaux, 1999; Hosmer, 2000; Husted e Allen, 2000; Livro Verde, 2001; Bird et al., 2007; Heugens e Dentchev, 2007). Argumenta-se também que a Responsabilidade Social e o desempenho económico da empresa estão relacionados positivamente (Lewicka-Strzalecka, 1999; Husted e Allen, 2000; Koslowski, 2002; António, 2003; Enderle, 2004). Alguns autores inclusivamente analisam e propõem condições em que as empresas, que assumem a ética e a RSE como estratégia, podem ganhar uma vantagem competitiva sobre a concorrência (Moreira e Cunha, 1997; Hosmer, 2000; Husted e Allen, 2000; McWilliams e Siegel, 2001; Burchell e Cook, 2006; Whitehouse, 2006; Heugens e Dentchev, 2007); incluem inclusive a ética e a RSE nos objectivos da empresa ou simplesmente falam da estratégia social das empresas (Husted e Allen, 2000; Whitehouse, 2006).

Este desejo crescente ou convicção levanta, contudo, uma questão de fundo: quais são os limites praxeológicos da utilização da ética e da RSE como estratégia empresarial? que isso deve ter limites para não acontecer que, afastando-se de um extremo (responsabilidade limitada), se chegue a outro extremo (responsabilidade total e ilimitada), tão indesejável como o primeiro.

Muitos dos argumentos da resposta a esta questão, provenientes de diversos autores citados adiante, remontam ao texto clássico de Milton Friedman (1970), contudo, a sua voz isolada não convenceu a maioria, provocando uma interminável avalancha de críticas. Ultrapassado o período de uma certa novidade da ideia e da euforia inicial com a RSE, pelo menos na Europa (ver Liedekerke e Dubbink, 2008), deve agora começar-se a ponderar as suas vantagens e desvantagens.

Mesmo assumindo que a inclusão da ética e da RSE na estratégia da empresa é frequentemente benéfica para esta última ou então que é prudente incluí-la (Friedman, 1970; Whawell, 1998; Kaler, 2000; Burchell e Cook, 2006; Whitehouse, 2006; Pater e Lierop, 2006) para não sofrer ameaças ou não causar danos à empresa (pressão das ONG, custas judiciais ou deterioração da imagem e da reputação, em resultado de acusações de práticas monopolísticas, assédio sexual, abuso de informação privilegiada, discriminação, corrupção, tráfico de influências, etc.), não será, por vezes, menos arriscado para a eficiência do alcance dos objectivos empresariais não as considerar? Segundo McWilliams e Siegel (2001), «existe um nível de investimento em RSE que maximiza os lucros, satisfazendo, ao mesmo tempo, a procura dos stakeholders para a RSE. Este nível de investimento pode ser determinado através da análise de custo-benefício. ( ); os gestores têm de tratar as decisões relacionadas com a RSE precisamente como tratam todas as decisões de investimento. ( ); as características de RSE são semelhantes a quaisquer outras características da oferta da empresa» (p. 125).

Na presente abordagem, tal como na literatura da área, assume-se a ética e a RSE como conceitos substitutos, equivalentes ou sinonímicos (Vogel, 1991; Ferrell e Fraedrich, 1997; Husted e Allen, 2000; Enderle, 2004; Rego et al., 2006), pois conforme realça Liedekerke e Dubbink (2008), o complexo conceito de Corporate Social Responsibility(CSR) sobrepõe-se a noções tão diversas como a ética dos negócios, a responsabilidade organizacional, cidadania organizacional, sustentabilidade, responsabilidade ambiental e filantropia organizacional.

A praxeologia, enquanto metodologia geral ou teoria de acção humana eficiente (Dudley, 1995; Gasparski, 1996; Freeman e Phillips, 1996; Swiatkiewicz, 1997), assume aqui apenas um papel acessório e instrumental, permitindo avaliar a incorporação de RSE na estratégia do ponto de vista de um duplo critério: da sua eficácia e eficiência.

O uso e o abuso da ética e da RSE «Neste quadro harmonioso de ética e de economia como aliados, pode-se encontrar características de wishfulthinking e sementes de complacência» (Paine, 2000, p.

319), tal como inúmeros mitos acerca da actividade económica (empresarial) a todos os níveis de conduta: geral, organizacional e individual (Geva, 2001).

«Ainda que seja possível e até provável que a ética compense a longo prazo, em geral, nos negócios, ela não compensará em ocasiões particulares nos negócios individuais» (Kaler, 2000, p. 162). Os bons tempos (prosperidade, desenvolvimento económico) são mais propícios à inclusão da ética e da RSE do que os tempos difíceis (Carr, 2003; Vuontisjärvi, 2006).

Mas, mesmo assim, «não é claro de que modo as companhias devem responder aos seus stakeholders e identificar as suas responsabilidades sociais» (Pater e Lierop, 2006, p. 339). Como sublinham Heugens e Dentchev (2007, p.164): «Os riscos da RSE podem ter um impacto significante sobre a capacidade de uma organização atingir os seus objectivos. Os riscos organizacionais podem provocar um sério rompimento dos processos nucleares de transformação organizacional e comprometer a realização de alvos e objectivos internos».

Segundo Buchholz e Rosenthal (1998), da conceptualização da RSE não resulta nenhum mecanismo específico para resolver a questão da afectação dos recursos organizacionais (eficiência da afectação). A articulação e a operacionalização dos três objectivos (triple bottom line) impostos ou assumidos voluntariamente pela organização (económico, social e ambiental) continuam a ser problemáticas (Fisher e Lovell, 2003). Whitehouse (2006) conclui do seu estudo que os gestores das empresas (em 16 companhias multinacionais presentes no Reino Unido) consideram difícil a medição do sucesso de implementação das suas próprias políticas de RSE.

A inclusão, para além do económico, de objectivos sociais e ambientais, como meios e/ou como fins, pode fazer com que a realização do primeiro seja muito menor do que esperado ou até tão reduzida que não permite a sobrevivência da organização. Numa situação destas, a empresa pode não resolver nem os seus problemas, nem os das suas partes interessadas (stakeholders).

Na literatura da área pressupõe-se que a promoção da ética e da RSE deve também ajudar a reduzir ou a atenuar alguns problemas sociais e económicos (desemprego, exclusão social e pobreza, poluição do ambiente e aquecimento global, etc.), pois, a conduta (não) ética e socialmente (ir) responsável dos actores da vida económica, condiciona o funcionamento do sistema económico como um todo (Argandoña, 1989; Lewicka-Strzalecka, 1999; Sen, 1999/02; Hosmer, 2000; Hosmer e Chen, 2001; Koslowski, 2002). Contudo, os resultados desse comportamento podem, por vezes, ser contraproducentes ou prejudiciais para a própria sociedade e para os seus sistemas económicos.

As estratégias que impõem padrões éticos podem ser usadas sem ter em conta se elas de facto ajudam ou prejudicam a sociedade ou alguns grupos. A RSE pode ser usada como vantagem competitiva através da imposição da convenção ética de uma empresa sobre um sector inteiro em que ela actua, daí que a RSE possa criar uma situação de monopólio para aquela empresa à semelhança de outros factores. «As estratégias éticas podem ser, por isso, descritas como práticas anti- competitivas, que restringem a competição efectiva de outras empresas no mercado» (Husted e Allen, 2000, p. 26).

As estratégias de RSE podem subverter um simples processo democrático, porque quando as empresas se envolvem em problemas sociais, começam a tomar decisões que podem não estar no melhor interesse de toda a sociedade (Husted e Allen, 2000).

pelo facto de as estratégias de RSE terem de adicionar valor à empresa, estas últimas tendem a ser conservadoras, concentrando o seu esforço nas causas populares ou politicamente correctas, não se envolvendo em causas controversas; «estima-se que 80% da filantropia empresarial é dirigida para as ‘questões seguras'» (Husted e Allen, 2000, p. 27).

Potenciais perigos de inclusão da ética e da RSE A diluição/enfraquecimento da atenção da gestão pela inclusão de RSE constitui uma ameaça porque faz com que os responsáveis percam da vista a estratégia comercial; corre-se o risco de distribuir os recursos de gestão disponíveis por um número crescente de alternativas de investimento (Heugens e Dentchev, 2007); enfraquece-se o sentido do dever dos gestores perante os proprietários (Friedman, 1970; Lewicka-Strzalecka, 1999).

A adopção da RSE pode constituir o risco de se gastar os recursos da empresa de forma não produtiva, canalizando-os para os objectivos que encorajam os stakeholders para o comportamento tipo free-riding. Pois a RSE, sendo parcialmente investimentos em bens públicos, significa a afectação dos recursos de uma empresa que podem ser usufruídos por todos, mesmo por aqueles que não contribuíram mas beneficiam da melhoria dos serviços públicos, inclusive a própria concorrência. A despesa com RSE acarreta também custos de oportunidade, no sentido em que cada euro gasto na RSE não pode ser investido noutras actividades geradoras de rendimento (Heugens e Dentchev, 2007; ver também Kirchler e Hölzl, 2003).

O alargamento da coligação organizacional pela inclusão dos interesses de todos os stakeholders, e não apenas dos críticos (estratégicos ou mais influentes), constitui uma ameaça porque uma coligação tão ampla pode tornar-se disfuncional, conduzindo ao caos e à anarquia (Heugens e Dentchev, 2007).

Contudo, muitos dos autores que apoiam a RSE apelam à inclusão de stakeholders tão ampla quanto possível.

O sucesso da estratégia pode ser comprometido por uma implementação defeituosa da mesma e um dos factores que impede a implementação de RSE com êxito é a falta de indicadores práticos do seu desempenho; muitos dos objectivos de RSE têm natureza etérea, tornando a sua quantificação difícil ou mesmo impossível (Fisher e Lovell, 2003; Whitehouse, 2006; Heugens e Dentchev, 2007). «A adopção de actividades de RSO, quando os cruciais stakeholders estão a ser excluídos devido a dificuldades de medição do sucesso da estratégia baseada na RSE, aumenta o risco da implementação defeituosa. ( ) A falta de apoio dos trabalhadores pode facilmente conduzir a problemas adicionais com a implementação da estratégia» (Heugens e Dentchev, 2007, pp. 156-162).

A diluição e o abuso do conceito de RSE reduzem a credibilidade da empresa.

Algumas empresas são percebidas como ilegítimas por natureza (indústria de tabaco, de álcool, pornográfica, militar/defesa ou petroquímica) e a adopção por elas de RSE não significa uma melhoria automática da imagem ou reputação, pelo contrário, pode agravar ainda mais a sua situação. A adopção de RSE por este tipo de empresas é encarada como hipocrisia e conduz à destruição da legitimidade (Heugens e Dentchev, 2007). Segundo Morsing e Schultz (2006), a situação mudou bastante, hoje em dia as expectativas dos stakeholders em relação à RSE são mais imprevisíveis e transversais para muitas indústrias, incluindo questões como o trabalho de menores, os organismos geneticamente modificados ou as sweatshops.

A adopção da estratégia de RSE consciencializa diversos públicos sobre a ligação que a empresa tem com os problemas sociais incorporados na sua estratégia, o que faz crescer a percepção e a convicção da sua responsabilidade total pela condução até à solução final destes problemas (Heugens e Dentchev, 2007). As empresas não devem tornar-se proprietárias de tarefas próprias de outras instituições (Estado, autarquias, ONG ou sociedade civil); não devem assumir-se como principais responsáveis pela resolução de todos e quaisquer problemas que competem aos outros. Segundo os resultados de um inquérito realizado por Burchell e Cook (2006), o diálogo entre ONG e as empresas, no que diz respeito às questões de RSE, segundo a maioria, tanto dos representantes das ONG, como das empresas, faz aumentar as expectativas dos stakeholders. Esta situação pode, portanto, conduzir a uma escalada de exigências de RSE das empresas.

As empresas podem sujeitar-se a uma duradoura deterioração da sua reputação se ignorarem ou não considerarem os perigos da comunicação insuficiente ou defeituosa dos riscos associados à adopção de medidas de RSE;a falha na comunicação clara e inequívoca da razão que está por trás dessas medidas contribui para o sentimento de ansiedade relacionado com as medidas de RSE que se cria na sociedade (Heugens e Dentchev, 2007). «A adopção de actividades de RSE pode aumentar o risco percebido, a que estão expostos os grupos externos, particularmente quando as empresas falham na comunicação sobre os seus motivos de adopção de práticas da RSE de modo conveniente às audiências exteriores» (Heugens e Dentchev, 2007, p. 157). A falha na comunicação sobre as medidas de RSE com os stakeholders externos será sempre percebida como uma campanha de relações públicas, assim como a associação do nome da empresa com determinados problemas sociais ou ambientais pode causar um vasto leque de efeitos indesejáveis colaterais, independentemente do cuidado com que a comunicação tenha sido feita.

A estratégia de RSE, que apoia causas impopulares ou controversas (e.g., combate ao HIV e apoio aos doentes com SIDA no início dos anos 1980, combate ao trabalho escravizado na Europa, ao tráfico de crianças/pedofilia e mulheres/ prostituição, ao narcotráfico, à corrupção no futebol, etc.) pode ser encarada com desagrado por certos grupos sociais ou partes da sociedade (Husted e Allen, 2000, p. 27).

Os consumidores finais continuam pouco conscientes das medidas de RSE, e mesmo aqueles que têm conhecimento da matéria, quando não optam por escolhas de melhor qualidade/preço nas decisões de compra, têm dificuldade em se orientarem segundo a RSE, porque não possuem a informação suficiente e relevante para o caso, mas também porque a busca desta informação exige um esforço exagerado (Whitehouse, 2006).

Os empresários e os gestores de mais alto nível das empresas têm pouca ou nenhuma experiência e escassos incentivos para se envolverem na resolução de problemas sociais e/ou ambientais (Friedman, 1970; Buchholz e Rosenthal, 1998; Husted e Allen, 2000); as empresas não estão aptas para resolverem problemas sociais; «poucas firmas têm experiência necessária para atender tais problemas como a pobreza, o analfabetismo ou a SIDA» (Husted e Allen, 2000, p. 26); problemas relacionados com os conflitos militares no continente africano, o desrespeito pelos direitos humanos no Tibete, etc.

Os contextos culturais, onde possam existir interesses potencialmente conflituais de um largo e diversificado espectro de stakeholders , tornam difíceis as decisões dos responsáveis das empresas no que diz respeito à aplicação mais eficiente dos recursos organizacionais (Bird et al., 2007). Esta situação torna-se ainda mais complexa num contexto multicultural, em que as empresas podem enfrentar os stakeholders que partem de normas divergentes ou opostas e que têm diferentes perspectivas daquilo que é uma conduta aceite e aceitável, porque não existe uma solução moral única e universal (Pater e Lierop, 2006).

A moral da história Ao terminar, retoma-se brevemente a questão axiológica dos meios e dos fins, dos valores/princípios instrumentais e superiores/supremos, que alimenta continuamente a literatura da Ética dos Negócios.

A forma estratégica de RSE, constituindo a instrumentalização da ética, é geralmente condenada pelos éticos como prenúncio da morte da ética (Liedekerke e Dubbink, 2008). Alguns expoentes máximos da Ética dos Negócios como Bowie (2001) consideram que a ética, por vezes, não compensará; porém, as empresas e os empresários deverão continuar a fazer o que está certo. Mas será isto possível e não apenas wishfulthinking? Onde estão os Dons Quixotes de la Mancha? A literatura (os manuais) de Gestão, ou mais amplamente das Ciências Empresariais, está repleta de casos de sucesso, por norma eticamente neutros ou positivos, ou então no extremo, na área da Ética dos Negócios, citam-se casos de violação de normas éticas e legais em prol do benefício económico e, por vezes, da sobrevivência organizacional, para se chegar à moral da história.

A história económica queda-se em silêncio sobre os homens («empresários») bons, uns «coitadinhos» que desgraçaram o negócio, provavelmente porque não ficou nada para contar. «No mundo de escassez de recursos, o desperdício deve ser considerado como imoral» (R. A. Posner citado por Koslowski, 2002, p. 56).

No extremo oposto, onde a afirmação de Bowie é considerada puro wishfulthinking, escolhe-se soluções utilitárias ou praxeológicas, onde se primazia aos critérios de eficácia e eficiência (modelo de gestão amoral e modelo de gestão imoral), em detrimento da dimensão ética. Mas cuidado: porque levando o assunto ao extremo, pode parecer possível levar em linha de conta as declarações proferidas por Jürgen (Josef) Stroop [1], após a devida descontextualização: «é a eficácia, e não a chamada moralidade, que constitui um dever de acção patriótica e nacional» (Moczarski, 2007, p. 112).

«A formulação apodíctica de normas éticas parece ser inadequada, porque dilui a importância da sua devida dosagem» (Ossowska, 1970/85, p. 23).

A identificação e a análise dos stakeholders, que constitui a cerne da RSE (McWilliams e Siegel, 2001; Burchell e Cook, 2006), teve na sua origem o reconhecimento da existência de vários públicos ou interesses da/na organização (Freeman, 2002). «A percepção principal foi de que os executivos tinham de dar alguma atenção estratégica aos grupos que eram importantes para o sucesso das suas corporações. Até ao momento [isso é] senso comum. ( ) O Capitalismo do stakeholder não é uma panaceia. Simplesmente permite que os negócios se tornem uma instituição plenamente humana» (Freeman, 2002, pp. 111-116).

Por outro lado, sabemos do quotidiano que «numa sociedade livre, não acontece forçosamente que apenas as pessoas ‘más' façam ‘mal'; basta que aquilo que é bom para uns venha a revelar-se mau para outros» (Friedman, 1970). Este é um dilema, a que se pode chamar clássico, da Ética dos Negócios e um argumento utilizado em sua defesa ou como a razão de ser da existência deste domínio do conhecimento. Contudo, dilemas deste tipo não são exclusivos da actividade económica ou empresarial, eles surgem em vários domínios da vida social humana, também estão presentes (MacIntyre, 1977/97).

O dilema do duplo critério (ético vs. eficiente) é bem expresso por Koslowski (2002): «não ninguém que queira viver numa sociedade justa onde não nada para comprar, nem numa sociedade rica e eficiente que aplica os seus recursos em fins moralmente repreensíveis. ( ) A forma de coordenação por via da propriedade, da maximização da utilidade ou do lucro, assim como por via do mercado não pode constituir oconteúdo da ordem social e da acção individual, tal como esta forma não pode ser abandonada caso se queira assegurar a liberdade e a eficiência na economia» (pp. 44-67).

Em última instância, resta-nos sempre a medida justa: «quando Aristóteles formulou a sua regra da medida justa, teve uma intuição acertada, no que diz respeito ao carácter dos nossos juízos de valor e das normas morais. O bem e o mal não estão, neste domínio, divididos por uma divisória explícita, mas constituem um contínuo, em que cada pessoa, após ter tomado consciência, tem de ser ela própria a determinar os limites» (Ossowska, 1970/85, p. 234).

Conclusões Existe um vasto leque de limitações à utilização de ética e de RSE como estratégia empresarial do foro praxeológico, abordadas aqui resumidamente e de modo introdutório, que os responsáveis das empresas, assim como os agentes/ actores sociais que promovem a ideia de RSE, devem ter em atenção.

Estas limitações podem comprometer a eficácia e a eficiência da estratégia, a continuidade do negócio e a sobrevivência das próprias organizações, contudo, não tem de ser necessariamente assim. A presente abordagem não pretende, de modo algum, reduzir a importância e os benefícios da RSE para as empresas e para a sociedade como um todo.

Foi aqui extensamente referido o trabalho de Heugens e Dentchev (2007), os quais, recorrendo à auscultação de peritos e à posterior confirmação no meio organizacional, discriminaram sete tipos de perigos em que as empresas incorrem, com intensidade diferenciada, investindo em RSE: quatro deles têm um maior impacto dentro da organização e são mais concretos do que simbólicos e têm maior influência sobre a coordenação interna e sobre os mecanismos de governação; três deles referem-se a grupos ou a pessoas fora da coligação dominante da organização e com um impacto ao nível das relações inter- organizacionais das quais a empresa faz parte, são mais simbólicos e têm maior influência sobre a legitimidade, a reputação e o capital social da organização.

No entanto, os sete tipos de perigos descritos por Heugens e Dentchev (2007) não esgotam o leque de situações que limitam a sua aplicação. Foram aqui acrescentadas ainda quatro situações provenientes da literatura, mas provavelmente haverá mais, e por isso é necessário continuar a investigação.

O esforço institucional levado a cabo pelos Governos, Comissão Europeia e ONU, bem como a propagação da ideia de RSE pelas ONG e a imprensa junto das empresas no sentido de incrementarem a sua responsabilidade e a sua responsabilização social e ambiental, têm de ter em atenção, em simultâneo, os critérios éticos e os de eficiência, assim como a aplicação da medida justa em cada caso. Amartya Sen (1999/02) ' prémio Nobel de Economia de 1998 ', relembrando os ensinamentos de Buda, igualmente aponta para o «caminho do meio».

Não é importante analisar os limites para além dos quais a estratégia pode tornar-se menos eficiente ou mesmo ineficiente, mas também as situações em que a ética e a RSE podem ser cruciais para a estratégia e o desenvolvimento das organizações.

Nota [1]Jürgen (Josef) Stroop, general das SS durante a Segunda Guerra Mundial, criminoso de guerra, declarado carrasco dos judeus do gueto de Varsóvia em 1943, assassino de centenas de milhares de pessoas de várias nacionalidades na Polónia, Grécia, Ucrânia, França e Alemanha, condenado à pena de morte pelo Tribunal Militar norte-americano em Dachau e pelo Tribunal Distrital de Varsóvia. Enforcado em 1951.


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