Aplicação de métodos estatísticos na avaliação da satisfação dos utentes com o
internamento hospitalar
1. INTRODUÇÃO
A satisfação do utente constitui a sua avaliação pessoal da qualidade dos
serviços de saúde que lhe foram prestados, podendo-se definir como o grau de
congruência entre as expectativas do utente e a sua percepção da qualidade dos
cuidados recebidos (Meister e Boyle, 1996).
Hoje em dia, a avaliação das percepções e da satisfação dos utentes em relação
aos serviços de saúde é considerada fundamental para a melhoria contínua da
qualidade dos serviços prestados, constituindo uma das áreas prioritárias de
investigação em serviços de saúde consideradas no Plano Nacional de Saúde 2004/
2010 (Direcção-Geral da Saúde, 2004).
As razões preconizadas por Aragon e Gesell (2003) que esclarecem a importância
da avaliação da satisfação dos utentes e consequentemente, a crescente
implementação de programas com vista à promoção da satisfação dos utentes nos
hospitais são as seguintes:
§ A constatação de que a satisfação dos utentes afecta
significativamente a reputação dos hospitais na comunidade;
§ A aceitação da satisfação dos utentes como uma importante medida
da qualidade dos serviços prestados;
§ O facto de os médicos prestarem cada vez mais atenção à satisfação
dos utentes devido à sua associação com a cooperação dos utentes, os
resultados clínicos e, mais recentemente, a propensão dos utentes
para instaurar acções legais contra os médicos.
O objectivo geral deste trabalho é estudar a satisfação dos utentes com o
internamento hospitalar, recorrendo a métodos estatísticos de análise
univariada, bivariada e multivariada.
Os objectivos específicos são:
§ Caracterizar os utilizadores do serviço de internamento
hospitalar;
§ Identificar os aspectos que mais contribuem para a satisfação
global do utente;
§ Identificar os aspectos perante as quais os utentes apresentam
maiores e menores índices de satisfação, identificando áreas chave de
intervenção;
§ Avaliar a relação entre a satisfação e as atitudes dos utentes, no
que diz respeito à sua intenção de regressar ao hospital, caso
necessite novamente de cuidados, e de recomendar o hospital a
familiares e amigos;
§ Obter um índice global que traduza a satisfação dos utentes com o
internamento hospitalar;
§ Estudar a influência de variáveis sócio-demográficas e de
variáveis referentes à experiência de internamento na satisfação dos
utentes;
§ Fornecer informação útil para a gestão dos serviços de saúde
centrada nos utentes.
2. METODOLOGIA
A população deste estudo é constituída pelos utentes adultos que estiveram
internados entre 2000 e 2004, pelo menos duas noites, em algum dos 20 hospitais
que aderiram ao projecto de avaliação da qualidade dos serviços de internamento
hospitalar desenvolvido pelo Centro de Estudos e Investigação em Saúde da
Universidade de Coimbra.
No período de recolha dos dados, 10 dos hospitais eram hospitais do sector
público administrativo (SPA): Hospital Distrital de Águeda, Hospital José
Luciano de Castro (Anadia), Hospitais da Universidade de Coimbra, Hospital de
São João (Porto), Hospital de São José (Lisboa), Hospital de São Marcos
(Braga), Hospital Distrital de Mirandela, Hospital Ortopédico Santiago do
Outão, Hospital Dr.Francisco Zagalo (Ovar) e Hospital Dr. José Maria Grande
(Portalegre) e 10 eram sociedades anónimas (SA): Hospital de Santo António
(Porto), Centro Hospitalar do Barlavento Algarvio (Portimão), Hospital de São
Sebastião (Santa Maria da Feira), Hospital Distrital da Figueira da Foz,
Instituto Português de OncologiaFrancisco Gentil (Coimbra), Instituto Português
de OncologiaFrancisco Gentil (Porto), Hospital de Santa Marta (Lisboa),
Hospital Pedro Hispano (Matosinhos), Hospital de Santa Luzia (Viana do Castelo)
e Hospital São Teotónio (Viseu).
Resultante de um processo de amostragem aleatória estratificada com afectação
proporcional (por serviço, faixa etária e género) e sujeita a uma taxa de
resposta de cerca de 37%, a amostra é constituída pelos 6383 utentes que
responderam ao questionário e o devolveram por correio.
Os dados em estudo neste trabalho foram recolhidos através do Instrumento de
Avaliação da Qualidade Hospitalar Internamento de Adultos (IAQH-IA),
concebido pelo Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de
Coimbra e denominado Como Vê o Internamento do Seu Hospital (Ferreira e
Mendes, 1997).
Este instrumento de medição com cerca de 100 perguntas, algumas das quais
abertas, é um questionário padronizado de auto-aplicação que tem como propósito
medir vários aspectos da satisfação dos utilizadores durante o seu percurso
pelos hospitais: admissão, cuidados diários, informação, enfermeiros, médicos,
outro pessoal e alta. O seu objectivo é fornecer à organização informação e
conhecimento mais profundo sobre a qualidade dos serviços prestados, sob a
perspectiva dos seus utilizadores.
Começou-se por caracterizar os utentes, a sua relação com o hospital e os
episódios de internamento através de estatística descritiva.
As variáveis referentes à avaliação da qualidade apercebida, da satisfação e
das atitudes, medidas através de escalas do tipo Likert com 4 ou 5 níveis,
foram convertidas numa escala de 0 (pior classificação) a 100 (melhor
classificação) e tratadas com se fossem quantitativas.
De seguida, recorreu-se à modelação de equações estruturais para desenvolver
modelos de satisfação e calcular índices de satisfação e de qualidade
apercebida, em termos globais e referentes a aspectos específicos,
nomeadamente, a admissão, os cuidados diários no hospital, a informação, o
pessoal de enfermagem, o pessoal médico, outro pessoal, as condições de
alojamento, a alta. A avaliação destes aspectos específicos resultou de médias
ponderadas dos respectivos itens incluídos no IAQH-IA, utilizando como
ponderadores os pesos obtidos a partir da aplicação de análises factoriais
confirmatórias. Foi contemplada nos modelos de equações estruturais a relação
entre a satisfação e as atitudes (recomendações/intenções).
Calculado o índice de satisfação global a partir do modelo de equações
estruturais proposto, estudaram-se factores que, de acordo com a literatura, o
podem influenciar, nomeadamente: características sócio-demográficos dos
utentes, características da relação dos utentes com o hospital, características
dos episódios de internamento, impacto do internamento, estado de saúde actual
dos utentes e quem preencheu o questionário.
O estudo dos factores determinantes da satisfação isoladamente foi realizado
recorrendo ao teste t para a diferença de médias (amostras independentes) e à
análise de variância, consoante o determinante defina 2 ou mais grupos,
respectivamente. Foram considerados significativos os valores de p inferiores
ou iguais a 0,05 e, muito significativos, os inferiores ou iguais a 0,01.
A análise multivariada dos factores determinantes da satisfação foi feita
através de árvores de classificação e regressão (algoritmo CRT Classification
and regression trees), tendo como variável dependente a satisfação global dos
utentes e como variáveis independentes todos os potenciais determinantes. Este
método foi adoptado pela boa capacidade de ajustamento que lhe é característica
e pela simplicidade da sua interpretação, permitindo predizer sem qualquer
cálculo valores para a variável dependente de novos indivíduos, observando a
que nó terminal devem pertencer tendo em conta os valores registados para as
variáveis independentes.
A análise dos dados foi realizada com recurso a dois programas de tratamento
estatístico de dados: o SPSS Statistical Package for Social Sciences (versão
15.0) e o AMOS Analysis of MOment Structures(versão 6.0).
2.1. Modelos de equações estruturais
Os modelos de equações estruturais têm vindo a ganhar popularidade na avaliação
da satisfação dos consumidores, o que advém, em parte, da sua aplicação em
projectos de grande dimensão que visam a avaliação da satisfação de clientes a
nível nacional, como é o caso do American Customer Satisfaction Index (ACSI,
descrito em www.theacsi.org) e do European Customer Satisfaction Index(ECSI,
descrito em www.ecsiportugal.pt), que seguem a linha metodológica do Customer
Satisfaction Barometer proposta por Fornell (1992). No que diz respeito à
saúde, para além de serem utilizados no âmbito do ECSI, os modelos de equações
estruturais foram utilizados noutros estudos recentes de satisfação de utentes,
tais como, Suhonen et al. (2007), Mark e Wan (2005), Larrabee et al. (2004),
Marley et al.(2004), Aragon e Gesell (2003), Fontana et al.(2003) e Fontana e
Rosenheck (2001).
Estes modelos incluem todo um conjunto de técnicas estatísticas que permitem
examinar relações entre uma ou mais variáveis independentes e uma ou mais
variáveis dependentes. Estes modelos são designados de diversas formas, tais
como, modelos causais, análise causal, sistemas de equações simultâneas ou
análise de estruturas de covariância. Por vezes, são também designados por path
analysis ou análise factorial confirmatória, contudo, estes são apenas dois
tipos de modelos de equações estruturais (Tabachnick e Fidell, 1996). São muito
populares nas ciências sociais, em que se assiste a um crescente interesse nas
técnicas de medição e em que a maior parte das teorias é formulada em termos de
construtos (variáveis latentes), usando-se medidas (indicadores) para os
representar. As equações estruturais mostram o quanto os indicadores reflectem
o construto (Kelloway, 1998).
Um modelo de equações estruturais é constituído por dois modelos:
§ Modelo estrutural: definido pelo conjunto de equações que definem
as relações entre as variáveis latentes;
§ Modelo de medida: constituído pelo conjunto de equações que
definem as relações entre as variáveis latentes e as variáveis de
medida (indicadores) do modelo.
A modelação de equações estruturais envolve 5 etapas: a especificação do
modelo, a identificação, a estimação dos coeficientes, a avaliação do
ajustamento e a reespecificação (Schumacker e Lomax, 1996).
A especificação do modelo diz respeito ao modelo teórico inicial formulado pelo
investigador, tendo por base o seu conhecimento do fenómeno em estudo e o
referencial teórico que o suporta. Optou-se por especificar dois modelos e
comparar os respectivos desempenhos.
Na etapa de identificação a questão chave é investigar se serão obtidos valores
únicos para os parâmetros estimados. Esta etapa pode ser complicada, contudo, o
AMOS realiza-a automaticamente.
A etapa de estimação dos modelos consiste em determinar os valores dos
parâmetros q que fazem com que a matriz de covariâncias S(q) seja tão próxima
quanto possível da matriz de covariâncias da amostra (S). Neste trabalho
seguiu-se a recomendação de Schumacker e Lomax (1996), tendo-se recorrido ao
método de estimação asymptotically distribution-free (ADF), uma vez que
dispomos de variáveis de medida categóricas ordinais (apesar de convertidas
numa escala de 0 (pior classificação) a 100 (melhor classificação) e tratadas
como quantitativas) e os respectivos coeficientes de assimetria e curtose não
variam entre -1 e 1.
O ajustamento dos modelos foi avaliado através de medidas de ajustamento
absoluto (que avaliam até que ponto o modelo global prediz a matriz de
covariâncias observada), nomeadamente, o RMR (root mean square residual), o GFI
(goodness-of-fit index) e o AGFI (adjusted GFI), e de medidas de ajustamento
parcimonioso (que avaliam a relação entre a qualidade do ajustamento de um dado
modelo e o número de parâmetros que é necessário estimar), nomeadamente, o PGFI
(parcimonious fit index), o AIC (Akaike information criterion) e o CAIC
(consistent Akaike information criterion).
A reespecificação ocorre, geralmente, quando a qualidade de ajustamento do
modelo especificado é fraca, não tendo sido necessária no âmbito deste
trabalho.
Optou-se por não incluir nos modelos variáveis com mais de 25% de valores
omissos e por substituir os valores omissos das variáveis incluídas nos modelos
pelas respectivas médias.
2.2. Árvores de classificação e regressão
As árvores de classificação e regressão (CRT) são uma das metodologias mais
utilizadas nos estudos de data mining e podem ser consideradas como modelos de
regressão não-paramétricos, que têm como objectivo estabelecer uma relação
entre o vector de variáveis independentes (covariáveis) e a variável resposta.
Os modelos são ajustados mediante sucessivas divisões binárias no conjunto de
dados, de modo a tornar os subconjuntos resultantes cada vez mais homogéneos,
em relação à variável resposta. Essas divisões são convenientemente
representadas por uma estrutura de árvore binária, na qual cada nó corresponde
a uma divisão numa covariável particular.
Nestas árvores, quer as covariáveis quer a resposta podem assumir valores
contínuos ou categóricos. Quando a resposta é categórica o modelo designa-se
por árvore de classificação; caso contrário, designa-se por árvore de
regressão. Neste trabalho, uma vez que a variável resposta é quantitativa
(índice de satisfação global), o modelo designa-se árvore de regressão.
As componentes básicas de uma árvore de classificação ou de regressão são os
nós e as regras de divisão (splitting rules). Os nós estão associados aos
subconjuntos resultantes da aplicação de uma regra de divisão ao conjunto de
dados. O primeiro nó de uma árvore, que corresponde ao conjunto de dados
completo, é chamado de nó raiz e os nós terminais denominam-se folhas. Os nós
gerados pela divisão de um nó já existente designam-se descendentes e o nó que
os originou é chamado de ascendente ou pai (Ferreira et al., 2001). Uma vez que
o método CRT desenvolve-se com vista à maximização da homogeneidade dentro dos
nós, a extensão em que um nó não representa um conjunto homogéneo de casos é um
indicador de impuridade. A medida de impuridade utilizada foi o LSD (least-
squared deviation). Na construção da árvore, o LSD faz com que apenas sejam
criadas partições em que a diferença entre a variância do nó ascendente e a
soma das variâncias dos dois nós descendentes (pesadas pela proporção de casos
de cada nó) seja superior a um dado valor definido, tendo-se optado pelo valor
0,0001.
Aplicou-se a técnica de pruning para reduzir a complexidade da árvore sem pôr
em causa a qualidade do ajustamento e evitar o problema de overfiting, ou seja,
para evitar que se ajuste excessivamente à amostra de modelação, não podendo
ser generalizado a outras amostras.
Para os casos em que a variável independente assumia valores omissos, recorreu-
se a surrogates, isto é, a outras variáveis independentes com elevada
associação à variável independente original e que são usadas na construção da
árvore (SPSS, 2004).
A avaliação da qualidade do ajustamento dos modelos fez-se através do risco
estimado que representa a variância dentro dos nós, que é a parte da variância
total (sem covariáveis) não explicada pelo modelo. Quanto menor for o risco
estimado, melhor é o modelo (SPSS, 2004).
A validação do modelo, que permite verificar até que ponto a estrutura da
árvore ajustada pode ser generalizada a outras observações, foi feita
utilizando metade da amostra como amostra de modelação e a outra metade como
amostra de validação.
3. RESULTADOS
Apresentam-se nesta secção uma breve caracterização dos utentes e dos episódios
de internamento, os modelo de equações estruturais ajustados e a análise dos
factores determinantes da satisfação.
3.1. Caracterização dos utentes e dos episódios de internamento
No que diz respeito à caracterização sócio demográfica, a tabela 1 mostra que
cerca de 58,4% dos utentes são do sexo feminino, predominam os idosos (utentes
com 65 ou mais anos) que constituem aproximadamente 39,4% da amostra, a maioria
dos utentes são casados (68,8%), predominam os utentes com o primeiro ciclo de
ensino básico (36,5%) e a maioria dos utentes (43,8%) classificou como razoável
o seu estado de saúde no momento de preenchimento do questionário.
Tabela 1 Características sócio demográficas
_____________________________________________________________________________
|Variável______________________|Categoria___________________|______N|_______%|
|Género_ _____________________| Masculino_ ______________|___2568|____41,6|
| _____________________________| Feminino_ _______________|___3603|____58,4|
|Idade__________________________| Dos_18_aos_24_anos_ _____|____331|_____5,4|
|_______________________________| Dos_25_aos_44_anos_ _____|___1574|____25,7|
|_______________________________| Dos_45_aos_64_anos_ _____|___1806|____29,5|
| _____________________________| 65_ou_mais_anos_ ________|___2413|____39,4|
| Situação_marital_ ________| Casado(a)_ ______________|___4251|____68,8|
|_______________________________| União_de_facto_ ________|____158|_____2,6|
|_______________________________| Solteiro(a)_ ____________|____692|____11,2|
|_______________________________| Viúvo_(a)_ _____________|____832|____13,5|
|_______________________________| Divorciado(a)_ __________|____178|_____2,9|
| _____________________________| Separado(a)_ ____________|_____68|_____1,1|
| Nível_de_literacia_ _______| Não_sabe_ler_nem_escrever|____704|____11,5|
|_______________________________| Só_sabe_ler_e_escrever_ |___1102|____17,9|
|_______________________________| 1º_Ciclo_do_Ensino_Básic|___2241|____36,5|
|_______________________________| 2º_Ciclo_do_Ensino_Básic|___1007|____16,4|
|_______________________________| 3º_Ciclo_do_Ensino_Básic|____524|_____8,5|
|_______________________________| Ensino_Secundário_ _____|____442|____72,0|
|_______________________________| Ensino_Médio_ __________|_____29|_____0,5|
| _____________________________| Ensino_Superior_ ________|_____92|_____1,5|
| Percepção_do_estado_de_saú| Excelente_ ______________|____469|_____7,6|
|_______________________________| Muito_boa_ ______________|____534|_____8,7|
|_______________________________| Boa_ ____________________|___1365|____22,2|
|_______________________________| Razoável_ ______________|___2699|____43,8|
| _____________________________| Fraca_ __________________|___1092|____17,7|
Observa-se na tabela 2 que cerca de 47,6% dos utentes nunca tinham estado
internados anteriormente nesse hospital, cerca de 87,3% dos utentes já foram
tratados nesse hospital na consulta externa ou na urgência, menos de 1% dos
utentes eram funcionários do hospital, mas, cerca de 7,6% dos utentes tinham
algum familiar que era funcionário do hospital. A maioria dos utentes (82,1%)
não sentiu dificuldades de transporte no acesso ao hospital e no regresso a
casa, 24,6% dos utentes responderam ter necessitado de muita ajuda para as
actividades diárias (comer, tomar banho, vestir, ir à casa de banho, ir para a
cama), predominam os utentes que sentiram algumas dores (40,3%), a maioria
(77,1%) afirmou ter-lhe sido marcada alguma consulta de seguimento e apenas
31,9% dos utentes afirmou ter recebido alguma explicação acerca de como
reclamar, caso sentisse necessidade.
Tabela 2 Características dos utentes e do internamento
_____________________________________________________________________________
|Variável____________________|______________________N|______________________%|
|1º_Internamento_____________|___________________2985|___________________47,6|
|Experiência_anterior________|___________________5359|___________________87,3|
|Funcionário_do_hospital_ __|_____________________56|____________________0,9|
|Familiar_de_funcionário_____|____________________456|____________________7,6|
|Dificuldades_de_transporte_ |___________________1099|___________________17,9|
|Não_necessitou_de_ajuda_ __|___________________2124|___________________34,0|
|Nenhumas_dores_ ____________|____________________757|___________________12,2|
|Marcada consulta de | 4770| 77,1|
|seguimento___________________|_______________________|_______________________|
|Foi dada explicação de como| 1765| 31,9|
|reclamar_____________________|_______________________|_______________________|
O tempo de internamento situou-se entre os 2 e os 2.970 dias, sendo a média de
19,86, com um desvio padrão de 64,55 dias. De referir que a moda é 3 dias, a
mediana é 9 dias e a média é 19,86 dias, denotando uma distribuição assimétrica
positiva, comprovada por um coeficiente de assimetria de 22,94. A partir desta
variável criou-se uma variável binária utilizando como ponto de corte a
mediana. A maioria dos utentes (86,5%) considerou que passou no hospital o
tempo necessário.
Cerca de 84,5% dos questionários foram preenchidos pelo próprio utente (sozinho
ou com auxílio), sendo de realçar o facto de 2,3% dos questionários terem sido
preenchidos por familiares ou amigos de utentes falecidos.
3.2. Modelos de equações estruturais
A tabela 3 apresenta as médias e desvios padrão dos indicadores da qualidade
apercebida e os pesos dos respectivos itens obtidos por análise factorial
confirmatória.
Tabela 3 Indicadores da qualidade apercebida
______________________________________________________________________________________________________
|Indicador___________|Média;_Desvio_padrão;_Itens_(pesos)____________________________________________|
|Admissão |Média: 53,70; Desvio padrão: 23,97 |
| |Eficiência do processo de admissão (0,721), preparação para o internamento |
|____________________|(0,893),_atenção_que_foi_dada_às_suas_necessidades_(0,671).___________________|
|Cuidados diários no|Média: 54,98; Desvio padrão: 26,46 |
|hospital |Satisfação das suas necessidades (0,909), coordenação de cuidados (0,927), aj|da
|____________________|e_simpatia_(0,926),_sensibilidade_para_os_problemas_(0,884)._____________________|
|Informação |Média: 52,65; Desvio padrão: 24,75 |
| |Facilidade em obter informações (0,854), informações (0,899), informações a|
|____________________|familiares_ou_amigos_(0,817).____________________________________________________|
| |Média: 55,28; Desvio padrão: 26,23 |
|Pessoal de |Aspectos técnicos (0,912), atenção prestada ao seu estado de saúde (0,916), |
|enfermagem |resposta às suas chamadas (0,862), cuidados e carinho (0,911), informação |
|____________________|fornecida_(0,874)._______________________________________________________________|
| |Média: 56,06; Desvio padrão: 27,13 |
|Pessoal médico |Atenção prestada ao seu estado de saúde (0,894), |
| |disponibilidade (0,817), cuidados e carinho (0,920), aspectos técnicos (0,916), |
|____________________|informação_fornecida_(0,886),_coordenação_(0,900).___________________________|
| |Média: 53,99; Desvio padrão: 20,66 |
|Outro pessoal |Pessoal auxiliar (0,776), pessoal do laboratório de análises (0,882), pessoal d|
|____________________|radiologia_e_imagiologia_(0,833),_maqueiros_(0,747)._____________________________|
| |Média: 51,25; Desvio padrão: 20,07 |
|Condições de |Privacidade (0,808), quarto (0,831), ambiente calmo (0,801), qualidade da |
|alojamento |alimentação (0,660), sinalização (0,768), edifício (0,744), estacionamento |
|____________________|(0,447),_visitas_(0,833),_horário_das_visitas_(0,730)___________________________|
| |Média: 50,92; Desvio padrão: 22,59 |
|Alta |Procedimentos da alta (0,821), planeamento da alta (0,925) e coordenação dos |
|____________________|cuidados_(0,783)_________________________________________________________________|
A qualidade apercebida do pessoal médico foi a melhor avaliada pelos utentes,
seguindo-se a do pessoal de enfermagem, a dos cuidados diários no hospital, a
do outro pessoal, a da admissão, a da informação, a das condições de alojamento
e, por último, a da alta.
O primeiro modelo de satisfação proposto (modelo 1), apresentado na figura 1,
teve como referência o modelo utilizado no âmbito da aplicação do ECSI à
avaliação da qualidade apercebida e da satisfação com os serviços de
internamento dos hospitais EPE, adaptando-o aos dados recolhidos com o
instrumento IAQH-IA. No que diz respeito à relação entre as variáveis latentes
imagem e qualidade apercebida, parece-nos mais adequada uma relação de
correlação do que uma relação de causalidade.
Figura 1 1º Modelo de equações estruturais proposto
O segundo modelo proposto (modelo 2) que não inclui a variável imagem, que no
contexto da saúde não nos parece ter muito interesse. A figura 2 apresenta este
modelo.
Figura 2 2º Modelo de equações estruturais proposto
A avaliação da qualidade do ajustamento destes modelos e a opção por um deles
foram realizadas a partir dos valores das medidas apresentadas na tabela 4:
Tabela 4 Medidas de avaliação da qualidade do ajustamento dos modelos
____________________________
|Medida|Modelo_1__|Modelo_2__|
|GFI___|0,82096___|0,81941___|
|AGFI__|0,74723___|0,74717___|
|RMR___|87,49992__|88,37808__|
|PGFI__|0,58151___|0,58529___|
|AIC___|4268,13910|4138,08160|
|CAIC__|4539,78787|4370,92341|
As medidas de ajustamento absoluto apresentaram valores ligeiramente melhores
para o modelo 1 (GFI e AGFI mais altos e RMR mais baixo) do que para o modelo
2, contudo, as diferenças são muito pequenas. Os valores obtidos para as
medidas de ajustamento parcimonioso demonstram que o modelo 2 é mais
parcimonioso do que o modelo 1, apresentando um valor um pouco mais alto para o
PGFI e valores consideravelmente mais baixos para o AIC e para o CAIC. Assim,
optou-se pelo modelo 2.
O modelo 2 é, assim, composto por 33 variáveis, das quais 14 são variáveis de
medida e 19 são variáveis latentes. No que diz respeito ao papel destas
variáveis no modelo, 17 são exógenas (ou independentes) e 16 são endógenas (ou
dependentes).
Os indicadores da qualidade apercebida, por ordem decrescente do seu peso, são:
pessoal de enfermagem (enf), cuidados diários no hospital (cui), pessoal médico
(med), informação (inf), outro pessoal (out), condições de alojamento (cond),
admissão (adm) e alta (alt).
No que diz respeito à satisfação, os indicadores com maior peso são Fui muito
bem tratado(a) pelos médicos (q61) e Fui muito bem tratado(a) pelos
enfermeiros (q62), seguindo-se a Qualidade do hospital impressão geral
sobre os cuidados e serviços que lhe foram prestados (q53) e Fui tão bem
tratado(a) no hospital que até comentei com a minha família e amigos (q56).
O indicador com maior peso nas atitudes é Recomendaria este hospital a um
familiar ou amigo(a) que precisasse de ser internado (q71), seguindo-se
Voltaria a este hospital caso precisasse de ser novamente internado(a) (q72).
Observa-se que a qualidade apercebida tem um impacto directo sobre a satisfação
muito elevado (0,93) e que o impacto directo da satisfação nas atitudes é baixo
(0,25).
O facto do impacto directo da satisfação nas atitudes ser baixo (0,25) mostra
que, satisfeitos ou não os utentes têm consciência de que as suas opções são
muito reduzidas, manifestando atitudes claramente mais positivas do que se
poderia prever.
O índice de qualidade apercebida apresentou um valor médio de 53,69 e um desvio
padrão de 20,77, o índice de satisfação global apresentou um valor médio de
59,93 e um desvio padrão de 25,81 e o índice de atitudes apresentou um valor
médio de 87,45 e um desvio padrão de 15,25.
No contexto da melhoria contínua da qualidade, a meta de qualquer organização é
obter índices de qualidade de média mais elevada, correspondentes à menor
variabilidade possível. A observação do diagrama de dispersão da média versus
desvio padrão de cada indicador da qualidade apercebida (figura 3) permite
identificar aspectos de satisfação/insatisfação homogénea/distribuída (Lambin,
2000).
Figura 3 Diagrama de dispersão da média versus desvio padrão de cada
indicador da qualidade apercebida
O diagrama de dispersão apresentado permite constatar que, relativamente à
informação observa-se uma insatisfação distribuída (média baixa e desvio padrão
alto), enquanto que para a alta e para as condições de alojamento observam-se
insatisfações homogéneas, ou seja, os utentes partilham a opinião de que estes
aspectos não têm a qualidade que deveriam. Relativamente aos cuidados diários,
ao pessoal de enfermagem e ao pessoal médico, observa-se satisfação distribuída
e, relativamente ao outro pessoal observa-se uma satisfação homogénea.
Por outro lado, o diagrama de dispersão da média de cada indicador da qualidade
apercebida versus o respectivo peso (figura 4) permite identificar os pontos
fortes dos hospitais em estudo, bem como, aqueles em que é prioritária a
implementação de acções correctivas.
Figura 4 Diagrama de dispersão média versus peso de cada indicador da
qualidade apercebida
A observação desta figura permite constatar que a informação é o aspecto em
relação ao qual é mais importante agir. Este aspecto está posicionado no
quadrante superior esquerdo, o que significa que apresenta um valor baixo para
a média e um impacto elevado na qualidade apercebida e consequentemente na
satisfação global, sendo por isso prioritário melhorá-lo.
As condições de alojamento e a alta também registaram valores médios muito
baixos, no entanto, estas duas variáveis têm baixos impactos na qualidade
apercebida, pelo que, importa tentar melhorar estes aspectos, mas não são
prioritários.
Os cuidados diários no hospital, o pessoal de enfermagem e o pessoal médico
podem ser considerados os pontos fortes dos serviços de internamento,
apresentando valores altos para a média e para o peso, isto é, posicionando-se
no quadrante superior direito.
3.3. Estudo dos factores determinantes da satisfação dos utentes
Tal como referido anteriormente, a influência de cada variável no índice de
satisfação global isoladamente foi feita através do teste t para amostras
independentes ou da análise de variância, sendo os resultados apresentados na
secção 3.3.1.
Para além da análise bivariada dos dados, foi também realizada uma análise
multivariada, cujos resultados se apresentam e analisam na secção 3.3.2.
Aplicou-se o método CRT, a partir do qual se construiu uma árvore de regressão
tendo como variável dependente a satisfação global dos utentes e como variáveis
independentes todos os potenciais determinantes.
3.3.1. Análise bivariada
Os valores observados para as estatísticas de teste (t ou F, consoante o
teste), os respectivos graus de liberdade e os valores p obtidos são
apresentados na tabela 5.
Tabela 5 Resultados obtidos através do teste t ou da Análise de Variância
_______________________________________________________________________
|Questã|Variável____________________________|t_ou_F__|g.l.____|Valor_p|
|90_____|Género______________________________|2,349___|6169____|0,019__|
|91_____|Faixa_etária________________________|0,765___|3;_6120_|0,513__|
|92_____|Situação_marital___________________|1,751___|3;_6175_|0,154__|
|96_____|Nível_de_estudos____________________|39,612__|6;_6134_|0,000__|
|1______|Internamentos_anteriores_____________|4,012___|3;_6266_|0,007__|
|2______|Experiência_anterior________________|-4,682__|6139____|0,000__|
|97_____|Funcionário_do_hospital_____________|0,059___|6003____|0,953__|
|98_____|Familiar_de_funcionário_do_hospital_|1,351___|5998____|0,177__|
|3______|Dificuldades_de_transporte___________|-2,108__|1759,274|0,035__|
|6______|Necessidade_de_ajuda_________________|27,785__|2;_6240_|0,000__|
|7______|Dores_sentidas_______________________|20,944__|3;_6196_|0,000__|
|8 |Tempo de internamento |-1,564 |5987 |0,118 |
|_______|(ponto_de_corte:_mediana)____________|________|________|_______|
|9______|Opinião_sobre_o_tempo_de_internament|22,483__|2;_5786_|0,000__|
|10_____|Marcação_de_consulta_de_seguimento_|2,152___|2721,200|0,031__|
|11_____|Explicação_de_como_reclamar________|-1,893__|2718,073|0,058__|
|54_____|Impacto_do_internamento______________|1913,264|4;_5973_|0,000__|
|77_____|Percepção_do_estado_de_saúde______|13,207__|4;_6154_|0,000__|
|99_____|Preenchimento________________________|6,773___|3;_6070_|0,000__|
A partir dos resultados expressos na tabela 5 e tendo em conta o índice médio
de satisfação global de cada grupo, pode-se afirmar que, no que respeita às
características sócio-demográficas dos utentes:
§ O nível de estudos apresenta uma influência muito significativa na
satisfação dos utentes, sendo os utentes com ensino médio ou superior
os mais insatisfeitos;
§ O género apresenta uma influência significativa na satisfação dos
utentes, sendo as mulheres as mais insatisfeitas.
Quanto à influência da relação dos utentes com o hospital na sua satisfação
global, os resultados mostram que:
§ O número de internamentos anteriores apresenta uma influência
muito significativa na satisfação dos utentes, diminuindo a
satisfação com o aumento do número de internamentos anteriores, ou
seja, os utentes mais satisfeitos são aqueles para quem este foi o
primeiro episódio de internamento no hospital;
§ A experiência anterior na consulta externa ou na urgência
influencia muito significativamente a satisfação dos utentes,
manifestando-se mais insatisfeitos os utentes que já passaram por
essa experiência.
No que diz respeito às características do episódio de internamento, observa-se
que:
§ Ter sentido dificuldades de transporte influencia
significativamente a satisfação, diminuindo-a;
§ A necessidade de ajuda para as actividades diárias influencia
muito significativamente a satisfação, manifestando-se mais
insatisfeitos os utentes que mais necessitaram de ajuda;
§ As dores sentidas durante o internamento influenciam muito
significativamente a satisfação, sendo os utentes que sentiram mais
dores os mais insatisfeitos;
§ A opinião sobre o tempo de internamento tem uma influência muito
significativa na satisfação, sendo os utentes que consideraram ter
estado internados o tempo necessário os mais satisfeitos;
§ A marcação, na alta, de uma consulta de seguimento influencia
significativamente a satisfação, sendo os utentes a quem foi marcada
consulta de seguimento os mais satisfeitos;
No que diz respeito ao estado de saúde:
§ O impacto do internamento, ou seja, a medida em que o internamento
contribuiu para as melhoras do utente, influencia de forma muito
significativa a sua satisfação global, aumentando a satisfação com o
impacto do internamento.
§ A percepção que os utentes têm do seu estado de saúde influencia
de forma muito significativa a sua satisfação global, sendo os
utentes que o classificam como excelente os mais satisfeitos e os que
o classificam como fraco os mais insatisfeitos.
A satisfação global manifestada através das respostas dadas a este questionário
é influenciada de forma muito significativa por quem o preencheu. Ter sido o
utente a preencher o questionário (sem ajuda) conduziu a um maior índice médio
de satisfação. De referir que o índice mais baixo registou-se no conjunto de
questionários respondidos por familiares ou amigos de doentes que faleceram, o
que poderá significar que estes se dispuseram a responder com o intuito de
manifestar o seu desagrado.
3.3.2. Árvore de regressão
As principais características dos nós terminais da árvore de regressão ajustada
à amostra de modelação estão apresentadas na tabela 6. Identificando a que nó
terminal um novo indivíduo pertencerá, o respectivo índice de satisfação global
pode ser estimado pela média desse nó.
Tabela 6 Principais características dos nós terminais
________________________________________________________________________________________________
|N?Caracterização |Número de |Média|Desvio |
|__|_________________________________________________________________|observaçõe|______|padrão|
|4_|Impacto_do_internamento:_Bom.____________________________________|1307________|57,083|17,947_|
|5_|Impacto_do_internamento:_Muito_Bom.______________________________|695_________|74,139|17,417_|
|6_|Impacto_do_internamento:_Excelente.______________________________|479_________|86,719|13,695_|
|7_|Impacto_do_internamento:_Mau.____________________________________|199_________|17,500|17,900_|
|9 |Impacto do internamento: Regular. |372 |34,610|19,440 |
|__|Percepção_do_estado_de_saúde_actual:_Todas,_excepto_excelente.|____________|______|_______|
|10|Impacto do internamento: Regular. |100 |44,515|19,842 |
|__|Percepção_do_estado_de_saúde_actual:_Excelente._______________|____________|______|_______|
Os utentes mais satisfeitos encontram-se no nó 6, com uma média de 86,719,
sendo aqueles para quem o impacto do internamento foi excelente. No sentido
oposto, encontram-se no nó 7 os utentes mais insatisfeitos, com uma média de
17,500, sendo aqueles para quem o impacto do internamento foi mau. Neste nó
observa-se uma elevada variabilidade de valores, sendo o desvio padrão
ligeiramente superior à média (17,900).
O risco estimado para a amostra de modelação foi de 305,660, com um erro padrão
de 8,884. Para a amostra de validação, obteve-se um risco estimado de 300,776,
com um erro padrão de 8,388. Os valores obtidos para o risco estimado nas duas
amostras indicam que não ocorreu overfiting, sendo o risco estimado inferior na
amostra de validação. A variabilidade da variável dependente observada no nó
zero, ou seja, sem covariáveis, foi de 659,668 para a amostra de modelação e
676,468 para a amostra de validação. Uma vez que o risco estimado representa a
parte da variância não explicada pelo modelo, constata-se que a percentagem de
variância explicada foi de 54% para a amostra de modelação e de 56% para a
amostra de validação.
O nível de estudos, apesar de não constar da árvore de regressão, assume um
papel importante no modelo como surrogate. O mesmo acontece de forma menos
acentuada com as variáveis: dores sentidas durante o internamento, tempo de
internamento, funcionário do hospital, opinião acerca do tempo de internamento
e situação marital.
4. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
Cada vez mais, é reconhecida a importância de apoiar as decisões estratégicas
em evidências. Os resultados apresentados poderão ser utilizados no âmbito da
gestão hospitalar, informando os decisores acerca da opinião dos utentes sobre
os cuidados que lhes são prestados.
O papel dos utentes é fundamental, sendo estes quem melhor conhece a realidade
vivida nos hospitais. A sua opinião não pode ser descurada, sendo extremamente
importante que os hospitais realizem periodicamente estudos de avaliação da
satisfação dos seus utentes, como o que aqui se apresenta. Este estudo tem um
âmbito mais geral, uma vez que os dados não caracterizam apenas o serviço de
internamento de um hospital, mas sim os serviços de internamento de uma amostra
representativa dos hospitais públicos portugueses.
Os modelos de equações estruturais permitiram obter ponderadores para o cálculo
do índice de satisfação global e também analisar os pesos dos indicadores nas
respectivas variáveis latentes e os impactos entre variáveis latentes. É de
salientar o forte impacto da qualidade apercebida na satisfação e o fraco
impacto da satisfação nas atitudes (intenções e recomendações).
Apesar da comparação ser impossível pelo facto dos dados resultarem de
questionários estruturalmente diferentes, pode-se referir que o índice de
satisfação global apresentou uma média de 59,93, consideravelmente mais baixa
que a obtida para os hospitais EPE aplicando o ECSI, que, de acordo com os
resultados disponíveis em www.hospitaisepe.min-saude.pt, foi de 80,5 em 2003 e
de 81,7 em 2005. Um aspecto que pode explicar esta diferença é a forma de
aplicação do questionário. Os dados analisados neste artigo foram recolhidos
por via postal, enquanto que os dados do ECSI foram recolhidos por telefone.
Apesar das desvantagens inerentes à aplicação do questionário por via postal,
nomeadamente, o grande número de valores omissos e a baixa taxa de resposta,
este parece-nos ser o método de recolha de dados mais apropriado a este tipo de
estudo. Entrevistas pelo telefone, resolvendo o problema da taxa de resposta,
levantam um outro com maior impacto no enviesamento dos resultados: o anonimato
dos respondentes. Ao reconhecer que as suas respostas não são anónimas, os
respondentes podem sentir-se inibidos e não dizerem o que realmente pensam.
Por outro lado, o nível de pormenor das perguntas de cada dimensão faz com que
o IAQH-IA levante questões algumas delas eventualmente não equacionadas
anteriormente pelo utente. Esta abordagem é relevante pois o objectivo da
aplicação deste questionário é contribuir para a melhoria contínua da qualidade
e não apenas proceder a um diagnóstico para fins estatísticos.
A informação foi identificada como o aspecto em que é prioritário agir, sendo
um aspecto em relação ao qual os utentes se revelam descontentes e cujo peso na
qualidade apercebida é elevado. Trata-se de um aspecto em relação ao qual se
registou uma insatisfação distribuída, observando-se, simultaneamente, uma
média baixa e uma elevada variabilidade nos dados.
Os cuidados diários no hospital, o pessoal de enfermagem e o pessoal médico
foram identificados como os pontos fortes dos hospitais em estudo: os utentes
valorizam-nos e estão satisfeitos com o seu desempenho. Contudo, estes são
aspectos em relação aos quais se observa uma satisfação distribuída,
verificando-se grande variabilidade nas avaliações realizadas pelos utentes, o
que pode significar a necessidade de maior adequação às necessidades dos
utentes.
A análise da influência de cada potencial determinante na satisfação permitiu
concluir que o nível de estudos, o número de internamentos anteriores no mesmo
hospital, a experiência anterior na consulta externa ou na urgência, a
necessidade de ajuda e as dores sentidas durante o internamento, a opinião
sobre o tempo de internamento, o impacto do internamento, a percepção do estado
de saúde actual e quem preencheu o questionário são factores com influência
muito significativa no índice de satisfação global. O género, as dificuldades
de transporte sentidas no acesso ao hospital e a marcação, na alta, de uma
consulta de seguimento apresentam também influências significativas no índice
de satisfação global.
As árvores de classificação e regressão são geralmente utilizadas para
identificar grupos homogéneos e predizer valores para a variável resposta.
Apesar de não permitir a formulação de testes de hipóteses e a construção de
intervalos de confiança, tem como atractivo a facilidade de interpretação.
Evidenciou a influência do impacto do internamento, do nível de estudos e da
percepção do estado de saúde actual na satisfação global dos utentes.
Uma limitação sentida neste estudo e que é comum à generalidade dos estudos de
satisfação realizados a partir de escalas é o facto de os valores obtidos serem
de natureza categórica (ordinal) e de serem tratados como se fossem
quantitativos. Apesar da conversão dos valores para uma escala de 0 a 100 ter
sido feita assumindo uma relação linear entre a qualidade efectiva (que se
procura quantificar na escala) e a avaliação ordinal feita pelo utente, esta
relação é complexa. As curvas de valor que a representam podem variar
consideravelmente consoante as expectativas e o grau de exigência dos utentes.
Não dispondo de informação adicional que permitisse agir de outra forma, optou-
se por considerar uma relação linear, que não nos parece desajustada uma vez
que existirão curvas de valor inferiores e outras superiores, podendo-se pensar
que se optou por uma situação intermédia. Uma linha de investigação futura será
identificar a curva de valor que melhor caracteriza cada tipo de utente,
utilizando-se posteriormente essa informação na passagem dos valores ordinais a
quantitativos.
Pretende-se dar continuidade a este trabalho, implementando técnicas de análise
multivariada que nos permitam extrair mais conhecimento desta base de dados,
bem como de outras que resultem da aplicação deste instrumento noutros
hospitais ou da reaplicação aos mesmos hospitais, que permitirá uma análise
longitudinal dos indicadores obtidos.
Apesar deste estudo ter incidido apenas sobre a avaliação da satisfação dos
utentes com o internamento hospitalar, recomenda-se a aplicação destas
metodologias na avaliação da satisfação dos utentes com as urgências e com as
consultas externas.