Áreas para o acolhimento das actividades empresariais no Algarve: Estratégias e
instrumentos de gestão territorial
1. Introdução
Passados mais de 20 anos desde a entrada em vigor do Plano Regional de
Ordenamento do Território do Algarve (PROT 1991), e quase outros tantos desde a
publicação da grande maioria dos planos directores municipais (PDM) dos 16
municípios da Região, considerou-se pertinente analisar os conteúdos e as
directrizes dos documentos estratégicos, e as orientações emanadas dos planos
de escala supra-municipal, assim como as interpretações e as transposições que
delas fizeram os instrumentos de gestão territorial (IGT) em matéria de
implementação de áreas para o acolhimento de actividades empresariais. Estas
áreas correspondem aos espaços definidos nos instrumentos de gestão territorial
(sobretudo nos PDM) expressamente para a instalação de unidades industriais,
grandes estabelecimentos comerciais, operadores logísticos e serviços
relacionados com as actividades produtivas.
A pouca clareza e assertividade dos documentos orientadores para aquelas
actividades, que contribuiu em grande medida para uma actuação dos municípios
pautada pela inconsistência, incoerência e ausência de articulação num plano
regional (que as actividades empresariais exigem) teve, e tem, como resultado
no território e no sector empresarial, uma eficácia muito aquém da visada pelos
postulados enunciados pelas estratégias. Todavia, há casos (poucos) de sucesso,
com reconhecimento fora da Região, fruto de iniciativas isoladas (públicas e
privadas), que se configuram como "modelos" adoptáveis a outros
contextos territoriais, mais ou menos dinâmicos ou periféricos.
Um primeiro esforço de monitorização das áreas empresariais no Algarve teve
início em 2009. A CCDR Algarve disponibilizou a plataforma
www.algarveacolhe.com, para divulgar junto de potenciais investidores na Região
a oferta de terrenos e instalações, para venda ou aluguer, nos espaços
definidos pelos IGT da Região do Algarve para usos empresariais. Pretendeu-se
colmatar a ausência de informação sobre a oferta regional para fins
empresariais, inibidora da concretização das intenções descritas nos documentos
estratégicos para a Região, que referem a necessidade de diversificar a base
económica, demasiadamente assente na construção / imobiliária / turismo.
Este projecto permitiu estruturar os elementos essenciais para efectuar uma
análise em duas vertentes: i) conhecer, em termos quantitativos e qualitativos,
o tecido empresarial da Região; e ii) observando a dinâmica de instalação das
empresas, avaliar a aderência aos objectivos traçados nos documentos da
estratégia de desenvolvimento regional veiculados pelos IGT. Parte-se da tese
de que os objectivos do PROT 91 (DR n.º 11/91, de 21 de Março) quanto à
dinamização e desenvolvimento de um sector produtivo regional forte e inovador,
não foram ainda alcançados. Constata-se também que os IGT em vigor, que
supostamente traduziriam as orientações da estratégia regional, não foram
eficazes na implementação das intenções que tinham subjacentes quanto à
distribuição e localização das áreas para fins empresariais. Porém, é
incorrecto inferir que a responsabilidade caberá apenas aos IGT, por não terem
"cumprido" as orientações dos documentos estratégicos ou dos planos
supramunicipais ou regionais. Como se tentará demonstrar, não só os IGT
(administração local) pouco atenderam aos respectivos enquadramentos regionais
(ou mesmo sub-regionais), como também as próprias estratégias não continham
linhas programáticas e de operacionalização e, sobretudo, não avaliaram as
estratégias anteriores. Ou seja, no caso em análise, os enquadramentos
estratégicos que se vêm sobrepondo partem, persistentemente, de uma ausência de
avaliação da implementação das estratégias anteriores.
As relativas incoerências do processo de planeamento como instrumento de
ordenamento do território eficaz têm sido identificadas e debatidas por vários
autores sob diferentes perspectivas (sobre a avaliação do interesse público na
ocupação e uso do solo ver Needham, 2006). A evidência resultante desta
reflexão e da análise de diversos casos de estudo tem demonstrado que as
dinâmicas de uso e transformação do solo são relativamente autónomas na
resposta a dinâmicas locais e de mercado, não sendo consentâneas, por um lado,
com visões positivistas do planeamento associadas a padrões de zonamento
rígidos e, por outro lado, com a diversidade de agendas dos diferentes níveis e
tutelas da administração pública. (ver, por exemplo, Portas et al, 2003 e 2011;
Cabral e Crespo, 2010). Neste artigo pretende-se apenas apresentar um exemplo
concreto de um domínio - o zonamento e a programação de áreas para
actividades empresariais - que não tem a montante uma prática consistente
de avaliações e um acervo suficiente de estudos de caso.
Luís B. Soares (2004, pp. 96), reconhece que a "generalização dos PDM
veio reforçar as competências e a 'autonomia' da gestão autárquica
no respeitante ao ordenamento do território municipal, mas, ao mesmo
tempo" instalar "uma visão fragmentada e localista dos problemas
territoriais e da sua resolução", e considera que tal terá sido acentuado
"pela ausência de políticas e de instrumentos de ordenamento do
território de escala supramunicipal". Ou seja, teriam faltado
"políticas de enquadramento" e prevalecido "a total
incapacidade de produzir instrumentos de coordenação e integração territorial
dos planos municipais" (Soares, 2004, pp. 96). Porém, como se tentará
demonstrar, a "intervenção descoordenada, casuística e sem orientações
consistentes" que "teve, muitas vezes, efeitos directos na
incoerência e posterior falta de aplicabilidade dos planos" imperou mesmo
com o enquadramento de um PROT: o PROT Algarve (1991), anterior a qualquer um
dos 16 PDM. Não será, então, apenas um problema de ausência de quadro de
referência estratégico, integrador e de escala regional, mas sim um problema
com, pelo menos, duas vertentes: i) a clareza e assertividade desse e de
posteriores quadros orientadores, para o tema que o presente artigo aborda: as
áreas para as actividades empresariais; e ii) uma das "condicionantes de
fundo" do "debate sobre a política regional para o país"
reside nas "práticas dos distintos actores locais e regionais, e a sua
disposição e capacidade para se pensarem colectivamente em função de um
projecto territorial comum" (Ferrão, 2004, pp. 74).
A desarticulação e a descoordenação estão presentes em dois momentos: i) na
geração inicial de planos supramunicipais e regionais, entre entidades e
organismos da administração central e central desconcentrada; ii) na seguinte
geração desses planos nos quais as entidades da administração local foram
chamadas, senão a uma elaboração conjunta, pelo menos à concertação, prevista
pela Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e Urbanismo, LBPOTU
(Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto; e DL n.º 380/99, de 22 de Setembro). Assim,
não é apenas, numa primeira fase, uma desarticulação entre conceptualizadores e
executores (dois níveis distintos), mas também a posterior extensão dessa
desarticulação para um quadro de responsabilidades comuns e partilhadas por
aqueles dois conjuntos de agentes. O artigo reporta somente à componente
actividades empresariais e à sua territorialização mas, eventuais análises
sobre outras actividades do "projecto territorial comum" -
turismo, rede urbana e equipamentos, as actividades agrícolas, etc. -
apresentariam muito certamente os mesmos resultados.
Houve legítimas expectativas de que, feito o balanço em matéria da avaliação
dos PDM e da articulação entre os níveis da administração, suprimidos ou
corrigidos os constrangimentos e aspectos críticos, melhoradas as componentes
instrumentais (cartografia, recursos humanos, etc.) e, sobretudo, com a nova
lógica de abordagem das questões do território veiculadas pela LBPOTU, poderiam
vir a ter lugar mudanças no planeamento e gestão das transformações do
território. A LBPOTU redefiniu a atribuição de competências e responsabilidades
na gestão territorial (pelas escalas central, regional e local), e partiu de um
optimismo no qual estavam criadas as condições para a melhor articulação entre
as estratégias, a montante, e o exercício do planeamento, a jusante. Estariam
assim melhoradas as condições para uma "cultura de reflexividade,
concertação estratégica e cooperação de base territorial" (Ferrão, 2004,
pp. 74).
A Revisão do PROT (2007) é elaborada neste quadro. Os planos da competência da
administração central têm um carácter essencialmente estratégico, cabendo aos
municípios, em sede de plano director, definirem a estratégia de
desenvolvimento municipal e o modelo de ordenamento territorial. Como se
tentará demonstrar, a estratégia veiculada pela Revisão do PROT, em matéria da
programação de áreas de acolhimento empresarial é vaga, ainda mais do que o
documento estratégico que lhe esteve subjacente (EDA 2007-2013), para além de
que o Observatório criado para a monitorização da implementação do PROT não
contempla, como havia sucedido com o PROT 1991, as áreas de acolhimento
empresarial. Assim, contrariando o quadro optimista que conferia "maior
importância às visões estratégicas e aos processos de formulação, execução,
acompanhamento e avaliação das políticas…" (Ferrão, 2004, pp. 75), no
qual as CCDR poderiam não apenas desempenhar um papel como "gestor
estratégico do desenvolvimento territorial", mas também "corrigir
os erros do passado" e "promover novas formas de relação
institucional entre departamentos da administração central e entre estas e as
autarquias" (Soares, 2004), verificou-se que, pelo menos no Algarve, a
oportunidade não foi aproveitada, e o papel não foi cumprido.
A expressão territorial e, assim, a relativa eficácia das estratégias
delineadas e dos instrumentos para a sua operacionalização é visível sob as
mais diversas formas. A olho nu, ao percorrer o principal eixo viário da Região
- a EN/ER 125 -, torna-se evidente. Por um lado, a imparável
ocupação da envolvente daquele eixo por pequenas e médias indústrias, pequeno e
grande comércio, oficinas e serviços, quando os IGT definem outros usos para a
grande maioria dos terrenos ocupados por aquelas actividades. Por outro lado,
estando os PDM em vigor há já 15-20 anos, esperar-se-ia que, sobretudo ao longo
do mesmo eixo, houvesse no terreno uma expressão do uso que o plano define, uma
transposição para o terreno das suas intenções. No entanto, observam-se
ocupações idênticas em ambos os lados do eixo - proliferação de
estabelecimentos -, quando o plano define usos distintos para cada um dos
lados do eixo. Duas décadas decorridas sobre a vigência dos PDM, seria já tempo
de se ter no terreno a correspondente dos usos que constam nas plantas de
ordenamento dos planos.
Esta questão orienta a investigação para outro nível de interrogações que o
artigo procurará enquadrar. Será que a distribuição de áreas para o acolhimento
de actividades empresariais e a sua programação/execução decorre da
transposição para os PDM de uma estratégia desadequada? Porque é que os PDM não
conseguiram romper com lógicas de localização anteriores - isentas do
exercício de planeamento e ordenamento - que privilegiaram as
localizações "naturais" definidas por factores como, em regra, a
proximidade aos principais eixos e nós viários? Será que os PDM assumiram
diagnósticos superficiais, ou errados, e não incorporaram evidências, não
previram tendências e não entenderam as lógicas de localização das áreas
empresariais? Para tais questões, e para se entender o generalizado insucesso
das orientações em matéria de áreas empresariais, as respostas, mesmo que
parciais, são afirmativas.
Por esse motivo, são utilizadas expressões como "relativa eficácia"
ou "relativo insucesso". Há, porém, exemplos bem-sucedidos de como
a estratégia definida no PDM, suportada por uma vontade política forte e por
uma eficiente programação e afectação de meios, está a ter resultados e a
cumprir os objectivos referidos nas estratégias regionais e nos IGT.
Identificar-se-ão exemplos e concluir-se-á com um dos objectivos fundamentais
da ideia subjacente à plataforma www.algarveacolhe.com: a identificação de bons
exemplos de áreas de acolhimento empresarial que se podem constituir como
modelos a seguir em sede de revisão dos PDM.
2. Os espaços para o acolhimento empresarial nos documentos estratégicos e nos
IGT
Ao longo do artigo serão utilizadas expressões com significados semelhantes mas
que se reportam a realidades diferentes. Para melhor se compreender o conteúdo
e o contexto em que expressões como áreas de acolhimento empresarial (ou área
para o acolhimento de actividades empresariais) e espaços para o acolhimento de
actividades empresariais são utilizadas, entende-se por conveniente uma prévia
clarificação. A primeira reporta-se a uma concentração de empresas e de
actividades (em parcelas ou lotes), e de instalações livres (para venda e ou
aluguer). Estas aglomerações de empresas, actividades e superfícies/instalações
disponíveis apresentam as mais diferentes formas e géneses e os mais diversos
graus de programação, ocupação e de compactação. Entende-se por espaços para o
acolhimento de actividades empresariais aqueles que foram inscritos nos planos
municipais de ordenamento do território (PMOT) para a circunscrição das áreas
de acolhimento empresarial. Estes espaços são bastante heterogéneos,
compreendendo um vasto leque de ocupações e de usos. Embora os PDM os tenham
circunscrito para fins industriais e empresariais, em alguns casos já
existentes à data da sua elaboração e publicação, em muitos deles persistem as
ocupações e usos anteriores - habitação, agricultura, etc.
Como se depreende, existem espaços sem áreas e áreas fora de espaços. Neste
artigo serão abordadas as dinâmicas ocorridas nos espaços e respectivas áreas,
essencialmente porque é para esses espaços que, por imperativos do ordenamento
do território, se deverão transpor e materializar as estratégias de
desenvolvimento. Serve também esta clarificação para afastar qualquer eventual
interpretação daquelas duas terminologias como transposições de uma figura
legalmente criada com a designação de Área de Localização Empresarial (ALE),
criada e definida pelo DL nº 46/2001, de 10 de Fevereiro. Não existe no Algarve
nenhuma área enquadrável nesta figura, embora duas áreas, referidas mais
adiante, apresentem alguns dos seus aspectos distintivos.
2.1. O Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (1991)
O PROT Algarve (1991) continha muito poucas orientações, e muito genéricas,
sobre as áreas de acolhimento empresarial. Para a questão das áreas
empresariais limitou-se a identificar "áreas alternativas de concentração
industrial" e a sugerir a sua localização na envolvente de 4 aglomerados:
Tunes, Faro, Loulé e Castro Marim. O plano sugeria as 4 novas áreas de escala
sub-regional (as existentes estariam saturadas?), adiantava parâmetros
genéricos (dimensão, distância ao aglomerado mais próximo, etc.), e recomendava
o fomento de uma rede de pequenas áreas, de âmbito local.
Este plano revelou-se pouco assertivo quanto a orientações para as áreas de
acolhimento empresarial, e delegou a matéria nos PDM. Não teria sido precoce a
referência à diversificação do tecido produtivo regional, como posteriores
documentos estratégicos a fizeram. À época (1991), as preocupações eram o
ordenamento e a contenção da expansão urbana, o esforço de impedir a
descaracterização física da Região, a salvaguarda dos atractivos e das
potencialidades turísticas e a protecção dos espaços naturais, ameaçados por
duas décadas de intensa construção. Por outro lado, este plano não tinha
associado um programa de execução que identificasse os domínios de actuação, as
acções/projectos a desenvolver, uma estimativa dos montantes financeiros
necessários, a definição de prioridades e as fontes de financiamento.
A irrelevância dada pelo PROT 1991 à questão do acolhimento empresarial ficou
evidente no Estudo de Avaliação do PROT Algarve 1989/1996 (CEDRU, 2000).
Reportando-se aos primeiros 5 anos de vigência do PROT, o estudo aborda uma
série de domínios - demografia, sistema urbano, infraestruturação do
território, etc. - com algum pormenor mas, em matéria de áreas
empresariais, a abordagem é muito sumária: constata-se a perda de população
activa na indústria; e afirma-se não terem sido "… cartografadas áreas
industriais concretas mas apenas concentrações industriais…" (CEDRU,
2000, pp.9). A avaliação aborda a transposição das orientações do PROT para os
PDM quanto ao zonamento e criação de áreas de âmbito local/municipal mas,
contrariamente a outras dinâmicas abordadas (por amostragem), não se debruça
sobre a programação, a emissão de alvarás, a infraestruturação, a instalação de
empresas e a ocupação das áreas empresariais. Destaque-se ainda a opinião dos
autarcas quanto aos "efeitos gerados pelo PROT Algarve 1991" no
domínio "actividade industrial": um autarca não respondeu; onze
consideraram os efeitos "nulos"; e os restantes quatro consideraram
os efeitos "positivos mas reduzidos" (CEDRU, 2000, pp. 153).
2.2. As áreas de acolhimento empresarial nos planos directores municipais
Houve, refere a avaliação, uma concordância dos PDM com as orientações
veiculadas no PROT. Não terá sido plena, também porque as orientações eram
vagas mas, efectivamente, foram definidas nos PDM as 4 "áreas
alternativas". Da mesma forma, foram definidas "as segundas
linhas" de "áreas afectas ao uso industrial, de interesse local ou
concelhio…"(CCR Algarve, 1990, pp. 48). Contudo, nem as primeiras se
afirmaram como o "cordão" de áreas empresariais de âmbito sub-
regional, nem as segundas como uma segunda linha de áreas de nível hierárquico
inferior. A delimitação destas áreas nos PDM, tendo que ser inclusiva com as
pré-existências e acolher outros condicionalismos, produziu um quadro de áreas
caracterizado por uma extrema heterogeneidade, tendo no entanto um aspecto bem
vincado: a ausência de uma hierarquia de áreas empresariais definida nos níveis
sub-regional e local/municipal, como o PROT pretendia. Como resultado, os 16
PDM aprovados após o PROT definiram um total de 64 espaços para acolhimento de
actividades empresariais.
Sendo expectável, face às especificidades dos municípios da Região, que existam
concelhos com mais espaços que outros, é no entanto óbvio que, na elaboração
dos PDM, não houve uma lógica comum a todos os concelhos no que respeita à
definição e delimitação de espaços para fins empresariais. Os parâmetros
indicados pelo PROT, quanto a dimensões e distância aos centros urbanos, terão
sido também interpretados como meramente indicativos. Das 4 "áreas
alternativas", apenas duas (Loulé e Castro Marim) têm mais de 50 ha (as
outras duas têm 13,6 e 8,7 ha). Algumas destas áreas não passaram de intenções
uma vez que, ou não tiveram concretização (Tunes e Castro Marim) ou, quando a
tiveram, ficou aquém do esperado (S.B. Alportel). A concretização falhou
também, no caso destas quatro áreas (que se pretendiam estruturantes), pelos
seguintes aspectos: i) na generalidade, os acessos não foram executados; ii)
frequentemente, o perímetro definido em PDM não considerou (ou remeteu a
questão para um plano de ordem inferior), o cadastro e a existência de outros
usos, designadamente o uso habitacional.
Haveria mais aspectos a considerar na avaliação da execução das 4 áreas
propostas pelo PROT. No entanto, e passados 20 anos sobre a sua entrada em
vigor, a melhor avaliação consistirá, sem dúvida, na actual ocupação destas
áreas. Apenas uma destas áreas (Loulé) cumpriu o seu desígnio. As restantes
nunca se afirmaram. A área de S.B. Alportel tem 5 estabelecimentos; as de Tunes
e Castro Marim nunca se concretizaram.
A delimitação de espaços para as actividades empresariais nos PDM terá assim,
com o enquadramento genérico dado pelo PROT, seguido outras lógicas incutidas
por cada um dos municípios e das equipas que os elaboraram. Na ausência de uma
metodologia de origem, poder-se-á a posteriori estabelecer um conjunto de
tipologias de espaços para o acolhimento empresarial que enquadra os 64 espaços
definidos nos planos. Assim, os PDM: i) delimitaram áreas onde havia já
concentrações de empresas; ii) circunscreveram áreas com loteamentos
industriais e comerciais executados antes dos PDM (incluindo, por vezes,
terrenos na envolvente para eventuais expansões); iii) circunscreveram grandes
unidades industriais que, não constituindo áreas empresariais, não poderiam ter
outra classificação no PDM que não a industrial; iv) identificaram áreas,
interessantes em termos de proximidade a nós viários, considerando que o
conjunto de estabelecimentos existente (nalguns casos, muito reduzido) fosse
capaz de atrair outros estabelecimentos; v) identificaram áreas onde, não
havendo pré-existências de natureza empresarial, se considerou, atendendo à
proximidade de nós/eixos viários, ou de lugares com dimensão, que deveria
existir um espaço para fins empresariais.
2.3. As áreas de acolhimento empresarial definidas em planos de pormenor
Os PDM, nos artigos que dispõem sobre as "áreas industriais, comerciais e
de serviços", são claros quanto à obrigatoriedade de os espaços serem
objecto de Planos de Pormenor (PP) ou operações de loteamento. Em rigor, apenas
em 1 dos 64 espaços previstos nos PDM houve lugar à elaboração, aprovação e
publicação de um plano de pormenor (PP da Área Industrial de Santa Margarida
- Tavira, RCM nº 24/2003, de 19 de Fevereiro). As restantes programações
foram por via dos loteamentos. Porém, apenas em 24 dos 64 espaços definidos em
PDM para fins empresariais tiveram lugar operações de loteamento aprovadas e
executadas posteriormente à data de entrada em vigor dos planos, sendo que
daqueles, 5 tinham já loteamentos anteriores à entrada em vigor dos planos.
Para além daqueles 24 espaços, há ainda outros 7 com operações de loteamento
concretizadas antes da entrada em vigor dos planos. Constata-se, assim, a fraca
programação dos espaços previstos nos PDM, uma vez que, mesmo contabilizando os
que tinham já loteamentos concretizados, em apenas 31 dos espaços previstos em
plano (48% do total) - somente 23% do total da superfície prevista no
conjunto dos PDM - teve lugar a programação para fins empresariais. Nos
restantes 33 espaços (e 77% da superfície) a ocupação permanece, grosso modo,
idêntica à que existia antes dos PDM.
A consciencialização, por alguns executivos camarários, de que o
"exercício de planeamento" subjacente ao padrão de localização e a
estratégia de programação de espaços para as actividades empresariais expressos
nos PDM não estaria a resultar, terá sido a razão para, muitos anos após a
entrada em vigor dos planos, terem sido publicados 9 PP - Portimão,
Tavira, Faro, Lagos (3), Loulé (2) e Castro Marim - que contemplam, total
ou parcialmente, lotes para acolher empresas. Todos estes PP significaram
alterações dos PDM, em terrenos afectos a outros usos e condicionantes, e levam
à conclusão de que, pelo menos nestes municípios, houve o entendimento que, não
forçosamente o número de espaços previstos, mas sobretudo as suas localizações
e os mecanismos para a programação destas áreas, não seriam os mais adequados.
Este "reforço" de novos espaços é passível de várias
interpretações: i) muitos dos definidos em PDM não se revelaram interessantes
para a iniciativa municipal (e privada); ii) mesmo nos espaços com vocação para
as actividades empresariais, a iniciativa privada foi insuficiente para a
constituição de uma oferta de terrenos e de instalações, pelo que os municípios
chamaram a si a iniciativa de definir e programar estas áreas.
Note-se também que estes 9 planos são muito posteriores à entrada em vigor dos
PDM (entre 10 e 16 anos). Considerando que a vigência destes últimos é de 10
anos, seria este o tempo em que os municípios estariam, não a publicar PP que
alteram os usos definidos nos PDM, mas sim a concluir os respectivos processos
de revisão, a apresentar a redefinição da estratégia para as actividades
empresariais e a transpô-la para o zonamento. Ao invés, os PP vêm coexistir com
os espaços definidos nos PDM; não vieram desenvolver e concretizar as
estratégias e propostas do plano director mas, sem as rever, adaptar ou (mesmo)
suprimir, resultam num averbamento de "novas orientações" -
não articuladas e repensadas num quadro mais vasto de âmbito regional ou
municipal - para o desenvolvimento das actividades empresariais. Não
houve uma revisão da estratégia para as actividades empresariais, mas sim a
sobreposição (ou justaposição) da anterior, e do seu zonamento, com intenções
isoladas.
As evidências sustentam estas conclusões. Alguns dos municípios (Loulé,
Portimão) que publicaram PP são municípios onde a oferta de lotes e de
instalações é largamente excedentária. Em Castro Marim, onde em 10 anos não se
fixou uma empresa no espaço definido em plano, sem se demonstrar real ou
potencial capacidade de captação de empresas, publicou-se um PP em cuja área se
poderia concentrar 1/3 de todos os estabelecimentos instalados no conjunto de
todos os 73 espaços da Região. Destaque-se que, destes 9 planos, apenas um foi
concretizado (Portimão), embora nenhuma empresa ainda se tenha fixado. Os
restantes oito planos não tiveram concretização. Para completar esta breve
retrospectiva sobre as dinâmicas dos espaços definidos nos PDM para as
actividades empresariais, julga-se pertinente, porque corrobora a falta de
dinamismo apontada, referir a absoluta inexistência de aprovações, em matéria
de áreas empresariais, em sede do Programa Operacional Regional (QCA II, 1994-
2001) - ou seja, nos primeiros 6-7 anos de vigência dos planos directores
-, e a uma procura igualmente muito baixa[1] no quadro comunitário
seguinte (PO Regional, QCA III, 2000-2006).
2.4. As áreas de acolhimento empresarial na "Estratégia de
Desenvolvimento do Algarve" (2007-2013) e na Revisão do PROT Algarve, de
2007
O falhanço, nesta matéria, foi assumido no diagnóstico da Estratégia de
Desenvolvimento do Algarve 2007-2013 (CCDR Algarve, 2006). A análise refere que
"… apesar da relativa concentração espacial das empresas industriais há,
em contrapartida, uma significativa dispersão de zonas industriais na região, …
(…). Esta dispersão contrasta igualmente com a ausência de áreas de localização
industrial, em termos específicos, e de localização, em termos gerais"
(CCDR Algarve, 2006, pp. 24).
Inequivocamente, o documento reconhece a ineficácia das anteriores estratégias
e planos. É referida "… uma ausência de planificação para a implantação
industrial nos aglomerados e zonas industriais. Não existe qualquer
levantamento sistematizado da tipologia de empresas localizadas nessas áreas
nem uma estratégia específica para o sector que permita seleccionar as
indústrias a atrair para aqueles espaços" (CCDR Algarve, 2006, pp. 24).
As orientações propostas pelo PROT não colheram e a aplicação e gestão dos PDM
descurou a planificação das "zonas industriais". O estudo refere
ainda: "a persistência de um absoluto desconhecimento da ocupação das
áreas de acolhimento"; e, "concomitantemente, a ausência de uma
estratégia que permita definir as actividades que deverão ser captadas e
fixadas naquelas áreas." Registe-se que estes aspectos ficaram amplamente
comprovados nos levantamentos efectuados no quadro do projecto
www.algarveacolhe.com. Em muitos espaços definidos em PDM, mesmo em loteamentos
municipais, muitos dos estabelecimentos não são das actividades que se
pretenderia inicialmente acolher.
Para além de apontar a indefinição/difusão do padrão locativo das áreas
empresariais, o documento critica a ausência de uma estratégia de atracção de
empresas, a não definição de um perfil das empresas a atrair, e ainda a
inexistência de "entidades gestoras" que consigam fazer descolar as
áreas existentes de meros loteamentos "onde foram instaladas as
infraestruturas base convencionais" sem uma "gestão
condominial".
Actualmente, vários anos passados sobre o diagnóstico (de 2006), parte
significativa dos municípios não tem qualquer loteamento ou área de iniciativa
municipal afecta a estes usos e, outros, nem tão pouco de iniciativa privada.
Com excepções, os loteamentos municipais são áreas que os municípios
urbanizaram e alienaram a preços baixos, permitindo que os proprietários dos
lotes os mantenham expectantes. Não está prevista a reversibilidade dos lotes
e, quando há de facto a instalação de um estabelecimento, não há critério de
selecção (para além das restrições de natureza ambiental).
Desta forma, os municípios abdicaram da capacidade de implementar uma
estratégia de captação e fixação de empresas e de definir um rumo para o sector
produtivo do município. Não deixa de ser notório, designadamente pela
discordância que, após a delegação nos municípios de competências nos domínios
do ordenamento do território e do licenciamento de actividades (que os
municípios vinham reclamando), uma boa parte dos municípios receba as
competências e não as exerça, como instrumentos que são, para o crescimento
económico e o desenvolvimento dos seus concelhos, precisamente os argumentos
levantados na reclamação das competências.
A EDA 2007-2013 refere a necessidade de "… uma nova estratégia de
atracção de empresas de nova geração, … conjugar a disponibilidade de infra-
estruturas avançadas, acessibilidades de qualidade, serviços qualificados de
apoio…",enfatiza a necessária "organização planeada do
espaço" e propõe "assegurar a criação de uma rede de áreas
empresariais…". As prioridades e linhas de actuação para operacionalizar
tais intenções referem a "promoção de zonas de localização empresarial
consolidadas que assegurem o ordenamento das actividades económicas e da
logística regional" e a definição de "um modelo de localização de
Zonas Industriais de Nova Geração para a implementação de empresas com forte
conteúdo tecnológico" (CCDR Algarve, 2006, pp. 25).
O documento contém ainda, para além do diagnóstico crítico sobre a actuação das
entidades públicas e do sector privado, uma nova terminologia. Deixou de haver
referência às "áreas industriais" e são melhor especificados os
"formatos" de aglomeração das actividades produtivas: a assunção da
logística como um vasto conjunto de actividades que envolve, a montante e a
jusante, a tradicional transformação e que, assim, importa beneficiar das
sinergias propiciadas pela aglomeração; o destaque para a necessidade de criar
áreas para empresas e serviços intensivos em conhecimento - os
"centros/pólos de transferência tecnológica".
As propostas constantes na EDA 2007-2013 viriam a ser transpostas para a
Revisão do PROT Algarve (RCM n.º 102/2007, de 3 de Agosto); quer porque a
entidade responsável pela elaboração de ambos é a mesma - CCDR Algarve
- quer porque os consultores nestes domínios foram, também, os mesmos.
Todavia, e tendo a figura do PROT, por força das alterações introduzidas na
LBPOTU, adquirido um carácter orientador e estratégico, serão os PMOT a
efectuar a "tradução" destes princípios e normativas.
Na Revisão do PROT Algarve, dificilmente se vislumbrariam as áreas para o
acolhimento empresarial se o documento, por entre parques temáticos, museus,
teatros, hospitais, centros de congressos, etc., não identificasse os
equipamentos de âmbito regional "estruturantes para o sistema territorial
do Algarve…". De entre uma listagem numerosa, sobressaem: um
"Tecnopólis Portimão-Lagos - 2 centros especializados na criação de
actividades inovadoras e sistemas inteligentes"; um "Pólo
Tecnológico da Universidade do Algarve, no Parque das Cidades"; um
"Parque das Novas Actividades Aglomeração Faro-Loulé-Olhão, incluindo o
Pólo Tecnológico do Algarve"; e mais 3 parques, obviamente tecnológicos,
em outras tantas localizações, de sectores como a cortiça, as ciências do mar e
a energia solar (CCDR Algarve, pp. 47).
O acolhimento empresarial é também abordado no ponto "1.7 Estruturação
das Redes de Transporte e Logística", nomeadamente nos Objectivos
Operativos para a Rede Logística, onde é referida a concretização do
"sistema regional de logística e áreas de localização empresarial
apoiado" em 4 centros de âmbito regional - "Centro
Empresarial e de Logística de Tunes"; "Área de Negócios do
Sotavento Algarvio"; "Mercado Abastecedor da Região de Faro
(MARF)" e "Área Empresarial do Barlavento" - e a
conclusão e consolidação da "rede de parques empresariais
municipais". Em suma, a Revisão do PROT Algarve 2007 consegue ser, ainda,
mais genérica do que a EDA.
Não pretendendo a confrontação exaustiva sobre o que dispõem o PROT 1991 e a
sua Revisão para as áreas empresariais, há no entanto importantes semelhanças e
dissemelhanças a destacar, a saber: i) a Revisão de 2007 enuncia 6 pólos
tecnológicos, transpondo assim para o território mais uma terminologia do que
propriamente projectos concretos; ii) a manutenção de uma perspectiva de
hierarquização das áreas empresariais - 4 centros de âmbito regional e
uma rede de áreas municipais; iii) a assunção, mais clara em 2007, de que as
áreas do sistema regional deverão posicionar-se no corredor do principal eixo
viário - a A22 -, atribuindo-se assim às actividades logísticas o
ambiente "enquadrador" das áreas de localização empresarial; iv) a
Revisão do PROT deixa de referir as áreas para Loulé e São Brás de Alportel; v)
a Revisão do PROT confirma uma área consolidada e em funcionamento - o
MARF -; "repesca" no PROT 1991 duas áreas que não tiveram
concretização - Tunes e Castro Marim -; e "lança" uma
nova área - Área Empresarial do Barlavento -, sem antecedentes e
sem posteriores desenvolvimentos. Houve porém, na Revisão do PROT, a
preocupação de associar ao documento um Programa de Execução, embora meramente
indicativo.
3. Situação actual dos espaços dos PMOT para fins empresariais
Em resultado dos processos de definição, programação e ocupação dos espaços
para actividades empresariais, o cenário actual, em termos de número,
distribuição, génese, e forma/tipologia (espontânea ou programada) das áreas
empresariais é muito heterogéneo. Após a apresentação, nos pontos anteriores,
numa sequência cronológica necessariamente muito sintetizada, da constituição e
génese dos espaços para o acolhimento de actividades empresariais no Algarve,
faz-se a seguir um resumo da situação actual destes espaços, assim como das
figuras pelas quais se constituíram.
Os PMOT (PDM e sequentes PP) previram um total de 73 espaços para o acolhimento
de actividades empresariais. É, sem dúvida, um número excessivo. Tal significa
que está previsto em PMOT um espaço para o acolhimento de actividades
empresariais em cada 68,5 km2; ou seja, distando em média do espaço mais
próximo não mais do que 8,3 km. Destes 73 espaços, somente 43 tiveram
programação (PP ou loteamento), sendo que apenas houve execução em 35 destes
43; ou seja, e em relação ao total (73 espaços em PMOT), apenas houve, em quase
duas décadas de PDM, execução em 48% dos espaços. Porém, a taxa de ocupação dos
lotes é baixa. Uma parte bastante significativa dos 1.585 lotes executados, não
tem edificação e está livre (22% do total); e uma outra parte também
significativa das naves edificadas nos lotes (13,3%) está para venda ou
aluguer, sendo que uma parte importante destas naves nunca teve ocupação. Por
outras palavras, somente 52% dos lotes tem empresas a laborar.
Quanto a empresas instaladas nos espaços definidos nos IGT, o seu número é de
885 (empresas e estabelecimentos). Mais relevante que o número destas empresas,
sem dúvida baixo, é a sua estrutura: i) apenas 167 das empresas (18,9%) estão
classificadas nas actividades industriais; ii) apenas 38 (4,3%) estão nas
actividades afectas à logística e transportes; iii) e apenas 181 (20,4%) estão
classificadas como comércio grossista. Os serviços às empresas são em número
residual e as empresas classificadas em sectores como o comércio retalhista e
stands e oficinas auto têm um peso excessivo (32%). Em número significativo, e
crescente, estão as empresas de serviços pessoais e domésticos, clubes e
associações recreativas e culturais, incluindo equipamentos na área da saúde e
até escolares. Como resultado, mais de metade das empresas instaladas não
parece ter enquadramento nas classes de espaço tal como estão definidas nos
PDM.
O grande número de espaços e de tipologias resultam da coexistência no
território: i) das anteriores concentrações de empresas (industriais,
comerciais e outras) ou grandes unidades fabris isoladas que os PDM; ii) das
áreas que, com os PDM, foram executadas, esmagadoramente por via de loteamentos
e só muito excepcionalmente por PP; e iii) das áreas que, antes da revisão dos
PDM, foram programadas em sede de PP (apenas uma foi executada, e não tem ainda
qualquer ocupação).
Em matéria de "espontaneidade" das áreas empresariais, reconhece-se
a acção positiva dos IGT: desde o PROT 1991 e a entrada em vigor dos PDM, não
surgiram mais concentrações de empresas em regime de licenciamento individual.
Ou seja, procedendo à circunscrição das antigas áreas ocupadas pelas unidades
transformadoras tradicionais - não significando contudo que tenha havido
uma estruturação ou requalificação destas áreas de forma a melhorar as
condições de laboração - a entrada em vigor dos PDM terá, pelo menos,
impedido novas concentrações "espontâneas". Pontualmente,
instalaram-se unidades, armazéns e superfícies (grossistas ou retalhistas) sem
enquadramento a montante mas, regra geral, começou a prevalecer a figura do
loteamento. Porém, sendo esta a realidade nos espaços previstos para a
instalação de actividades empresariais nos PDM, o mesmo não ocorreu fora deles.
Sobretudo na envolvente dos grandes eixos, persiste a instalação de
estabelecimentos e de actividades que, pela sua natureza, deviam estar nas
áreas para tal previstas nos PDM.
Com os PDM vingou a figura do loteamento. De um total de 49 loteamentos para
fins empresariais, 36 (73% do total) foram na vigência dos PDM; embora apenas
73,6% da área destes 36 loteamentos esteja concretizada. Por outro lado, a
grande maioria destes loteamentos (31 em 36) são de particulares. Isto é, com
os PDM, os municípios praticamente abdicaram da figura do loteamento municipal,
por via dos quais poderiam concretizar a estratégia de captação e fixação de
empresas (mecanismos de redução fiscal, baixo custo dos terrenos, etc.) com
relação com a base produtiva local e geradoras de cadeias de valor. Dos 11
loteamentos municipais existentes na Região, apenas 5 são posteriores aos PDM.
Tem, assim, prevalecido uma generalizada ausência da iniciativa municipal para
a dotação dos territórios com as infraestruturas e as condições para procederem
à relocalização de estabelecimentos disseminados e atraírem empresas. A
situação afigura-se eventualmente mais preocupante quando se verifica que, dos
16 municípios, 5 não têm qualquer loteamento para estes fins.
Como forma de sintetizar, não propriamente numa classificação dos espaços para
actividades empresariais segundo as intenções e objectivos dos documentos
estratégicos e dos PMOT, mas mais numa "arrumação" segundo a forma
como os espaços se afirmaram (ou não) no território - i.e., relacionando
as intenções em plano com a dinâmica efectiva desses espaços -,
apresenta-se uma "tipologia" dos mesmos segundo as duas referidas
vertentes (Quadro_1). A informação apresentada consubstancia a análise e os
comentários produzidos, que convergem na constatação da inconsequência e da
ineficácia das estratégias veiculadas pelos documentos estratégicos e pelo PROT
no que respeita à questão das áreas empresariais.
A inconsequência e a ineficácia podem ser observadas em duas fases: a) entre
1992 e 1997, com a publicação dos PDM; b) com os PP, após 1997. As duas
complementam-se, sendo porém evidente que é uma ineficácia
"anunciada". A implementação das áreas empresariais estava à
partida fortemente cerceada por um insuficiente diagnóstico regional que,
assim, pouco adiantou na definição de uma estratégia, clara e operativa, para a
criação daquelas áreas. Como exemplos, e como atrás se referiu, nem o PROT 1991
apresentava um programa de execução, nem o posterior Estudo de Avaliação do
PROT (1989/96) procurou avaliar a implementação das orientações emanadas.
Com orientações pouco assertivas para as actividades empresariais e o seu
zonamento, o PROT 1991 deixou a questão entregue ao voluntarismo dos
municípios. A esmagadora maioria destes procurou acima de tudo
"garantir" a expansão dos perímetros urbanos para fins turísticos e
residenciais. Como a questão não se conforma com uma abordagem de escala local/
municipal, a ausência de um quadro conceptual regional foi negativamente
decisiva. A ineficácia é bem visível nos valores apresentados no Quadro_1: i)
48,7% da superfície dos espaços previstos nos PDM para as áreas empresariais
encontram-se desocupados, entregues a outros usos ou mesmo sem uso; ii) 89,8%
desta superfície não teve qualquer programação, e apenas 6% foi concretizada;
iii) 71,8% da superfície contida nos espaços definidos nos PDM com a intenção
de, integrando pré-existências, criar estruturas para a fixação de empresas,
está livre; iv) 99,3% da superfície contida nas áreas sem ocupação de natureza
empresarial (ou habitacional), sem uso ou com uso agrícola - ocupação que
ocorria à data de entrada em vigor do PDM -, encontra-se livre; e v) até
mesmo 55,9% da superfície dos espaços com todos os loteamentos executados após
a entrada em vigor dos PDM se encontra livre, sendo que 86,1% desta superfície
(234,2 ha) não tem programação (PP ou loteamento).
Os posteriores PP - sem trazerem alterações que traduzam um reequacionar
da estratégia anterior, e sem que se assumam como um exercício de
"relocalização" de áreas previstas em plano, constituindo-se sim
como "adições" aos espaços já previstos -, padecem da mesma
ineficácia, apenas: i) 1 dos 9 planos foi executado; ii) 8,9% da superfície dos
lotes destes planos foi executada; iii) estão implantados 3 estabelecimentos
(que já existiam antes do plano).
A observação do Quadro_1 permite ainda orientar a análise para uma outra
realidade. Tendo concluído que os documentos estratégicos elaboraram, em vários
momentos, diagnósticos insuficientes, propostas genéricas sem enquadramento e
prioridades, e que as "interpretações" ou
"transposições" feitas pelos PDM (e posteriores PP) destas
estratégias não contribuíram (como o reconhecem os diagnósticos de sucessivos
documentos estratégicos) para a criação e consolidação de áreas empresariais na
Região, qual será então o padrão de localização e de distribuição destes
espaços?
O reduzido número de estabelecimentos nos espaços previstos nos PDM, quando
comparados com os totais regionais, e a persistência nestes espaços de muita
superfície livre, apesar de a vigência dos PDM ter mais de década e meia, não
significa necessariamente que tenha havido uma quebra de dinamismo na
instalação de estabelecimentos. De acordo com os Anuários Estatísticos da
Região do Algarve (INE), em 1992 havia 1.529 empresas classificadas nas
Indústrias Transformadoras com sede na Região (logo, apenas uma fracção do
total), apenas 75% das empresas desta secção existentes em 2009. O que ocorreu
terá sido a instalação de empresas em terrenos fora dos espaços para tal
previstos nos PDM, dando assim de certa forma uma continuidade aos processos de
localização e de distribuição espacial das actividades e dos estabelecimentos
que existiam antes da entrada em vigor dos PDM.
Esta tese assenta em dois aspectos: o primeiro, pela observação das dinâmicas
que contribuíram para um padrão disperso da distribuição das actividades
empresariais; o segundo, pela observação do grau de concretização e dos níveis
de "consolidação" dos espaços previstos em plano. Quanto à
dispersão - a ocupação indiscriminada de espaços previstos para outros
usos -, podem ser destacados dois padrões. Um primeiro, a dispersão pura,
com a ocupação de terrenos sem uma lógica comum para além da possibilidade de
aquisição/arrendamento de um terreno em condições financeiras mais vantajosas,
da propriedade do terreno quando é o próprio a instalar a empresa/
estabelecimento ou da existência de um ou outro factor locativo relevante (nó
viário, proximidades de outra empresa da fileira/subsidiária, etc.). Um
segundo, um padrão designado por "dispersão orientada", que tem na
Região a máxima expressão na ocupação da envolvente do principal eixo viário
regional - a EN/ER 125.
3.1. Dois casos de sucesso
A análise elaborada permite afirmar, de forma mais sustentada, que a eficácia
das estratégias, do planeamento, do zonamento e da gestão dos espaços e das
áreas para acolher as actividades empresariais têm sido extremamente reduzidas.
Contudo, há casos que deveriam ser seguidos e adaptados. Estes casos enfrentam
dificuldades várias: a secundarização num quadro regional que sempre
privilegiou outras actividades (construção, imobiliária, turismo); o débil
tecido produtivo da região, consequência da desestruturação das actividades
económicas não directamente relacionadas com as citadas actividades; a ausência
de volume e de massa crítica do mercado regional; o carácter periférico da
Região, no domínio da produção, mas também em matéria de inserção nas grandes
redes de transporte e de comunicações; e, também, a ausência de uma cultura e
de uma prática de articulação entre e dentro das próprias entidades e
organismos, que permitam orientar as actuações para um desígnio comum e criar
os procedimentos para a concretização desses objectivos. Neste contexto, e com
os constrangimentos acima apresentados, destacam-se duas iniciativas
desenvolvidas na Região: 1) o Mercado Abastecedor da Região de Faro (MARF), no
concelho de Faro; 2) a Zona Industrial da Feiteirinha, concelho de Aljezur.
O MARF instalou-se num espaço para o qual o PDM de Faro previa a criação de um
mercado abastecedor grossista para o sector hortofrutícola regional. Sem perder
a sua função original, o MARF diversificou e reorientou a sua actividade para a
distribuição e a logística, potenciando a sua localização geográfica.
Actualmente, para além do mercado grossista e de empresas do comércio por
grosso, estão instaladas 11 das 39 empresas dos "Transportes e
Armazenagem" a laborar nas áreas empresariais da Região (28% do total),
unidades da indústria transformadora (com elevado grau de tecnologia) e vários
serviços de operadores à escala regional.
A iniciativa desenvolvida em Aljezur, num contexto geograficamente menos
favorável, é também notável. Seguindo as orientações do PROT 1991, o
Regulamento do PDM definiu a criação da Zona Industrial da Feiteirinha. O
enunciado é muito genérico, eventualmente até menos elaborado do que o de
outros PDM da Região. Em 1998 é emitido o Alvará de Loteamento para a Zona
Industrial, e as infraestruturas são concluídas em 2003. Houve no entanto a
percepção de que a dinâmica incutida ao processo não estaria a resultar. Para
além da relocalização de algumas oficinas, a procura dos lotes era praticamente
inexistente. A prática habitual de concluir as obras de urbanização e esperar
por interessados não gerou resultados. Neste contexto, a autarquia constituiu
uma estrutura (informal) - o CADE (Centro de Apoio ao Desenvolvimento)
- que, desde o início se concentrou no objectivo claro e explícito de
funcionar como uma "agência" de captação de empresas e de
investimento e, simultaneamente, coordenar internamente todas as fases de
tramitação nos serviços camarários de uma intenção de investimento.
A zona industrial não está totalmente ocupada, o que sucede por existir
critério na apreciação das pretensões. A prática corrente de alienar lotes para
actividades indiferenciadas não é aqui seguida; pelo contrário, privilegiam-se
as empresas com domicílio fiscal no concelho, que criem relações com a base
produtiva local, que criem novas frentes para os recursos locais, ou que
redescubram e desenvolvam actividades/fileiras que projectem o concelho.
Destes dois casos há a destacar sobretudo o seguinte: i) ambas as áreas têm
entidades gestoras, importantes na captação de empresas e na gestão e
manutenção das infraestruturas - necessidade fundamental relevada pelos
documentos estratégicos -, o que não sucede em nenhuma outra área da
região; ii) estas entidades gestoras, para além do aspecto de gestão
condominial tradicional, desenvolvem outras frentes de trabalho como
candidaturas a programas de financiamento, apoio à comercialização, assessorias
fiscais e jurídicas, etc.; iii) em Aljezur existe um mecanismo de
reversibilidade do lote (cujo custo é simbólico), eficientemente aplicado
quando o proponente não cumpre com os estipulado no regulamento, o que não
sucede em nenhuma outra iniciativa municipal na região; iv) no MARF, a
concepção e a estrutura das instalações edificadas permite a ocupação por
módulos, agrupados ou desagrupados em função das necessidades das empresas.
Ou seja, estes dois casos, que não figuravam no PROT 1991 como os espaços
estruturantes na região para o acolhimento empresarial - o MARF surge,
posteriormente à sua consolidação, na Revisão do PROT (2007), e a área de
Aljezur não é mencionada nesta revisão - acabam por praticamente ser os
únicos casos em que houve uma concretização das orientações fornecidas pelos
sucessivos enquadramentos estratégicos, embora estes mesmos enquadramentos
tivessem apontado para outras localizações. Estes dois casos demonstram assim
que a interpretação das orientações genéricas contidas nos documentos e planos
estratégicos ficou ao livre arbítrio dos municípios (e dos privados).
Demonstram igualmente que não tiveram lugar acções de monitorização, de
acompanhamento e de avaliação da implementação das estratégias, caso contrário
não resultariam apenas estas duas áreas que, nem figuravam no exercício de
planeamento. Particularmente mais preocupante será porventura a evidência de
que, com mais ou menos, e maiores ou menores, introduções no quadro legal e
normativo, com frequentes redistribuições dos papéis e das competências das
entidades, com planos mais ou menos físicos ou de natureza estratégica, em cada
fase de novo quadro estratégico (não necessariamente com planeamento) persistam
e se agravem as lacunas de base. De entre estas, a ausência de avaliação das
anteriores directrizes e a extrema dificuldade em articular e operacionalizar
as intervenções no território.
4. Conclusões
Como se procurou demonstrar ao longo do artigo, a melhor forma de aferir a
qualidade das estratégias de desenvolvimento, assim como a eficiência da sua
transposição para o território por via dos processos de planeamento será
através da leitura e interpretação dos resultados expressos nesse mesmo
território. Com 20 anos decorridos desde a aprovação das orientações emanadas
do PROT 1991, mais de 15 desde a vigência da primeira geração de PDM na Região,
já quatro anos desde a Revisão do PROT 2007 - embora ainda sem a segunda
geração de planos directores - e, durante este período, diversos
documentos de teor conceptual e estratégico que foram produzidos para enquadrar
os planos regionais de ordenamento do território, estranhamente, ou não, o
resultado que se tem no território não é o que se desejava. Como se afirmou nas
primeiras páginas do artigo, deveria haver no território uma correspondência,
quanto aos usos e funções, ao que está definido e previsto nas plantas de
ordenamento dos PDM. Porém, muito poucas são as situações em que tal se
verifica. A observação revela a manutenção e a perpetuação dos mecanismos de
ocupação e apropriação do território que subsistem sem correspondência com os
princípios do material estratégico, legislativo e normativo que foi sendo
produzido.
Durante os últimos 20 anos, e não obstante: i) as sucessivas alterações dos
quadros legais e normativos; ii) o alargamento dos âmbitos de elaboração,
participação e concertação dos processos de planeamento e de ordenamento do
território aos vários níveis e escalas geográficas de actuação das entidades; e
iii) as significativas melhorias nos domínios tecnológicos, comunicacionais,
informáticos, cartográficos, etc.; não se operaram as transformações desejadas
e perspectivadas. Subsistem, e de forma bastante vincada, as
"condicionantes de fundo" (Ferrão, 2004, pp. 74), apesar do novo
quadro redistributivo das funções e responsabilidades de promoção do
desenvolvimento territorial.
Em domínios como o objecto do presente artigo, são ainda evidentes os
insuficientes desempenhos das funções de "regulação da acção de
actores" (escalas nacional-regional) e, sobretudo, a "mobilização
de actores regionais e subregionais em torno de programas de acção
comuns" (Ferrão, 2004, pp. 76). A constituição e desenvolvimento de áreas
para o acolhimento de actividades empresariais na Região do Algarve poderiam
ter constituído um "programa de acção comum", tivesse entretanto
existido nas várias fases do processo, um entendimento prospectivo dos diversos
agentes envolvidos e, sobretudo, uma aproximação entre dois domínios que
persistem em não se integrarem mutuamente: o desenvolvimento regional e o
ordenamento do território.
Neste quadro, brevemente resumido, foram também apontados os exemplos da
constituição das áreas empresariais de Aljezur e do MARF. Os documentos
estratégicos de referência produzidos nos últimos 20 anos referem a necessidade
de criação de áreas daquela natureza, que permitiriam criar e atrair empresas
para a Região, e dotá-la de um tecido produtivo forte e gerador de emprego.
Contudo, aqueles documentos não só não têm conseguido apresentar diagnósticos
"reais" e, assim, uma fundamentação estruturada e consistente, como
também não têm conseguido, naturalmente, mobilizar os restantes actores para a
sua prossecução. Em 2012, ainda não teve lugar a formalização da revisão de
nenhum PDM da Região, e os poucos processos em curso estão ainda numa fase
muito embrionária; enquanto no quadro vigente continuam a subsistir as
condições para as actuações "fragmentadas" e
"localistas".
Por último, e face ao volume das "discordâncias" demonstradas ao
longo do artigo entre os documentos estratégicos e enquadradores e o planeado,
executado e ocupado, subsiste a questão da adequabilidade da área de
localização empresarial enquanto figura para acolher as actividades
empresariais. As discordâncias verificam-se um pouco por todo o país, não são
um exclusivo do Algarve.
Os discursos e as hipóteses que suportam a concentração destas actividades em
espaços e zonamento próprios referem um vasto leque de vantagens, nomeadamente:
a diminuição dos custos com a infraestruturação; a especificidade da própria
infraestruturação que não pode ser ubíqua e extensível a todo o território; o
ambiente empresarial; as economias de escala, de aglomeração e as sinergias; a
incompatibilização com outros usos; etc.. Parece, assim, com a concentração,
prevalecer um quadro e uma lógica nos quais se combinam tanto as vantagens para
as empresas (repartição de custos das infraestruturas, ambiente empresarial, e
outros) como para o ordenamento do território e a gestão territorial. Até
houve, como se deu conta, áreas empresariais que se constituíram neste
contexto. Como foi destacado, apenas duas funcionam com uma gestão conjunta e
com um projecto definido. Existem, porém, mais áreas na região, não exactamente
nos parâmetros das duas referidas, mas aproveitando as vantagens próprias de
uma aglomeração, mesmo que apenas orgânica.
Parece, assim, subsistir a adequabilidade da figura da área de localização
empresarial. O que terá falhado, e sobre tal se procurou reflectir, terão sido:
i) factores que estão na génese ou a montante do exercício de planeamento
- orientações vagas, interpretações e aplicações das mesmas sem nexo,
excesso de áreas de localização empresarial na grande maioria dos municípios, a
escolha (e inscrição nos IGT) de localizações sem qualquer aptidão e
viabilidade, etc.; ii) condições para implementação e monitorização eficaz dos
IGT - a criação (frequentemente sem execução) de mais áreas, sem uma
alteração (remoção, eventualmente) das existentes; a própria ultrapassagem, em
muito, do período de 10 anos previsto na lei para a revisão do PDM, e iii)
práticas, seguidas na gestão quotidiana em matéria de autorização de
localização e licenciamento, que, sem uma perspectiva enquadradora, foram
permitindo a instalação de unidades industriais, logísticas e comerciais um
pouco por todo o território, frequentemente até em terrenos abrangidos por
condicionantes especiais.
Entretanto, e como as empresas e as actividades nascem, desenvolvem-se e
morrem, têm dinâmicas próprias que, frequentemente, apenas postumamente são
enquadradas em modelos teóricos - funcionais, espaciais ou outros -
e em quadros legais e normativos que, não raras vezes, requerem a aplicação de
regimes transitórios para compatibilização (legalização), o processo de
ocupação do território prossegue, em grande medida, no modelo que existia antes
da cobertura do território pelos planos de ordenamento.