Estudantes adultos no Ensino Superior: O que os motiva e o que os desafia no
regresso à vida académica
Introdução
Desde a Declaração de Lisboa (2000), e da agenda então definida de metas a
alcançar no que respeita ao grau de certificação da população europeia, os
diversos países implementaram políticas que encorajam "novos públicos" para a
frequência do Ensino Superior (ES). Esta mobilização encontra-se em linha com a
tão proclamada "Aprendizagem ao Longo da Vida" e com as vantagens dela
decorrentes (Edwards & Usher, 2000; Illeris, 2003).
Os processos de Aprendizagem ao Longo da Vida não são só afetados pelo
histórico da educação que se observa em cada país, mas também por fatores
socioeconómicos. Um dos fatores que parece determinar a procura, por parte dos
adultos, de um ensino de nível superior é o nível médio de escolarização da
população em geral. É o designado Efeito de Mathew' (Boeren, 2009, cit. por
Broek & Hake, 2012), que se traduz na proporcionalidade direta entre a
procura de educação de nível superior por parte dos adultos e o grau médio de
escolaridade da população em geral. No caso português, o nível médio de
escolarização pode ser considerado baixo1, dado pouco animador para uma
frequência generalizada de adultos no Ensino Superior. Por outro lado, a atual
crise económica influencia negativamente as possibilidades dos adultos para que
ingressem neste nível de ensino. As limitações financeiras por que passam as
famílias não favorecem esta decisão e o financiamento das universidades está a
ser afetado, conduzindo à redução de recursos humanos e materiais
indispensáveis para o alargamento da sua oferta educativa. Não obstante os
constrangimentos referidos, recentemente o padrão social e etário das
universidades portuguesas adquiriu uma nova reconfiguração e temos vindo a
assistir ao aumento progressivo de estudantes universitários adultos, que
decidiram ingressar no ES para dar um novo rumo às suas vidas.
Esta não é uma situação nova e muitas universidades portuguesas têm a tradição
de receber estudantes adultos, desde 1960, através do designado exame ad-hoc.
Contudo, uma das medidas que recentemente contribuiu para trazer mais "adultos"
para o mundo universitário foi o processo dos "Maiores de 23 anos" (M23).
O presente artigo, que se reporta a um estudo em que se investiga a situação
dos M23 que frequentam duas universidades portuguesas2, analisa um grupo
específico constituído por pessoas que se encontram na faixa etária entre os 45
e os 60 anos de idade que, na literatura especializada, são vulgarmente
designadas por "estudantes adultos" (mature students) (Richardson, 1995;
Trueman & Hartley, 1996).
São várias as razões, e também os problemas, que os estudos referem sobre a
integração destes estudantes no mundo universitário e sobre as suas perspetivas
de sucesso académico. Na condução da investigação a que este artigo dá corpo,
detivemo-nos nas seguintes: i) a questão do envelhecimento da sociedade e da
permanente necessidade de formação; ii) a pressão para conciliarem a atividade
profissional, as responsabilidades familiares e as exigências académicas; iii)
as dificuldades de integração social que, considerando as práticas dos
estudantes tradicionais, favorecem uma integração mitigada, dada a
incompatibilidade de interesses e de motivações; iv) a pressão para o sucesso e
a inevitabilidade para que não fracassem; v) os ajustamentos aos défices que a
idade, inegavelmente, aporta e as contínuas exigências do meio universitário; e
vi) os processos de ensino e aprendizagem que a universidade desenvolve e que
incorporam, ou não, saberes construídos por estes "novos" estudantes com idades
mais avançadas.
1. Maiores de 23 anos: Um desafio para o Ensino Superior
Aprender mais e melhor tornou-se um pré-requisito fundamental numa sociedade
que se assume cada vez mais competitiva, mas integrada num cenário pouco
animador em que o desemprego atinge, em proporções alargadas, diversas camadas
sociais. Deste modo, as universidades e todas as instituições que trabalham em
prol da educação e da formação assumem um papel fundamental.
A Declaração de Bolonha que, entre outros objetivos visou o alargamento do
Ensino Superior a outros públicos distintos dos tradicionais, provocou
profundas mudanças e novas oportunidades. O ingresso pela via dos Estudantes
M23, que valoriza a experiência de vida dos candidatos, tornou a entrada para a
Universidade mais generalizada e acessível a uma grande massa de estudantes,
que se destacam dos restantes membros estudantis pelas suas características
motivacionais, pessoais e académicas. Como referem Brás, Jezine, Fonseca, &
Gonçalves (2011), o processo M23 significa "o abrir do fecho", na medida em que
abre portas à inclusão de um público não tradicional, com outros saberes, ao
mesmo tempo que quebra o círculo do chamado elitismo' da educação superior em
Portugal" (p. 173).
O número de estudantes M23 nas universidades portuguesas cresceu
exponencialmente nos últimos anos, tendo alcançado o seu pico no ano de 2008,
com 26.151 inscritos e 17.306 admitidos3. Davies et al. (2002, cit. por Pires,
2007) referem quatro fatores que estarão na origem do ingresso de estudantes
adultos no ES: a) as políticas educativas e apoios financeiros que promovem uma
maior acessibilidade e flexibilidade para "outros" públicos; b) a conjuntura
social e económica, que obriga à aposta na educação, abarcando todos os grupos
sociais da população portuguesa; c) políticas e práticas das instituições de
ES, que incluem a reestruturação dos programas curriculares e mais ofertas em
ensino pós-laboral; e, ainda, d) motivos que se relacionam com as ambições,
aspirações, expetativas futuras, suporte social e familiar destes "novos"
estudantes do ES.
Mas quem são estes estudantes adultos? Importa clarificar alguns aspetos que os
permitam caracterizar, nomeadamente as motivações para o estudo, a diversidade
de papéis que desempenham, o processo de adaptação ao novo contexto, as
expectativas que possuem quanto ao sucesso académico e, ainda, a sua perceção
sobre o processo de ensino na universidade.
Um breve olhar sobre resultados da investigação que temos vindo a realizar
oferece-nos um quadro geral dos estudantes adultos que entraram pela via M23
nas Universidades do Algarve e de Aveiro, entre 2006/07 e 2010/11. Centrando-
nos nos que se encontram na faixa etária entre os 45-60 anos, estes representam
20% do total, têm um emprego e uma família (em média, dois filhos) e provêm de
famílias com baixo nível de escolarização. Possuem também um nível de
escolaridade baixo, sendo, na sua maioria, os primeiros da família a frequentar
uma universidade. Como era expetável, o intervalo temporal entre a frequência
de uma instituição de ensino e a universidade é elevado, havendo casos de
estudantes que voltaram a estudar 30 anos após a sua última matrícula numa
instituição de ensino (Gonçalves et al., 2011).
Os obstáculos dos estudantes adultos centram-se nas incompatibilidades entre as
exigências profissionais e os horários académicos, na perceção de falta de
apoio específico na universidade e na dificuldade de entenderem determinados
conteúdos do curso que frequentam (Richardson, 1994; Santos, Bago, &
Fonseca, 2013).
2. Estudantes não-tradicionais versus estudantes tradicionais
Caracterizamos, em seguida, os traços diferenciadores dos estudantes adultos
relativamente aos restantes estudantes que seguiram uma trajetória académica
contínua.
Um critério de diferenciação são as motivações para o ingresso no ES. A
investigação mostra que as principais motivações dos estudantes adultos para
ingressarem no ES são as seguintes: a) desejo de progredir na carreira; b)
satisfação pessoal, sobretudo em idades mais avançadas; c) necessidade de
obtenção de um determinado grau ou diploma que possa ser reconhecido
socialmente; d) "escape", fuga à rotina do dia a dia; e) oportunidade para
conhecer novas pessoas; e, ainda, f) desejo de se tornarem melhores cidadãos
(Fischer, Yan, & Stewart, 2003; Long, 2004; Monteagudo, 2008; Newstead
& Hoskins, 2003).
Para além de constituir um enorme desafio, é também uma aposta no capital
cultural e social, um meio para travar novas amizades, de explorar novos mundos
e de adquirir novos conhecimentos (AEC, 2007; Forrester-Jones &
Hatzidimitriadon, 2006; Walker, 2006; Withnall, 2006, 2012).
A diversidade de papéis sociais surge também como um fator de extrema
importância na distinção entre estes dois públicos universitários. Autores como
Dill e Henley (1998, cit. por Zosky, Unger, White, & Mills, 2004) e Davies
e Williams (2003) enfatizam os papéis múltiplos que os estudantes adultos
desempenham, tais como a atividade profissional e responsabilidades familiares,
ao mesmo tempo que são estudantes. Para Kirby, Biever, Martinez, & Gómez
(2004), o regresso aos estudos por parte de estudantes mais velhos representa
uma fonte de stress e de conflito no seio das suas famílias, bem como no
desempenho das suas atividades profissionais.
No que se refere à relação trabalho-família, autores como Kirby et al. (2004) e
Trueman e Hartley (1996) salientam a maior probabilidade de conflitos, devido à
falta de tempo, ao aumento da tensão e à mudança de rotinas. Curiosamente, e no
caso das mulheres, acrescentam que a multiplicidade de papéis que decorre da
frequência do ES contribui para o aumento da sua autoestima e confiança,
excetuando as mulheres casadas, onde são visíveis sinais negativos.
Em consequência desta diversidade de papéis, Kasworm (2003) acrescenta um outro
tópico diferenciador: o estado de maturidade, que é adquirido com o acréscimo
de responsabilidades próprio do ser humano. A autora enfatiza, ainda, o papel
crucial que muitos dos estudantes adultos que frequentam o ES referem,
nomeadamente o apoio emocional recebido por parte dos filhos, do cônjuge, dos
irmãos, dos colegas de trabalho e dos amigos. Kirby et al. (2004) sublinham
igualmente a importância do apoio que é prestado pelos familiares e colegas de
trabalho, mas frisam, sobretudo, os níveis de satisfação que estes estudantes
experimentam quando obtêm bons resultados académicos e o seu impacto na
diminuição dos níveis de stress e de ansiedade.
O período de transição e passagem para o mundo do ES significa um momento
importante na vida de qualquer estudante, marcado por sentimentos de ansiedade,
alegria e alguma tensão (Schlossberg, Waters, & Goodman, 1995). Este
período é marcado por etapas que são fundamentais e decisivas na adaptação a um
novo sistema educativo que, por sua vez, é regido por normas, regras e padrões
de ensino diferentes (Merrill, 2001; Reay, Ball, & David, 2002).
Continuando a analisar o que caracteriza os estudantes adultos que ingressam no
ES, como é que estes se comportam na adaptação a este novo contexto? Que tipo
de estratégias adotam para alcançarem bom desempenho e sucesso académico?
No que se refere às relações sociais, a entrada no ES possibilita-lhes a
oportunidade de entrarem em contacto com outros estudantes provenientes de
outras culturas e contextos sociais diferentes (Lange, 2004). Esta relação com
outros "mundos" favorece uma troca mútua de conhecimentos e de aprendizagens.
Deste modo, a universidade é, por excelência, um espaço favorável à criação de
"trocas de relações afetivas" (Santos & Antunes, 2007, p.158), embora
também possa significar um enorme risco de perda de uma identidade social
(Baxter & Britton, 2001; Young, 2000).
Segundo um estudo de Lapssey e Edgerton (2002), a adaptação à universidade está
muito dependente de padrões de vinculação seguros, muitas vezes aliados ao
círculo familiar e aos amigos. Na ausência destes, os estudantes adultos
tornam-se seres "camuflados", receosos e inseguros perante os docentes e
colegas, revelando uma maior dificuldade de adaptação. Porém, os altos níveis
de motivação, a experiência de vida e a vontade de quererem aprender mais
constituem qualidades que os ajudam no processo de integração e facilitam o
sucesso académico (Munro, 2011). As aprendizagens anteriores, a multiplicidade
de papéis enquanto gestores do seu próprio tempo, o empenho e a dedicação aos
estudos constituem questões centrais no mundo dos adultos (Knowles, 1980, cit.
por Jarvis, 2004). Os estudantes adultos revelam uma maior maturidade
relativamente aos estudos e, como explicam Zosky et al. (2004), estão mais
motivados para cumprir com os objetivos em termos académicos do que os colegas
mais jovens.
A questão da incorporação de saberes práticos nos processos de aprendizagem e a
capacidade de refletir sobre a experiência pessoal são igualmente
características dos estudantes adultos (Jarvis, 2001; Merriam & Clark,
2000). De acordo com esta perspetiva de análise, estes estudantes manifestam
vontade de expressar as suas opiniões e reflexões críticas sobre determinados
assuntos do seu interesse, tendo por base a sua experiência de vida. A
incorporação de saberes adquiridos ao longo da vida nos processos de
aprendizagem no ES coloca a questão dos métodos e das técnicas de ensino
(Badalo & César, 2008). Esta rentabilização das experiências de vida nos
processos de aprendizagem é defendida por diversos autores (Fry, Ketteridge,
& Marshall, 2003; Merriam & Clark, 2000), que afirmam que as
experiências de vida, quer sejam planeadas ou não, envolvem sempre
aprendizagem, sendo esta um "processo de transformação da experiência em
conhecimento, competências, atitudes, valores e crenças" (Jarvis, 1992, cit.
por Merriam & Clark, 2000, p. 31). Neste sentido, a aprendizagem é sinónimo
de autonomia e de liberdade, na medida em que possibilita aos estudantes
adultos valorizarem-se mais a si próprios, bem como aos contextos em que vivem
as suas experiências.
Parafraseando Pires (2007) quando se pronuncia sobre o papel da educação de
adultos, neste campo educativo, o que mais importa é tornar os adultos
criticamente reflexivos e levá-los a "participarem de uma forma mais plena no
discurso e na acção [pelo que] a enfâse deve ser colocada nos reais interesses
e nas necessidades dos adultos" (p. 168). É necessário que também no ES os
docentes saibam cativar o interesse dos estudantes adultos, começando por
tentar perceber as suas reais necessidades e dificuldades dentro do mundo
académico.
Outro traço caracterizador dos estudantes adultos que frequentam o ES e que nos
propomos analisar é a perceção do sucesso/insucesso escolar. Uma das
consequências da massificação do ES é a heterogeneidade dos estudantes
universitários, que trazem consigo um mundo de experiências, diferentes
motivações, distintos níveis de competências académicas, sociais e ambientais,
que poderão estar na origem do insucesso e consequente abandono académico
(Correia & Mesquita, 2011; Crosling, Thomas, & Heagney, 2008). Brites-
Ferreira, Seco, Canastra, Dias, & Abreu (2011) distinguem dois conjuntos de
causas para o insucesso: por um lado, relacionadas com a instituição e, por
outro, com o indivíduo. Ligadas à instituição encontram-se os equipamentos, os
serviços e as atividades pedagógicas e extracurriculares; na esfera individual
destacam-se aspetos ligados à transição para o ES e fatores contextuais e
individuais. No caso dos estudantes adultos são acrescentados outros fatores
preditores de insucesso, tais como a incompatibilidade dos horários com as
responsabilidades familiares, o horário de acesso a serviços que a universidade
disponibiliza (p. ex. bibliotecas) e o acesso e/ou a representação nos órgãos
universitários (Broek & Hake, 2012; Thomas, 2002; Tinto, 1993). Para o
estudante adulto é, pois, importante, que esteja familiarizado com a
instituição e que sinta a universidade como um espaço de que pode usufruir e
que não é uma regalia dos "outros" estudantes (Hammond, 2004; Read, 2011).
Variáveis como o género, a idade e o património cultural e académico da família
nuclear são também referidos na investigação como condicionadores do sucesso
dos estudantes adultos. No que respeita à variável género, Mills et al. (2009,
cit. por Brites-Ferreira et al., 2011) concluíram que os estudantes do sexo
feminino se dedicam com mais empenho no primeiro ano do curso, obtendo, desta
forma, melhores resultados, mas outros estudos também mostram que as mulheres
se sentem menos merecedoras da oportunidade de prosseguirem estudos, pelas
responsabilidades sociais que estão associadas aos seus papéis de esposas e de
mães (Reay, Crozier, & Clayton, 2009).
Sintetizando, as variáveis académicas e ambientais e o background dos alunos
constituem fatores que influenciam, direta ou indiretamente, o sucesso no ES.
Acrescente-se, ainda, que as universidades devem assumir um papel importante no
compromisso de integrarem práticas de ensino que promovam o bem-estar dos
estudantes adultos, ao implementarem "estratégias de autoconfiança em relação
às aprendizagens que [eles] possuem" (Correia & Mesquita, 2011, p. 106).
Metodologia
O presente artigo integra-se numa investigação mais vasta que tem como objeto
de estudo os estudantes M23 e toma como sujeitos os estudantes adultos que
possuem uma idade mais avançada (entre 46-62 anos). Este cluster representa 20%
dos estudantes M23 que estudámos e apresenta dados de caracterização que nos
motivaram a aprofundarmos as razões para que tomassem a decisão de ingressarem
no ES. Recordamos que, maioritariamente, têm (ou tiveram) uma carreira
profissional, têm responsabilidades familiares e as últimas experiências
académicas são longínquas. Pretendemos, portanto: 1) identificar as motivações
que levaram estes estudantes à candidatura ao ES; 2) perceber como é que eles
conciliam a vida pessoal (familiar e social) com a vida académica; e perceber
ainda 3) como veem a sua integração no meio universitário, 4) como percecionam
as situações de sucesso (ou de insucesso), 5) que desafios pessoais
experimentam para fazer face às exigências de estudo, e, finalmente, 6) que
opiniões possuem sobre o processo de desenvolvimento curricular do curso que
frequentam.
As histórias de vida são consubstanciais a todos os seres humanos e estão
presentes em todas as culturas e estádios de desenvolvimento humano. No seu
sentido mais estrito, são entendidas como a investigação e construção de
sentido a partir de eventos pessoais (Pineau & Le Grand, 1996). Neste
grande universo das histórias de vida, centrámo-nos nas abordagens biográficas
por episódio: embora nunca perdêssemos de vista, como guia e fundo de
interpretação, a biografia das pessoas, o foco das entrevistas estava nos
eventos pessoais dos entrevistados relacionados com a sua vivência no Ensino
Superior. Para a condução das entrevistas biográficas, levámos em consideração,
especialmente, Atkinson (1998). Desta forma, as entrevistas foram realizadas
individualmente. Cada sessão teve uma duração que variou entre 30 e 90 minutos.
Algumas pessoas foram entrevistadas em duas ou três sessões diferentes.
Foram realizadas entrevistas a 5 estudantes adultos que se encontravam a
frequentar diferentes cursos de licenciatura na Universidade do Algarve, no ano
letivo de 2011/12. Tratou-se de uma escolha por conveniência, organizada pelo
critério "idade dos sujeitos a entrevistar". Dois dos sujeitos são do género
masculino e três do género feminino.
As entrevistas foram transcritas e depois sujeitas a uma análise de conteúdo,
organizada pelos tópicos que nos propúnhamos estudar. De acordo com Bessant
(2007, cit. por Munro, 2011), os dados qualitativos são particularmente
importantes quando se pretende compreender o sentido que os estudantes
universitários atribuem às suas experiências académicas. A abordagem
qualitativa e interpretativa é particularmente adequada nestes casos, não só
pelo valor intrínseco do método, pois permite recolher, na primeira pessoa, a
opinião dos sujeitos a investigar, mas porque possibilita, também, uma
construção de conhecimento que emerge dos dados recolhidos.
Resultados
Tendo como referentes as seis áreas enunciadas no ponto anterior, passamos em
seguida a apresentar os resultados a que nos conduziu a análise de conteúdo da
informação recolhida através das entrevistas realizadas.
1. Motivações/razões para o ingresso
A maioria dos sujeitos explicou os motivos porque não continuou, na altura
certa, um percurso académico completo (ES), e estes foram, sobretudo, a
constituição de família e a assunção de obrigações, que exigiam uma situação de
emprego que não permitia a frequência de um ensino de nível superior. Em
primeiro lugar, surge o encorajamento da família. Todos os entrevistados,
independentemente do género, referem que foram os/as companheiros/as e, em
alguns casos, também os filhos, os principais motores para que a decisão fosse
tomada.
Dos restantes motivos alegados sobressaem, sobretudo, razões de natureza
pessoal, tais como: a procura de conhecimento e a vontade de querer saber mais;
a possibilidade de frequentar um curso que correspondesse a interesses
pessoais; a oportunidade, já no limite, de completar um projeto que algures no
passado ficou inacabado; a convicção de que se trata de uma decisão que só foi
possível quando "a vida já estava resolvida"; e, ainda, uma decisão ponderada
pela capitalização de ganhos que poderiam advir deste investimento.
Os motivos relacionados com a melhoria da situação profissional foram pouco
referidos, o que era expetável dado tratar-se de pessoas que se encontram numa
faixa etária em que já atingiram o topo nas suas carreiras profissionais ou,
inclusivamente, estão aposentadas.
2. Conciliação entre a vida pessoal e a vida académica
Frequentar o ES, particularmente cursos que funcionam em horário pós-laboral,
acarreta, inevitavelmente, alterações na vida pessoal, familiar e social dos
estudantes. Para os estudantes adultos esta é uma dificuldade acrescida, pois
trata-se de sujeitos que já alcançaram uma estabilidade profissional e familiar
e que possuem muitas rotinas instaladas. Os entrevistados referem estes
constrangimentos e as alterações que tiveram que operar nas suas vidas.
Destacam a necessidade de reorganizarem o quotidiano familiar e social,
salvaguardando, contudo, o imperativo de continuarem a manter o controlo. Estes
indicadores são referidos tanto por sujeitos do género masculino como feminino,
embora nas mulheres assumam uma dimensão mais prática (é preciso continuar a
estar organizado), enquanto nos homens uma dimensão mais subjetiva: a
continuidade de uma presença (embora ausente) nas práticas familiares.
3. Integração no meio e nas vivências universitárias
Depois da sensação de sucesso que experimentam quando sabem que foram aceites
na universidade, o choque com a realidade aporta vários sentimentos. Nos dados
recolhidos, estes sujeitos referem a necessidade de passar uma mensagem de que
são pessoas mais velhas e fazem-no vestindo-se de forma mais tradicional,
assumindo, de forma consciente e deliberada, que não fazem parte do grupo dos
estudantes universitários em geral. Confessam que sentem, por parte dos colegas
e também dos professores, uma atitude de respeito resultante do reconhecimento
de que possuem mais idade, mas também manifestações de carinho e de admiração,
o que, segundo confessam, os ajuda a ultrapassar o receio de não serem aceites
por serem muito mais velhos.
Os receios iniciais rapidamente são sanados e, embora todos os entrevistados
assumam que não se integraram plenamente na vida social universitária (festas,
saraus, semanas académicas, etc.), o mundo académico, para eles, revelou-se uma
fonte de rejuvenescimento, provocou uma mudança de atitude perante a vida e,
sobretudo, sentem que a sabedoria de vida que possuem é uma mais-valia para os
processos de ensino e aprendizagem em que estão envolvidos. Estes adultos mais
velhos também referem a dificuldade, sobretudo no primeiro semestre, para se
integrarem nos ritmos, linguagens e modelos do mundo universitário.
4. Sucesso/insucesso académico
No momento do ingresso no ES, as perceções destes estudantes sobre o sucesso
académico caracterizam-se por uma falta de confiança, pois receiam que a
formação anterior, longínqua e muito limitada nas aquisições, não os equipe
para que consigam obter sucesso no meio académico em que se encontram. Contudo,
e à medida que vão realizando provas de avaliação e os resultados são
positivos, esta perceção inicial desvanece-se, a autoconfiança cresce e acabam
por concluir que os mais velhos têm mais sucesso do que os estudantes
tradicionais:
Mas o que é que se passa aqui? Quando chego ao final do ano letivo,
olho e constato que alunos mais jovens, sem nada para fazer, com
melhores capacidades, têm piores resultados ( ) [porque são mais
novos], pensa-se que física e psiquicamente têm mais capacidade do
que um jovem idoso, como eu me considero, mas os resultados não
mostram isso.
Esta conclusão é muito gratificante em termos pessoais, uma recompensa pelo
esforço despendido, mas também é um motivo de orgulho para os familiares. É
interessante constatar que, mesmo mais velhos, estes estudantes dão enorme
importância ao reconhecimento dos familiares ' esposa, filhos ' referindo,
particularmente, o prazer que esse sucesso dá (ou teria dado, caso já tenham
falecido) aos seus pais. No que se refere aos progenitores, prevalece o
sentimento de que havia um destino por cumprir que não tinha sido, na altura
certa, satisfeito, mas que essa dívida finalmente foi saldada. Não negam,
contudo, que o sucesso académico só é obtido com muito trabalho, com muito
esforço, com muita disciplina pessoal e capacidade de auto-organização, e
constatam que se trata de um nível de ensino onde prevalece o rigor e a
exigência e, por isso, não podem entrar por um caminho de facilitismo.
Na proporção direta do esforço que despendem, são exigentes relativamente ao
ensino que lhes é prestado. Concentram nos professores, nas práticas de ensino
que desenvolvem e nas relações que estabelecem com os alunos a responsabilidade
de contribuírem para que os estudantes obtenham sucesso e prossigam o percurso
de aprendizagem que iniciaram.
A necessidade da obtenção de sucesso assenta numa variedade de propósitos que
levaram ao ingresso no curso. No caso dos estudantes adultos que já estão
aposentados, a pressão para o sucesso é organizada por projetos que querem
realizar, sendo que os que estão no ativo procuram uma melhoria na situação
profissional.
No que se refere aos receios e às expetativas, comparam-se com os outros, os
estudantes tradicionais, e assusta-os a sua autoconfiança relativamente à
possibilidade de sucesso. Não partilham do mesmo sentimento e assolam-nos,
sobretudo, dúvidas quanto às suas potencialidades.
5. Capacidades pessoais e exigências face aos processos de aprendizagem
As dúvidas quanto ao potencial de desempenho, mas também a conclusão a que
rapidamente chegam de que, apesar de alguns défices associados à idade, o
sucesso é possível, levam os estudantes adultos que integraram este estudo a
concluir que aprendem e implementam estratégias pessoais que acabam por ser bem
sucedidas. A fábula da "lebre e a tartaruga" aplica-se a esta situação. Veem-se
como mais cumpridores e persistentes do que os estudantes tradicionais que,
embora tenham uma capacidade de resposta mais rápida, não são tão resilientes.
Como nos disse um dos entrevistados: "É difícil?! Vais ver que o velhinho chega
lá ao pé de ti e de uma passada passa-te à frente".
Por outro lado, e talvez por estarem numa fase da vida em que já construíram e
acomodaram "outros saberes", pautam a sua relação com os colegas pela dimensão
ética e o sentimento de ajuda e de apoio, por oposição a uma postura mais
competitiva dos colegas mais jovens. Sublinham as vantagens de um trabalho
colaborativo e salientam os ganhos globais que "todos" podem retirar dessa
atitude.
As práticas de solidariedade, e a defesa de maior colaboração nos processos de
aprendizagem, não os distraem do sentido de responsabilidade que julgam ter
mais desenvolvido do que os colegas. Reconhecem que a sabedoria de vida que
adquiriram os equipa com outras leituras e com outras posturas, particularmente
no que se refere a "levar a sério" o que estão a fazer, aspeto que é distintivo
dos outros estudantes.
Contudo, estão conscientes de que há aspetos em que não podem competir com os
colegas estudantes tradicionais, e que se traduzem em défices, resultantes ou
da idade ou da quebra nas práticas de aprendizagem. Referem, por exemplo, menor
capacidade de memorização, dificuldade de concentração, menos energia física e
lentidão intelectual.
Igualmente de assinalar, e neste caso como contributo positivo, o facto de
acharem que são capazes, por via da maturidade etária, de contribuir para a
qualidade da lecionação dos cursos, quisesse a universidade incorporar esses
saberes no ensino que ministra:
( ) é a vida, é a vivência que nós temos e a experiência de vida; 40,
50 anos de vida permite-nos ter outro background que não tem, por
exemplo, uma jovem de 20 anos. ( ) Por isso é que eu digo que um
estudante universitário na minha idade não é uma desvantagem, é uma
vantagem. ( ) eu posso não ter capacidade para dominar determinadas
matérias, mas tenho um saber diferente daquele que eles têm, e era
esse saber que eu gostava que fosse mais aprofundado, que fosse mais
aproveitado.
Ainda como aspetos distintivos no campo das suas capacidades pessoais, os
estudantes adultos salientam mais estabilidade emocional e psicológica e maior
abertura e tolerância, quando se comparam com os estudantes tradicionais.
6. Processo de desenvolvimento curricular
Sobre o processo de desenvolvimento curricular, os estudantes adultos elegem um
conjunto de considerações em que discutem o processo de ensino e de
aprendizagem, mas também a atitude dos docentes do curso que frequentam.
Analisam as diferenças entre o modelo de ensino que conheciam e o que
encontraram e desconcerta-os a contingência do saber que é valorizada no ensino
universitário, bem como a inexistência de manuais escolares, embora considerem
que, desta forma, lhes é facilitada a construção de um espírito crítico, bem
como a capacidade de análise de posições antagónicas.
Outros, pelo contrário, assumem uma atitude crítica quanto ao tempo que é dado
ao debate de ideias, que acham reduzido, e justificam esta limitação com a
extensão dos programas. Sobre as matérias lecionadas também se posicionam.
Questionam a sua pertinência e o "volume" dos conteúdos de aprendizagem,
afirmando que existe uma enorme pressão para que, nos momentos de avaliação,
mostrem que os memorizaram, embora tenham a consciência que não existiu um
processo de assimilação.
A questão da relação entre a teoria e prática é também apresentada como
discutível, na análise que lhes foi proposta sobre o seu próprio processo de
ensino e de aprendizagem. Sobre este aspeto, já anteriormente apresentado
aquando da análise da incorporação de saberes práticos nos processos de
aprendizagem, os entrevistados apresentam opiniões divergentes. Para uns, a
utilização de um saber feito de experiência pode ser uma vantagem para o ensino
universitário, mas outros defendem métodos de ensino que ajudem os estudantes
mais experientes a colocarem-se numa postura de maior modéstia face ao
conhecimento.
Quando se pronunciam sobre os professores, as suas opiniões objetivam mais a
pessoa do professor e não tanto o ato de ensinar neste nível educativo. Ou
seja, mais do que denunciarem uma opinião sobre os docentes do ES, opinam sobre
os diferentes professores que tiveram e sobre as suas performances individuais.
Entendem que as práticas são muito distintas, que variam em função de
características pessoais, de diferentes graus de motivação da classe docente e,
sobretudo, da maturidade profissional de alguns docentes, que lhes permite um
desempenho mais ajustado à função e às características dos estudantes adultos.
Curiosamente, estabelecem uma relação direta entre o acréscimo de idade dos
professores e variáveis como a competência para ensinar e a capacidade para
ajustar os momentos de ensino às diferenças entre os estudantes. É como se a
visão que possuem de si próprios sobre a capacidade de transferirem as
experiências de vida para as vivências como estudantes universitários fosse
replicada quando opinam sobre o corpo docente no ES.
Discussão e Conclusão
Este artigo pretendeu levantar e discutir algumas questões relacionadas com a
frequência do Ensino Superior por adultos com idade mais avançada. Propusemo-
nos analisar aspetos como a motivação para ingressar neste nível de ensino, a
conciliação entre a vida pessoal e a vida académica, a integração destes
estudantes no meio e nas vivências universitárias, a sua perceção sobre o
sucesso/insucesso académico, a visão sobre as suas capacidades pessoais face às
exigências dos processos de aprendizagem e, finalmente, que opiniões manifestam
acerca do processo de desenvolvimento curricular.
No que se refere às razões que levaram ao ingresso no ES, os resultados
apurados são congruentes com o que investigação mostra sobre as motivações e os
constrangimentos dos estudantes mais velhos (Davies & Williams, 2003;
Withnall, 2006). Para nenhum dos sujeitos foi uma decisão tomada de ânimo
leve', tendo sido ponderados todos os aspetos das suas vidas que poderiam vir a
ser afetados pela frequência do Ensino Superior: o apoio à família, o
investimento financeiro e, sobretudo, o risco que iam correr ao realizar um
investimento que poderia não ter retorno. A alteração das rotinas familiares e
uma gestão muito rigorosa do tempo são imposições que a entrada no ES coloca a
estes estudantes para que conciliem a vida familiar e os estudos, sem que a
primeira seja afetada e para que a segunda seja concluída com sucesso. Há muita
coisa em jogo e importa continuar a assumir responsabilidades que não podem ser
descartadas e contrair outras que envolvem um elevado investimento, tanto
pessoal como financeiro.
Autores como Baxter e Britton (2001) referem outras fontes de risco no que se
refere à conciliação entre a vida académica e a vida pessoal: o risco do
género, que penaliza as mulheres, tradicionalmente mais responsabilizadas
socialmente pela organização da vida familiar; e o risco do afastamento dos
habitus da classe trabalhadora, uma consequência inevitável para quem frequenta
o Ensino Superior. A frequência deste nível de ensino como que reivindica uma
nova identidade, tanto para o próprio como para as pessoas com quem se
relaciona socialmente, o que, implicitamente, desafia relacionamentos
anteriores. Nos relatos apurados, os estudantes do nosso estudo descrevem como
tentam gerir as relações com a família e com os amigos antigos, a fim de
minimizar as perturbações nas suas vidas. Qualquer estratégia que adotem tem
consequências, sendo patente quando, por exemplo, nos dizem que colegas de
trabalho fazem comentários do género: "Eh pá, tás com verdadeiro espírito
académico".
Por outro lado, a questão da gratificação pessoal está bem patente nas razões
aludidas e, tal como nos refere Walker (2006), argumentam que a decisão de
ingressar no Ensino Superior foi, também, uma estratégia para promoverem um
envelhecimento ativo que lhes proporcionasse bem-estar e uma ocupação
intelectualmente estimulante.
No que se refere à integração no meio e na vivência universitária, os problemas
que os sujeitos do presente estudo sentiram e os desafios que esta nova
experiência lhes colocou são comuns a pessoas que passam por experiências
semelhantes (Young, 2000). O inevitável "choque intergeracional", que surge da
convivência entre pessoas adultas (sobretudo os mais velhos) e estudantes mais
jovens, está abundantemente referido na literatura (Merrill, 2001; Reay et al.,
2002). Para os sujeitos do nosso estudo, embora este não seja um obstáculo para
a obtenção de sucesso e se sintam relativamente integrados no meio
universitário, afirmam que é, sem dúvida, uma integração mitigada, na medida em
que existem várias vivências em que não participam, como é o caso das
atividades sociais.
Por outro lado, a universidade possui uma cultura própria, linguagens e habitus
que os estudantes adultos desconhecem. Traduzem-se em práticas epistemológicas
e pedagógicas, num estilo próprio de comunicação (oral e escrita), e o próprio
espaço físico universitário é complexo; os estudantes adultos acham o mundo
universitário "assustador" (Read et al., 2011, cit. por Munro, 2011). Na
investigação que desenvolvemos, embora o sentimento de medo não tenha sido
verbalizado pelos entrevistados, quando questionados sobre o processo de
integração, está subjacente a ansiedade e o receio de não serem capazes de se
adaptar e de se apropriar da complexidade da vida académica, tanto no que se
refere à vida social, como à apropriação de saberes.
Sobre a perceção de sucesso/insucesso académico, os sujeitos do nosso estudo
referem que, no início, tiveram muitos receios por acharem que não iam ser bem
sucedidos. Contudo, e à semelhança do que concluiu Lange (2004), nos resultados
que apurámos há evidências de que a frequência da universidade é
transformadora, leva as pessoas a ultrapassar uma visão reduzida e elementar
das questões e dos problemas, desafia-as para que sejam mais conscientes e
leva-as a assumirem atitudes mais críticas e responsáveis no seu quotidiano.
Entre os vários indicadores apurados sobre a perceção que os estudantes adultos
possuem relativamente às suas capacidades pessoais face às exigências que os
processos de aprendizagem colocam, detenhamo-nos, em termos de discussão, nos
défices que os entrevistados elencaram, e que, considerados como um dado
adquirido, parecem condicionar a sua expectativa de sucesso. Existe como que
uma aceitação acrítica de que esses défices vão condicionar o sucesso, opinião
que é negada pela investigação (Richardson, 1994). Concomitantemente, e se nos
ativermos aos saberes de vida que estes estudantes construíram ao longo da sua
existência, os estudos também mostram que estes conhecimentos, embora de
carácter mais prático, são uma mais-valia não negligenciável, que tanto
contribui para a capacitação para o sucesso, como para a qualidade do serviço
educativo que é prestado pela universidade (Forrester-Jones &
Hatzidimitriadou, 2006). Estes autores defendem a importância de uma ação
contínua e de esforços que devem ser empreendidos pela instituição
universitária para integrar estudantes em várias faixas etárias, não apenas
para estender o acesso ao Ensino Superior a um público mais alargado mas,
sobretudo, como meio de promoção académica dos alunos e de crescimento social.
Finalmente, o processo de desenvolvimento curricular. Na discussão dos
resultados obtidos neste campo de análise, centremo-nos na pessoa do professor
e na perceção dos entrevistados sobre o desempenho deste ator educativo, por
eles considerado como a chave para o sucesso do processo que encetaram. Embora
muitos estudos acusem o "distanciamento" entre o corpo docente e os discentes
que existe no meio universitário (Munro, 2011; Read, 2011), Merrill (2001)
defende que, no ensino universitário, e como forma de atenuar as desigualdades
entre estudantes tradicionais e não tradicionais, os professores universitários
devem assumir uma postura de educadores de adultos. Para tal, precisam ouvir as
vozes dos estudantes adultos oriundos da classe trabalhadora e de desafiar as
estruturas políticas e práticas das instituições de ES, não só para que
melhorem as experiências de aprendizagem, mas também para reafirmar a
identidade da "classe social" nos debates académicos.
Em jeito de conclusão, podemos concluir que a frequência da universidade por
estes adultos muda a sua opinião, não só acerca do mundo académico, mas também
acerca do meio envolvente. Passam por um processo de socialização que é
frequentemente muito duro, pois relacionam-se com outros estudantes que possuem
ideias e posturas diferentes das suas, e têm que acompanhar (e ser bem
sucedidos) num meio de que desconhecem as regras e que os desafia, tanto do
ponto de vista pessoal como intelectual. Contudo, os sujeitos que integraram
este estudo consideram que a experiência que estão a viver tem contribuído para
que se desenvolvam e, tal como no estudo de Merrill (2001), sentem que os seus
"horizontes foram alargados", a sua identidade reforçada e que o processo de
aprendizagem tomou conta das suas vidas ao ponto de quererem ir mais além.