Cientistas portugueses no estrangeiro: Factores de mobilidade e relações de
diáspora
Introdução
A crescente internacionalização da ciência contemporânea manifesta-se, entre
outros fenómenos, na crescente mobilidade dos cientistas entre países. Tal como
se universalizaram as tecnologias de produção e disseminação da ciência e a
legitimação dos seus conhecimentos e procedimentos, uma validade sancionada
pela participação em comunidades que transcendem as fronteiras dos Estados
nacionais (Nunes e Gonçalves, 2001: 15), também as carreiras científicas se
tornaram globais (Mahroum, 2000b).
A circulação de investigadores é considerada um vector fundamental para a
produção de ciência, contribuindo para a acumulação e transferência de
conhecimento.
A mobilidade é uma pré-condição essencial para a fertilização cruzada de ideias
e know-how. Os cientistas que se deslocam entre diferentes locais de produção
de conhecimento trocam ideias e know-howe aprendem sobre novas técnicas,
dispositivos e princípios (Gibbons e outros, 1997: 38)
Porém, os fluxos de circulação não são equitativos, antes reflectirão o
crescimento heterogéneo e diferenciado do sistema mundial da ciência. Há países
que acolhem um maior volume de investigadores estrangeiros e outros que os
perdem, quando os fluxos de saída superam os de entrada e de retorno. Porém,
os cientistas expatriados não estão necessariamente perdidos para o sistema
científico de origem, podem igualmente contribuir para a transferência de
conhecimento a partir dos seus países de acolhimento.
Qual será então a posição de Portugal nesta teia mundial de circulação de
cientistas? Tradicionalmente enteados de Galileu (Nunes e Gonçalves, 2001), o
acentuado crescimento do sistema científico português das últimas décadas terá
em parte mudado as condições de trabalho e de carreira dos cientistas
portugueses. Mas como se reflectirão estas mudanças nos comportamentos,
atitudes e representações dos cientistas móveis?
O presente artigo tenta esboçar uma resposta a estas questões, seguindo uma
estrutura tripartida. Em primeiro lugar, são examinadas as condições de
atracção que os sistemas científicos estrangeiros continuam a exercer sobre
os investigadores portugueses. Em segundo lugar, são discutidos os factores de
impulsão para a saída proporcionados pelo sistema português. Por fim, é
testada a hipótese que os cientistas portugueses expatriados continuam ligados
à ciência portuguesa, contribuindo para a produção e disseminação de
conhecimento.
Este artigo resulta de um projecto de investigação em curso sobre a mobilidade
internacional dos cientistas no sistema científico português. É baseado num
inquérito online (ver Lyons e outros, 2005) aplicado em Junho de 2007 a uma
amostra de conveniência de investigadores portugueses radicados no estrangeiro.
1
803 cientistas foram recenseados através de diversas fontes
2
mas, não havendo dados sobre o número e distribuição geográfica ou por áreas
científicas de investigadores portugueses no estrangeiro,
3
é impossível aferir a representatividade quantitativa e qualitativa da amostra
de conveniência reunida.
4
Foram recebidas 521 respostas,
5
correspondendo a 65% da amostra inicial.
Factores de atracção dos sistemas científicos estrangeiros
Muita da já abundante literatura sobre mobilidade científica conceptualiza a
direcção dos fluxos de circulação em termos de factores de atracção (pull) e
de repulsão (push) (Todisco, Brandi e Tattolo, 2003; Thorm e Holm-Nielsen,
2006; Jalowiecki e Gorzelak, 2004; Baruch, Budwahr e Khatri, 2007). Geralmente,
os primeiros dizem respeito às condições favoráveis de acolhimento no país de
destino e os segundos às condições menos propícias à actividade científica no
país de origem. Entre os factores de atracção mais comuns encontram-se não só
as condições científicas (recursos disponíveis para a actividade científica,
nomeadamente financiamento e equipamento; qualidade do ambiente de
investigação; desenvolvimento em áreas de ponta; equipas compostas por
cientistas reputados) e profissionais (oportunidades de formação e emprego,
remunerações, progressão), mas também políticas (natureza democrática dos
regimes, facilidades concedidas à imigração qualificada) e culturais (língua,
estilo de vida, cosmopolitismo, presença de comunidades do país de origem)
(Todisco, Brandi e Tattolo, 2003: 126; Thorm e Holm-Nielsen, 2006: 5; Rizvi,
2005: 176; Jalowiecki e Gorzelak, 2004: 301; Baruch, Budwahr e Khatri, 2007:
100; De la Vega e Vessuri, 2008: 72; Favell, Feldblum e Smith, 2006: 9).
Um primeiro passo de identificação dos factores de atracção que condicionam a
mobilidade dos cientistas portugueses consiste na caracterização da
distribuição dos investigadores no estrangeiro por país de acolhimento (quadro
1).
Quadro_1
Distribuição dos investigadores portugueses no estrangeiro por país de
acolhimento
N=521
Fonte: *OCDE, Main Science and Technology Indicators, dados relativos a 2005
(ou último ano disponível);
**National Science Foundation, S& E Indicators 2008, dados relativos a 2005;
***UNESCO, Internacional flows of mobile students at the tertiary level,dados
relativos a 2005
Verifica-se então que os cientistas portugueses são atraídos para sistemas
científicos do centro do sistema-mundo: de maior dimensão (medida, por
exemplo, pelo número de investigadores), com um maior investimento em ciência
(aferido, por exemplo, pelo peso da despesa em I& D no PIB nacional), com
maior produtividade (patente no número de publicações), com sistemas de ensino
terciário mais internacionalizados (atracção de estudantes estrangeiros).
Assim, mais de metade dos inquiridos encontra-se no Reino Unido e nos Estados
Unidos. Apesar de tal poder ser em parte atribuído a desvios na amostragem, a
preponderância destes dois países como destino dos fluxos de mobilidade
científica internacional é corroborada pelos dados estatísticos
6
disponíveis e por vários estudos anteriores (Fontes, 2007; van de Sande,
Ackers e Gill, 2005: 19; Alarcon, 1999: 1390; Diaz-Briquets e Cheney, 2002: 52,
48; Baruch, Budwahr e Khatri, 2007; Hirt e Muffo, 1998: 30; Casey e outros,
2001: 39-41; Morano-Foadi, 2006: 213; Mahroum, 2000a e 2000b; Millard, 2005:
351; Szélenyi, 2006: 184). Justifica-se sobretudo pelas razões científicas
acima mencionadas, mas também por factores de ordem profissional (salários
atractivos, quantidade de oportunidades de emprego, formas de recrutamento para
lugares de investigação tradicionalmente abertas e transparentes, sem
discriminação por nacionalidade) mas também cultural (preponderância global da
língua e cultura anglo-saxónica).
7
Pode também constatar-se o peso assinalável de outros países pertencentes à
União Europeia (França, Holanda, Alemanha), explicável também pela proximidade
geográfica e a existência de programas de mobilidade intra-europeia e de
acordos de livre circulação e reconhecimento de diplomas. 5% dos inquiridos
encontram-se na Suíça, país com uma considerável comunidade de emigrantes
portugueses. Verifica-se que os estudantes de doutoramento se localizam
primordialmente na União Europeia (41%) e no Reino Unido (31%), enquanto que há
uma maior proporção de investigadores doutorados nos Estados Unidos (38%) e
noutros países fora da Europa (6%)
De forma geral, os investigadores portugueses localizam-se nas instituições de
topo dentro de cada país: por exemplo, no Reino Unido o Imperial College, as
Universidade de Cambridge, Edimburgo e Oxford e o University College de
Londres; nos Estados Unidos o MIT, as Universidades de Harvard, Califórnia
(Berkeley), Nova Iorque, Carnegie Mellon, Yale e Stanford; em França a
Universidade de Paris, o Instituto Pasteur, a École des Hautes Études en
Sciences Sociales, o INSEAD; na Holanda as Universidades de Delft, Amesterdão,
Twente, Wageningen e Utrecht; na Suíça as Universidades de Lausana, Zurique e
Genebra. Esta distribuição é conforme à tendência dos fluxos de mobilidade
científica se dirigirem para centros de gravidade ou clusters (Millard, 2005;
ver também Gill, 2005: 330; Mahroum, 2000a: 65; Mahroum, 2000b: 514; van de
Sande, Ackers e Gill, 2005: 15, 17). No entanto, diferentes áreas científicas
têm diferentes centros gravitacionais, ou seja, as instituições científicas
podem ter áreas específicas de excelência (Laudel, 2005), que atraem estudantes
e investigadores estrangeiros, ainda que no cômputo geral possam ter uma
avaliação menos positiva. Mahroum (2000a: 78) demonstra, para o caso britânico,
como as instituições com um maior número de académicos estrangeiros são também
as que obtêm as melhores classificações nos exercícios de avaliação.
Foi pedido aos cientistas inquiridos que assinalassem a importância atribuída a
um conjunto de factores sobre a escolha da instituição estrangeira onde se
encontram a fazer investigação (quadro_2).
Quadro_2
Importância atribuída a um conjunto de justificações para a escolha da
instituição de acolhimento no estrangeiro(média)
Nota: N=489; valores médios entre 1 (nada importante) e 5 (muito importante)
Constata-se que o motivo invocado com mais veemência é o prestígio da
instituição, o que é conforme a resultados de estudos internacionais (Ackers e
outros, 2001: 71; Mahroum, 2000a: 56; Mahroum, 2000b: 516; Millard, 2005: 345;
van de Sande, Ackers e Gill, 2005: 17; Szélenyi, 2006: 195). Seguem-se outras
justificações de ordem científica: recursos disponíveis, composição
interdisciplinar ou multinacional da equipa, presença de um determinado
cientista. Corroborando os dados acima apresentados, os inquiridos também
consideram como muito relevante o país onde se situa a instituição de
acolhimento.
Os estudantes de doutoramento, como é típico de um período de formação, tendem
a conferir maior importância à influência de outros cientistas mais seniores na
escolha da instituição: a escolha de um orientador em particular, a
recomendação de um professor em Portugal, a presença de outros portugueses, ter
conhecido membros da equipa em actividades científicas anteriores. A ausência
deste tipo de contactos pode funcionar como uma barreira à mobilidade (Casey e
outros, 2001: 46), enquanto que os contactos interpessoais tecidos em ocasiões
como conferências influem na escolha de uma instituição de acolhimento
(Millard, 2005: 353; Diaz-Briquets e Cheney, 2002: 142; Mahroum, 2000a: 100).
As redes entre académicos seniores tendem também a facilitar a mobilidade dos
estudantes de doutoramento e investigadores em pós-doutoramento (Millard, 2005:
355; van de Sande, Ackers e Gill, 2005: 17; Diaz-Briquets e Cheney, 2002: 52;
Szélenyi, 2006: 199). A escolha da instituição baseada na intenção de trabalhar
com um cientista em particular é também mais valorizada pelas mulheres, pelos
investigadores mais jovens e localizados a maiores distâncias geográficas. Para
Baird (1992: 3) e Hirt e Muffo (1998: 24), os professores e orientadores nos
estudos pós-graduados são agentes críticos da socialização científica,
definindo conhecimento e valores disciplinares, modelos de papéis,
proporcionando ajuda e conselhos práticos. A relação entre orientador e
estudante tem uma importância crucial para a conclusão com sucesso dos estudos
de doutoramento (Golde, 1998: 68; Hirt e Muffo, 1998: 21-22) e para o
crescimento intelectual e a prossecução dos objectivos de carreira dos
estudantes (Baird, 1992: 7).
A diversidade de nacionalidades nas equipas de investigação é considerada mais
importante por investigadores mais jovens, radicados noutros países que não os
anglo-saxónicos (onde esta diversidade é um dado praticamente adquirido em
qualquer instituição). A valorização do contacto entre o departamento de
acolhimento e empresas é, como seria de esperar, fortemente influenciada pela
área científica do investigador, tendo destaque as ciências da engenharia (ver
também Millard, 2005: 356).
Quanto às conexões entre instituição de acolhimento e Portugal, verifica-se que
a existência de protocolos de intercâmbio
8
ou projectos em colaboração entre as instituições de origem e destino dos
investigadores (que tendem a facilitar o processo de mobilidade, ao diminuírem
os custos, os tempos e os entraves burocráticos Tremblay, 2002: 61; Avveduto,
2001: 233) é mais relevante para as investigadoras do sexo feminino e em
instituições de acolhimento fora da Europa; a recomendação de um colega ou
professor em Portugal também é mais valorizada por mulheres e investigadores
mais jovens; por fim, a existência de investigadores portugueses na mesma
instituição é considerada mais importante por investigadores jovens,
localizados na Europa não comunitária. Estes dados demonstram que a importância
das redes pessoais na escolha das instituições pode ser menos significativa que
outros factores, mas não é nula. As migrações em cadeia são mais frequentes
entre os migrantes menos qualificados, mas também são possíveis no caso dos
cientistas (Ferro, 2004: 386; Diaz-Briquets e Cheney, 2002: 55, 141; Szélenyi,
2006: 194).
Nas respostas abertas a esta questão, os inquiridos destacam aspectos como a
qualidade genérica ou as características específicas ao nível de trabalho
científico da instituição Qualidade da ciência e investigação praticada no
laboratório; um ambiente interactivo em termos de discussão científica e input,
quer entre os membros do laboratório onde estou como entre diferentes
laboratórios na mesma instituição ou entre instituições. (investigador
doutorado, Estados Unidos) , as condições laborais (remuneração e carreira)
Salário muito superior ao que tinha na Europa (investigador doutorado,
Estados Unidos) , e critérios pessoais, como a proximidade de Portugal e a
qualidade de vida na cidade escolhida O meio metropolitano em si. Delft é
uma cidade agradável e Roterdão/Haia cidades cheias de oferta cultural são
mesmo aqui ao lado; acessibilidade, incluindo a de existir um aeroporto
internacional não muito longe. (investigadora doutorada, Holanda) e a
compatibilização com a carreira do cônjuge
9
No mesmo campus existe também um Centro de Investigação em Física na área
de trabalho da minha mulher (também investigadora) (investigador doutorado,
Alemanha).
Factores de impulsão para a mobilidade
Na acepção mais comum da literatura desta área, os factores de repulsão dizem
respeito às condições negativas no país de origem, de natureza profissional e
científica (ver Casey e outros, 2001: 38-39; Ackers e outros, 2001: 68;
Todisco, Brandi e Tattolo, 2003: 125), mas também políticas (repressão,
instabilidade, guerra civil) ou económicas (crise, desemprego, baixo
rendimento, corrupção) (ver Ferro 2004: 384; Jalowiecki e Gorzelak, 2004: 301;
Thorn e Holm-Nielsen 2006: 2) que empurram os cientistas para o estrangeiro.
Porém, considerando a mobilidade como um fenómeno natural (e até benéfico)
nos sistemas científicos, será mais pertinente analisar as condições que no
país de origem estimulam ou impulsionam essa saída, quer de índole estrutural
(circunstâncias do sistema científico, perspectivas de carreira) quer de índole
pessoal (experiências e motivações individuais).
A bibliografia internacional (Alarcon, 1999: 1390; Baruch, Budwahr e Khatri,
2007: 100; Jalowiecki e Gorzelak, 2004: 300; Millard, 2005: 353; Avveduto,
2001: 238; Tremblay, 2002: 42; Rizvi, 2005: 179; Diaz-Briquets e Cheney, 2002:
11; Mahroum, 2000a: 24; Szélenyi, 2006: 185) indica que o estudo num país
estrangeiro é frequentemente o primeiro passo para a migração tendencialmente
permanente: Estudar no estrangeiro oferece possivelmente uma integração social
e cultural e fornece os créditos educacionais (reconhecidos no estrangeiro) que
tornam a integração menos difícil (Ferro, 2004: 383). Porém, dado que o
sistema de ensino terciário em Portugal atinge um nível de desenvolvimento
comparável ao dos países do centro, esta migração de estudantes
universitários far-se-á não no 1.º ciclo mas sim ao nível dos estudos pós-
graduados.
Efectivamente, a grande maioria dos investigadores portugueses que desenvolvem
actividade científica no estrangeiro fez a sua formação inicial em Portugal
(96%). Entre os investigadores doutorados é um pouco mais frequente a
licenciatura obtida num país estrangeiro, o que se poderá dever à necessidade
de sair do país para estudar há algumas décadas atrás (por motivos vários, como
a guerra colonial, a instabilidade nas universidades no período pós-25 de
Abril, a inexistência de alguns cursos em Portugal). Já no que respeita ao
ensino pós-graduado, 80% dos investigadores com mestrado
10
e 76% dos investigadores com doutoramento obtiveram estes graus no
estrangeiro.
11
A discriminação das universidades portugueses de licenciatura dos
investigadores portugueses no estrangeiro (quadro_3) permitirá aferir quais as
instituições que tendencialmente preparam ou incentivam mais os seus alunos à
prossecução de uma carreira de investigação e/ou à formação pós-graduada no
estrangeiro. Segundo Mahroum (2000a: 52, 62), a mobilidade faz-se geralmente
das periferias para os centros, mas as instituições de origem têm de ser
reconhecidas pelos pares para que os investigadores sejam aceites nas
organizações de topo.
Quadro_3
Investigadores portugueses no estrangeiro por universidade portuguesa de
obtenção da licenciatura (%)
Nota: N=487
Fonte: *GPEARI, Diplomados no Ensino Superior, 1993-2005, http://
www.estatisticas.gpeari.mctes.pt/?idc=47& idi=171906;
**GPEARI, Evolução da Qualificação do Pessoal Docente do Ensino Superior
Universitário Público: 1993-2004, http://www.estatisticas.gpeari.mctes.pt/
& ?idc=47& idi=105243
Verifica-se então que a maioria dos investigadores provém das universidades
públicas localizadas nas três principais cidades: Lisboa, Porto e Coimbra.
12
As universidades públicas regionais são pontos de origem menos frequentes e
as universidades privadas (com a excepção da Universidade Católica, que tem
características específicas) e institutos politécnicos ocupam posições muito
marginais, com cerca de 2% dos casos. As universidades de Lisboa, Porto e
Coimbra distinguir-se-ão por serem mais antigas e de maior dimensão
(mensurável, por exemplo, no número de diplomados na última década), mas também
mais orientadas para a investigação (patente, por exemplo, na proporção mais
elevada de doutorados no pessoal docente, na atribuição de doutoramentos, mas
também no acolhimento de centros de investigação,
13
no investimento e produtividade científica). Há a ressalvar a Universidade do
Algarve, origem de um número de investigadores no estrangeiro desproporcionado
em relação à sua dimensão, mas que também regista um nível elevado de
qualificação do pessoal docente.
Entre os inquiridos, é muito frequente encontrar uma orientação para a
internacionalização prévia, que desenvolverá a apetência para a mobilidade: 83%
dos estudantes de doutoramento declararam ter participado em actividades
científicas no estrangeiro antes do início dos estudos. A actividade mais
frequentemente referida é a participação em conferências no estrangeiro (53%),
seguida de perto pela visita ou estágio numa instituição estrangeira (47%).
Segue-se a participação num projecto de investigação em colaboração
internacional (36%) e a realização de trabalho de campo ou recolha de
bibliografia ou dados (34%). Cerca de um terço dos inquiridos (com destaque
para os estudantes King e Ruiz-Gelices que se encontram a fazer o doutoramento
em países da União Europeia, possivelmente em muitos casos no mesmo país e/ou
universidade) tinha participado num programa de mobilidade europeu ao nível do
ensino superior (Erasmus ou Sócrates). Estudos anteriores (King e Ruiz-Gelices,
2003: 242; Ackers e outros, 2001: 64; Gill, 2005: 331-332) concluíram que a
participação nestes programas aumenta a propensão para continuar a estudar ou
trabalhar no estrangeiro, visto que uma experiência internacional durante a
licenciatura tende a aumentar a confiança em viajar, a desenvolver capacidades
(conhecimento de línguas estrangeiras, receptividade à mudança, flexibilidade,
abertura a novas experiências, facilidade de relacionamento interpessoal) e a
promover a criação de ligações com potenciais instituições de acolhimento e
orientadores.
No que respeita às razões de suporte da decisão de sair de Portugal para
desenvolver trabalho científico no estrangeiro (quadro_4), são referenciadas
como mais importantes as motivações científicas (aprender novas técnicas,
estabelecer redes) e de carreira (valorizar o currículo, aumentar as
possibilidades de conseguir um emprego no estrangeiro ou em Portugal, no caso
dos estudantes de doutoramento).
14
Quadro_4
Importância atribuída a um conjunto de justificações para a decisão de fazer
investigação no estrangeiro (média)
Nota: N=488; valores médios entre 1 (nada importante) e 5 (muito importante)
Os investigadores doutorados, sobretudo os que têm situações contratuais mais
instáveis (bolseiros, contratos temporários) atribuem maior importância à
dificuldade em encontrar emprego e à importância para o currículo científico de
uma experiência no estrangeiro. A possibilidade de estabelecer redes
científicas internacionais é valorizada sobretudo pelos investigadores mais
jovens.
Os investigadores inquiridos atribuem também valor ao facto de a mobilidade
colmatar lacunas do sistema científico português: utilizar meios que não estão
disponíveis, trabalhar em áreas pouco desenvolvidas, obter uma formação de
maior qualidade (ver também Casey e outros, 2001: 38-39; Todisco, Brandi e
Tattolo, 2003: 125). 77% dos investigadores doutorados afirmam ainda ter sido
importante ou muito importante sair do país para obter formação pós-graduada,
visto que a oferta em Portugal até há poucos anos era reduzida. A utilização de
meios que não estão disponíveis em Portugal é mais importante para os
estudantes de doutoramento e investigadores mais jovens (ver também Ackers e
outros 2001: 71).
Em respostas abertas, os inquiridos realçaram outros factores que tornam o
sistema científico português menos atractivo:
as condições financeiras (valor das bolsas e das remunerações) e regalias
laborais Maior valor da bolsa de doutoramento no estrangeiro. Maior
facilidade de ganhar bolsa de doutoramento pela FCT sendo a instituição de
acolhimento no estrangeiro (estudante de doutoramento, Holanda); Maior
salário que em Portugal, mesmo comparando o maior custo de vida (investigador
doutorado, Suíça);
os meios para fazer investigação melhores acessos a financiamento
(estudante de doutoramento, Estados Unidos); Falta de apoios para investigação
na área da oncologia. Falta de equipamento na maioria dos grupos.
(investigador doutorado, Estados Unidos);
os procedimentos de recrutamento e promoção A mentalidade no meio de
investigação no estrangeiro é muito menos institucional e hierarquizada. O
mérito é um pouco mais importante que a cunha. (estudante de doutoramento,
Reino Unido); Os concursos públicos em instituições portuguesas são
frequentemente viciados de forma a favorecer candidatos internos,
independentemente do seu mérito. (investigador doutorado, ciências naturais,
Estados Unidos); Cultura científica: trabalhar num local onde novas ideias são
bem-vindas; na pequenez do meio científico português é difícil desenvolver
novas ideias sem invadir o território' de alguém. (investigador doutorado,
ciências naturais, Reino Unido).
Esta insatisfação com o sistema científico de origem como motivação para a
saída foi também detectada em estudos sobre outros países europeus com
estruturas académicas mais rígidas e tradicionais (propensas ao inbreeding, às
relações de patrocínio entre seniores e juniores, ao favorecimento de outros
critérios de selecção que não o mérito científico, à prevalência de mecanismos
de recrutamento mais informais e, como tal, mais dependentes do contacto
pessoal), como Espanha, Itália, França (Ackers e outros, 2001: 72; Casey e
outros, 2001: 35; Morano-Foadi, 2006: 213; Gill, 2005: 327-328; Millard, 2005:
352; Avveduto, 2001: 239).
Porém, apenas uma minoria invoca como motivação para a saída a incapacidade em
conseguir emprego ou inscrição num doutoramento.
As motivações não científicas têm também algum peso na decisão de mobilidade.
As razões pessoais (estar próximo a familiares ou amigos) são assinaladas
maioritariamente por investigadoras, mais velhas, casadas, com filhos e cuja
família reside consigo no país de acolhimento. Tal é conforme ao dado que a
mobilidade das mulheres (cientistas e não só) está frequentemente associada à
mobilidade dos parceiros (Ackers e outros, 2001: 58). Por outro lado, mais de
80% dos inquiridos atribui pelo menos alguma importância à experiência de viver
noutro país (sendo este factor mais frequentemente assinalado por
investigadores mais jovens), que proporcionará enriquecimento pessoal, contacto
com outras culturas e a aprendizagem de uma língua estrangeira:
15
Ter a experiência de viver noutro país, aprender outra língua e cultura, e
também ter a oportunidade de trabalhar num laboratório diferente (estudante de
doutoramento, França); Ter contacto com outras culturas, línguas, maneiras de
pensar, tudo isto estabelece um termo de comparação que não se adquire se não
se mudar de sítio'. E o poder de comparação ajuda ao espírito crítico, criando
uma dinâmica de pensamento apropriada ao doutorando/investigador. (estudante
de doutoramento, Holanda).
Foi ainda pedido aos investigadores inquiridos que comparassem as condições
proporcionadas pelos sistemas científicos de partida e de acolhimento quanto a
um conjunto de factores (quadro_5). Há no entanto que ressalvar que 37% dos
estudantes de doutoramento inquiridos afirmam nunca ter feito investigação em
Portugal e que 36% dos inquiridos saíram de Portugal imediatamente após a
licenciatura, pelo que o seu conhecimento directo do sistema científico
português será limitado.
Quadro_5
Avaliação das condições de trabalho científico em Portugal e no país de
acolhimento
Nota: N=467
Atendendo às diferentes características dos sistemas científicos e à própria
atitude subjacente à decisão de migrar temporária ou definitivamente para o
estrangeiro, não é de estranhar que a avaliação dos inquiridos sobre as
condições oferecidas pelo país de acolhimento sejam mais favoráveis que sobre
as condições em Portugal. Tal é especialmente notório no que diz respeito às
condições materiais de investigação (recursos, autonomia, facilidade de
publicação de artigos em revistas internacionais) e de carreira (oportunidades
de emprego, progressão na carreira, transparência nos processos de
recrutamento). Porém, para os estudantes de doutoramento a diferença no
reconhecimento internacional dos doutoramentos e no contacto com os professores
não é muito significativa. No que respeita à conciliação entre vida
profissional e familiar, o balanço é relativamente favorável a Portugal.
A limitada capacidade de atracção do sistema científico português está também
patente nas intenções de retorno dos cientistas expatriados. Tendo sido
perguntado aos inquiridos se tencionavam regressar a Portugal dentro de um
prazo de cinco anos (quadro_6), as respostas da amostra dividiram-se quase
equitativamente, ainda que a proporção de estudantes de doutoramento com
intenção de regressar (66%) fosse bastante superior à proporção de
investigadores doutorados (38%).
Quadro_6
Intenção de regressar a Portugal num prazo de cinco anos e respectivas
justificações
Nota: N=521
No que respeita a variações estatisticamente significativas, há a registar uma
intenção de regresso mais pronunciada entre os inquiridos mais jovens, sem
família constituída (solteiros, sem filhos) ou cuja família reside em Portugal
e, no caso dos investigadores doutorados, com situações contratuais provisórias
(bolsas ou contratos com termo).
Quanto às razões apontadas para o regresso a Portugal, há a assinalar a
preponderância das motivações familiares,
16
o desejo de contribuir para o desenvolvimento científico e económico-social do
país
17
e a qualidade de vida em Portugal.
18
Os investigadores doutorados invocam também a existência de um contrato ou uma
oferta de trabalho com uma instituição portuguesa. Estes dados são conformes
com estudos internacionais anteriores (Fontes, 2007; Casey e outros, 2001: 41;
Gill, 2005: 322; Rizvi, 2005: 188; Todisco, Brandi e Tattolo, 2003: 126). Neste
leque de justificações não há praticamente variações estatisticamente
significativas, à excepção da falta de oportunidades no país de acolhimento só
ser assinalada por estudantes de doutoramento localizados na União Europeia ou
fora da Europa (excluindo os Estados Unidos) e as razões familiares serem
invocadas mais por mulheres (85%) que homens (75%) e mais pelos os mais jovens
(mais de 80%) que pelos investigadores acima dos 40 anos (42%).
Quanto às razões apontadas para o não regresso a Portugal, são maioritariamente
assinaladas as fracas condições proporcionadas pelo país de origem, em termos
de oportunidades de trabalho, recursos para investigação, condições salariais e
laborais. Para os estudantes de doutoramento é também relevante o desejo de
prolongar a experiência de trabalho no estrangeiro e para os investigadores
doutorados as razões familiares têm maior peso. Idênticas barreiras ao regresso
ao país de origem foram identificadas em estudos anteriores (Baruch, Budwahr e
Khatri, 2007: 106; Casey e outros, 2001: 19, 44, 46; Thorn e Holm-Nielsen,
2006: 1; Laudel, 2005: 379).
Ligações ao sistema científico português
Num mundo que se tornou tão mais pequeno e interconectado nas últimas
décadas, a migração científica, mesmo que definitiva, poderá não significar a
perda de cérebros para o sistema científico de origem. Muitos dos cientistas
expatriados manterão contactos estreitos, colaborações ou redes científicas com
o país de onde partiram, pelo que podem ser considerados transmigrantes:
imigrantes cujas vidas quotidianas dependem de interconexões múltiplas e
constantes através de fronteiras internacionais e cujas identidades se
configuram em relação a mais de um Estado-nação, criando e mantendo relações
sociais multifacetadas que interligam as sociedades de origem e de acolhimento
(Schiller, Basch e Blanc, 1995: 48; ver também Favell, Feldblum e Smith, 2006:
5).
O estatuto de transmigrante dos cientistas portugueses pode ser aferido por
um conjunto de indicadores: as suas ligações ao sistema científico português, a
pertença associativa, as práticas de contacto com o país de origem. Esta
manutenção de laços é geralmente considerada importante para assegurar
condições para o regresso ao país de origem, visto que os investigadores
receberão informação privilegiada sobre oportunidades de emprego e serão
conhecidos ou recomendados a potenciais recrutadores por cientistas locais
(Ackers, 2001: 73; Casey e outros, 2001: 44; Gill, 2005: 322; Morano-Foadi,
2006: 215), mas também permite construir redes de diáspora, através das quais
os cientistas promovem a circulação de conhecimento (e tecnologia) e dão o seu
contributo à distância para o desenvolvimento do sistema científico de origem
(Thorn e Holm-Nielsen, 2006: 13; Rizvi, 2005: 189; Meyer e Brown, 1999; Meyer e
Wattiaux, 2006; Favell, Feldblum e Smith, 2006: 12).
A maioria dos investigadores portugueses no estrangeiro (88%) mantém algum tipo
de contacto com o sistema científico português (quadro_7).
Quadro_7
Contactos com o meio científico português (%)
Nota: N=521.
Verifica-se que de longe a actividade mais frequente são os contactos informais
com colegas portugueses. Seguem-se as actividades que indiciam um
acompanhamento à distância da ciência produzida em Portugal (ler artigos,
participar em conferências) e só depois as actividades relativas a uma efectiva
colaboração com o sistema científico português (colaboração em projectos,
escrita de artigos em co-autoria, ministrar aulas ou seminários, fazer trabalho
de campo, escolha de temas de investigação relacionados com Portugal)
19
(ver também Fontes, 2007). 23% dos estudantes de doutoramento no estrangeiro
encontram-se num programa de doutoramento misto e 20% afirmam ainda ter uma
ligação contratual a uma instituição portuguesa: serão em muitos casos
assistentes na carreira docente ou de investigação. Entre os investigadores
doutorados, cerca de um terço afirma promover o intercâmbio de estudantes com
instituições portuguesas e aproximadamente 15% declara alguma participação em
actividades de formação (como membros do júri ou orientadores de doutoramento e
pós-doutoramento) ou de enquadramento da prática científica (membros de
conselhos científicos, editoriais, de avaliação de centros, departamentos ou
concursos).
20
Alguns inquiridos indicam que os contactos se fazem preferencialmente com
outros expatriados, mais do que investigadores em Portugal: Com colegas
portugueses em áreas relacionadas mas a maioria a viver e trabalhar no
estrangeiro (estudante de doutoramento, Irlanda). Outros exprimem alguma
insatisfação com a receptividade dos colegas e instituições portugueses:
quaisquer das actividades que marquei foram levadas a cabo apenas uma ou outra
vez. A dificuldade em fazer e manter contactos com colegas portugueses é
imensa, já há muitos anos que tento e sinto muito pouco interesse.
(investigadora doutorada, Holanda).
No que respeita aos meios através dos quais estes contactos são feitos,
verifica-se a predominância do e-mail (82% assinalam um uso frequente a muito
frequente) e em segundo lugar do telefone (44%). Vários autores destacam o
papel que as novas tecnologias da informação e comunicação têm na comunicação
científica global (Gibbons e outros, 1997; Ackers e outros, 2001: 131; Connel,
Wood e Crawford, 2005: 13; Mahroum, 2000a: 31; De la Vega e Vessuri, 2008: 80),
nas actividades transnacionais em geral (Schiller, Basch e Blanc, 1995) e no
estabelecimento de redes científicas de diáspora (Meyer, Kaplan e Charum, 2001:
353; Meyer e Wattiaux, 2006; Mahroum, Eldridge e Daar, 2006: 29; Brown, 2000;
Meyer e Brown, 1999; Ferro, 2004: 388; Thorn e Holm-Nielsen, 2006: 13). Os
contactos face a face são assinalavelmente mais raros, sobretudo as visitas de
investigadores portugueses à instituição de acolhimento no estrangeiro (4%),
sendo um pouco mais frequentes as visitas dos investigadores expatriados a
Portugal (26%) e os encontros em reuniões científicas (12%).
Aos investigadores doutorados foi ainda perguntado quais os tipos de
instituições portuguesas com as quais mantinham esses contactos. Mais uma vez
se constata o acentuado peso do ensino superior no sistema científico português
(praticamente 80% referiu as universidades) e a escassa ligação entre os
cientistas e as empresas (apenas 5%).
Com o objectivo de aferir a integração dos cientistas portugueses no
estrangeiro em diferentes colectivos, foram formuladas questões relativas à
participação associativa, sobretudo de índole científica. Ainda que a pertença
associativa seja geralmente baixa em Portugal, 75% dos inquiridos afirmou
pertencer a, ou participar em actividades de pelo menos um dos tipos de
associações elencados. Verifica-se então que, para além da participação em
associações científicas internacionais (57%) ou no seu país de acolhimento
(46%), um número significativo de inquiridos mantém ligações com associações
disciplinares (28%) ou de âmbito científico-profissional (21%) em Portugal.
21
A participação em associações de emigrantes portuguesas é a que colhe um
número mais reduzido (mas não nulo) de respostas afirmativas (10%).
22
Mas talvez o dado mais relevante seja que um pouco menos de um terço dos
inquiridos (31%) declara participar nas actividades de associações ou grupos de
estudantes ou investigadores portugueses na sua instituição, no país de
acolhimento ou internacionais. Neste conjunto estão incluídas associações
culturais ou linguísticas integradas em grandes universidades
23
(que se destinam a promover actividades culturais, eventos sociais,
representar e defender os interesses de estudantes e académicos portugueses na
instituição de acolhimento e incentivar os contactos com o meio académico e
empresarial português), associações a nível nacional, como a PAPS Portuguese-
American Post-graduate Society
24
e associações de âmbito internacional, como o FIIP Fórum Internacional de
Investigadores Portugueses. Este último foi criado em 1995, conta com o apoio
da FCT e a sua actividade de maior visibilidade é a organização de um fórum
bianual. Destina-se a oferecer um espaço de divulgação e aproveitamento do
potencial e recursos científicos portugueses dentro e fora de Portugal, e
estimular a mobilidade e a internacionalização da comunidade cientifica
portuguesa, visando promover parcerias entre investigadores e centros de
investigação em Portugal e no estrangeiro de modo a facilitar a mobilidade de
pós-doutorados e alunos de doutoramento ( ), o intercâmbio científico entre
investigadores em Portugal e no estrangeiro, ( ) e a colaboração científica
entre investigadores residentes em Portugal e investigadores ( ) residentes no
estrangeiro; incentivar a troca de informações, o contacto e a coordenação de
esforços entre investigadores portugueses residentes no estrangeiro; organizar
encontros ( ) para debater os novos desafios científicos e tecnológicos, a
política das instituições académicas face às conjunturas sociais e tecnológicos
da actualidade, e as respostas encontradas em Portugal e nos diversos países
representados no FIIP; identificar áreas interdisciplinares, na fronteira da
investigação contemporânea ( ) de modo a promover o diálogo e a colaboração
entre os investigadores em Portugal e os investigadores de origem portuguesa
residentes fora do País.
25
Estas organizações assemelham-se a redes de diáspora (ainda que este termo
seja mais usado relativamente a países do Sul, não europeus), uma vez que
servem para mobilizar e ligar trabalhadores altamente qualificados expatriados,
permitindo a exploração não só do seu conhecimento incorporado, mas também das
duas redes socioprofissionais alargadas, bem como os recursos humanos,
materiais e cognitivos associados (Meyer, Kaplan e Charum, 2001: 352). Têm
características semelhantes às redes de diáspora científica identificadas por
outros autores (Brown, 2000; Meyer e Brown, 1999; Meyer e Wattiaux, 2006: 10;
Mahroum, Eldridge e Daar, 2006: 29): são recentes, emergiram espontaneamente de
iniciativas comunitárias, são apolíticas e sem fins lucrativos mas mantém
relações com o governo do país de origem, usam a Internet como principal meio
de ligação entre os membros e têm por objectivo promover trocas e comunicação
entre os membros mas também contribuir para o desenvolvimento de Portugal,
apoiando o trabalho cooperativo à distância (Mahroum, Eldridge e Daar, 2006:
33).
Em suma, os investigadores portugueses expatriados são um recurso do sistema
científico, que já é de alguma forma mobilizado, mas cujo potencial ainda
está por realizar plenamente:
[Queria] quebrar a lógica Portugal/fora de Portugal que para mim não tem mais
sentido: gostaria de poder trabalhar mais em Portugal (faço-o pouco, mas vou
mantendo algumas ligações laborais muito esporádicas), embora mantendo relações
de trabalho fora de Portugal também. (estudante de doutoramento, Holanda)
Conclusão
A mobilidade internacional dos cientistas portugueses apresenta acentuadas
semelhanças com os padrões identificados em estudos anteriores realizados em
outros contextos nacionais. Os investigadores são atraídos por sistemas
científicos e instituições que detêm mais capitais materiais e simbólicos,
assim como perspectivas de carreira e de vida mais aliciantes. Apesar do
significativo crescimento do sistema português, as condições proporcionadas
ainda são comparadas desfavoravelmente com as encontradas noutros países, o que
desincentiva os movimentos de regresso.
Porém, os cientistas expatriados mantêm, na maior parte dos casos, relações
estreitas e regulares com o meio académico português, pelo que podem constituir
pontos nodais em redes transnacionais de transferência de conhecimento. Ainda
que seja pertinente procurar assegurar condições propícias ao retorno de
pessoal científico altamente qualificado em cuja formação o Estado português
tanto tem investido, será talvez ainda mais importante garantir que a
comunicação e as trocas entre locais e expatriados se faça de forma cada
vez mais intensa e profícua.
É ainda necessário conhecer de forma aprofundada o volume não despiciendo de
cientistas regressados ao sistema científico português: as suas trajectórias,
motivações e as conexões mantidas com investigadores e instituições
estrangeiros. Será essa a fase seguinte do projecto no qual este artigo se
insere.