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EuPTHUHu0874-13362009000200001

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variedadeEu
Country of publicationPT
colégioHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0874-1336
ano2009
Issue0002
Article number00001

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Em evocação de Nicolas Oikonomides I Em evocação de Nicolas Oikonomides

Nicolas Oikonomides (1934-2000)

Conhecendo-se as bases culturais e o pensamento peninsular, facilmente se chega à conclusão que a cultura helénica ' para além da latina e, ainda, da árabe e celta (e outras, embora em menor grau) ' constitui um substracto de base com que lidamos, consciente ou inconscientemente, no nosso dia a dia. Essa realidade legitima o facto que tenhamos votado, em 2008, um volume especial da Revista Portuguesa de História do Livroprecisamente ao tema Helénicos (em memória do saudoso investigador e docente do Collège de France, Jean-Pierre Vernant).

Voltamos hoje ao contacto com os leitores ' tal como então havíamos previsto ' com um outro volume especial, desta feita sobre o tema Neo-Helénicos.

Trata-se, claramente, de um regresso à velha Hélade e à sua cultura, na perspectiva de vários especialistas do nosso tempo.

O que se pretende, ao fim e ao cabo, é abordar questões da História da Cultura e do pensamento ' e, também, de acordo com o espírito que norteia a presente Revista, questões sobre História do Livro e da Edição ' sobre a velha Grécia, que se repercutiram ou foram objecto de difusão e interpretação, em várias regiões da Europa do ocidente, desde a Idade Moderna ao período contemporâneo.

Face a essa perspectiva, pretende-se ter bem presente duas figuras tutelares que ecoam bem fundo no nosso espírito. Trata-se, antes do mais, de Nicolas Oikonomides ' cuja presença (em termos de orientação bibliográfica) nos acompanhou, em Janeiro ' Fevereiro de 1978, durante a nossa presença quer em Atenas quer em outras regiões da Grécia antiga, quer ainda o poeta Giánnis Ritsos, que também na capital grega, nesse mesmo período, nos recebeu em sua casa e nos guiou também, pela tutela onírica, como os bons poetas o sabem fazer.

Giánnis Ritsos (1909-1990), poeta grego

É por demais evidente que na direcção da RPHL ' tal como sucede desde 12 anos atrás quando fundámos esta Revista ' os aspectos da política, no mau sentido do termo, não têm, como nunca tiveram, acolhimento nas nossas páginas partilhadas com os leitores. Não interessa aqui, pois, que Okonomides seja de um quadrante político e que Giánnis Ritsos seja de outro (o que, mesmo assim, não deixa de se reflectir em algumas das suas estrofes).

O que interessa aqui, fundamentalmente, é elevar a grande Grécia, a sua imorredoura cultura e pensamento, os mestres que viu nascer no solo pátrio, bem como os mestres de todas as idades que cresceram à sombra do Parténon e do liceu, seja em Itália, em França, em Castela, Portugal ou outra região do mundo. Deste modo, o presente volume especial desta Revista, elevando a magna Grécia, procura ser um contributo aberto, e insuspeitado, à cultura e civilização de todos os tempos.

Alguns passos para um perfil científico de Nicolas Oikonomides como helenista Cremos ser de toda a justiça que o presente volume destes estudosNeo- Helénicosseja editado em homenagem ao Prof. Nicolas Oikonomides. Trata-se, inquestionavelmente, de uma figura cimeira nos meios helenísticos internacionais. Ele representa para a Grécia ' e indirectamente para o Canadá, onde se acolheu na fase final da sua vida ' algo muito semelhante ao que representa Jean-Pierre Vernant para a França.

Nicolas Oikonomides nasceu em Atenas, em 14 de Fevereiro de 1934, tendo estudado primeiramente na universidade local entre 1951 e 1956. Nunca escondeu que ficou a dever os primeiros incentivos à tutela que recebeu do bizantinista Dionysios Zakythinos.

Concluída a sua licenciatura, rumou a Paris em 1958. , sob a direcção do historiador Paul Lemerle, desenvolveu um intenso programa de investigações com vista ao seu doutoramento. Tais estudos conduziram-no, a dado passo, ao estudo de um domínio científico, a Sigilografia, em que ainda hoje é visto como uma das maiores autoridades mundiais.

Nessa segunda metade dos anos 50, ficou a dever-se-lhe uma das mais interessantes descobertas do século XX na área dos estudos bizantinos. Trata-se do feliz ensejo que se lhe propiciou de encontrar, na biblioteca do mosteiro do Escorial (Espanha), o hoje designado por Escorial Taktikon[1] ou Taktikon Oikonomides.

Gravura representando o mosteiro do Escorial onde Nicolas Oikonomides encontrou o Taktikon

As pesquisas deste seu trabalho sobre o Taktikon do Escorial e outros Taktika prolongaram-se pelos anos 60, altura em que defendeu aquela sua tese de doutoramento, com o maior êxito, na capital francesa. após essas provas este bizantinólogo regressou a Atenas.

O texto dessa sua tese veio a ser publicado em Paris, muito mais tarde, em 1972. Trata-se da obra Les listes de préséance byzantines des IXe et Xe siècles.Consta dela a apresentação e tradução desse Taktikon, bem como os comentários de sua autoria. Este trabalho saiu com a chancela das edições do Centre Nationale de La Recherche Scientifique (CNRS).

Oikonomides, regressado a Atenas, deparou-se com um país que não era o mesmo. Vivia-se então naquela cidade, bem como em toda a Grécia, o regime designado por «ditadura dos Coronéis», implantada em 1967. Sendo casado com a investigadora de estudos Otomanos, Elizabeth Zachariadou ' e não pactuando com essa situação política ' optou pelo seu exílio no Canadá.

Nicolas Oikonomides tinha, com efeito, contraído matrimónio, anos antes, com uma outra especialista de não menor importância, Elizabeth Zachariadou.

Importar registar que esta havia desenvolvido uma vasta obra, a partir de fins da década de 50, tanto no âmbito da sua pesquisa historiográfica pessoal [2], como no panorama da difusão internacional do helenismo em geral, a partir das mais prestigiadas instituições internacionais associadas à investigação deste tema[3].

Antes de deixar a Grécia, Oikonomides tinha associado o seu nome a duas interessantes edições. Uma foi a intitulada The Two Agoras in Ancient Athenas,que saiu em 1963. A outra foi uma reedição da obra Ancient Coins ' Illustrating Lost Masterpieces of Greek Art,um clássico da autoria de F.

Imhoof-Blumer e P. Gardner, de 1964, acompanhado de um estudo de introdução do próprio Oikonomides.

Chegado ao Canadá, este helenista aceitou, em Julho de 1969, na Universidade de Montreal, a cátedra de História de Bizâncio. Manteve esse posto durante perto de duas décadas, ou seja, até 1989, quando regressou de novo à sua cidade natal.

Durante esse vasto período ' e para além de ter editado em Paris, como se disse, a sua dissertação de doutoramento ' este bizantinólogo desenvolveu uma vasta soma de estudos na sua especialidade. Estes podem sistematizados em três grandes vertentes.

A primeira vertente diz respeito a três obras de particular importância (que ombreiam magistralmente com a do seu doutoramento), que são Fiscalité et Exemption Fiscale à Byzance (IXe-XIe S.),de 1996;e, ainda,Social and Economic Life in ByzantiumeSociety, Culture and Politics in Byzantium,estas duas últimas preparadas em colaboração com a sua esposa, Elizabeth Zachariadou (e editadas postumamente, respectivamente, em 2004 e 2005).

Quanto à segunda vertente, ela deve-se a uma natural continuidade do trabalho empreendido pelo seu mestre da Universidade francesa, Paul Lemerle, em torno da divulgação dos documentos existentes nas colecções dos mosteiros do Monte Athos, na Grécia. , ele teve ensejo de publicar um trabalho não menos relevante acerca do trabalho intelectual e religioso nessas comunidades.

Um aspecto do Monte Athos, na Grécia

A terceira vertente diz respeito ao seu extraordinário papel no âmbito da Sigilografia. Ficou a dever-se-lhe, entre outros trabalhos, uma cuidada e criteriosa discrição dos itens existentes na colecção bizantina de Dumbarton Oaks, em vários volumes. O seu trabalho levou ainda à criação de um novo jornal científico ' de que ele foi o responsável editorial ' intitulado Studies in Byzantine Sigilography.

Na capital da Grécia continuou a desenvolver um trabalho de pesquisa exemplar.

Com várias edições que poderiam ainda ser assinaladas, Oikonomides acabaria por falecer em 31 de Maio de 2000, legando para a posteridade uma obra histórica verdadeiramente invulgar.

O desaparecimento deste sábio constitui uma perda irreparável para a comunidade de helenistas mediterrânicos e não . Dois eruditos que conheceram bem o seu trabalho, John Nesbitt e Eric McGeer, quando escreveram acerca do falecimento de Oikonomides, evocaram, com toda a propriedade, algumas características presentes num belo poema do escritor grego Cavafy:

Ele era justo, sábio e corajoso e, enfim, Grego, mais que qualquer outra coisa; a humanidade não se pode honrar por mais belas qualidades, não se encontram melhores senão entre os deuses[4].


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