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EuPTHUHu1645-00862009000200003

EuPTHUHu1645-00862009000200003

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN1645-0086
ano2009
Issue0002
Article number00003

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Adaptação portuguesa do questionário para a avaliação da adesão ao tratamento anti-retrovírico - VIH (CEAT-VIH).

O Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) foi identificado na década de 1980 e desde então o impacto negativo da pandemia da SIDA não deixa de crescer em todo o mundo. A situação que se observa em Portugal não é diferente.

De acordo com os dados disponíveis do Centro de Vigilância Epidemiológica das Doenças Transmissíveis (CVEDT, 2008) encontram-se notificados 34 888 casos de infecção VIH/SIDA nos diferentes estadios da doença, incluindo os casos de SIDA por VIH-1 e VIH-2, casos de infecção de portadores assintomáticos e de sintomáticos não SIDA (Complexo Relacionado com a SIDA, na designação clássica), no nosso país. Entre 01/01/1983 e 31/12/2008 foram notificados 15 020 casos de SIDA, dos quais 7273 faleceram. As infecções oportunistas são as patologias associadas a um maior número de mortes, destacando se os óbitos referindo tuberculose ( 41,2%).

Como denominador comum a todos os estadios, verifica-se que o maior número de casos notificados (casos acumulados) corresponde a infecção em utilizadores de drogas por via endovenosa ou toxicodependentes, constituindo 42,5% de todas as notificações reflectindo a tendência inicial da epidemia no nosso país (CVDET, 2008).

Quando, em 1996, surgiu uma nova família de anti-retrovíricos (Inibidores da Protease), nasceu uma nova esperança para os portadores da doença. Estas novas terapêuticas anti retrovíricas, em conjunto com os tratamentos existentes, reduziram de forma importante e significativa a morbilidade e mortalidade associada à infecção pelo VIH (Chesney et al., 2000; Gir, Vaichulonis & Oliveira, 2005; Remor, 2002a).

Estas terapêuticas foram denominadas HAART (Highly Active Antiretroviral Therapy) e promoveram esta enfermidade ao estatuto de doença crónica (maior esperança de vida), controlável a longo prazo (diminuição de episódios mórbidos e frequência de internamentos) e com consequente melhoria da qualidade de vida.

Para atingir estes benefícios é essencial um nível de adesão à terapêutica de cerca de 90 a 95% das doses prescritas.

No entanto, estes tratamentos podem implicar a toma simultânea de vários fármacos durante períodos de tempo indefinidos e de acordo com rigorosas condições de administração, o que faz aumentar a probabilidade de abandono dos tratamentos ou uma adesão insuficiente (Remor, 2002b). Trabalhos recentes identificaram uma associação entre a complexidade do tratamento e a baixa adesão ao tratamento (p. ex.: Remor, Milner-Moskovics & Preussler, 2007).

Alguns estudos levados a cabo sobre o grau de adesão em indivíduos infectados pelo VIH estimam que a percentagem de doses tomadas relativamente à prescrição oscile entre 50 a 75% e que apenas 30% das doses prescritas sejam tomadas com a frequência indicada e na dose necessária (Chesney et al., 2000; Remor, 2002b).

Uma vez que as evidências clínicas estabelecem uma relação estreita entre a adesão insuficiente à terapêutica anti-retrovírica e o aparecimento de mutações de resistência, de falência virológica, bem como a antecipação da progressão clínica para a fase de SIDA, tem-se vindo a discutir largamente esta questão pelos especialistas no tratamento da infecção pelo VIH.

Uma vez que ainda não é possível erradicar o VIH, a terapêutica anti- retrovírica tem como principal objectivo retardar a evolução da doença, promover a supressão da carga viral abaixo do limiar de detecção pelo máximo de tempo possível, a restauração e a manutenção da imunidade, estimulando deste modo a manutenção da saúde geral e um aumento da qualidade de vida dos indivíduos VIH+ (Antunes, 2005).

Porém, para se alcançarem os benefícios dos resultados positivos que a terapêutica anti retrovírica permite, é necessário um cumprimento rigoroso em relação à toma dos medicamentos por parte das pessoas que vivem com VIH/SIDA (Antunes, 2005; Remor, 2002c). Actualmente, muitos países estabeleceram uma política de saúde que inclui o acesso gratuito e universal ao tratamento anti- retrovírico, não obstante existem poucos estudos publicados que avaliem a eficácia das estratégias implantadas para garantir que os fármacos distribuídos estão a ser tomados de forma adequada, ou seja, na frequência e quantidade com que são prescritos (Remor, 2002c; Remor et al., 2007).

Neste sentido, existem também poucos instrumentos standarde especialmente desenvolvidos para avaliar os resultados de programas de intervenção para melhoria da adesão ao tratamento e também como medida de controlo das tomas dos medicamentos em ensaios clínicos com novos fármacos (Remor et al., 2007).

Devido à complexidade de avaliação da adesão terapêutica ao tratamento anti retrovírico, foi criado um instrumento multidimensional de medida de adesão em Espanha, designado Cuestionario para la Evaluación de la Adhesión al Tratamiento Antirretroviral (CEAT-VIH). Este questionário surgiu como medida de adesão ao tratamento específica para a infecção VIH/SIDA (Remor, 2002b, 2002c). O benefício deste instrumento reside em tratar-se de uma medida de auto-relato validada por um critério clínico externo, a carga vírica. Importa referir que o presente questionário tem sido utilizado com sucesso noutros países como a Espanha (Remor, 2002b, 2008), Brasil (Remor et al., 2007; Giovelli, 2009), Perú (Alcántara Zapata, 2008; Tafur-Val-derrama, et al., 2008), Colômbia (Villa González, 2005), México (Remor, 2008) e mais recentemente Roménia.

Em Portugal também existem lacunas ao nível de instrumentos para medir o construto de adesão terapêutica na infecção VIH/SIDA, razão que justificou neste estudo levar a cabo a tradução, adaptação transcultural e validação do referido questionário para a população portuguesa, dada a sua pertinência na área e pelos estudos de adaptação também realizados noutros países.

A adaptação do CEAT-VIH para Portugal é parte integrante de um projecto de investigação mais alargado (Reis, 2007).

MÉTODO Material O“Cuestionario para la Evaluación de la Adhesión al Tratamiento Antirretroviral (CEAT-VIH)1 é um questionário de adesão terapêutica específico para avaliar a adesão à terapêutica anti-retrovírica. É um instrumento de carácter multidimensional, de auto administração e está validado para indivíduos adultos (Remor, 2002a; Remor, 2002c). Constitui uma ferramenta rápida e simples de administrar, abarcando os principais factores associados ao comportamento de adesão. O instrumento é constituído por 20 itens que foram formulados com base na revisão da literatura especializada e na experiência clínica junto dos indivíduos portadores de VIH/SIDA. A pontuação total é obtida pela soma de todos os itens (mínimo possível 17 pontos e máximo possível 89 pontos). Quanto maior a pontuação, maior será o grau de adesão ao tratamento anti retrovírico.

É de salientar que os itens do questionário permitem identificar importantes factores comportamentais a ter em conta quando se deseja implementar um plano de intervenção para melhorar a adesão terapêutica (Remor, 2002b, 2002c, 2008).O estudo psicométrico original que conduziu à criação do CEAT-VIH (Remor, 2002b) permitiu estabelecer uma correlação entre a adesão e a quantificação da carga vírica ( de cópias do vírus por mm3), principal indicador clínico do efeito do tratamento farmacológico.

Procedimento A versão em português (Portugal) do CEAT-VIH realizou-se mediante o processo de tradução-retrotradução (forward-backward translation) por especialistas bilingues português espanhol de forma independente. Para verificar a equivalência semântica foi realizada uma reflexão falada com a presença de 10 indivíduos seleccionados de forma a reunir um grupo heterogéneo em termos de género, idade, habilitações literárias e profissão. Após a leitura dos 20 itens que constituem o CEAT VIH foi discutida a possibilidade de existir ambiguidade na compreensão dos mesmos e modificaram-se dois itens que suscitaram dúvidas (itens 7 e 16). Finalmente, foi realizado um estudo piloto com 9 sujeitos com diagnóstico VIH/SIDA, a cumprir terapêutica anti-retrovírica e internados no Serviço de Infecciologia do Hospital de Joaquim Urbano (Porto, Portugal), aos quais foi administrado o CEAT VIH juntamente com a entrevista de caracterização sociodemográfica. Foi lhes pedido que comentassem os itens que considerassem por algum motivo, de difícil compreensão ou que suscitassem ambiguidade. Nenhum item foi alterado nesta fase. A versão final foi então considerada atingida.

Para o estudo psicométrico em Portugal do CEAT-VIH foi seleccionada uma amostra de 125 utentes em tratamento anti-retrovírico atendidos na Consulta Externa de Infecciologia do Hospital de Joaquim Urbano (Porto, Portugal). A amostra foi recolhida durante os meses de Junho de 2006 e Fevereiro de 2007. O preenchimento dos questionários junto dos utentes que satisfaziam os critérios de inclusão (VIH+ e terapêutica anti-retrovírica pelo menos três meses) foi realizado no final das consultas dos utentes e sempre na presença da psicóloga responsável pelo estudo.

A recolha dos dados foi realizada com base numa entrevista estruturada de caracterização sociodemográfica construída para o estudo que incluiu: idade, sexo, estado civil, escolaridade, classe social e ocupação. Os dados relativos ao perfil clínico foram retirados directamente do processo clínico dos utentes que incluíram: via de infecção, tempo de infecção, marcadores biológicos carga vírica e de linfócitos T CD4+ e terapêutica anti-retrovírica.

O estudo obteve parecer favorável da Comissão de Ética do Hospital de Joaquim Urbano e posterior autorização do Conselho de Administração do mesmo hospital.

A participação dos utentes foi voluntária e todos assinaram o Termo de Consentimento Informado, pelo qual aceitavam as condições do estudo.

Participantes Para o estudo psicométrico em Portugal do CEAT-VIH foi seleccionada uma amostra de 125 utentes em tratamento anti-retrovírico atendidos na Consulta Externa de Infecciologia do Hospital de Joaquim Urbano (Porto, Portugal). A amostra foi recolhida durante os meses de Junho de 2006 e Fevereiro de 2007. O preenchimento dos questionários junto dos utentes que satisfaziam os critérios de inclusão (VIH+ e terapêutica anti-retrovírica pelo menos três meses) foi realizado no final das consultas dos utentes e sempre na presença da psicóloga responsável pelo estudo.

A recolha dos dados foi realizada com base numa entrevista estruturada de caracterização sociodemográfica construída para o estudo que incluiu: idade, sexo, estado civil, escolaridade, classe social e ocupação. Os dados relativos ao perfil clínico foram retirados directamente do processo clínico dos utentes que incluíram: via de infecção, tempo de infecção, marcadores biológicos carga vírica e de linfócitos T CD4+ e terapêutica anti-retrovírica.

O estudo obteve parecer favorável da Comissão de Ética do Hospital de Joaquim Urbano e posterior autorização do Conselho de Administração do mesmo hospital.

A participação dos utentes foi voluntária e todos assinaram o Termo de Consentimento Informado, pelo qual aceitavam as condições do estudo.

RESULTADOS Caracterização da amostra Os participantes apresentam idades compreendidas entre os 20 e os 68 anos, com média de 39,9 anos e desvio-padrão de 9,8. Cerca de 80% é do sexo masculino e a maioria dos sujeitos é solteira (44%). Relativamente ao nível de escolaridade, a maioria dos sujeitos possui um baixo nível de escolaridade, em que 31,2% completou o ciclo e 27,2% completou o ciclo.

No que concerne à ocupação, 38,4% dos sujeitos estão profissionalmente activos e 25,6% estão reformados. Relativamente ao nível socioeconómico, avaliado pela classificação social de Graffar (Deus, 2002) verificamos que a maioria dos sujeitos pertence à classe média e média baixa, respectivamente 40 e 42,4%. A descrição mais detalhada das características sociodemográficas está detalhada no Quadro 1.

Quadro 1 Caracterização dos participantes em função das características sociodemográficas. Porto, Portugal, 2007 (N=125)

Relativamente à via de infecção, 62,4% refere a via sexual como meio de transmissão do VIH e os restantes 37,6% referem a transmissão por via endovenosa. De realçar que nenhum sujeito referiu não saber como ficou infectado.

De acordo com o Quadro 2, o esquema anti-retrovírico de tratamento prescrito mais frequente (39,2%) foi a combinação dos Inibidores Nucleósidos da Transcriptase Reversa (INTR) com Inibidores Não Nucleósidos da Transcriptase Reversa (INNTR). É possível verificar que o tempo médio de infecção pelo VIH é de 69,5 meses, com um desvio-padrão de 41,6 e varia no intervalo de 4 a 170 meses.

Quadro 2 Caracterização dos participantes em função das variáveis clínicas. Porto, Portugal, 2007 (N=125)

No que concerne aos indicadoresclínicosda infecção VIH/SIDA, os valores médios da carga vírica situam-se em 2029,8 cópias/ml de vírus no sangue, com um desvio-padrão de 7.575,9, sendo o mínimo <50 (abaixo do limiar de detecção) e o máximo 57.698 (virémia descontrolada). Do total dos sujeitos que integram a amostra 70,4% apresentam valores de carga vírica indetectáveis. Para a contagem de linfócitos T CD4+, o valor médio encontrado é 359,7 CD4+, com um desvio- padrão de 243,1, a variar no intervalo entre 14 e o 1167. Do total dos sujeitos que compõe a amostra, 24,8% apresentam contagem de linfócitos T CD4+ ><200 (critério para a classificação na fase de SIDA).

CARACTERÍSTICAS PSICOMÉTRICAS DO CEAT-VIH No Quadro 3 são apresentados os indicadores de qualidade dos itens, como a média, a correlação item com o resultado total, corrigida pela eliminação do item em questão, e o alphade Cronbach se o item é eliminado. O alphade Cronbach global para a escala foi 0,709.

Quadro 3 Resultados das respostas aos itens do questionário CEAT-VIH (N=125).

Validade de Critério Externo Para testar a hipótese de que os indivíduos que apresentam um nível mais elevado de adesão à terapêutica apresentam níveis baixos de carga vírica, realizou-se uma análise de correlação (Pearson) entre a variável grau de adesão ao tratamento (pontuação directa obtida pelo CEAT-VIH) e a medida de carga vírica mais recente (até três meses). Os resultados apontam para uma correlação inversa significativa entre o grau de adesão ao tratamento e a pontuação total obtida no questionário (r= 0,20; p=0,001). Isto é, mostram que as pontuações obtidas pelo CEAT VIH se correlacionam com o marcador biológico que indica o êxito do tratamento farmacológico.

Para contemplar outra medida de validade de critério externo, analisou-se a correlação (Pearson) entre a percentagem de adesão ao tratamento avaliada pelo farmacêutico da farmácia hospitalar numa escala de 0 a 100 (onde 0 indicaria baixa adesão e 100 máxima adesão possível), tendo sido encontrada uma correlação significativa entre as duas medidas (r=0,19; p=0,02). Ou seja, a avaliação realizada pelo farmacêutico revelou-se similar às pontuações obtidas pelo utente no questionário CEATVIH através do auto-relato.

Validade Preditiva: Sensibilidade e Especificidade Para avaliar a capacidade do questionário CEAT-VIH em detectar o nível de adesão ao tratamento óptimo necessário para a predição de carga vírica indetectável, realizou-se uma análise de curvas ROC (Zweig & Campbell, 1993).

Mediante a análise das curvas ROC podemos identificar a sensibilidade (proporção de verdadeiros positivos) e a especificidade (proporção de falsos positivos) de um instrumento diagnóstico para identificar casos positivos na variável estado (grupo prognosticado, neste caso, com carga vírica detectável, correspondendo a 29,6% da amostra).

Na Figura 1 está representada a curva ROC obtida para o CEAT VIH e os indicadores de discriminação em função da carga vírica. Como se pode observar, a curva ROC está distante da linha diagonal (quanto maior a curvatura da linha, maior é a capacidade de discriminação), indicando que a pontuação do grau de adesão ao tratamento (medido pelo CEAT-VIH) parece identificar de forma adequada os indivíduos com carga vírica detectável (>50 cópias de ARN do vírus por ml.). A interpretação subjectiva do gráfico é confirmada pelos resultados estatísticos obtidos, onde a área abaixo da curva é 0,665 (I.C. 95%, 0,575 a 0,747; p= 0,001).

Figura 1 Curvas ROC obtidas para o CEAT-VIH e indicadores de sensibilidade e especificidade

No Quadro 4 são apresentados os indicadores de sensibilidade e especificidade obtidos para o CEAT-VIH. Como se pode observar, o ponto de corte óptimo sugerido pela análise estatística é ≤78 (pontuação directa no CEAT-VIH) para uma adesão insuficiente ao tratamento associada a uma carga vírica detectável.

A esta pontuação associa-se uma sensibilidade de 70,3% e uma especificidade de 56,8%.

Quadro 4 Sensibilidade e especificidade do CEAT-VIH

ESTUDO DAS DIFERENÇAS DE ADESÃO EM FUNÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS E VARIÁVEIS CLÍNICAS Em diferentes trabalhos anteriores (Remor, 2002b; Remor et al., 2007; Gordillo, Amo, Soriano & González-Laloz, 1999; Israelski, Gore-Felton, Power, Wood & Koopman, 2001), as características sociodemográficas (sexo, idade, ocupação) foram alvo de estudo para a compreensão do seu efeito sobre a adesão.

Portanto, passamos a apresentar as análises diferenciais em função destas variáveis.

Para analisar a existência de efeitos de interacção entre as variáveis independentes sociodemográficas e a adesão terapêutica, recorreu-se ao procedimento estatístico de análise de variância a dois factores fixos Two- Way ANOVA. Foi assim identificado um efeito de interacção entre as variáveis sexo e idade.

Os sujeitos foram divididos em seis grupos de acordo com a variável idade. A categorização em três intervalos de idades foi realizada com base numa distribuição homogénea de participantes para cada intervalo. Os seis grupos constituídos são: 1 Homens com idade até aos 35 anos; 2 Homens com idades entre os 36 e os 42 anos; 3 Homens com idade superior a 43 anos; 4 Mulheres com idade até aos 35 anos; 5 Mulheres com idades entre os 36 e os 42 e, 6 Mulheres com idade superior a 43 anos.

Tendo em conta os resultados obtidos verificou-se que existe um efeito interactivo dos dois factores associados na variável dependente, ou seja, na adesão.

Os efeitos principais do sexo [F(1,124)=5,91; p=0,01], da idade [F(2,124)=3,08; p=0,04] e o efeito de interacção [F(2,124)=5,23; p=0,00] são estatisticamente significativos. Os dados referentes a esta análise são apresentados no Quadro 5.

Quadro 5 Efeito de interacção das variáveis“Sexo e Idade na“Adesão

Tendo em conta o efeito de interacção entre as variáveis sexo e idade, procedeu-se a uma análise de variâncias a um factor fixo One-Way ANOVA, com o objectivo de explorar a existência de diferenças estatisticamente significativas entre os grupos.

Pela análise do Quadro 6 podemos verificar que existem diferenças estatisticamente significativas (p≤0,05) entre os diferentes grupos das possíveis combinações da variável sexo/idade [F(5,119)=3,81; p=0,00)] e a adesão.

Quadro 6 Estudo das diferenças de“Adesão em função da variável“Sexo/Idade

As comparações post hoc entre os grupos da variável foram realizadas através do teste Tukey. Analisemos então as diferenças encontradas.

Verificamos que os sujeitos do sexo masculino nos três grupos de idades (1: M=78,34; DP=5,61; 2: M=77; DP=6,98; 3: M=79,79; DPP=6,18) apresentam diferenças estatisticamente significativas de adesão em relação aos sujeitos do sexo feminino com idades até aos 35 anos (M=70,63; DP=6,18).

No que se refere aos sujeitos do sexo masculino com mais de 43 anos, identificamos que apresentam diferenças estatisticamente significativas de adesão em relação aos sujeitos do sexo feminino do mesmo grupo de idades (M=75,11; DP=4,75).

Relativamente ao sexo feminino, verificamos que existem diferenças estatisticamente significativas entre os sujeitos com idades compreendidas entre os 36 e os 42 anos (M=79,71; DP=6,15) e o grupo com idades até aos 35 anos (M=70,63; DP=6,18).

Para os restantes grupos não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre si.

Para o estudo das diferenças de adesão relativamente à variável ocupação os sujeitos foram divididos em duas categorias relativamente ao desempenho de uma profissão ou actividade similar. Os primeiros incluem os sujeitos profissionalmente activos e os segundos incluem os desempregados e os reformados. Para a divisão nestes dois grupos foram excluídos quatro sujeitos (três em situação de baixa médica e apenas um estudante).

Através desta análise podemos observar que existem diferenças estatisticamente significativas entre os participantes activos (n=48; M=78,9; DP=4,6) e os participantes inactivos (n=73; M=76,6; DP=6,8), a favor dos participantes activos (t(123)=-1,97; p=0,05).

Para o estudo das diferenças de adesão relativamente à variável classe social optou-se por criar uma nova variável que contemplasse apenas duas classes, a alta e a baixa, tendo em conta a análise da distribuição de frequências dos sujeitos pelas diferentes categorias. A primeira engloba as classes alta, média alta e média e a segunda as classes média baixa e baixa.

A análise permitiu verificar que existem diferenças estatisticamente significativas de adesão entre os sujeitos pertencentes à classe alta (n=65; M=78,7; DP=6,3) e os sujeitos pertencentes à classe baixa (n=60; M=76,3; DP=5,6), sendo maior a adesão na classe alta (t(123)=2,17; p=0,03).

ANÁLISES DA RELAÇÃO ENTRE ADESÃO AO TRATAMENTO E AS VARIÁVEIS CLÍNICAS Para a análise da relação entre adesão ao tratamento e as demais variáveis clínicas, recorreu-se ao uso da correlação de Pearsonedoteste t de Student, de acordo com a operacionalização das variáveis. Não foram encontradas correlações estatisticamente significativas entre a adesão ao tratamento e a contagem de linfócitos T CD4+ (r=0,04; p=0,63), tempo de diagnóstico de VIH+ em meses (r=-0,05; p=0,54) e início do tratamento anti-retrovírico em meses (r=-0,13; p=0,14). Também não encontramos diferenças significativas no nível de adesão em função do tipo de via de infecção pelo VIH: sexual ou sanguínea (t(123)=0,769; p=0,44).

DISCUSSÃO Estudos anteriores (Berg et al., 2004; Gordillo et al., 1999; Israelski et al., 2001; Stout, Leon & Niccolai, 2004), identificaram que o perfil sociodemográfico poderia estar associado a um comportamento de maior adesão ao tratamento anti-retrovirico, descrevendo os indivíduos do sexo masculino, adultos jovens, profissionalmente activos, com um nível escolar mais alto e provenientes de classes sociais também mais altas como mais cumpridores do tratamento. Mais recentemente, o trabalho de Remor et al. (2007) ressaltou as controvérsias na literatura sobre a capacidade predictiva do perfil sociodemográfico sobre a adesão ao tratamento na população com VIH, não havendo até o momento um consenso na literatura sobre esta questão.

No presente estudo, encontramos diferenças no grau de adesão ao tratamento anti-retrovirico em função de algumas características sociodemográficas, por exemplo, tendo em conta o efeito de interacção existente entre as variáveis sexo e idade. Em concreto, os homens de todas as idades apresentaram níveis de adesão superiores às mulheres com idade até 35 anos, porém os homens com mais de 43 anos apresentaram um cumprimento do tratamento menor que as mulheres da mesma idade. No que se refere somente às mulheres, verificamos que aquelas que pertencem ao intervalo de idades compreendido entre os 36 e os 42 anos apresentam níveis de adesão superiores comparativamente às mulheres até 35 anos de idade. Não encontramos diferenças estatisticamente significativas de adesão entre os homens considerando os diferentes grupos de idade.

Atendendo às características referentes à ocupação, encontramos diferenças estatisticamente significativas de adesão entre os sujeitos que se encontram profissionalmente activos ou a desempenhar alguma actividade, comparativamente com aqueles que não têm qualquer profissão ou similar. Os primeiros apresentaram melhores níveis de adesão do que os segundos. É provável que a falta de estabilidade económica e os pobres recursos sociais decorrentes desta situação actuem como barreiras para o cumprimento do tratamento. No que concerne à classificação social, os sujeitos provenientes de classes sociais mais baixas apresentaram níveis de adesão inferiores aos sujeitos de classes sociais mais elevadas. Considerando que as variáveis anteriores podem estar interligadas ou sobrepostas, atendendo ao facto de os indivíduos terem referido instabilidade ocupacional ou desemprego e tendência a auto definir-se numa situação de baixa classe social, poderíamos colocar a hipótese de que a variável subjacente ao efeito sobre a adesão ao tratamento é na realidade, a ausência de recursos económicos. De facto, um importante trabalho epidemiológico associou os índices de pobreza e desigualdades económicas a uma pior situação de saúde no indivíduo e maior mortalidade, destacando que estas desigualdades económicas diminuem a capacidade de controle do indivíduo (Bosma, Schrijvers & Mackenbach, 1999).

Estes resultados levam-nos à reflexão sobre a complexidade das interações entre variáveis sociodemográficas e adesão ao tratamento farmacológico.

Principalmente, tratando-se de um tratamento tão complexo e por tempo indefinido como o da Infecção pelo HIV, onde, evidências de que o isolamento social, o stress, o preconceito, a falta de informação, a falta de apoio social e de um serviço de saúde acessível contribuem muito mais para um baixo cumprimento que os factores associados às características sociodemográficas (Remor et al., 2007; Remor, Penedo, Shen & Schneiderman, 2007; Ruiz Perez et al., 2005).

Por outro lado, relativamente às variáveis clínicas verificamos que a via de transmissão foi essencialmente sexual. Estes resultados parecem ser consistentes com a tendência epidemiológica da infecção em Portugal verificada actualmente pelo CVEDT (2008) que aponta para um aumento do número de infecções por via sexual.

A maioria dos sujeitos foi encaminhada para a consulta da especialidade (Infecciologia) com critérios para o diagnóstico de fase de SIDA (ou pela contagem de linfócitos T CD4 < 200 ou pela presença de infecção oportunista).

Algumas explicações possíveis para este facto poderão estar relacionadas com o desconhecimento de se estar infectado, com a procura tardia dos serviços de saúde e com a possível falta de informação acerca dos cuidados a assumir perante uma doença desta dimensão.

À data do preenchimento do questionário, a maioria dos sujeitos apresentava valores de carga vírica indetectáveis, ou seja, com a sua situação clínica controlada. Verificamos que naqueles cujos valores são indetectáveis, a adesão medida pelo auto relato (CEAT VIH) foi superior comparativamente aos restantes.

Verificamos ainda que o marcador biológico e a medida de auto-relato utilizada neste estudo estão associados entre si. Poderíamos, deste modo, afirmar que a medida de auto-relato do nível de adesão constitui um método fidedigno da avaliação do comportamento de adesão terapêutica ao tratamento anti- retrovírico.

Também foi encontrada uma relação significativa entre a adesão ao tratamento avaliada pelo farmacêutico do hospital e a pontuação no questionário CEAT-VIH, apoiando a validade externa do instrumento.

No que concerne ao tempo de infecção e início do tratamento, apesar de no presente estudo não terem sido encontradas diferenças estatisticamente significativas de adesão, não excluímos a hipótese de que estas podem ser importantes para a compreensão do fenómeno de adesão como evidenciaram outros trabalhos (Israelski et al., 2001; Remor, 2002a). Importa destacar que, embora as correlações não tenham sido significativas, a direcção destas associações coincidiu com as observadas nos estudos anteriores, por exemplo, foi observada uma relação inversa entre tempo de diagnóstico e tempo de tratamento com o grau de adesão informado. Esta relação poderá constituir uma consequência da cronicidade do tratamento conduzindo o utente ao abandono do tratamento ou a uma adesão insuficiente.

Sendo um dos objectivos principais desta investigação a tradução, adaptação transcultural e estudo psicométrico do CEAT-VIH para a população portuguesa, importa tecer algumas considerações finais. Como vimos, é um instrumento de avaliação da adesão ao tratamento através do auto-relato que constitui uma ferramenta rápida e simples de administrar, de fácil compreensão por parte dos sujeitos, com carácter multidimensional, uma vez que abarca os principais factores que podem interferir com o comportamento de adesão.

A análise das características psicométricas na nossa amostra permitiu confirmar que o questionário tem qualidades que permitem o seu uso em Portugal, uma vez que se mostrou útil, fiável e válido para avaliar o grau de adesão ao tratamento anti retrovírico.


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