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EuPTHUHu1645-00862009000200012

EuPTHUHu1645-00862009000200012

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN1645-0086
ano2009
Issue0002
Article number00012

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Versão portuguesa do questionário de bem-estar espiritual (SWBQ): análise confirmatória da sua estrutura factorial

O estudo do contributo da espiritualidade para a saúde conduziu à emergência do conceito de Bem-estar Espiritual (BEE) e espelha a importância crescente atribuída à dimensão espiritual para o bem-estar.

A noção de BEE ou saúde espiritual tem sido descrita em múltiplos termos por vários autores (Fisher, Francis e Johnson, 2000; Moberg, 2002, 2008; O Connell & Skevington, 2007; Westgate, 1996). Apesar das diferentes perspectivas na definição do conceito, a maioria aponta para a sua independência da dimensão religiosa e por vezes até da componente implícita ou explicitamente centrada no sagrado, presente nas mais actuais definições de espiritualidade (Chandler, Holden, & Kolander, 1992). Todas as definições de BEE sugerem igualmente a multi-dimensionalidade do construto. em 1975, numa das primeiras tentativas para gerar consenso relativamente a uma definição abrangente de espiritualidade, a National Interfaith Coalition on Aging(NICA; Moberg, 2002) propôs como definição de trabalho que spiritual wellbeing is the affirmation of life in a relationship with God, self, community, and environment that nurtures and celebrates wholeness”(p. 48). A noção que o BEE deve assumir uma perspectiva relacional, evidente nesta definição, foi também assumida subsequentemente por vários autores que propuseram definições envolvendo pelo menos dimensões da relação com o próprio, com os outros e com o transcendente (Goodloe & Arreola, 1992; Hawks, 1994; Hood-Morris, 1996;Young, 1984).

A quase totalidade destas definições, no entanto, não parte de um modelo conceptual que tenha sido confirmado empiricamente. A maioria não chega sequer a ser operacionalizada. Procurando ultrapassar estas limitações, Fisher (1999) desenvolveu uma definição abrangente de BEE, que reúne os quatro sistemas de relação propostos pela definição consensual da NICA, tendo-a confirmado empiricamente através de um conjunto alargado de entrevistas com professores do ensino secundário. Este estudo conduziu ao desenvolvimento de um modelo conceptual de Bem-estar espiritual.

Como resultado desse trabalho empírico, Fisher (1999) conceptualiza o Bemestar espiritual como uma forma de estar dinâmica que se reflecte na qualidade das relações que o indivíduo estabelece em quatro domínios da existência humana, isto é, consigo próprio, com os outros, com o ambiente e com algo ou Alguém que transcende o domínio humano. O domínio pessoal (personal) diz respeito à forma como uma pessoa se relaciona consigo própria no que respeita ao significado, propósito e valores de vida. Pressupõe o desenvolvimento de auto- conhecimento e consciência sobre si mesmo, relacionados com a identidade e a auto-estima. O comunitário (communal), refere-se à qualidade e profundidade das relações inter-pessoais no que diz respeito à moralidade, cultura e religião. Inclui sentimentos de amor, justiça, esperança e na humanidade. O domínio ambiental (environment), consiste nas relações com o mundo físico e biológico (cuidar e proteger), expressando-se através da admiração e de sentimentos de união com a natureza. Por fim, o domínio transcendental (transcendental other), refere-se à relação do próprio com algo ou alguma coisa para além do que é humano, nomeadamente uma força cósmica, uma realidade transcendente, ou Deus, e expressa-se através do culto e adoração relativamente à fonte de mistério do universo.

De acordo com o modelo conceptual de Fisher, a qualidade das relações que o indivíduo estabelece em cada domínio, é indicador do seu BEE nessa dimensão.

Por outro lado, a saúde espiritual é dinâmica e o desenvolvimento de BEE em cada um dos domínios -resultante do confronto com os desafios da existência humana -expressa-se pelo aprofundar das relações nesse domínio e pelo acrescentar de novas dimensões. Simultaneamente o desenvolvimento da qualidade das relações num domínio de BEE contribui para o aprofundamento das relações nos restantes. A interacção entre estas dimensões de relação permite o crescimento e complexificação recíprocas. Fisher sugere, por exemplo, que os valores, propósito e sentido para a vida desenvolvidos através do auto- conhecimento são pré-condições, e simultaneamente são aprofundados pelos valores morais, culturais ou espirituais construídos a partir do aprofundamento das relações interpessoais (Fisher, 1999, p.31). Assim, o bem-estar espiritual global de uma pessoa será resultante do efeito combinado do BEE em cada um dos domínios adoptados pelo indivíduo.

A partir desta definição e modelo conceptual e ainda com base numa revisão de medidas pré-existentes do conceito e num conjunto de estudos qualitativos prévios (Fisher, 1999; Fisher et al., 2000), Gomez e Fisher (2003) desenvolveram recentemente o Spiritual Well-being Questionnaire SWBQ. Esta nova operacionalização para o construto, avalia as quatro dimensões referidas (pessoal, comunitária, ambiental e transcendental) e permite obter uma medida global de BEE resultante da adição dos diferentes domínios. Este instrumento foi validado através de quatro estudos realizados junto de estudantes do ensino secundário e universitário de países de língua inglesa (Gomez & Fisher, 2005a,b). Os resultados destes estudos de validação revelaram boas características métricas e também a existência de relação entre algumas dimensões do bem-estar espiritual (e.g., pessoal, comunal e ambiental) e características como a extroversão, o neuroticismo, o psicoticismo e também com a felicidade. Os dados suportam simultaneamente a independência do construto face à personalidade.

Existem diversos instrumentos de mensuração de bem-estar espiritual ou de uma dimensão espiritual da saúde (para uma revisão de medidas disposicionais e funcionais de espiritualidade ver Hill, 2005 ou ainda O Connell & Skevington, 2007, para instrumentos que medem espiritualidade enquanto componente da qualidade de vida). No entanto, o SWBQ é a única ferramenta que avalia discriminadamente as quatro dimensões identificadas no modelo de Fisher (1999), modelo este que foi posteriormente reconfirmado em outros estudos (Fisher 2006, 2007; Fisher, Francis, & Johnson, 2000, 2002). Uma adequada diferenciação e mensuração destas diferentes componentes do bem-estar espiritual parece relevante na medida em que estas dimensões poderão ter repercussões distintas nas medidas de bem-estar físico e/ou psicológico (e.g., Fehring, Brennan, & Keller, 1987; Gomez & Fisher, 2003;2005a, b; Gouveia, Ribeiro & Pinto, 2008).

O objectivo deste estudo é então apresentar os resultados psicométricos de uma versão portuguesa deste questionário adaptado para a população geral, referindo-se mais concretamente às propriedades estruturais do SWBQp (versão portuguesa).

MÉTODO Participantes Participaram neste estudo 439 sujeitos, seleccionados por conveniência, com idades compreendidas entre os 16 e os 71 anos (M=36,47, DP=10,77), de ambos os sexos, ainda que ligeiramente enviesada para o feminino (F=61,6%, M=38,4%) e com escolaridade entre os4eos23 anos (M=15,13, DP=3,52). Dos 439 sujeitos que compõem esta amostra, 54,5% são casados, 15,7% são solteiros, 8,9% são divorciados e apenas 0,7% são viúvos (as).

Instrumento O SWBQ é um questionário de auto-preenchimento, constituído por 20 itens, distribuídos de igual forma (5 itens) para avaliarem cada uma das quatro sub- escalas de BEE: Pessoal (e.g., meaning in life), comunitária (e.g., kindness towards other people), ambiental (e.g., oneness with nature) e transcendental (e.g., personal relationship with the Divine/God ou worship of the Creator). Aos respondentes é pedido que indiquem em que medida sentem que cada afirmação reflecte a sua experiência pessoal actual. Os itens são avaliados numa escala 5 pontos [variando de 1=muito pouco a 5=totalmente].

Todos os itens são formulados positivamente e o resultado é obtido pela média das respostas atribuídas aos itens de cada sub-escala. É possível igualmente obter uma medida global de BEE resultante da adição dos diferentes domínios.

Os autores originais apresentam bons resultados de fiabilidade e validade para todas as sub-escalas, com valores de consistência interna para diferentes sub- amostras variando entre α=0,76 e α=0,95 (Gomez & Fisher, 2003, 2005a,b).

Os resultados preliminares da versão portuguesa deste instrumento (Gouveia, Pais-Ribeiro & Marques, 2008), apresentam também bons indicadores de consistência interna global (α=0,89) oscilando os valores das diferentes dimensões entre α= 0,72 (dimensão pessoal) e α= 0,88 (dimensão transcendental).

A análise factorial confirmatória realizada revelou igualmente valores de ajustamento aceitáveis para um modelo de 4 factores correlacionados de acordo com o proposto pelos autores originais (Qui2/df=1,96 p<0,00; CFI=0,91; RMSEA=0,06 p=0,02).

Procedimento O processo de adaptação baseou-se no método Traduz-Retraduz (Hill & Hill, 2002), que consiste em 3 etapas: ) tradução por 3 pessoas com conhecimentos sólidos da língua inglesa e com experiência na tradução de questionários; ) verificação da tradução através de retroversão e comparação com o original, bem como análise final da validade de conteúdo dos itens por 2 especialistas em psicologia; ) estudo piloto com uma amostra de 30 sujeitos, para verificação da clareza e compreensão dos itens. A recolha de dados foi realizada em organizações empresariais e contextos de formação profissional e de lazer (ex.

jardins e esplanadas), no distrito de Lisboa. Os questionários foram preenchidos no momento e na presença do experimentador. Dos 452 questionários aplicados, 13 foram eliminados por não terem sido correctamente preenchidos. Os dados foram recolhidos entre 2007 e 2008. A análise de dados foi realizada com recurso aos softwares estatísticos SPSS v. 17 e AMOS v.17.

RESULTADOS Análise descritiva e consistência interna do SWBQp No Quadro 1 apresentam-se os resultados obtidos relativos às médias, desvios padrão, correlações dos itens com a escala a que pertencem, valores de consistência interna dos itens e factores (Alpha de Cronbach) e ainda os pesos de regressão obtidos na Análise Factorial Confirmatória (AFC) que testou a adequação dos dados ao modelo proposto pelos autores da versão original.

Quadro 1 Características psicométricas do SWBQp

Os valores obtidos são globalmente favoráveis à consistência interna dos itens e factores, apresentando a escala total (α=0,88) a escala ambiental 0,84, a transcendental 0,89, a comunitária 0,74 e a pessoal 0,75.

No quadro 1, apresentam-se ainda os pesos de regressão obtidos na AFC que testou a adequação dos dados ao modelo original do SWBQ (Figura 1). Todos os itens se encontram moderada a fortemente saturados nas escalas, variando entre 0,40 e 0,90.

Salienta-se que os valores de correlação item-factor (0,33), o alfa da escala sem o item (0,77) e o peso de regressão (0,40) do item 9 sugerem a necessidade de reformulação do seu conteúdo.

Uma apreciação comparativa entre as dimensões, sugere que a dimensão transcendental do BEE será a mais sólida e as escalas pessoal e comunitária as menos consistentes.

Validade Factorial (AFC) do SWBQp O modelo de 4 factores correlacionados, proposto pelos autores, foi testado através de uma análise factorial confirmatória (Arbuckle, 2005). Verificando-se a normalidade da distribuição, utilizou-se o método da Máxima Verosimilhança.

Para a análise da qualidade do modelo, utilizaram-se os índices de ajustamento Comparative Fit Index (CFI) e Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA).

O CFIavalia a adequação do modelo hipotético em comparação com o pior (independente) modelo. Valores próximos de zero indicam que o modelo proposto não significa uma melhoria em relação ao pior modelo (Byrne, 2001). Segundo Bentler e Bonett (1980), índices de ajustamento CFI superiores a 0,90 indicam que a solução extraída é boa e valores de RMSEA inferiores a 0,10 indicam uma solução adequada. A solução encontrada apresenta qualidades de ajustamento aceitáveis com Qui2/df=2,803 (< 5 ajustamento aceitável; Marsh & Hocevar, 1985), p<0.0001, CFI=0.92 e RMSEA=0.06 (p=0.001). Estes resultados permitem confirmar globalmente o modelo sugerido por Gomez e Fisher (2003).

Inter-correlações entre as escalas do SWBQp A análise das inter-correlações entre as escalas (Quadro 2) revelou que se encontram todas significativamente correlacionadas (p<0.01), com valores de correlação oscilando entre R=0,29 (comunitária e transcendental) e R=0,67 (pessoal e comunitário).

Quadro 2 Matriz de inter-correlações das dimensões do SWBQp

DISCUSSÃO Os objectivos deste trabalho consistiram no desenvolvimento de uma versão portuguesa do Spiritual Well-being Questionnaire (SWBQ; Gomez & Fisher, 2003) e num primeiro estudo da sua validação.

No seu conjunto, os resultados obtidos permitiram verificar que esta versão portuguesa do Questionário de Bem-estar Espiritual (SWBQp) apresenta características psicométricas bastante satisfatórias, quer em termos da confirmação da sua estrutura factorial, quer relativamente aos bons índices de consistência interna das escalas e da grande maioria dos itens que as constituem.

Os resultados das análises da consistência interna dos itens e dos pesos de regressão na análise confirmatória sugerem, no entanto, a vantagem em se realizarem alterações à formulação do item 9 auto-consciência (item 9- pessoal). Outros dois itens, admiração e respeito pela criação ou origem do universo (item 6–trans-cendental) e confiar nos outros (item 8-comunitária), poderão ainda ganhar com a reformulação do seu conteúdo de forma a torná-los melhores contributos para a solidez factorial da escala. Do ponto de vista desta análise da qualidade dos itens, estes nossos resultados corroboram aliás algumas das conclusões extraídas pelos próprios autores nos estudos originais (Gomez & Fisher, 2005a). Tal facto reforça a nossa sugestão para a sua alteração também na versão portuguesa, em posteriores estudos a desenvolver para a melhoria das qualidades psicométricas deste questionário.

Uma apreciação comparativa entre os domínios, sugere que a dimensão transcendentaldo BEE será a mais sólida e as escalas pessoale comunitáriaas menos consistentes.


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