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BrBRCEEx0100-40421999000100016

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variedadeBr
ano1999
fonteScielo

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Métodos para avaliação do grau de oxidação lipídica e da capacidade antioxidante

INTRODUÇÃO Os lipídios desempenham um importante papel no que respeita à qualidade de certos produtos alimentares, particularmente em relação às propriedades organolépticas que os tornam desejáveis (e.g. flavor, cor, textura). Por outro lado, conferem valor nutritivo aos alimentos, constituindo uma fonte de energia metabólica, de ácidos graxos essenciais (e.g. ácidos linoleíco, linolênico e araquidónico) e de vitaminas lipossolúveis (e.g. A, D, E e K)2.

A oxidação lipídica é um fenômeno espontâneo e inevitável, com uma implicação direta no valor comercial quer dos corpos graxos, quer de todos os produtos que a partir deles são formulados (e.g. alimentos , cosméticos, medicamentos).

A peroxidação lipídica constitui a principal causa de deterioração dos corpos graxos (lipídios e matérias graxas). Afastados do seu contexto de proteção natural, os corpos graxos sofrem, no decurso de processos de transformação e armazenamento, alterações do tipo oxidativo, as quais tem como principal conseqüência a modificação do flavor original e o aparecimento de odores e gostos característicos do ranço, o qual representa para o consumidor, ou para o transformador industrial, uma importante causa de depreciação ou rejeição3.

Nos últimos anos, a preocupação constante de proporcionar aos consumidores produtos de alta qualidade levou à adoção de medidas que permitem limitar o fenômeno de oxidação durante as fases de processamento e armazenagem dos produtos (e.g.escolha de processos que limitem as operações de arejamento e o tratamento térmico; utilização de matérias-primas refinadas, com baixos teores de água e isentas de pró-oxidantes; armazenamento a baixas temperaturas e em atmosfera inerte; adição de compostos antioxidantes; utilização de embalagens estanques e opacas à radiação UV, etc.). Deste conjunto de ações, a adição de compostos antioxidantes é, sem dúvida, uma prática corrente, razão que justifica o atual interesse pela pesquisa de novos compostos com capacidade antioxidante. O baixo custo de obtenção, facilidade de emprego, eficácia, termo-resistência, "neutralidade" organoléptica e ausência reconhecida de toxicidade, são premissas para a sua seleção e utilização a nível industrial3.

Neste contexto, torna-se necessário, por um lado controlar a qualidade dos corpos graxos, através da determinação do seu grau de oxidação e, por outro avaliar, a capacidade antioxidante de novos compostos. A grande diversidade de métodos analíticos (químicos, físicos e/ou físico-químicos) propostos na literatura para a avaliação do grau de oxidação lipídica e da capacidade antioxidante coloca, na prática, algumas dificuldades de seleção.

O presente trabalho não pretende efetuar uma descrição exaustiva de todas as metodologias mas, tão somente após uma abordagem geral do processo de oxidação lipídica, refletir sobre os métodos mais usados ou que foram alvo de maior desenvolvimento na última década.

OXIDAÇÃP LIPÍDICA: GENERALIDADES A oxidação lipídica está na origem do desenvolvimento do ranço, da produção de compostos responsáveis por off flavors e off odors, da reversão e da ocorrência de um elevado número de reações de polimerização e de cisão. Este tipo de reações não diminui o tempo de vida e o valor nutritivo dos produtos alimentares, como podem gerar compostos nocivos (Fig._1)4-6.

Os fenômenos de oxidação dos lipídios dependem de mecanismos reacionais diversos e extremamente complexos, os quais estão relacionados com o tipo de estrutura lipídica e o meio onde esta se encontra. O número e a natureza das insaturações presentes, o tipo de interface entre os lipídios e o oxigênio (fase lipídica contínua, dispersa ou em emulsão), a exposição à luz e ao calor, a presença de pró-oxidantes (e.g. ions metálicos de transição) ou de antioxidantes, são fatores determinantes para a estabilidade oxidativa dos lipídios7-9.

Composição Química dos Lipídios Os lipídios presentes a nível dos sistemas biológicos e alimentares são constituídos por uma mistura de tri-, di- e monoglicerídeos, ácidos graxos livres, glicolipídios, fosfolipídios, esteróis, etc. A maior parte destes constituintes é oxidável em diferentes graus7,10,11.

Os triglicerídeos resultam da esterificação de uma molécula de glicerol com os ácidos graxos, sendo considerados os principais responsáveis pelo desenvolvimento do ranço. Os triglicerídeos mistos de ácidos graxos insaturados ou saturados de cadeia longa, contendo um número par de átomos de carbono, são os principais componentes das gorduras naturais comestíveis, podendo existir na forma de diapasão (I) e/ou de cadeira (II)10,11.

A hidrólise (enzimática e não enzimática) dos triglicerídeos pode originar diglicerídeos, monoglicerídeos e ácidos graxos livres.

A presença nestas moléculas das mesmas cadeias insaturadas dos triglicerídeos torna-as predispostas à oxidação. No estado natural, estes compostos insaturados apresentam duplas ligações com configuração cis, separadas entre si por grupos metilênicos5,11.

Os ácidos graxos possuindo uma ou duas duplas ligações não originam de partida os mesmos produtos de decomposição que os ácidos graxos altamente insaturados5,7.

Os óleos vegetais de uso alimentar (óleo de soja, de amendoim, de milho, de canola, de cártamo, de trigo e de arroz) possuem níveis mais elevados de ésteres de ácidos graxos insaturados (e.g. ácido oleico (18:1), ácido linoleíco (18:2), ácido linolênico (18:3)). As gorduras de animais terrestres contem níveis mais altos de glicerídeos de ácidos graxos saturados (e.g. ácidos palmítico (16:0) e esteárico (18:0)). Os óleos de peixes e de animais marinhos são os que possuem maior teor de ácidos graxos insaturados10,11.

Uma vez que a velocidade de autoxidação está dependente do número de duplas ligações presentes na molécula, seria de esperar que os óleos vegetais exibissem maior susceptibilidade à deterioração que as gorduras animais. Porém, tendem a oxidar mais lentamente do que seria de esperar a partir da sua composição química, porque contem quantidades significativas de tocoferóis, os quais atuam como antioxidantes naturais11.

As gorduras naturais contem também quantidades significativas de fosfolipídios.

Estes compostos resultam de reações de esterificação de polihidroxialcoóis (e.g. glicerol) com ácidos graxos e ácido fosfórico, podendo ainda este último estar associado a compostos básicos nitrogenados (e.g. colina, etanolamina). Os fosfolipídios contendo cadeias de ácidos graxos insaturados, são igualmente susceptíveis a danos oxidativos10,11.

Entre outros compostos, as gorduras naturais possuem igualmente esteróis (e.g.colesterol e sitosterol), os quais não intervem de forma significativa na estabilidade oxidativa das gorduras11.

Distribuição dos Lipídios na Matriz Trata-se de um aspecto de extrema importância no que respeita ao desenvolvimento de processos oxidativos. Os lipídios podem estar dispersos na matriz, formada pelos polissacarídeos e pelas proteínas, encontrando-se facilmente expostos à oxidação. No entanto, a existência de interações hidrofóbicas entre as cadeias de ácidos graxos e as hélices de amilose, ou o encapsulamento dos lipídios pelas proteínas, podem conduzir ao retardamento dos processos oxidativos7.

Freqüentemente, a estabilidade e a conservação, em condições normais, de alguns alimentos com elevado teor em lipídios deve-se à forma compartimentada ou descontínua como alguns dos seus constituintes (e.g. lipoxigenase, água e oxigênio) se distribuem no seio da matriz.

A relação entre a fração oxidável e a fração estável dos lipídios num mesmo alimento pode ser modificada pela formulação e pelas condições de processamento. Determinados processos (e.g. trituração, torrefação, secagem) tem como conseqüência a alteração profunda dessa estrutura compartimentada, provocando a ruptura dos glóbulos de gordura, favorecendo a ação de enzimas lipolíticas (lipases), a eliminação de água e aumentando a exposição ao oxigênio. A presença de uma fase lipídica contínua resulta na formação de uma maior superfície de troca com o meio e na conseqüente predisposição à oxidação7,10.

Atividade da Água A quantidade de água presente na matriz pode afetar a estabilidade oxidativa dos lipídios7,10,11.

Dados experimentais permitiram verificar que as velocidades mais baixas do processo de oxidação dos lipídios se observam para valores de atividade da água (aw) compreendidos entre 0,2 e 0,3 7. A velocidade de oxidação aumenta para valores inferiores e muito próximos de zero (estado de desidratação), ou superiores. O primeiro caso pode explicar-se pela formação de canais na matriz como resultado da eliminação de água, através dos quais é favorecida a migração do oxigênio. O segundo resulta provavelmente do favorecimento de reações de oxidação enzimática e da capacidade de mobilização de metais de transição (pró- oxidantes) pela água6,7,11.

Mecanismos de Oxidação A degradação oxidativa dos ácidos graxos insaturados pode ocorrer por várias vias, em função do meio e dos agentes catalisadores.

Fotoxidação O mecanismo de fotoxidação de gorduras insaturadas é promovido essencialmente pela radiação UV em presença de sensibilizadores (e.g. clorofila, mioglobina), e envolve a participação de oxigênio singleto (1O2) como intermediário reativo.

O processo envolve reações radicalares, cujo resultado é a formação de hidroperóxidos diferentes dos que se observam na ausência da luz e de sensibilizadores, e que por degradação posterior originam aldeídos, álcoois e hidrocarbonetos5,10.

A velocidade da reação não é afetada por scavengers de radicais peroxilo e é inibida pelos carotenos7,11.

Autoxidação A autoxidação é um processo dinâmico que evolui ao longo do tempo.

Trata-se de um fenômeno puramente químico e bastante complexo, envolvendo reações radicalares capazes de auto-propagação, e que dependem do tipo de ação catalítica (temperatura, íons metálicos, radicais livres, pH). No decurso da seqüência reacional, classicamente dividida em iniciação, propagação e terminação, é possível distinguir três etapas de evolução oxidativa3,7,8,10,12: 1. desaparecimento dos substratos de oxidação (oxigênio, lipídio insaturado); 2. aparecimento dos produtos primários de oxidação (peróxidos e hidroperóxidos), cuja estrutura depende da natureza dos ácidos graxos presentes; 3. aparecimento dos produtos secundários de oxidação, obtidos por cisão e rearranjo dos peróxidos (epóxidos, compostos voláteis e não voláteis), cuja natureza e proporção dependem de diversos parâmetros.

Oxidação Enzimática A oxidação lipídica pode ocorrer por catálise enzimática, nomeadamente por ação da lipoxigenase. Esta enzima atua sobre os ácidos graxos poli-insaturados (e.g.

ácidos linoleíco e linolênico, e seus ésteres), catalisando a adição de oxigênio à cadeia hidrocarbonada poli-insaturada. O resultado é a formação de peróxidos e hidroperóxidos com duplas ligações conjugadas, os quais podem envolver-se em diferentes reações degradativas, semelhantes às observadas para os processos de autoxidação, originando diversos produtos13. O processo de catálise enzimática decorre com maior especificidade, em termos de substrato e de produtos finais, do que o processo de autoxidação10.

Um aspecto importante da atuação da lipoxigenase é o que se relaciona com a sua capacidade para co-oxidar substratos (carotenóides, tocoferóis, clorofila, proteínas, etc.), sendo responsável pela iniciação de novos processos oxidativos10.

MÉTODOS PARA A AVALIAÇÃO DO GRAU DE OXIDAÇÃO LIPÍDICA A avaliação do estado de oxidação de óleos e gorduras, ou seja, a medida do ranço, é uma determinação importante a nível industrial. Trata-se, em primeiro lugar, de um meio de controlar e garantir a qualidade das matérias-primas adquiridas, bem como um método de controle de qualidade dos produtos comercializados. Acresce ainda o interesse da sua aplicação ao estudo sistemático do desenvolvimento do ranço.

Estão descritos dezenas de métodos diferentes (físicos, químicos e físico- químicos) para a avaliação da estabilidade oxidativa de óleos e gorduras.

Porém, nenhum método se correlaciona de um modo perfeito com as modificações organolépticas produzidas no decurso das reações de oxidação. Cada método fornece informações sobre um estado particular do processo oxidativo, variável em função das condições aplicadas e dos substratos lipídicos usados7,9,10.

Uma das dificuldades para avaliar o grau de oxidação reside na escolha do momento mais adequado para efetuar essa determinação. De um modo geral, procura-se avaliar, em condições padronizadas e selecionando um determinado parâmetro indicador, o "período de indução" da reação, ou seja, o tempo necessário para se atingir um ponto crítico de oxidação (e.g. alteração de gosto, aceleração brusca da velocidade do processo oxidativo) (Fig._2). A determinação não deve ser pontual, i.e., restrita a um determinado momento, mas deve-se efetuar ao longo do tempo, de forma a ser representativa da duração de vida do produto4,7,10,11,14.

É importante estabelecer a distinção entre os testes para determinação da estabilidade oxidativa nas condições normais de armazenamento ou de distribuição (testes de estabilidade em tempo real), e a avaliação da resistência à oxidação efetuada por testes preditivos, os quais promovem um envelhecimento acelerado (testes de estabilidade acelerados) (Fig._3)7.

Os testes acelerados, recorrendo a condições padronizadas de oxidação acelerada (oxigenação intensiva, tratamento térmico e/ou catálise metálica), permitem estimar de forma rápida a estabilidade oxidativa de uma matéria graxa ou a eficácia "teórica" de um antioxidante, isolado ou em associação. Uma vez que os fenômenos naturais de oxidação são processos lentos, desenrolando-se freqüentemente ao longo de vários meses, os testes de estabilidade em tempo real tornam-se por vezes incompatíveis com o controle de qualidade a nível industrial4. Deste modo, os testes de estabilidade acelerados assumem particular importância na rotina analítica.

Análise Sensorial Na avaliação sensorial, a coleta e degustação de amostras ao longo do tempo permite seguir o aparecimento progressivo dos produtos de degradação dos lipídios, causadores de off flavorsou de off odors. É considerada a mais fidedigna de todas as determinações, porquanto mede aquilo de que o consumidor se apercebe, traduzindo a sua aceitação relativamente ao produto. Extremamente sensível, permite detectar quantidades da ordem dos mg.kg-1, enquanto que outros métodos possuem em geral um limiar mil vezes superior4,7,11,14. O ranço torna-se perceptível, sensorialmente, para um conteúdo lipídico peroxidado da ordem dos 0,5%5,7.

No entanto, esta análise não pode constituir por si um método de controle.

Difícil de pôr em prática e de custos elevados, a análise sensorial apresenta muitos inconvenientes. Reconhecer e quantificar sabores e odores desagradáveis necessita de uma longa aprendizagem, porquanto a sensação percebida não é única e modifica-se à medida que a oxidação progride. Se por um lado os diferentes constituintes de um produto influenciam a percepção (a natureza dos off flavors pode sofrer alterações pela interação de outros constituintes da matriz), por outro a sensibilidade difere de indivíduo para indivíduo4,7,10,11.

A preferência pessoal subjacente a esta forma de avaliação, aliada às dificuldades quer de determinação do momento exato em que um produto sofre oxidação, quer de comparação de resultados, justificam a existência de um conjunto de testes objetivos, baseados na determinação de propriedades físicas e químicas10,11. Porém, na opinião de alguns autores, a análise sensorial é insubstituível para saber se um teste utilizado (químico ou físico) é representativo da alteração de propriedades organolépticas7.

A avaliação sensorial pode ser aplicada às situações de envelhecimento acelerado, sendo a temperatura o único fator limitante7,11.

Análise dos Substratos da Oxidação Oxigênio Os métodos de absorção de oxigênio tem por base o fato de a oxidação das gorduras e óleos se traduzir num consumo mensurável de oxigênio atmosférico5.

O estudo cinético do consumo de oxigênio, inerente à degradação oxidativa, permite medir a duração da fase de iniciação (período de indução) e/ou o seu alargamento sob o efeito de um agente antioxidante.

Com base neste indicador de oxidação encontram-se descritos na literatura métodos manométricos, polarográficos, ponderais ou mesmo cromatográficos. A título de exemplo referem-se os seguintes ensaios: • Teste de Sylvester:trata-se de um método manométrico baseado na medida das variações da pressão de oxigênio a uma determinada temperatura (50-150oC). A amostra lipídica é colocada num recipiente estanque e aquecida com agitação. A reação do oxigênio do ar com a amostra conduz a uma diminuição da pressão no interior do recipiente.

Existem no mercado algumas versões automatizadas deste teste acelerado (Aparelho FIRA-Astell e Oxidograph)7,10; • Ensaio com bomba de oxigênio:neste método a amostra é colocada numa bomba de aço inoxidável, a qual está ligada a um registrador de pressão. O processo oxidativo é acelerado pelo oxigênio sob pressão (65-110 psi O2) e pelo aquecimento (99oC). Como resultado da absorção de oxigênio, a pressão no interior da bomba diminui5,11; • Oxigrafia com sistema polarográfico:é um método adaptado ao estudo do comportamento oxidativo das gorduras e dos óleos. A peroxidação lipídica é promovida pelo oxigênio e por um catalisador de natureza pró-oxidante (hemoglobina); a medição das pressões parciais de oxigênio ao longo do tempo é efetuada por um sistema polarográfico (eletrodo de Clark com controle de temperatura). A rapidez de execução, a reprodutibilidade dos resultados obtidos e o baixo custo são fatores que revelam a utilidade desta metodologia15; • Método de pesagem:trata-se de um teste muito simples, no qual uma amostra lipídica, rigorosamente pesada, é incubada em estufa (30-80oC) na ausência de luz. Determina-se o aumento do peso da amostra, resultante da adição de oxigênio, em intervalos regulares durante o período de incubação5,16. É um método não muito sensível, cujo ponto crítico se situa muito para além do momento a partir do qual se detecta alteração de flavor4; • Método cromatográfico:recorrendo à cromatografia gasosa (CG) por headspace, mede-se a absorção de oxigênio com auxílio de um detetor termocondutimétrico7.

A principal limitação destes métodos, quando aplicados a meios complexos, resulta da ocorrência de reações "parasitas", as quais contribuem igualmente para o consumo de oxigênio. Por outro lado, a produção de compostos voláteis, a partir da decomposição de peróxidos a alta temperatura, pode também falsear as determinações7,10.

Ácidos Graxos Residuais Não Oxidados O estudo da cinética de desaparecimento do(s) ácido(s) graxo(s) presente(s) na matriz é geralmente efetuado por cromatografia gasosa (CG), após extração e derivatização. A dificuldade do método reside em garantir a extração quantitativa da matéria graxa e em minimizar as perdas ao nível da preparação de derivados7. O método não deve ser aplicado quando os teores de ácidos graxos são muito baixos.

O nível de ácidos graxos residuais não oxidados pode igualmente estimar-se pela determinação do Índice de acidez (IA).Trata-se de uma volumetria ácido-base que compreende a neutralização, com uma solução padrão de hidróxido de potássio, de uma amostra rigorosamente pesada. Exprime-se em mg de KOH por grama de matéria graxa11.

Análise dos Produtos Primários de Oxidação Peróxidos A avaliação deste parâmetro de oxidação é geralmente efetuada pela determinação do Índice de peróxidos (IP). Este representa a diferença entre a formação e a decomposição de peróxidos, e exprime-se em milimoles de oxigênio ativo por kg de matéria graxa.

Segundo alguns autores o IP deve ser determinado nos primeiros estados do processo oxidativo. A variação do nível de peróxidos ao longo do tempo ocorre de uma forma gaussiana, pelo que um nível baixo de peróxidos não constitui uma garantia de boa estabilidade oxidativa, podendo, pelo contrário, ser sinônimo de alteração pronunciada7.

Dois tipos de métodos são classicamente usados para dosear os peróxidos: • Método iodométrico de Lea (LEA):mede o iodo produzido a partir da decomposição do iodeto de potássio pelos peróxidos:

Ao efetuar esta determinação deve ter-se em consideração que: - o iodo libertado pode fixar-se às duplas ligações dos ácidos graxos insaturados, dando um valor de IP por defeito; - o oxigênio presente no meio pode levar à libertação de iodo e dar origem a um valor errado de IP por excesso. É, portanto, aconselhável efetuar o desarejamento prévio do meio, bem como evitar a agitação no decurso da reação; - a determinação do ponto final da titulação é difícil quando o nível de peróxidos é baixo (IP = 0,06-20), mesmo em presença de um indicador (amido).

Nestes casos deve-se optar por uma determinação potenciométrica ou, em alternativa, pode-se medir o valor de absorvência, a 350 ou 290 nm, dos íons I3- em meio metanol/ácido acético7.

• Método colorimétrico:os peróxidos presentes oxidam o Fe2+ a Fe3+, o qual é doseado por colorimetria (l=500 nm) sob a forma de cloreto ou tiocianato férrico5,7,10,17.

Os métodos usados para a determinação do IP apresentam um caráter empírico, pois que os resultados e a exatidão dos testes dependem das condições experimentais utilizadas (e.g. variação do peso da amostra, condições de reação (tempo e temperatura), tipo de peróxidos presentes e sua reatividade)10.

Nos alimentos, o IP é calculado sobre a matéria graxa extraída. O processo de extração, quando conduzido em presença de oxigênio, pode gerar peróxidos em quantidades por vezes superiores aos originalmente presentes. Por outro lado, a remoção do solvente a alta temperatura pode igualmente conduzir à decomposição da matéria graxa7.

Tendo em vista a medida da resistência ao ranço oxidativo, encontram-se normalizados alguns testes que se baseiam na produção acelerada de peróxidos: • Método do Oxigênio Ativo (AOM) ou teste de Swift:neste método uma corrente de ar purificado é feita borbulhar, a um fluxo constante, na matéria graxa aquecida a 98C. O teor em peróxidos (IP) é determinado em intervalos regulares pelo método iodométrico. O teste decorre durante o tempo necessário para se atingir valores de IP=100 (óleos vegetais) ou IP=20-60 (gorduras animais). O período de indução é determinado através de um gráfico de valores IP em função do tempo5,7,11. Como alternativa pode-se usar a avaliação sensorial como indicador do grau de oxidação11.

O princípio do método é criticável pelo fato de se medir simultaneamente o nível de peróxidos resultante de processos de formação e de decomposição. Estes processos não variam do mesmo modo com a temperatura. Assim, enquanto a formação de peróxidos prevalece até aos 60-70C, a decomposição e ocorrência de reações laterais de polimerização e clivagem assumem particular relevo para valores superiores. Por outro lado, os peróxidos formados a partir dos ácidos graxos poli-insaturados decompõem-se mais rapidamente que os resultantes de ácidos graxos mono e di-insaturados. Acrescente-se ainda que o desenvolvimento de off flavors ocorre muitas vezes antes de se verificar a acumulação de altos níveis de peróxidos.

Como conseqüência, verifica-se uma falta de correlação entre os resultados obtidos e o grau de oxidação do produto nas condições normais de armazenamento 4,7,11.

O método AOM pode ser usado para a avaliação da resistência relativa de várias amostras de lipídios à oxidação. No entanto, o seu uso restringe-se à análise de gorduras e óleos, não sendo aplicável a sistemas mais complexos como as matrizes alimentares11.

• Teste de estufa de Schaal:envolve o aquecimento a 60-70oC da amostra (50-100 g), em estufa termostatizada, até ao aparecimento dos primeiros sinais de oxidação. As amostras são examinadas em intervalos de tempo regulares, avaliando-se o estado de oxidação do produto sensorialmente ou, em alternativa, pela determinação do IP. Procede-se, então, à determinação do período de indução de modo semelhante ao referido para o método AOM.

Os resultados fornecidos por este teste apresentam uma boa correlação com a avaliação efetuada nas condições normais de armazenamento. A principal crítica relaciona-se com o inadequado controle das condições de oxidação7,10,11,18.

Na última década, alguns métodos suscitaram particular interesse de aplicação: • Calorimetria diferencial:permite avaliar o período de indução, com base na formação de hidroperóxidos a temperaturas de 80-140oC e sob fluxo de oxigênio7; • Quimiluminescência: mede a quantidade de energia produzida pela transição dos elétrons do estado excitado ao estado fundamental, no decurso da formação de peróxidos. Por falta de sensibilidade dos aparelhos de medida é necessário aumentar artificialmente o rendimento em fótons, para o que se recorre ao aquecimento do produto, à iluminação por um feixe de luz ou à adição de um indutor (e.g. hidroperóxido exógeno, hipoclorito de sódio, 9-10- dibromoantraceno)19-21. Todavia, não existe uma relação simples entre o teor em peróxidos e a intensidade da quimiluminescência, a qual depende também da estrutura dos compostos7.

Dienos Conjugados A oxidação dos ácidos graxos poli-insaturados ocorre com formação de hidroperóxidos e deslocamento das duplas ligações, com conseqüente formação de dienos conjugados5,10.

Os dienos conjugados absorvem a 232 nm. Os produtos secundários da sua oxidação, em particular as a-dicetonas ou as cetonas insaturadas, apresentam um máximo de absorção a 272 nm. Esta diferença é particularmente interessante permitindo diferenciar estados de evolução oxidativa com base na relação A272 nm/A232 nm: quanto maior o valor da absorvência a 232 nm, mais elevado será o conteúdo em peróxidos, correspondendo, portanto, ao início do processo de oxidação; pelo contrário, quanto maior for o valor de absorvência a 272 nm, maior será o teor de produtos secundários presentes9,10,22,23.

A determinação espectrofotométrica está desaconselhada para a análise de meios complexos, para os quais os riscos de interferência são numerosos, em particular se existirem compostos que absorvam fortemente entre 200 e 220 nm.

Nessa situação, a absorção a 232 nm limitar-se-á a uma pequena banda no espectro, sendo desejável recorrer à espectrofotometria diferencial ou utilizar a segunda derivada5,7.

Análise dos Produtos Secundários de Oxidação Os peróxidos, produtos primários de oxidação, são intermediários instáveis, sobretudo a temperaturas elevadas ou em presença de metais de transição. No decurso da sua decomposição produzem-se compostos de natureza muito diversa (aldeídos, cetonas, hidroxiácidos, hidrocarbonetos, polímeros), os quais são genericamente designados produtos secundários (Fig._1). Muitos destes compostos de degradação possuem um odor desagradável, enquanto que os peróxidos são incolores e inodoros7,10.

Compostos Aldeídicos A natureza e proporções relativas dos aldeídos provenientes de processos degradativos dependem muito do tipo de ácido graxo oxidado e das condições de oxidação5.

Para o seu doseamento são freqüentemente usados alguns métodos colorimétricos: • Teste do Ácido 2-Tiobarbitúrico (TBA): trata-se de um teste baseado na reação do ácido tiobarbitúrico com os produtos de decomposição dos hidroperóxidos. Um dos principais produtos formados no processo oxidativo é o malonaldeído† (MA), um aldeído com 3 átomos de carbono2.

Neste ensaio uma molécula de MA reage com duas moléculas de TBA para formar um complexo de cor vermelha, o qual absorve a 532-535 nm e apresenta máximos de absorção secundários a 245 e 305 nm7,11,24. A reação ocorre em meio ácido (pH 1-2) e a alta temperatura (100oC), no sentido de aumentar a sua velocidade e sensibilidade7.

Como padrão para a análise quantitativa é usado normalmente o 1,1,3,3- tetraetoxipropano (TEP), o qual liberta MA e etanol, após hidrólise ácida2,25.

Os resultados são normalmente expressos em unidades de absorvência por unidade de peso da amostra ou em "valor TBA", definido como o peso, em mg, de MA por kg de amostra.

O teste tem sofrido modificações para aumentar a sensibilidade de detecção e eliminar interferências de outros constituintes da amostra. Paralelamente ao método espectrofotométrico para quantificação do complexo MA-TBA, recorre-se com freqüência à cromatografia líquida de alta resolução e à cromatografia gasosa2,4,25,26.

O ensaio pode ser executado segundo dois procedimentos: 1. diretamente sobre o produto, seguido da extração e doseamento do complexo corado; 2. extração prévia dos aldeídos, seguida de reação com o TBA.

No primeiro caso, poder-se-á separar o complexo MA-TBA formado, por cromatografia líquida de alta resolução, usando uma pré-coluna. Desta forma diminui-se o limiar de detecção cerca de 20 vezes em relação aos protocolos de extração normalmente efetuados. No segundo, os aldeídos voláteis são, na maior parte das vezes, previamente extraídos com um solvente orgânico (e.g.

ciclohexano, tetracloreto de carbono, butanol)7.

Apesar de freqüentemente usado, o teste do TBA apresenta limitações, tornando necessárias algumas precauções quanto ao significado atribuído às determinações realizadas: - o MA forma-se unicamente a partir dos ácidos graxos possuindo pelo menos três duplas ligações. Na realidade, o teste TBA não entra em linha de conta com os derivados do linoleato ou oleato, mesmo para valores de IP>2000; - o MA não é o único produto de oxidação dos lipídios que reage com o TBA: os 4-hidroxialcenais, os 2,4-alcadienais e os 2-alcenais formam igualmente um cromogênio. Por essa razão parece preferível falar em "substâncias que reagem com o TBA" (TBARS)5,7,10; - a falta de especificidade do teste não se limita aos compostos anteriormente referidos. Particularmente quando o teor de MA é baixo, outros aldeídos não provenientes do processo de degradação dos lipídios podem reagir com o TBA (e.g. acetaldeído e compostos da reação de Maillard). Os açúcares, nomeadamente a sacarose e a glicose, interferem exercendo um forte efeito sinérgico na formação de TBARS, sobrestimando dessa forma a extensão da oxidação. Por outro lado, o MA pode não reagir com o TBA devido à sua complexação com proteínas, aminas e outros compostos4,5,7,26.

Pelo anteriormente exposto, parece conveniente estabelecer uma correlação entre os valores de TBARS e os resultados da avaliação organoléptica e/ou de outros métodos11. O teste TBA é muitas vezes realizado como complemento do IP.

• Índice de p-Anisidina (IpA):a p-anisidina, em meio acético, forma um complexo de cor amarela com os aldeídos que possuem duas duplas ligações conjugadas, em particular com o trans,trans-2,4-decadienal resultante da degradação do ácido linoleíco.

O IpA define-se como 100 vezes o valor da absorvência, medida a 350 nm, de uma solução resultante da reação de 1 g de lipídio em 100 ml de solvente contendo p-anisidina7,10.

Trata-se de um método normalizado pela IUPAC, estabelecendo-se que, por via de regra, um bom óleo deve apresentar um IpA inferior a 10 10.

O valor IpA encontra-se associado ao valor IP, traduzindo o chamado Valor Totox (Valor Total de Oxidação): Valor Totox = 2 (IP) + (IpA) Esta combinação permite correlacionar o nível de peróxidos, que representam o potencial de degradação da qualidade organoléptica, e os aldeídos, representativos do estado de deterioração efetivo. Considera-se que um corpo graxo bem conservado deve apresentar um valor Totox inferior a 107,10.

• Teste de Kreis ou Índice de ranço: é um método colorimétrico que se baseia na reação, em meio ácido, do floroglucinol com epoxialdeídos ou os seus acetais. A coloração vermelha obtida é medida por espectrofotometria. Trata-se de um teste rápido que fornece indicação da ocorrência de oxidação lipídica numa fase precoce do desenvolvimento do ranço5,10.

Quando aplicado a produtos alimentares, o ensaio sofre a interferência de alguns aditivos (e.g. vanilina). O MA reage igualmente desenvolvendo a referida coloração, o que pode explicar-se por um possível rearranjo originando o isômero 2,3-epoxipropanal10.

Encontram-se igualmente referidos na literatura vários métodos químicos tendo em vista a determinação de compostos carbonílicos totais (aldeídos e cetonas)24. A título de exemplo, cita-se o Índice de Carbonilo,o qualcorresponde à avaliação dos compostos carbonílicos que se formam no decurso do processo de oxidação. Tem por base a reação, em meio ácido, com a 2,4- dinitrofenilhidrazina e a formação dos respectivos derivados corados (2,4- dinitrofenilhidrazonas), seguida de determinação espectrofotométrica10,11,24,27.

Ácidos Oxidados Um dos métodos usados para a avaliação dos ácidos oxidados baseia-se na insolubilidade dos compostos polares no n-hexano. Procede-se à saponificação da matéria graxa, seguida de uma extração e posterior neutralização dos sabões pelo ácido clorídrico. Os ácidos graxos livres regenerados são, então, extraídos pelo n-hexano. Após a evaporação do solvente orgânico, o resíduo obtido é doseado ponderalmente. Trata-se de um método moroso e pouco preciso7.

Outro método aplicável recorre à separação, após saponificação, dos ácidos oxidados e não oxidados por cromatografia em camada fina ou por CG7.

Compostos Voláteis Os compostos voláteis, hidrocarbonetos (pentano, n-hexano, etano), aldeídos (pentanal, hexanal, hexenal, 2-octenal, 2-nonenal), cetonas (1,5-octadien-3- ona, 1-octen-3-ona) ou ácidos (ácido fórmico), resultam da decomposição dos produtos primários do processo oxidativo (peróxidos). Aparecem numa fase bastante precoce do ciclo evolutivo e estão na origem do ranço2,7.

O pentano e o hexanal são os compostos usualmente determinados, que, provêm da degradação do ácido linoleíco e araquidónico, os quais fazem parte integrante de uma grande variedade de produtos.

A determinação dos referidos produtos é vulgarmente efetuada por CG de injeção direta ou por headspace2,9.

Este método dispensa a extração prévia e adapta-se à análise de matrizes complexas. Os cromatogramas obtidos nem sempre são fáceis de interpretar pelo elevado número de picos presentes. Porém, observa-se uma perfeita correlação entre os resultados obtidos e a avaliação sensorial4,7,10.

A combinação da cromatografia gasosa com a espectroscopia de massa (CG/ EM)constitui uma técnica analítica altamente sensível, permitindo a obtenção de dados relativos à identificação, origem e quantificação dos compostos responsáveis por off flavors e off odors, e seus precursores4.

A termóliserepresenta uma variante do método anteriormente mencionado. Baseia- se na análise dos produtos voláteis formados por termodecomposição dos hidroperóxidos, por cromatografia gasosa direta ou após derivatização com a 2,4,6-triclorofenilhidrazina7,27.

A avaliação do teor de ácidos voláteis é usualmente feita por condutimetria. A análise baseia-se no registo das variações da condutividade da água destilada, na qual se faz a coleta dos ácidos de baixo peso molecular (e.g. ácido fórmico). Estes compostos são obtidos normalmente após iniciação forçada da oxidação a uma temperatura de 110-130oC e com corrente de ar ou de oxigênio4,7,14,18,28.

Os aparelhos Rancimat(Metrohm) (Fig._4) e OSI(Oxidative Stability Instrument) (Omniom) tem por base esse princípio. As condições de trabalho são semelhantes às do método do oxigênio ativo (AOM), embora neste caso se avaliem os produtos secundários de oxidação em vez de se determinarem os produtos primários (peróxidos)7.

Dados recentes apontam para a existência de uma boa correlação entre o período de indução determinado pelo Rancimat ou pelo teste OSI, e o obtido pelo teste AOM ou pela avaliação do IP em condições normais de temperatura e armazenagem prolongada7.

O método condutimétrico apresenta, contudo, inconvenientes: - se obtem resultados mensuráveis para níveis de oxidação elevados (IP>100), muito para além do ponto correspondente ao aparecimento de off flavors4,7. Esta crítica é comum ao método AOM; - os produtos de decomposição que se formam, nas condições térmicas do ensaio (T > 100oC), não são da mesma natureza que os obtidos nas condições normais de armazenamento. Esta crítica aplica-se igualmente a todos os testes que recorrem a uma oxigenação intensiva a altas temperaturas4,7. Para minorar estes inconvenientes, verifica-se hoje em dia uma tendência para efetuar as determinações a temperaturas mais baixas (60-90oC)14,29,30,31; - as condições térmicas usadas tornam impossível a avaliação da capacidade antioxidante de compostos termolábeis, os quais podem decompor-se ao longo do ensaio7.

Existem no mercado alguns aparelhos destinados à avaliação rápida do estado de oxidação lipídica, particularmente de óleos alimentares. É o caso do Foodoil- sensor(Northern Technologies International), que permite acompanhar o aumento da constante dielétrica do óleo ao longo do processo de degradação oxidativa.

Outros Métodos • Cromatografia líquida de alta resolução (HPLC):permite dosear separadamente peróxidos, hidroperóxidos e produtos secundários de oxidação. A maioria dos autores propõe o trabalho em fase reversa e o uso de detetores UV ou amperométricos5,7,32,33; • Espectrofotometria no IV:tem sido igualmente usado na avaliação do ranço, desempenhando um papel particularmente importante no reconhecimento de grupos funcionais não característicos e de compostos contendo duplas ligações com configuração trans5,10.

O aparecimento de bandas próximo dos 3410 cm-1 corresponde à formação de hidroperóxidos, enquanto que o desaparecimento de uma banda próximo dos 3125 cm-1 é indicativo da substituição de um hidrogênio de uma dupla ligação por um radical livre. Por outro lado, um aumento da banda de absorção a 970 cm- 1 corresponde à formação de duplas ligações com configuração trans (provavelmente devido a dano oxidativo), enquanto que o aparecimento de bandas adicionais próximo dos 1750 cm-1 (devido ao estiramento da ligação C=O) é um indício da formação de aldeídos, cetonas ou ácidos10; • Fluorimetria: usada para a detecção de produtos resultantes da oxidação lipídica contendo grupos NH2 livres. Os métodos fluorimétricos, que se baseiam na emissão de radiações pela espécie a determinar após absorção de radiação electromagnética de comprimentos de onda na zona UV/VIS, apresentam uma elevada sensibilidade e baixo limite de detecção, aplicando-se essencialmente à determinação da extensão da oxidação lipídica em sistemas biológicos10.

MÉTODOS PARA A AVALIAÇÃO DA CAPACIDADE ANTIOXIDANTE Os antioxidantes podem definir-se como substâncias que, numa concentração consideravelmente menor que a do substrato oxidável, retardam o ranço oxidativo, diminuindo a velocidade da reação ou prolongando o seu período de indução3,7,34.

A quebra da cadeia reacional da oxidação lipídica pelos antioxidantes não ocorre segundo um mecanismo simples, e certos aspectos, relativos às interações entre constituintes de meios complexos, não estão completamente esclarecidos. O emprego de antioxidantes em formulações é muitas vezes empírico, de tal modo que a garantia da sua eficácia nem sempre existe.

Tendo em vista uma rápida avaliação da capacidade e eficácia antioxidante de compostos químicos ou extratos vegetais, bem como o estudo dos mecanismos de ação antioxidante, estão descritos na literatura diversos trabalhos. Na maioria dos casos, correspondem a testes de estabilidade acelerados, em que se determina a extensão da oxidação de um lipídio usado como substrato, pela aplicação dos métodos anteriormente mencionados (veja item "Métodos para a avaliação do grau de oxidaçãos")4,35. A atividade antioxidante varia de acordo com o tipo de composto e sua concentração36,37.

A determinação da eficácia de um antioxidante corresponde freqüentemente à medida do alargamento do período de indução resultante da sua adição. Esse alargamento é por vezes expresso como um índice antioxidante ou fator de proteção (Fig._5)5.

Oxidação Forçada de um Substrato Lipídico O método consiste em colocar num reator de oxidação ácido linoleíco ou linoleato de metila em meio apolar, após o que se procede a um aquecimento a 110oC sob corrente de oxigênio. A diminuição da concentração do linoleato de metila é acompanhada por CG.

A atividade antioxidante é avaliada pelo aumento do tempo de semi-vida do substrato de oxidação na presença do antioxidante.

A utilização deste teste encontra-se condicionada pela solubilidade e estabilidade térmica dos antioxidantes no meio reacional. A oxidação do ácido graxo insaturado (ácido linoleíco ou linoleato de metila) pode ser acelerada utilizando um iniciador radicalar ou um pró-oxidante contendo íons Fe3+ (e.g.

hemoglobina), evitando deste modo o aquecimento e oxigenação intensivos7.

Co-oxidação de Substratos Trata-se de um ensaio espectrofotométrico baseado na descoloração (oxidação) do b-caroteno induzida pelos produtos da degradação oxidativa de um ácido graxo (e.g. ácido linoleíco). A determinação é efetuada a 470 nm, na presença e na ausência de um antioxidante7,15,29,38-40.

É um método simples, sensível, mas não específico (substâncias oxidantes ou redutoras interferem no ensaio)4. A co-oxidação do b-caroteno é normalmente efetuada num meio emulsionado, o que origina muitas vezes falta de reprodutibilidade dos valores de absorvência medidos. Acresce ainda a dificuldade de interpretação dos resultados devida à interação do b-caroteno com o oxigênio7,29.

Apesar dos inconvenientes referidos, o método é amplamente usado. Como não recorre a altas temperaturas, permite a determinação do poder antioxidante de compostos termo-sensíveis e a avaliação qualitativa da eficácia antioxidante de extratos vegetais. Neste caso, procede-se à separação dos respectivos constituintes por cromatografia em camada fina ou cromatografia em camada fina de alta resolução, seguida de pulverização com uma mistura de b-caroteno/ácido linoleíco, e posterior exposição à luz do dia ou à radiação UV. Após descoloração do fundo amarelo, a persistência de manchas com essa cor indica a presença de compostos com atividade antioxidante7,15.

Oxidação em Modelos Membranares e Lipossomas Alguns investigadores recorrem à modelização de estruturas membranares para estudar a oxidação dos fosfolipídios dos sistemas biológicos e a ação antioxidante de compostos. Outros referem o uso de sistemas lipossómicos, mono ou plurilamelares, ou de microssomas7,8,41.

Os testes mais usados para a avaliação do estado de oxidação dos ácidos graxos em sistemas biológicos são o teste do TBA ou a avaliação do consumo de oxigênio42.

Avaliação da Atividade Scavenger de Radicais "Gerados" in vitro (Ensaios "Armadilha") Sob a designação de "ensaios armadilha" (Trap Assays) podemos encontrar um conjunto de testes de inibição destinados à avaliação da capacidade scavenger de radicais livres "gerados" in vitro.

Os diversos métodos propostos na literatura variam quanto ao tipo de radicais livres gerados (Fig._6), ao indicador de oxidação escolhido e ao método usado para a sua detecção e quantificação.

Na maioria dos casos recorre-se à formação de radicais instáveis, pela decomposição térmica de azo iniciadores (e.g. ABAP, AMVN, AAPH), os quais reagem rapidamente com o oxigênio originando radicais peroxilo. Estes atuam sobre um substrato lipídico (e.g. ácido linoleíco ou um dos seus ésteres) desencadeando um processo de lipoperoxidação, em relação ao qual se escolhe um determinado indicador (e.g. consumo de oxigênio, desaparecimento do substrato lipídico, aparecimento de produtos de oxidação) que se observa e quantifica antes e após a adição de um composto antioxidante (avaliação da atividade scavenger)34,43-46.

Alguns autores propõem um outro tipo de testes que não recorrem à oxidação de substratos lipídicos, mas à redução de radicais livres estáveis gerados in vitro,como resultado da atividade scavenger de compostos antioxidantes.

O método de Brand-Williams et al.7,29 tem por base a redução do radical 2,2'- difenil-1-picrilhidrazilo (DPPH·), o qual apresenta um máximo de absorção a 517-520 nm. Ao fixar um H·, abstraído ao antioxidante em estudo, observa-se uma diminuição da absorvência, o que permite calcular, após o estabelecimento do equilíbrio da reação, a quantidade de antioxidante gasta para reduzir 50% do DPPH·. Trata-se de um teste rápido, que não envolve condições drásticas de temperatura e oxigenação.

Num outro ensaio proposto por Miller et al. obtém-se o radical cation ABTS·+, a partir do ácido 2,2'-azino-bis-(3-etilbenzotiazolina)-6-sulf ônico (ABTS) e em presença de H2O2, o qual apresenta máximos de absorção a 417, 645, 734 e 815 nm. Na presença de antioxidantes doadores de hidrogênio, pode medir-se a diminuição da formação deste radical por espectrofotometria43,47.

Encontram-se igualmente referenciados alguns ensaios cinéticos tendo por base a formação in vitrodo radical superóxido (O2-·) ou do radical hidroxilo (HO·)34,41,43,46.

No primeiro caso, o O2-·, gerado pelo sistema hipoxantina-xantina oxidase a pH fisiológico, reage com o citocromo c ou um derivado nitrado do azul de tetrazol segundo constantes de velocidade bem definidas (2,6.105 e 6.104 M-1s-1, respectivamente). Qualquer molécula capaz de reagir com o O2-· origina uma diminuição das constantes de velocidade referidas.

No segundo caso, o teste mais usado é o denominado "método da desoxirribose", segundo o qual os radicais HO· são gerados por uma mistura de ácido ascórbico/H2O2/Fe3+-EDTA. Os radicais não seqüestrados pelo composto em análise atacam a desoxirribose presente no meio, promovendo a sua degradação. Alguns dos compostos resultantes reagem positivamente com o TBA, em meio ácido e com aquecimento, tornando possível o cálculo da constante de velocidade da reação. A constante de velocidade da reação dos HO· com a desoxirribose, na ausência de compostos scavenger, é de 3,1.109 M-1s-1. Este método é também muito usado para a avaliação da atividade pró-oxidante de compostos.

TESTES ACELERADOS: PRINCIPAIS LIMITAÇÕES A falta de correlação por vezes observada entre os diferentes métodos deve-se, por um lado aos indicadores usados na avaliação do grau de oxidação (absorção de oxigênio, teor de peróxidos, aparecimento de produtos secundários, etc.), os quais não refletem o mesmo estado de evolução do processo oxidativo, e por outro às condições experimentais em que se efetuam as referidas determinações (e.g.temperatura, presença de catalisadores metálicos, pressão de oxigênio, exposição à luz, agitação)4.

Nos ensaios de estabilidade oxidativa mais usados (testes AOM, bomba de oxigênio e Rancimat), a oxidação é acelerada pela temperatura e pela oxigenação. A altas temperaturas o mecanismo de oxidação lipídica apresenta alterações significativas, observando-se a ocorrência de reações laterais (polimerização, ciclização e cisão), normalmente irrelevantes à temperatura normal de armazenamento. Em conseqüência, verifica-se a formação de novas espécies antioxidantes ou pró-oxidantes, as quais podem falsear as determinações. A velocidade de oxidação depende também da concentração em oxigênio, cuja solubilidade decresce com o aumento da temperatura4,7.

Por outro lado, quando usados para a avaliação da capacidade antioxidante de compostos verifica-se que o índice de proteção global, medido a alta temperatura, é em regra inferior ao verificado a temperaturas mais baixas. De fato, na presença de um antioxidante a velocidade do processo oxidativo diminui, devido ao aumento da energia de ativação da reação. Porém, este é compensado pelo fornecimento de energia térmica. O grau de eficácia dos antioxidantes, medido a alta temperatura, pode também refletir a maior ou menor estabilidade térmica dos compostos4,7,10. Estes fatos explicam alguns dos resultados contraditórios obtidos relativamente à eficácia antioxidante de certos compostos4,48.

CONCLUSÃO A metodologia usada para a avaliação do grau de eficácia de sistemas antioxidantes é basicamente a mesma que se utiliza para a determinação da estabilidade oxidativa de sistemas lipídicos. Esta resulta da aplicação de técnicas analíticas muito diversas (e.g. cromatografia, espectrofotometria, condutimetria, polarografia), da adoção de diferentes condições de ensaio e da medida de diferentes indicadores de oxidação (Fig._7).

O uso de metodologias tão diversas coloca dúvidas quanto à escolha do método mais adequado para um determinado estudo de estabilidade oxidativa ou de avaliação da capacidade antioxidante. A diversidade das condições de ensaio (e.g. substratos lipídicos, concentrações, tempo de oxidação, temperaturas, oxigenação) e dos sistemas modelo usados tem gerado algumas dificuldades no que respeita à interpretação e comparação dos dados publicados4. A Tabela_1 apresenta em resumo algumas das vantagens e desvantagens dos principais métodos usados.

O grau de oxidação deve ser determinado em diferentes estados de desenvolvimento do processo oxidativo, por recurso a vários métodos analíticos complementares, suscetíveis de acompanhar as modificações que se verificam quer ao nível dos substratos (em especial o oxigênio), quer dos produtos primários (peróxidos) e secundários (compostos carbonílicos, hidrocarbonetos) de oxidação.

Os testes acelerados não fornecem garantias quanto à validade da sua extrapolação para as condições normais de conservação e uso dos produtos, ou de proteção por parte dos antioxidantes. Não existe um teste analítico ideal, pelo que o método selecionado deve adaptar-se ao produto em questão, ao tipo de matéria graxa e ao tipo de formulação. As condições de ensaio devem aproximar- se, tanto quanto possível, das condições normais de armazenamento. Os resultados de maior validade são obtidos para temperaturas compreendidas entre os 40-60oC, sendo igualmente importante ter em conta, para a sua interpretação, a eventual presença de substâncias endógenas antioxidantes e/ou pró- oxidantes3,4,7.

A comparação da estabilidade oxidativa e da eficácia antioxidante em sistemas lipídicos será legítima se levar em consideração, por um lado as condições de oxidação empregadas e por outro, o método analítico e o indicador de oxidação escolhido. A eficácia dos vários compostos na proteção dos sistemas lipídicos deve ser comparada na mesma concentração molar e relativamente a padrões puros (e.g. BHT, BHA, a-tocoferol)4.

Verifica-se que uma necessidade premente de padronizar os métodos correntemente usados e de efetuar uma reavaliação de alguns dos dados disponíveis, procurando assim clarificar alguns aspectos contraditórios descritos na literatura.


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