Características físicas e químicas de um tipo de bacuri (Platonia insignis
Mart.) sem sementes
COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA
O bacurizeiro (Platonia insignis Mart.) é uma espécie madeireira e frutífera
nativa da Amazônia oriental brasileira (Cavalcante, 1996). Os frutos dessa
Clusiaceae têm grande aceitação nas áreas de ocorrência natural da espécie,
principalmente no Estado do Pará, que se constitui no maior produtor e
principal consumidor. Estimativas indicam que somente na cidade de Belém-PA,
são comercializados, anualmente, sete milhões de frutos, com valor total de U$
1,61 milhão (Shanley, 2000).
O bacuri é uma baga uniloculada, com formato arredondado, ovalado ou achatado
(Cavalcante, 1996; Guimarães et al., 1992) e peso médio de 257,9g, 326,0g e
346,3g, respectivamente, para frutos oriundos dos Estados do Maranhão, Piauí e
Pará (Mourão, 1992; Santos, 1982; Guimarães et al., 1992). Alguns tipos
produzem frutos bem maiores, com peso superior a 1.000g (Calzavara, 1970). O
número de sementes por fruto, geralmente, varia de um a cinco, com média de 2-
4 sementes (Villachica et al., 1996; Carvalho et al., 1998). Em casos raros,
são encontrados frutos contendo seis sementes (Mourão, 1992) ou desprovidos de
sementes (Calzavara, 1970).
Em termos percentuais, a maior parte do bacuri é representada pelo epicarpo e
mesocarpo, popularmente denominado de casca, sendo as sementes o segundo
componente. A polpa, que corresponde ao endocarpo (Mourão, 1992), é o
componente que ocorre em menor proporção. Resultados obtidos em amostras de
frutos de tipos com sementes, oriundos de diversas matrizes, mostraram valores
médios para os rendimentos percentuais de casca, polpa e sementes variando
entre 63,0% e 75,0%; entre 9,7% e 17,3%; e entre 13,0% e 26,0%, respectivamente
(Pesce, 1941; Calzavara, 1970; Barbosa et al., 1979; Guimarães et al., 1992;
Alcoforado et al., 1996; Santos, 1982; Cruz, 1988; Teixeira, 2000).
A ocorrência de bacuri sem sementes foi primeiramente assinalada por Calzavara
(1970), que identificou, na ilha de Marajó, uma planta que produzia frutos
partenocárpicos, sem, no entanto, caracterizá-los, salientando, apenas, que o
formato era arredondado. Moraes et al. (1994) afirmam que o rendimento
percentual de polpa do bacuri sem sementes situa-se entre 20% e 21%, enquanto
Souza et al. (2000) relatam que os frutos são de tamanho diminuto, com casca
espessa e reduzida quantidade de polpa.
Este trabalho teve por objetivo efetuar a caracterização física e físico-
química de um tipo de bacuri sem sementes, oriundo de uma planta estabelecida
em uma população natural, no município de Vigia-PA. Os frutos foram coletados
no mês de junho de 2000, após desprenderem-se naturalmente da planta-mãe e
caracterizados cinco dias após a coleta.
A caracterização física foi efetuada em uma amostra de 50 frutos, considerando-
se as seguintes variáveis: peso, comprimento, diâmetro, coloração e formato do
fruto, espessura da casca e rendimentos percentuais de casca, polpa e do
conjunto representado pela coluna placentária e óvulos abortados.
As características químicas da polpa foram determinadas em amostra retirada dos
50 frutos utilizados na etapa de caracterização física. Foram consideradas as
seguintes variáveis: teor de umidade, pH, acidez total titulável, sólidos
solúveis totais e a relação sólidos solúveis totais / acidez total titulável.
O teor de umidade da polpa foi determinado pelo método de estufa a 105±3°C, com
base em duas subamostras de 10 g, expressando-se o resultado em base úmida. As
leituras de pH e teor de sólidos solúveis foram efetuadas, respectivamente, em
potenciômetro, previamente calibrado com os padrões 4 e 7, e em refratômetro de
mesa. Para essas duas determinações, a polpa foi previamente diluída em água na
proporção de 1:3 (p/v), multiplicando-se, no caso do teor de sólidos solúveis
total, o valor da leitura por quatro. A acidez total titulável foi quantificada
em duas subamostras de 5 g de polpa diluída com 50 ml de água, pelo método
titulométrico com solução de NaOH a 0,1N fatorada, usando como indicador
solução de fenolftaleína a 1%.
O tipo de bacuri sem sementes analisado apresentou características físicas bem
diferentes da maioria dos tipos com sementes, principalmente no que concerne ao
tamanho e peso dos frutos, que são bem menores. O peso médio dos frutos foi de
apenas 89,24 g, com limites mínimo e máximo de 52,04 g e 129,61 g (Tabela_1),
enquanto nos tipos com sementes o peso dos frutos é quase sempre superior a 180
g (Mourão, 1972; Santos, 1982; Guimarães et al., 1992) podendo, em alguns
genótipos, atingir até 1.000g (Calzavara, 1970).
A ausência de sementes teve pouco significado no incremento do rendimento de
polpa que foi de apenas 18,13%, valor este bem próximo ao relatado por Moraes
et al. (1994) para frutos com essa característica. Esse rendimento de polpa
pode ser considerado baixo, pois alguns tipos de bacuri com sementes apresentam
rendimento semelhante ou até mesmo muito superior, em alguns genótipos
atingindo valor de 30% (Guimarães et al., 1992; Teixeira, 2000).
Considerando-se que, em média, a participação percentual do conjunto polpa e
sementes representa cerca de 30,3% do peso do fruto, teoricamente, poder-se-ia
esperar que o rendimento de polpa no bacuri sem sementes atingisse esse valor.
Para o tipo analisado, tal fato não foi verificado, em função de a casca ser
bastante espessa, principalmente em relação ao tamanho do fruto (Tabela_1), o
que implica pequeno volume da cavidade interna. Enquanto, nos tipos com
sementes, a participação relativa da casca, na composição do fruto, varia entre
63,0% e 75,0% (Pesce, 1941; Calzavara, 1970; Barbosa et al., 1979; Guimarães et
al; 1992; Alcoforado et al., 1996; Santos, 1982; Cruz, 1988; Teixeira, 2000),
no bacuri sem sementes, essa participação foi bem maior, atingindo valor de
81,66%.
Em todos os frutos, foram observados resquícios de óvulos abortados, de
coloração marrom-escura, quase preta, na maioria dos casos de tamanho diminuto
e aderidos à porção basal da coluna placentária (Figura_1a). Em alguns frutos,
essas estruturas apresentavam integumentos ligeiramente desenvolvidos, com
comprimento de 1,3 cm e largura de 0,3cm (Figura_1b). Os óvulos abortados,
juntamente com a coluna placentária, representaram, em média, apenas 0,21% do
peso do fruto (Tabela_1).
O fruto apresentou formato ovalado (Figura_1) e epicarpo de cor amarela
uniforme, quando completamente maduro. O formato, diferente do relatado por
Calzavara (1970), sugere a existência de mais de um tipo de bacuri sem
sementes, pois essa característica é bastante uniforme em frutos oriundos de um
mesmo genótipo e constitui-se em caráter com forte componente genético (Mourão,
1992). Convém ressaltar, ainda, que todos os frutos produzidos pela planta eram
desprovidos de sementes, ao contrário do observado por Souza et al. (2000) em
bacurizeiros de populações nativas da região Meio-Norte do Brasil que, embora
produzindo predominantemente frutos sem sementes, também desenvolviam frutos
com sementes, estes sempre de maior tamanho.
Os valores de pH e acidez total titulável (Tabela_2) foram semelhantes aos
encontrados para a polpa de tipos de bacuri com sementes (Barbosa et al., 1979;
Santos, 1982; Guimarães et al., 1992), embora, em relação à acidez total
titulável, Cruz (1988) e Teixeira (2000) tenham registrado valores bem menores
na polpa de frutos procedentes dos Estados do Maranhão e Piauí,
respectivamente.
O teor de sólidos solúveis totais na polpa e a relação sólidos solúveis totais
/ acidez total titulável foram baixos (Tabela_2). Muitos tipos de bacuri com
sementes apresentam polpa com teor de sólidos solúveis superior a 15°Brix, em
alguns casos atingindo até 21°Brix e relação sólidos solúveis totais/acidez
total titulável superior a 20 (Santos, 1982; Guimarães et al., 1992; Teixeira,
2000).
O tipo de bacuri sem sementes analisado tem pouco valor tanto para o consumo e
fruta fresca, como para utilização agroindustrial, pois os frutos são de
tamanho diminuto, com casca espessa e polpa com baixo teor de sólidos solúveis
totais.