Adubação nitrogenada na formação de porta-enxertos de limoeiro 'Cravo' em
tubetes
SOLOS E NUTRIÇÃO DE PLANTAS
Adubação nitrogenada na formação de porta-enxertos de limoeiro 'Cravo' em
tubetes1
Nitrogen fertilization on rangpur lime rootstock produced in dibble tubes
Walkyria Bueno ScivittaroI; Roberto Pedroso de OliveiraI; Cinara Fernanda
Garcia MoralesII; Elizete Beatriz RadmannII
IEng. Agr., Dr., Pesquisador (a) da Embrapa Clima Temperado. Caixa Postal 403.
CEP 96001-970. Pelotas-RS. E-mail: wbscivit@cpact.embrapa.br
IIEng.ª Agr.ª, Mestre. Bolsista de Desenvolvimento Tecnológico Industrial (DTI)
do CNPq / Embrapa Clima Temperado
INTRODUÇÃO
A citricultura é uma das atividades agrícolas de maior importância econômica e
social para o Brasil (Ministério da Agricultura e do Abastecimento, 2000),
sendo recomendada a utilização de mudas certificadas para a melhoria da
qualidade das frutas e o aumento da competitividade do setor no mercado
internacional (Oliveira et al., 2001). Atualmente, aplicam-se nos Estados de
São Paulo e Rio Grande do Sul normas rigorosas para a produção e a
comercialização de mudas certificadas de citros, visando a garantir a qualidade
genética e fitossanitária (Coordenadoria de Assistência Técnica Integral, 1998;
Secretaria da Agricultura e Abastecimento, 1998). Obrigatoriamente, as mudas
devem ser produzidas em ambiente protegido, com a utilização de substrato
isento de patógenos, nematóides e propágulos de plantas daninhas e a adoção de
uma série de medidas para evitar a incidência de cancro-cítrico, clorose
variegada dos citros, gomose e mancha-preta.
Os substratos comerciais utilizados na produção de mudas de citros são
constituídos, basicamente, por vermiculita, perlita, areia, turfa e casca de
pínus, além de outros materiais orgânicos em menor proporção. É comum, porém,
requererem a suplementação com fertilizantes minerais para a otimização do
desenvolvimento das plantas (Oliveira et al., 2001), sendo este um dos aspectos
determinantes do êxito do sistema de produção de mudas em ambiente protegido,
principalmente na fase de sementeira, uma vez que o volume de substrato
disponível para o desenvolvimento das raízes é bastante limitado e a perda de
nutrientes, acentuada (Joaquim, 1997; Perin et al., 1999).
O nitrogênio é um dos nutrientes requerido em maior quantidade pelos porta-
enxertos de citros, participando dos principais processos metabólicos da planta
(Maust & Williamson, 1994). Resultados de pesquisa têm demonstrado resposta
positiva à aplicação de fertilizantes nitrogenados sobre o desenvolvimento de
porta-enxertos de citros produzidos em bandejas ou tubetes (Carvalho, 1994;
Carvalho & Souza, 1996; Mattos Junior et al., 2001), especialmente quando
realizada de forma parcelada em pequenas doses (Carvalho, 1994; Carvalho &
Souza, 1996), minimizando as perdas por lixiviação e volatilização. O maior
controle ambiental presente em cultivos protegidos, associado ao uso de
substratos isentos de patógenos e ao transplantio sem ferimentos nas raízes,
possibilita a intensificação da adubação nitrogenada, reduzindo o tempo
necessário para a obtenção de mudas aptas ao transplantio. Deve-se evitar,
porém, as superdosagens, que podem ocasionar queima das folhas e do caule e
desbalanço nutricional (Carvalho, 1998).
O nitrogênio pode ser aplicado nas formas químicas nítrica, amoniacal e
amídica. Dentre as fontes comerciais do nutriente, destaca-se a uréia pela
facilidade de acesso no mercado, menor custo por unidade de N, elevada
solubilidade e compatibilidade para uso em mistura com outros fertilizantes. No
entanto, é uma fonte bastante suscetível a perdas por volatilização de amônio e
apresenta efeito ácido no substrato, condição esta particularmente desfavorável
para cultivos protegidos onde se realizam aplicações intensivas em volumes
limitados de substrato (Villas Bôas et al., 1999). Nestas situações, o nitrato
de cálcio pode constituir-se em alternativa viável à uréia, apesar do custo
relativo mais alto. Como vantagens adicionais, apresenta elevada solubilidade,
proporciona efeito alcalino no substrato e contribui para o fornecimento de
cálcio às plantas, nutriente requerido em maior quantidade pelos citros.
A via preferencial de fornecimento de nitrogênio às mudas de citros é a água de
irrigação, variando a freqüência de aplicação de uma a duas vezes por semana,
em função da dosagem, espécie utilizada e de condições de cultivo (Carvalho
& Souza, 1996).
O conhecimento das necessidades nutricionais da planta, bem como sua resposta à
aplicação de fertilizantes, é fundamental para otimizar a eficiência de
utilização destes, garantindo a produção econômica de porta-enxertos vigorosos
em um curto espaço de tempo. Nas condições do Rio Grande do Sul, onde apenas
recentemente deu-se início à produção comercial de mudas cítricas em ambiente
protegido, são restritas as informações de pesquisa relativas ao assunto,
requerendo maior atenção da pesquisa.
Este trabalho teve por objetivo avaliar o efeito de fontes e de doses de
nitrogênio, aplicado em cobertura, sobre o crescimento, produção de matéria
seca e absorção de nutrientes por porta-enxertos de limoeiro 'Cravo' produzidos
em ambiente protegido.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado sob condições de casa de vegetação de vidro, na
Embrapa Clima Temperado, em Pelotas-RS, de julho a dezembro de 2001.
Utilizaram-se sementes de limoeiro 'Cravo' [Citrus limonia (L.) Osbeck] recém-
coletadas de frutos maduros provenientes de plantas-matrizes do Centro Apta
Citros "Sylvio Moreira". As mudas do porta-enxerto foram produzidas em tubetes
plásticos cônicos, com capacidade para 50 cm3, preenchidos com substrato
comercial composto de vermiculita, solo orgânico e casca de pínus compostada,
cujas características físicas e químicas se encontram descritas na Tabela_1. Os
tubetes foram dispostos em bandejas metálicas com capacidade para 192 tubetes.
A semeadura foi realizada na profundidade de 1,5 cm, utilizando-se de uma
semente por tubete.
Os tratamentos compreenderam a combinação de duas fontes comerciais [(nitrato
de cálcio (15,5%N e 19% Ca) e uréia (46% N)] e quatro doses de nitrogênio
(0,15; 0,30; 0,45 e 0,60 g L-1) e um tratamento adicional, representado por uma
testemunha sem a adição de fertilizante nitrogenado, sendo dispostos em
delineamento blocos ao acaso, em esquema fatorial, com quatro repetições. As
unidades experimentais foram constituídas por 48 tubetes contendo uma muda de
limoeiro 'Cravo' cada, considerando-se na parcela útil, as 24 centrais.
A aplicação dos tratamentos (10 mL de solução por tubete) foi iniciada 56 dias
após a germinação das sementes, sendo repetida semanalmente, por 15 semanas,
até o transplantio das mudas. Nessas ocasiões, soluções de cloreto de cálcio
foram utilizadas para padronizar o fornecimento de cálcio às plantas dos
diferentes tratamentos, aplicando-se 1 mL por tubete de soluções contendo 35,3;
26,5; 17,6 e 8,8 g L-1 de CaCl2.2H2O, respectivamente, aos tratamentos-
testemunha e com aplicação de uréia; com aplicação de 0,15; 0,30 e 0,45 g L-
1 de nitrato de cálcio. Adicionalmente, as mudas receberam aplicações
quinzenais de 1; 1; 5 e 2 mL por tubete de soluções de fosfato ácido de
potássio p.a. (13,6 g L-1), sulfato de potássio comercial (87 g L1), sulfato de
magnésio comercial (6,4 g L-1) e micronutrientes quelatizados (0,28% de B;
0,05% de Cu; 5,7% de Fe; 1,2% de Mn; 0,37% de Zn e 0,08% de Mo, na concentração
de 1,5 mL L1), respectivamente. Estas adubações foram estabelecidas a partir de
proposições de Khalaf & Koo (1983) e Carvalho (1998).
Durante o período de desenvolvimento, as mudas foram irrigadas diariamente com
água destilada, evitando-se excessos. As médias das temperaturas mínimas e
máximas no interior da casa de vegetação durante o período de cultivo foram de
13,6°C e 22,5°C, respectivamente.
A avaliação dos tratamentos foi realizada 168 dias após a germinação,
determinando-se a altura das plantas; o diâmetro do caule, medido a 1 cm da
superfície do solo; as produções de matéria seca da parte aérea e das raízes e
a acumulação de N, P, K, Ca e Mg na parte aérea. Para o cálculo das acumulações
de nutrientes, foram considerados os dados de produção de matéria seca e de
concentração de nutrientes na parte aérea, determinados seguindo métodos
descritos por Tedesco et al. (1995).
Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância, comparando-se as
médias de fontes de N pelo teste de Tukey (p < 0,05) e de doses de N, por
análise de regressão polinomial.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise dos dados revelou influência apenas das doses de nitrogênio
utilizadas sobre a altura e o diâmetro do caule das mudas de limoeiro 'Cravo',
cujos efeitos médios para fontes de nitrogênio foram descritos por modelos
quadráticos (Figura_1), com valores máximos proporcionados pelas doses de 0,37
e 0,36 g L-1 de N, respectivamente. Independentemente da fonte, o crescimento
das plantas foi afetado pela aplicação das doses mais altas de nitrogênio. Este
efeito pode ser explicado pela elevação da pressão osmótica do meio de cultivo,
causando danos às raízes e prejudicando a absorção de nutrientes, com reflexos
sobre o desenvolvimento da parte aérea (Malavolta, 1980; Perin et al., 1999).
Ambas as fontes de nitrogênio propiciaram desenvolvimento adequado das mudas de
limoeiro 'Cravo', porém o período de tempo requerido para que apresentassem o
tamanho necessário ao transplantio para os recipientes onde se completa a
formação das mudas (altura de 10 a 15 cm), foi superior ao relatado por
Carvalho (1998), para as condições climáticas do Estado de São Paulo. Este
comportamento, muito provavelmente, está associado a fatores ambientais, bem
como à época do ano em que foi realizado o experimento, caracterizada pela
ocorrência de baixas temperaturas, especialmente nas fases de germinação das
sementes e de crescimento inicial das mudas, estendendo o período de sua
formação.
À semelhança do verificado para as variáveis altura e diâmetro do caule, a
produção de matéria seca da parte aérea das mudas de limoeiro 'Cravo' foi
influenciada significativamente apenas pela dose de nitrogênio utilizada, não
havendo efeito da fonte do nutriente ou da interação entre esses fatores. Os
dados obtidos foram ajustados por modelo quadrático (Figura_2A), a partir do
qual se determinou a produção máxima de matéria seca da parte aérea, de 1,06 g
planta-1, correspondente à utilização da dose de 0,38 g L-1 de N. A dose de
máxima eficiência técnica determinada neste estudo foi inferior à verificada
por Mattos Júnior et al. (2001), de 0,5 g L-1 de N, para as fontes nitrato de
cálcio e nitrato de amônio. Esta diferença possivelmente se deva ao efeito
prejudicial da utilização de doses elevadas de uréia, acidificando o substrato
e provocando toxidez às plantas pelo excesso de biureto, conforme relatado por
esses autores, ao trabalharem com mudas do mesmo porta-enxerto. Por sua vez, a
produção de matéria seca das raízes foi significativamente influenciada pela
interação entre fontes e doses de nitrogênio. Neste sentido, para a dose de
0,30 g L-1 de N, o desempenho proporcionado pelo nitrato de cálcio foi superior
ao da uréia, não havendo distinção entre as fontes de nitrogênio para as demais
doses avaliadas. Para a uréia, os dados de produção de matéria seca das raízes
foram descritos por modelo linear crescente e, para o nitrato de cálcio, por
modelo quadrático (Figura_2B). Para este último, a produção máxima de matéria
seca das raízes foi obtida com a dose de 0,35 g L-1 de N, indicando que doses
superiores de nitrogênio não se refletiram em aumento na produção de raízes,
mas, ao contrário, limitaram seu crescimento.
De forma geral, a produção de matéria seca das raízes acompanhou o padrão
observado para a parte aérea, comportamento este que se distingue do relatado
por Mattos Júnior et al. (2001), segundo os quais, sob doses mais altas de
nitrogênio, o crescimento da parte aérea é maior que o das raízes.
A comparação geral dos resultados obtidos pela testemunha sem nitrogênio, com
os dos demais tratamentos, demonstra claramente a importância do fornecimento
de nitrogênio para a formação de mudas de limoeiro 'Cravo'; a ausência de
suplementação mineral com o nutriente comprometeu o crescimento das plantas,
que apresentaram desempenho bastante inferior ao daquelas adubadas com uma
fonte do nutriente, confirmando observações de Maust & Willianson (1994),
Carvalho (1994), Carvalho & Souza (1996) e Mattos Júnior et al. (2001).
A acumulação de nitrogênio na parte aérea das mudas de limoeiro 'Cravo' variou,
apenas, em função da dose do nutriente, não havendo influência da fonte
utilizada (Figura_3). O aumento no fornecimento de nitrogênio às plantas
somente se refletiu em maior acumulação do nutriente até a dose de 0,41 g L-
1 de N, a partir da qual esta diminuiu. É interessante notar que a resposta
referente à acumulação de nitrogênio foi pouco maior que a obtida para a
variável produção de matéria seca da parte aérea, indicando a ocorrência de
absorção de luxo do nutriente, uma vez que a maior incorporação do nutriente
aos tecidos não se refletiu em maior produção de biomassa. Comportamento
semelhante foi verificado por Perin et al. (1999), ao trabalharem com mudas do
mesmo porta-enxerto.
Quanto à acumulação de fósforo e de potássio na parte aérea das mudas de
limoeiro 'Cravo', nota-se efeito de fontes e de doses de nitrogênio (Figuras_4
e 5). Para ambas as fontes de nitrogênio, uréia e nitrato de cálcio, os dados
obtidos foram ajustados por modelos quadráticos, sendo que maior acumulação de
fósforo foi proporcionada pela uréia; o contrário ocorrendo para a acumulação
de potássio, onde o melhor desempenho foi proporcionado pelo nitrato de cálcio.
Independentemente da fonte de N, a acumulação de fósforo e de potássio foi
limitada pelo aumento excessivo no fornecimento de nitrogênio, o que pode ser
atribuído tanto à menor produção de matéria seca da parte aérea, quanto à
ocorrência de interações antagônicas com o nitrogênio sobre a absorção desses
nutrientes.
Os resultados de acumulação de cálcio pela parte aérea das mudas de limoeiro
'Cravo' são apresentados na Figura_6. O efeito dos tratamentos restringiu-se à
variação na dose de nitrogênio, sendo descrito por modelo quadrático, com valor
máximo de 8,87 mg planta-1 de cálcio, correspondente à dose de 0,43 g L-1 de N.
A ausência de efeito das fontes de nitrogênio sobre esta variável indica que o
nitrato e o cloreto de cálcio foram igualmente eficientes no fornecimento de
cálcio para as mudas.
Conforme observado para os nutrientes N e Ca, a acumulação de magnésio pelas
mudas de limoeiro 'Cravo' variou apenas com a dose de nitrogênio, sendo os
resultados ajustados ao modelo quadrático de regressão, com ponto de máximo
proporcionado pela dose de 0,49 g L-1 de N (Figura_7).
De forma geral, as variações na acumulação de nutrientes pela parte aérea das
mudas de limoeiro 'Cravo' acompanharam as variações na produção de massa seca
destas. Os resultados evidenciaram, ainda, que a magnitude do efeito do aumento
na disponibilidade de nitrogênio no substrato sobre a acumulação de P, K, Ca e
Mg foi distinta, sempre, porém, sendo limitada pelo uso das doses mais altas de
nitrogênio.
CONCLUSÕES
1) O nitrogênio exerce papel preponderante sobre o crescimento de mudas de
limoeiro 'Cravo', que atinge valor máximo com a aplicação semanal da dose de
0,37 g L-1 de N, como uréia ou nitrato de cálcio.
2) A acumulação de N, P, K, Ca e Mg na parte aérea das mudas de limoeiro
'Cravo' acompanhou as variações na produção de matéria seca destas, sendo
limitada pela aplicação das doses mais elevadas de nitrogênio.