Efeito do óleo de soja no controle da antracnose e na conservação da manga cv.
Palmer em pós-colheita
COLHEITA E PÓS-COLHEITA
Efeito do óleo de soja no controle da antracnose e na conservação da manga cv.
Palmer em pós-colheita1
Effect of soybean oil in the control of anthracnose and on post-harvest
conservation of mango, cv. Palmer
Nilton Tadeu Vilela JunqueiraI; Renata da Costa ChavesII; Alessandra Carneiro
do NascimentoII; Vitor Hugo Vargas RamosI; José Ricardo PeixotoII; Lívia
Pereira JunqueiraII
IEmbrapa Cerrados, Cx. Postal 08223, CEP 73301-970, Planaltina-DF, Tel. 0xx 61-
3889829 E-mail: junqueir@cpac.embrapa.br; vhugo@cpac.embrapa.br
IIFaculdade de Agronomia e Veterinária, Universidade de Brasília, CEP 70910-
970, Brasília-DF, Tel. 0xx 61 307- 2801. E-mail: peixoto@unb.br,
renatachaves@unb.br
INTRODUÇÃO
Várias doenças acometem a manga na pós-colheita, provocando perdas expressivas.
Entre essas, a antracnose causada por Colletotrichum gloeosporioides Penz é a
mais expressiva (Junqueira et al., 2002a). No Brasil, o controle da antracnose
e de outras doenças da manga em pós-colheita vem sendo feito pela imersão dos
frutos durante 5 minutos, em água quente a 55 ºC, acrescida de thiabendazol a
0,2 % (Junqueira et al., 2002a). O benomil a 0,1 % ou 0,2 % também era
utilizado e oferecia resultados satisfatórios, mas esse fungicida foi retirado
do mercado por tempo indeterminado. Embora eficazes no controle dessa doença,
esses fungicidas podem deixar resíduos nos frutos, o que não satisfaz os
consumidores que, a cada dia, vêm aumentando suas exigências por frutos
ambientalmente corretos e sem resíduos de agroquímicos (Junqueira et al.,
2002a). Segundo Nascimento (2000) e Junqueira et al. (2000, 2002a, 2002b), a
antracnose da manga, Cvs. Haden, Tommy Atkins e Winter, na pós-colheita, pode
ser controlada com eficácia igual ou superior à de benomil e thiabendazol, pela
imersão de seus frutos em caldas contendo extratos etanólicos de sucupira
branca (Pterodon pubescens Benth. Sin. de P. emarginatus) a 20 ºC e 40 ºC e por
água quente a 45 ºC. Dessa forma, objetivando-se identificar produtos de origem
biológica que tenham ação fungicida e que possam ser utilizados para reduzir a
quantidade ou eliminar resíduos de fungicidas químicos em manga, conduziu-se o
presente experimento, onde se avaliou a eficácia do óleo de soja e de extrato
de sucupira no controle da antracnose e na conservação da manga na pós-
colheita.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram conduzidos dois experimentos nas dependências da Embrapa Cerrados.
Utilizaram-se mangas da Cv. Palmer produzidas num pomar localizado no Município
de Sobradinho, Distrito Federal, colhidas nos estádios 3 e 4 (CIAD, A.C.,
1998), nos meses de janeiro e fevereiro, um dia antes da instalação dos
experimentos. As mangas não receberam tratamentos contra pragas e doenças na
pré-colheita nem foram lavadas antes dos tratamentos.
No experimento número 1, utilizou-se delineamento experimental inteiramente
casualizado, com treze tratamentos e 4 repetições de 9 frutos. Os frutos foram
imersos durante cinco minutos, em caldas dos seguintes produtos: T1: Água a 22
ºC; T2: Água a 45 ºC; T3: benomil 1g/1.000 mL a 22 ºC; T4: benomil 1g/1.000mL a
45 ºC; T5: thiabendazol (TBZ) 2,4g/1.000mL a 22 ºC; T6: TBZ 2,4g/1.000 mL a 45
ºC; T7: 30 mL de extrato concentrado de sucupira + 25ml de óleo de soja/1.945mL
de água a 22 ºC ; T8: 30mL de extrato concentrado de sucupira + 25mL de óleo de
soja/1.945mL de água a 40 ºC; T9: 100mL de óleo de soja + 36g de leite em pó
instantâneo (LPI)/ 1.900mL de água; T10: 50mL de óleo de soja + 36g de LPI/
1.950mL de água ; T11: 50mL de óleo de soja + 36g de LPI + 2g de benomil/
1.950mL de água a 40 ºC; T12: 50mL de óleo de soja + 36g de LPI /1.950mL de
água a 40 ºC e T13: 50mL de óleo de soja + 36g de LPI /1.950mL de água a 40 ºC
+ 4,8g de TBZ.
Imediatamente após os tratamentos, os frutos foram acondicionados em caixas de
plástico e armazenados a 27±1ºC e umidade relativa de 72 a 85%. As avaliações
foram efetuadas aos 15 dias após os tratamentos, determinando-se a percentagem
da superfície dos frutos com antracnose, de frutos lesados, de frutos maduros,
frutos de vez, frutos verdes, Brix e textura dos frutos determinada por meio de
um texturômetro Teclock. Para determinar os percentuais da superfície dos
frutos cobertos com antracnose, determinaram-se a área lesada com base no
número de lesões por fruto e o diâmetro médio dessas lesões e a média das áreas
de 20 frutos colhidos ao acaso. Para tal, as cascas foram retiradas de 20
frutos, cortadas em pequenos retângulos e dispostas sobre uma superfície plana,
onde a área média foi determinada.
Para a obtenção do extrato concentrado de sucupira, foi utilizada a metodologia
descrita por Junqueira et al. (2000) e Nascimento (2000), na qual 1.000 gramas
de frutos de sucupireira branca, desaletados, foram moídos e colocados em 2.000
mL de etanol e mantidos a 23ºC por 5 dias. Após a coagem, retiraram-se 1.000 mL
de extrato que foram concentrados por evaporação do etanol, a 22ºC, até atingir
o volume de 350 mL
O leite em pó instantâneo (LPI) foi utilizado como emulsificante natural para o
óleo de soja, pelo fato de este conter, em sua formulação, a lecitina de soja e
estar disponível em qualquer mercado. O extrato de sucupira, por conter
resinas, precisa ser misturado ao óleo vegetal para que seu manuseio seja
facilitado.
Embora na literatura conste a utilização de água a 55 ºC nos tratamentos de
manga em pós-colheita, nestes experimentos, utilizou-se água a 45 ºC pelo fato
de temperaturas mais elevadas terem provocado injúrias nos frutos produzidos no
Distrito Federal.
No Experimento número 2, aplicaram-se os seguintes tratamentos: T1: Água a 22º
C; T2: benomil 1g/1.000mL a 45 ºC; T3: 50mL de óleo de soja + 36g de leite em
pó instantâneo (LPI) + 2g de benomil/1.950mL de água a 40ºC; T4: 50mL de óleo
de soja + 36g de LPI+ 4,8g de TBZ/1.950mL de água a 40 ºC; T5: 100mL de óleo de
soja + 36g de LPI/ 1.900mL de água. As frutas foram armazenadas em caixas de
plástico sob temperatura controlada a 17 ºC e umidade relativa de 85-100%. O
delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com 5 tratamentos e 4
repetições de 9 frutos. As avaliações foram efetuadas aos 30 dias após os
tratamentos, determinando-se os percentuais da superfície dos frutos cobertas
com antracnose, e de frutos lesados, e os percentuais de frutos maduros, frutos
de vez e frutos verdes.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A antracnose foi a principal doença que apareceu nos frutos. Em alguns casos,
constatou-se a presença da podridão-parda causada por Dothiorella dominicana.
Para o primeiro experimento (Tabela_1), verifica-se que, aos 15 dias após, os
tratamentos mais eficazes no controle da antracnose foram: T11 (50 mL de óleo
de soja + 36 g LPI + 2 g de benomil/1.950 mL de água com pH 5,6, aquecida a 40
ºC); T4 (benomil 2g/ 2.000mL a 45 ºC), e T13 (50 mL de óleo de soja + 36 g de
LPI + 4,8 g de TBZ/ 1.950mL de água aquecida a 40 ºC). Os tratamentos T3, T9,
T7, T12, T6, T8 e T10 à base de óleo de soja + leite em pó, extrato de sucupira
aquecido ou não, TBZ aquecido e benomil foram muito eficazes quando comparados
às testemunhas (água a 22 ºC e 45 ºC) e TBZ a 22ºC.
Não houve diferenças estatísticas para ºBrix entre os tratamentos. Os frutos do
tratamento T1 apresentaram a textura menos firme, não havendo diferenças
significativas entre os demais tratamentos. Não houve diferenças estatísticas
no percentual de frutos de vez, mas, quanto aos frutos maduros e verdes, houve
diferenças altamente significativas. Os tratamentos T7 ( 30 mL de extrato de
sucupira + 25 mL de óleo de soja/1.945mL) e T10 ( 50 mL de óleo de soja + 36 g
de leite em pó/1.950mL) apresentaram o menor percentual (3%) de frutos maduros,
ao passo que os tratamentos de T1 a T5 induziram o maior percentual de frutos
maduros (48% a 57%). Quanto aos frutos verdes, os tratamentos T7, T9, T12 e T10
mantiveram o maior percentual (41% a 53%). Não foram observados frutos verdes
nos tratamentos de T1 a T5.
Esses resultados evidenciam o potencial do óleo de soja e do extrato de
sucupira no controle da antracnose e na conservação de mangas na pós-colheita,
conforme já constatado por Junqueira et al. (2000) e Nascimento (2000). Estes
autores, trabalhando com frutos das cultivares Haden, Winter e Kent,
verificaram que o extrato de sucupira puro (não acrescido de óleo soja) a 22 ºC
e a 40 ºC, benomil a 1g/litro a 45 ºC e água quente a 45 ºC foram eficazes no
controle da antracnose em pós-colheita, em avaliações efetuadas aos 15 dias
após a colheita. Estes autores verificaram que benomil e thiabendazol a 22 ºC
não controlaram a doença. Por outro lado, analisando a Tabela_1, verifica-se
que, com os frutos da cultivar Palmer, o benomil a 1g/litro a 22 ºC foi eficaz
no controle da antracnose, ao passo que a água quente a 45 ºC não foi eficaz.
Essa diferença pode estar relacionada com a espessura da casca, cerosidade e
com a diferença de suscetibilidade entre essas cultivares, ao Colletotrichum
gloeosporioides. Nascimento (2000) verificou, também, que o extrato concentrado
de sucupira, diluído em 20 vezes, inibiu de forma eficaz, o crescimento in
vitro de Colletotrichum gloeosporioides em meio de cultura à base de batata,
dextrose e Ágar. Vários autores (Innecco, 2003; Mota et al., 2000; Moura et
al., 2000) relataram a eficácia, também, de óleos essenciais (óleos de origem
vegetal, que contêm substâncias aromáticas, geralmente utilizados na fabricação
de cosméticos) na inibição do crescimento in vitro de agentes patogênicos.
Quanto ao efeito de óleos vegetais in vivo, Silva et al. (2002) verificaram que
óleos vegetais, extrato de sucupira e outros produtos biológicos aumentaram o
tempo de conservação da banana na pós-colheita e foram eficazes no controle da
antracnose. Resultados semelhantes foram obtidos por Junqueira et al. (2003)
trabalhando com pós-colheita de mamão-papaia e por Junqueira et al. (2002b)
trabalhando com manga.
No segundo experimento (Tabela_2), verifica-se que, após 30 dias de
armazenamento em câmara a 17ºC e umidade relativa variando de 85% a 100%, os
frutos imersos na calda à base de 50 mL de óleo de soja + 36 g de leite em pó +
2 g de benomil/1.950 mL de água com pH = 5,6 apresentaram o menor índice de
antracnose, ou seja, de 6,0% contra 89,28% na testemunha, o menor percentual de
frutos maduros (2,78%) e o maior de frutos verdes (66,67%). O T2, à base de
benomil a 1g/l.000 mL, aquecido a 45ºC, propiciou o mesmo nível de controle da
antracnose obtido com os tratamentos à base de 50 mL de óleo de soja + 36 g de
leite em pó + 4,8 g de TBZ/1.950 mL de água a 40 ºC (T4) e 100 mL de óleo de
soja + 36 g de leite em pó/1.900 mL de água a 22 ºC (T5). Analisando a Tabela
2, verifica-se que todos os tratamentos contendo óleo de soja controlaram bem a
antracnose e impediram o amadurecimento dos frutos em comparação com os
tratamentos contendo somente o benomil, TBZ e testemunha. No entanto,
verificou-se que o processo de amadurecimento dos frutos foi bloqueado pelo
óleo de soja e não houve reversão, mesmo após os frutos terem sido armazenados
a 27±1 ºC por uma semana. Esses frutos, embora sadios e com boa aparência,
estavam com um ligeiro sabor e aroma de álcool, indicando a existência de algum
processo de fermentação interna. Dessa forma, há necessidade de pesquisas nessa
área visando a determinar estádios de maturação ideal e à obtenção de técnicas
ou produtos que possam reverter o bloqueio do processo de amadurecimento de
frutos tratados com óleos vegetais, de forma isolada ou misturado com
fungicidas. Não há, na literatura, informações sobre a ação de óleos vegetais
no controle de doenças e na conservação de frutos em pós-colheita, mas
acredita-se que o óleo bloqueia, de forma parcial ou total, a respiração do
fruto. Conseqüentemente, pode não haver produção de etileno e conversão do
amido em açucares, impedindo ou retardando o desenvolvimento dos patógenos.
Segundo Chitarra & Chitarra (1990), após a colheita, o principal processo
fisiológico do fruto é a respiração. Neste caso, ele adquire vida independente,
utilizando, para isso, suas reservas acumuladas. O tipo e a intensidade da
atividade fisiológica na pós-colheita determinam a sua longevidade. Conforme
citado por Pereira & Beltran (2002) e Finger & Vieira (2002), o
processo de amadurecimento do fruto é dependente do etileno. Para que sua
síntese ocorra, é necessária a presença do oxigênio, que é um dos substratos da
enzima ACC ( 1-ácido carboxílico 1 aminociclopropano oxidase). Dessa forma,
acredita-se que o óleo vegetal forme um filme sobre a epiderme do fruto,
reduzindo as trocas gasosas e, conseqüentemente, diminuindo a concentração do
oxigênio intracelular.
Quanto à composição do extrato etanólico de sucupira, Machado e Peixoto (1938),
citados por Nascimento (2000), relatam a presença de terpenos e sesquiterpenos,
sendo 89,30% de cedreno, 10,10% de 1-alfa cariofileno e 0,42% de cariofoleno,
além de ácido fenilacrílico, ácidos resínicos, álcool resínico e resenos.
Quanto à toxicidade para humanos, o extrato de sucupira é tradicionalmente
utilizado na medicina popular para tratamento de amigdalite, reumatismo
(Almeida et al., 1998) e como cicatrizante. No entanto, acredita-se que sua
toxicidade para mamíferos não seja elevada caso venha a ser utilizado como
defensivo agrícola.
CONCLUSÕES
1. O óleo de soja, isolado ou misturado com benomil ou thiabendazol, a 22ºC ou
a 40ºC, aumentou o tempo de prateleira da manga Palmer e foi eficaz no controle
da antracnose.
2. Os frutos tratados com óleo de soja e armazenados em câmara a 17ºC e 85 a
100% de umidade relativa permaneceram verdes ou de vez por um período de 30
dias, mas não amadureceram quando a temperatura da câmara foi elevada para
27±1ºC.
3. O thiabendazol não controlou a doença, mostrando-se eficiente apenas quando
adicionado ao óleo de soja ou quando aquecido.
4. O benomil foi mais eficaz quando aquecido ou misturado ao óleo de soja.
5. Os fungicidas, na ausência do óleo de soja, não tiveram efeito na
conservação dos frutos.
6. O extrato de sucupira foi eficaz na conservação dos frutos e no controle da
doença, mas, nas concentrações utilizadas, provocou leves queimaduras.