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BrBRCVHe0004-28032004000300011

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variedadeBr
ano2004
fonteScielo

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Participação da apoptose na rejeição aguda do transplante intestinal em ratos EXPERIMENTAL GASTROENTEROLOGYINTRODUÇÃO O transplante de intestino delgado (TID) é a proposta lógica para tratar a falência intestinal, porém existem sérias dificuldades ainda não superadas e que não o tornam procedimento rotineiro(1, 23). Entre os obstáculos, destacam- se a rejeição de difícil controle(21, 46), a necessidade de manter imunossupressão agressiva, surtos infecciosos graves, a complexa técnica cirúrgica, dificuldades na preservação do enxerto, desencadeamento de doenças linfoproliferativas(40, 47), que limitam a indicação clássica usual do TID(21, 23).

O modelo experimental em ratos proporcionou estudos mais controlados na avaliação da rejeição aguda e crônica(8, 11), das dificuldades ligadas à preservação intestinal(12, 26), da compreensão da função do enxerto(37), da doença do enxerto versus hospedeiro (DEVH)(14, 15), da indução de tolerância(2, 33) e do novo campo fascinante da medicina moderna, ' a engenharia tecidual ' que poderá revolucionar a forma de tratamento de diversas doenças, inclusive permitindo a produção de tecido intestinal em laboratório(22, 24).

Por conta dos estudos experimentais, verificou-se que a forte tendência à rejeição no TID é devido à grande concentração de tecido linfóide presente no intestino transplantado(8, 11, 17). A rejeição causa perda da integridade da barreira mucosa e favorece a translocação bacteriana e a sepse. A necessidade do uso de intensa imunossupressão para controlar a rejeição provoca maior tendência à infecção e ao desenvolvimento de tumores, além do risco de toxicidade para vários órgãos. Essas complicações limitam a sobrevivência prolongada após o TID e representam grande desafio à sua aplicação clínica(1, 9, 17, 23).

No Brasil, foram realizados, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), dois casos pioneiros de TID por Okumura na década de 60(35). Nessa Faculdade realiza-se pesquisa experimental de TID desde 1971, visando sua aplicação clínica(11, 15, 43). Recentemente, realizou-se na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo o primeiro TID, introduzindo entre nós o emprego de FK-560(7) para evitar a rejeição nesta modalidade de transplante.

A morte celular determina a perda da estrutura celular e da sua função de forma irreversível, sendo um fenômeno biológico constatado nos organismos vivos.

Ocorrem dois tipos de morte celular denominados apoptose(10) e necrose(3, 41).

A necrose celular é consequência da agressão do meio ambiente, que resulta em alterações precoces da membrana plasmática e leva à acidose com alteração do transporte de íons (potássio, magnésio, cálcio, sódio e cloro), por aumento da permeabilidade da camada de fosfolipídes e ruptura física da membrana e conseqüente perda da compartimentalização celular.

Em contraste, a apoptose compreende uma atividade bioquímica em resposta às alterações locais do meio ambiente intracelular, desencadeadas pela endonuclease nuclear, a qual divide o DNA em oligômeros(18). O processo da apoptose é observado quando a morte celular é evento fisiológico programado durante a embriogênese, metamorfose ou "turn over" celular normal. Entretanto, tem se tornado evidente que a apoptose ocorre também por meio de estímulos patológicos, como o que ocorre na vigência de infecões virais, hepatites, por exemplo(5, 6). Morfologicamente a apoptose é caracterizada pela condensação nuclear e citoplasmática seguida de perda da membrana nuclear, fragmentação da cromatina nuclear e subseqüente formação de inúmeros fragmentos de condensado nuclear e citoplasmático. Esses corpos apoptóticos são absorvidos pelas células adjacentes, não ocorrendo infiltrado leucocitário, obrigatoriamente encontrado nas reações inflamatórias.

Em transplante de órgãos, a apoptose tem sido investigada em transplante clínico e experimental de fígado(34), rim(36) e pancreas(25). Com a finalidade de se aprimorar o diagnóstico precoce e específico, e também o prognóstico da rejeição, decidiu-se pela busca experimental de outros métodos indicadores da rejeição, uma vez que o estudo histológico das biopsias é insuficiente para prover o almejado diagnóstico de certeza desta grave complicação.

Portanto, o objetivo do presente estudo experimental foi a avaliação da apoptose em ratos submetidos a alotransplante intestinal.

MÉTODO Animal de Experimentação Empregou-se o modelo de transplante intestinal em ratos isogênicos das raças Brown-Norway e Lewis, sendo 24 animais machos da raça Brown-Norway e 40 machos da raça Lewis, com o peso entre 200 a 350 gramas, distribuídos aleatoriamente, sem prévia seleção ou análise de qualquer parâmetro clínico-laboratorial para quaisquer dos grupos estudados. Os animais Brown-Norway foram apenas doadores do intestino delgado e os da raça Lewis, 8 doadores e 32 receptores. Os animais foram anestesiadas com pentobarbital (65 mg/kg) e atropina (0,04 mg/kg) via intraperitoneal, seguida de anestesia inalatória com halotano 2% associado a oxigênio (2,5 L/min).

Os animais foram distribuídos em dois grupos, a saber: Grupo Isotransplante (C) É o grupo controle (C), constituído por oito animais receptores da raça Lewis submetidos ao isotransplante. O mesmo animal foi submetido a duas biopsias e posteriormente ao sacrifício nos seguintes momentos: Momento C(3) ' Os oito animais receptores foram submetidos a biopsia intestinal no terceiro dia pós-operatório (PO3).

Momento C(5) ' Os oito animais foram submetidos a biopsia intestinal no quinto dia de pós-operatório (PO5).

Momento C(7) ' Os oito animais foram sacrificados no sétimo dia de pós- operatório (PO7).

Grupo Alotransplante (Tx) Constituído por 24 animais receptores da raça Lewis e 24 animais doadores da raça Brown-Norway, distribuídos em três subgrupos descritos a seguir: Subgrupo Tx(3) ' Oito animais receptores da raça Lewis submetidos ao alotransplante e sacrificados no terceiro dia de pós-operatório (PO3).

Subgrupo Tx(5) ' Oito animais receptores da raça Lewis submetidos ao alotransplante e sacrificados no quinto dia de pós-operatório (PO5).

Subgrupo Tx(7 ) ' Oito animais receptores da raça Lewis submetidos ao alotransplante e sacrificados no sétimo dia de pós-operatório (PO7).

Procedimento cirúrgico O transplante intestinal foi executado de forma heterotópica (Thiry-Vella), segundo a técnica de LEE et al.(29), ZHONG et al.(48, 49) e MONCHICK e RUSSELL (31). Não foi utilizada nenhuma forma de imunossupressão (Figura_1).

Apoptose Realizou-se a reação de TUNEL (Terminal deoxynucleotidil transferase mediated dUTP-biotin nick end labeling) utilizando-se o kit "In Situ Cell Death Detection Kit, Cat. 1684817 ' Boehringer Mannheim" para estudo imunoistoquímico de detecção e quantificação da apoptose, baseado na quebra das cadeias de DNA.

Os tecidos foram analisados através da microscopia óptica.

A avaliação da apoptose(18, 30) foi realizada por dois investigadores (UR, ADWL) pelo índice apoptótico, pela leitura direta das lâminas preparadas pela reação de TUNEL em áreas denominadas zona quente(10, 41, 47) (maior probabilidade de se encontrar células alteradas devido à rejeição); no caso foram as criptas e a lâmina própria das vilosidades intestinais. Foram escolhidos 10 campos aleatórios na área considerada zona quente e feita a leitura do número total das células apoptóticas(38, 39), somando-se o total de células apoptóticas nos 10 campos analisados à microscopia óptica com aumento de 400x. Houve exclusão da leitura nas áreas com evidência de necrose (Figuras 2, 3)

Análise estatística Os dados foram confrontados com a curva de Gauss (curva normal) e classificados em não-paramétricos (para P <0,05).

Os dados foram analisados de duas formas: intragrupo (dentro de cada grupo de estudos) e intergrupo (comparando os grupos em momentos diferentes).

Na análise intragrupo no grupo C foi realizado o teste de Friedmann com pós- teste de Muller-Dunn (o mesmo animal em diferentes momentos) e no grupo Tx o teste de Kruskall-Wallis com pós-teste de Muller-Dunn (animais diferentes em momentos diferentes).

Na análise transversal intergrupo entre os grupos C e Tx foi utilizado o teste de Mann-Whitney.

Os dados foram expressos em mediana e percentil 25 e 75.

RESULTADOS Avaliação da Apoptose No grupo C ' Na análise da apoptose intragrupo entre os três momentos do grupo isotransplante (C(3), C(5) e C(7)), houve diferença estatística quanto ao aumento do número de células em apoptose do momento C(3) para o C(5). O mesmo não ocorreu do momento C(5) para C(7). A contagem das células apoptóticas variou de 4 a 106 células (Gráfico_1).

No grupo Tx 'Na análise da apoptose intragrupo do grupo Tx entre os subgrupos Tx(3), Tx(5) e Tx(7), houve diferença estatística do subgrupo Tx(3) para Tx(5), ocorrendo aumento do número de células apoptóticas. Ocorreu, porém, o inverso do subgrupo Tx(5) para Tx(7) com diferença estatística, acarretado pela queda do número de células apoptóticas. E ao comparar o subgrupo Tx(3) com o Tx(7), embora o número de células apoptóticas no processo da rejeição seja maior no último subgrupo Tx(7), não houve diferença estatística entre ambas (Gráfico_2).

Avaliação Intergrupo entre os Grupos C e Tx ' Na análise da apoptose intergrupo entre os momentos C(3), C(5) e C(7) e os subgrupos Tx(3), Tx(5) e Tx(7), de forma pareada e transversal, observou-se que em todos os momentos os subgrupos do Tx obtiveram maior número de células em apoptose em relação aos três momentos do grupo C, com diferença estatística marcante, mais acentuada no quinto dia pós-operatório (C(5) e Tx(5)) (Gráfico_3).

DISCUSSÃO Observou-se o aumento de células em apoptose do subgrupo C(3) para C(5), embora o grupo seja isento do fenômeno da rejeição. Estes dados contrariam os resultados de FAYYAZI et al.(10), que comprovaram no grupo de animais que se submeteram ao isotransplante a não ocorrência do aumento do número de células em apoptose no decorrer do período pós-operatório (PO3 ao PO7), mantendo baixo número de células apoptóticas devido ao fenômeno normal de "turn over" celular dos enterócitos. Mas existem outras variáveis que puderam influir no mecanismo da apoptose em tecido submetido ao isotransplante: * o mecanismo de isquemia-reperfusão(27, 32, 41) se caracteriza pela lesão da mucosa intestinal devido à depressão da atividade mitótica e diminuição do seu metabolismo durante a isquemia fria na solução de preservação a 4°C (tempo do enxerto submerso na solução de preservação).

E também pelo aumento de células inflamatórias no intestino reperfundido por provável ativação da adesão de glicoproteínas a neutrófilos ou células endoteliais que desencadeiam interações celulares, resultando no processo da apoptose. O intestino delgado contém grande reservatório de mediadores que são liberados após perfusão tecidual(32). Esses mediadores incluem metabólitos reativos ao oxigênio, óxido nítrico, adesão dos leucócitos, protease, citocinas. Os metabólitos são produzidos por várias células, incluindo as células endoteliais, neutrófilos, macrófagos e fibroblastos. Durante a reperfusão tecidual ocorre o estímulo, desencadeando a liberação da cascata do processo inflamatório inespecífico e específico que incluem os linfócitos T e B. Lembrando que as lesões do enxerto intestinal, devido ao mecanismo isquemia-reperfusão, apresentaram-se completamente regeneradas depois de 24 horas da perfusão tecidual(32); * a lavagem da luz intestinal é importante para a fase de isquemia fria e quente, que é o tempo em que o enxerto intestinal permanece fora da solução de preservação a 4°C, enquanto se realizam as anastomoses vasculares do enxerto ao receptor, pois as enzimas digestivas: (protease pancreática, sal biliar e endotoxinas) têm efeito na patogênese da lesão da mucosa intestinal durante o tempo de isquemia(27); * o "turn over" da célula da mucosa intestinal é mais rápida em relação a órgãos sólidos e a apoptose é observada com maior freqüência nas vilosidades intestinais de tecido normal controle(41); * a pressão elevada durante a lavagem da luz intestinal e da perfusão intestinal acarreta lesões no enxerto intestinal(28, 48, 49); * a solução da Universidade de Wisconsin representa a solução de preservação modelo em relação a outras soluções pelo menor risco de lesão tecidual, mesmo em tempo prolongado de preservação(12, 13).

Houve aumento expressivo de células em apoptose do subgrupo Tx(3) para Tx(5), o que corresponde ao relatado por vários autores(4, 10, 47). Esse mecanismo de rejeição associada à apoptose é ainda controverso(10). A apoptose, neste caso, representa a resposta epitelial às alterações causadas pelo fenômeno da rejeição(4, 10). Isto pode corresponder à liberação das citocinas por células imunocompetentes, envolvidas na rejeição. Sabe-se que os linfócitos T- citotóxicos interagem com os antígenos de histocompatibilidade do enxerto intestinal causando lesão da membrana celular e resultando na apoptose.

Ocorreu, porém, decréscimo expressivo do subgrupo Tx(5) para Tx(7), diferentemente do encontrado por outros autores(10, 47). FAYAZZI et al.(10) mostrou aumento gradativo de células em apoptose até o nono dia de pós- operatório, depois ocorre o decréscimo do mesmo.

VENNARECCI et al.(47) observaram aumento do número de células em apoptose até o 15° PO e depois decréscimo progressivo. Esses autores propõem que o aumento do número de células apoptóticas está correlacionado à rejeição leve (grau 1) e moderada (grau 2). Nos casos de rejeição intensa (grau 3) e rejeição crônica, observou-se baixo índice de células apoptóticas por provável necrose e fibrose extensa da mucosa intestinal.

Neste estudo notou-se que no grupo Tx(7) a maioria se encontrava no estádio de rejeição intensa (grau 3) associada à necrose extensa(3, 10), o que provavelmente acarretou a queda do número de células em apoptose.

Estes dados não mostram exatamente controvérsia em relação aos autores citados, mas sim, apenas que neste estudo a rejeição se instalou de modo mais intenso e precoce.

Observou-se nítido aumento de células apoptóticas do grupo Tx em relação ao C em todos os momentos, por provável fenômeno da rejeição que se traduz na apoptose, em concordância com o observado por vários autores(6, 10, 32, 47).

Portanto, pode-se concluir, dentro das condições de realização desta pesquisa, que a apoptose foi relevante como marcador na fase inicial da rejeição, ocorreu a partir do terceiro dia de pós-operatório e manifestou-se principalmente nas criptas da mucosa intestinal.


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