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BrBRCVHe0034-71672005000300005

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variedadeBr
ano2005
fonteScielo

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Planejamento local: a fala do gerente de Unidade Básica de Saúde PESQUISA

Planejamento local: a fala do gerente de Unidade Básica de Saúde

Local planning: the speech of Basic Health Care Center manager

Planificación local: la habla de lo gerente de Unidad Básica de Salud

Márcia Regina Cubas* Enfermeira. Especialista em Saúde Coletiva - concentração em Gestão. Mestre em Saúde Pública - concentração em Planejamento e Gestão pela ENSP/FIOCRUZ.

Doutoranda em Enfermagem concentração em Saúde Coletiva na EEUSP. Professora da PUCPR

1. INTRODUÇÃO A partir de 1992 a Secretaria Municipal da Saúde - SMS de Curitiba foi promotora de um grande passo rumo ao planejamento descentralizado, conduzido pelo paradigma de que não bastava apenas uma reforma do organograma institucional para que houvesse mudança da lógica centralizadora. No aspecto administrativo-gerencial houve mudanças significativas no nível local, substitui-se às chefias de Centros de Saúde e Clínicas Odontológicas por um profissional mais abrangente na tecnologia da gerência de Unidades Básicas de Saúde - UBS. A denominada Autoridade Sanitária Local ASL deveria ser, além de um técnico competente dentro de sua profissão, um gerente capacitado para responder a tarefas mais complexas e possuir disposição para praticar o planejar em saúde.

Neste sentido, a administração do município de Curitiba desenvolve planos municipais intersetoriais, solidificados pela metodologia do Planejamento Estratégico Situacional - PES, propiciando contatos com a teoria e o método de forma contínua de forma a suscitar uma gestão voltada para "projetos multisetoriais integrados". Este propósito tem reflexos na condução do planejamento das Secretarias e por conseqüência nas US's.

A apropriação do raciocínio estratégico potencializa a criatividade e o desejo de transformar uma situação de saúde indesejada, portanto consideramos o planejamento local como forte instrumento de uma gestão descentralizada não devendo ser objeto de um "modismo" e sim um projeto institucional de compromissos firmados(1). Isto posto, este estudo foi estimulado pela percepção do compromisso que as ASL's possuem com o incremento do Sistema Único de Saúde - SUS em Curitiba e com o fato de que, a gestão plena do município foi direcionando afazeres cada vez mais complexos ao nível local, que hoje podem ser comparados aos do Secretário de Saúde de um pequeno município.

Desta forma, o objetivo desta pesquisa é apresentar a representação social do gerente de Unidade Básica de Saúde sobre o planejamento local. Configura-se numa apresentação de resultados considerados representativos e totalmente passíveis de novas reflexões ao possibilitar para os Gestores Locais o repensar em seus estilos, desempenhos e experiências.

Cabe ressaltar que este artigo não tem como foco central analisar a aderência do discurso coletivo construído, pois necessitaria de um método aprofundado para análise de discurso, mas oferece, em coerência com o instrumento metodológico usado, uma "descrição ou representação discursiva do imaginário social, um recorte cujo compromisso maior é com sua própria clareza, coerência semântica e didatismo"(2).

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Os conceitos que ancoram a construção deste artigo estão direcionados ao planejamento estratégico situacional de Carlos Matus e a teoria da Representação social.

Em relação ao primeiro, verifica-se que o conceito de planejamento é bastante discutido e diverso, porém, em sua re-contextualização na saúde, à luz de Matus, passa a ter um novo entendimento e sua definição será: o cálculo que precede e preside a ação, tratando-se da mediação entre o conhecimento e àquela, sendo um processo social complexo, produto das relações de conflito e articulação entre as diferentes forças sociais em uma realidade historicamente dada(3).

Salientando o mesmo como instrumento de gestão, promotor de desenvolvimento gerencial, exercendo forte influência sobre o compromisso das pessoas com os objetivos institucionais sendo uma atitude permanente da organização e do administrador(4).

Quanto à Representação Social, esta pode ser considerada como uma forma de pensamento de um coletivo ou um estoque de discursos presentes numa formação social em determinado momento histórico e que as pessoas apresentam quando necessitam expressar seus pensamentos sobre determinado tema(2).

Os conhecimentos carregados pelas representações sociais somente adquirem sentido e significado se levado em conta o contexto e a situação em que se manifestam(5) permitindo compreender porque alguns problemas sobressaem em uma sociedade, esclarecer alguns aspectos de sua apropriação pela mesma e entender como os debates e conflitos se desenrolam entre diferentes grupos de atores(6).

As representações sociais "se manifestam em condutas e chegam a ser institucionalizadas, portanto, podem e devem ser analisadas a partir da compreensão das estruturas e comportamentos sociais"(7) sendo consideradas matéria-prima para análises do social.

Sendo que os Discursos do Sujeito Coletivo -DSC aqui discutidos representaram uma estratégia para "tornar clara uma dada representação social" através de suas opiniões sobre o planejar localmente.

3. METODOLOGIA Trata-se de um estudo qualitativo que utilizou o instrumento metodológico do Discurso do Sujeito Coletivo - DSC para análise das informações, tendo como fundamento a teoria da Representação Social e seus pressupostos metodológicos.

O método é baseado na aplicação de quatro figuras metodológicas: - As Expressões Chave ECH: que são "transcrições literais de parte do discurso" individuais, consistem em trechos contínuos ou descontínuos da fala que revelam a essência do discurso ou teoria subjacente"(8).

- A Idéia Central - IC refere- se ao "nome ou expressão linguística que revela e descreve da maneira mais sintética e precisa possível o sentido ou o sentido e o tema das ECH de cada um dos discursos analisados e de cada conjunto homogêneo de ECH" ou ainda "a afirmação que permite traduzir o essencial do conteúdo"(8).

- A Ancoragem - AC define-se como "a expressão de uma dada teoria, ideologia, crença religiosa que o autor professa e que está embutida no seu discurso como se fosse uma afirmação qualquer"(8).

- O Discurso do Sujeito Coletivo - DSC que é um discurso-síntese homogêneo de ECH's que tem a mesma IC ou AC é "o discurso individual, expandido, socializado, mas jamais deturpado"(8).

O sujeitos da pesquisa foram oito ASL de US representantes dos oito Distritos Sanitários - DS de Curitiba selecionadas intencionalmente pelo tempo de ingresso na SMS, período na gerência de Unidade e pela experiência prévia com metodologia de planejamento. Houve também um cuidado quanto à formação básica destes sujeitos, sendo escolhidos quatro Enfermeiras, três Dentistas e um Médico, que representava a proporcionalidade da distribuição destes profissionais na gerência das 104 Unidades da Rede.

As questões éticas foram resguardadas através da inclusão do Termo de Consentimento Esclarecido conforme resolução nº196/96 do Conselho Nacional de Saúde e foi submetido a Comissão de Ética da Universidade Estadual de Ponta Grossa - PR.

A organização dos depoimentos foi desempenhada por meio da análise de cada entrevista, da extração das onze IC com suas respectivas ECH's. Em seguida foram agregando-se as ECH's iguais ou equivalentes que estabeleceram vinte e cinco DSC's.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Apresentaremos os discursos construídos que foram discutidos a partir de sua ancoragem à luz da literatura sobre o tema.

Em relação ao DSC que tem como idéia central a: "metodologia do planejamento é difícil, mas adaptável", encontramos um discurso único sobre a dificuldade sentida na apropriação do método que, com a vivência, pôde ser adaptado à realidade: DSC1-...As teorias do planejamento têm uma linguagem própria que não é do nosso vocabulário....Hoje eu não tenho um modelo rígido, a minha experiência dentro do planejamento local coloca que existe uma teoria que não se adapta na prática, porque esta é muito dinâmica, então procurei adaptar a teoria que aprendi a realidade....

Apresenta-se ancorado pela opinião de que o planejamento não admite metodologias fechadas(9) e de que a prática demonstra que não pode haver rigidez na aplicação de um método, pois cada local e experiência realizam adequações do mesmo aos sujeitos e seus processos(1).

O DSC oferecido na idéia central a intersetorialidade é um fator determinante para o processo de planejamento também se apresentou único. Percebe-se que o movimento proporcionado pela Prefeitura Municipal de Curitiba no sentido de compor Planos Distritais para a cidade, no local onde eles são necessários, através do Modelo Curitiba de Colaboração, reforça a necessidade da ação conjunta de várias secretarias: DSC2- Eu acredito que o pensar junto, quando se está atendendo uma mesma população e o construir com outras secretarias em busca da intersetorialidade ia facilitar muito o planejamento local....temos uma maior parceria, crescemos juntos... tinha que acontecer, porque para melhorar a cidade sei que as ações serão voltadas para a saúde, condições sócio-econômicas, habitação, alimentação e está tudo grudado, vamos ter que integrar os setores.

Ao escrever sobre a modelação de uma organização governamental segundo a lógica intersetorial, com a missão de proporcionar a melhoria de condições de vida da população de sua área de abrangência, Inojosa(10) afirmou que haverá necessidade de um planejamento referido a base geográfica e populacional própria, articulado e com caráter distributivo. Outro fator que podemos perceber embutido nesta homilia é a preocupação das ASL's com o conceito de "promoção em saúde", admitindo que este "tende a apontar na direção de novas estratégias que colocam a saúde na sua verdadeira dimensão intersetorial, tendo como eixo a qualidade de vida"(11).

Outro DSC que também se apresentou único foi o da avaliação é a continuidade do processo de planejamento e tão importante quanto este: DSC3- Eu me preocupo muito mais do que planejar as ações é em avalia- las, porque a continuidade do planejamento se perdia no dia a dia, a avaliação não era tão participativa como a elaboração, ficava centrado na pessoa da chefia ou em outro funcionário.

Esta faceta é ancorada na reafirmação de que a avaliação é eixo central no planejamento de ações, cuja implementação é uma atribuição do gestor local, sendo necessário o envolvimento da Secretaria para assegurar sua prática preparando-se e disponibilizando para acompanhar o gerente local(12).

No DSC cuja idéia central girava em torno da afirmação de que o conhecimento do território é pré-requisito para um planejamento local, percebe-se que o modelo da Vigilância à Saúde e seus pressupostos, trazidos pelo consultor da Organização Pan-americana da Saúde - Eugênio Vilaça Mendes ao município de Curitiba no início da década de 90 obteve frutos saudáveis. O consulente analisa que o planejamento inclui utilidade se permitir circunscrever um problema no âmbito em que capacidade para enfrentá-lo e que para isso o conhecimento do território-processo é pré-requisito básico(13): DSC4- O conhecimento da área e da comunidade, principalmente no sentido de que eu tenho informantes chaves facilita realizar o planejamento. As equipes foram se apropriando do território, foram aprofundando os problemas de cada área de abrangência e dizem ! Vou conhecer minha área! E assim realizam-se os mapas inteligentes...".

A última composição de DSC único tem como IC a autonomia do nível local é relativa do gestor local. Neste discurso podemos verificar a necessidade de um maior empenho em questões simples e o avanço à descentralização que ainda deve ser incorporado pela instituição: DSC5- "A Unidade local tem uma autonomia relativa em todos os aspectos porque ela não se encontra isolada, está dentro de um sistema articulado. Eu acho que no planejamento local esta autonomia também é relativa, porque existem coisas que se repetem na cidade como um todo....o que preciso é autonomia no aspecto de permitir execução de pequenas ações....temos que avançar muito na questão da descentralização...".

O relato do trabalho da Secretaria Municipal da Saúde de Campinas(14) pôde ajudar a entender este discurso, quando o autor afirma que é necessário considerar as diferenças da viabilidade política entre a equipe dirigente, de nível central e as equipes locais, pois as últimas têm menos "grau de liberdade", menos poder de decisão que a primeira.

Outro elemento, edificado em quatro discursos, que ao nosso entendimento são complementares é o da participação da equipe na construção do planejamento é um facilitador. O primeiro discurso (DSC6) revela a necessidade de aproximações constantes ao grupo de trabalho com duplo objetivo: fazer a equipe conhecer o problema e levantar novas propostas de ação; o segundo (DSC7) tem como preocupação à cumplicidade que é garantida quando o planejamento é participativo; o terceiro (DSC8) refere à necessidade da participação, mesmo quando as condições institucionais não sejam favoráveis e o último (DSC9) apresenta alusão a um planejamento realizado com envolvimento, concluindo que é uma "forma de fazer um combinado com todo o mundo".

Numa de suas ponderações sobre o Agir Comunicativo e o Planejamento, Rivera(15) menciona que a arte da gerência pode ser confundida com a comunicação, "conduzir é comunicar, negociar, motivar e criar ambientes próprios a um agir cooperativo, baseado em compromissos de ação legítimos". Pressuposto refletido nos DSC's acerca da participação da equipe que pode ser corroborado com a análise de que a adesão ao projeto/plano não pode ser construída apenas na participação dos profissionais na discussão do plano, mas deve expressar-se no envolvimento com a realização de operações/ações e com busca de resultados(16).

O próximo discurso que ao nosso ver estabeleceu complemen-taridade é a capacitação é um estímulo para desenvolver planejamento local. O primeiro discurso coloca toda a importância dada aos processos oficiais formadores como as oficinas de trabalho: DSC10- Foi a capacitação pelo distrito que facilitou meu planejamento....quando fiz o GERUS tive um pouco de embasamento e acho que quem fez a especialização e participou de todas as oficinas realmente tem uma bagagem....

O processo de distritalização da Secretaria da Saúde de Curitiba através da adoção "de uma pedagogia problematizadora e decodificada de conteúdos tecnicamente complexos" possibilitou a construção de espaços de poder no nível localª(17) somado à referência ao projeto GERUS - Gerência de Unidade Básicas de Saúde, que movimentou a SMS durante dois anos, entre a constituição do corpo condutor, o preparo dos monitores e a formação das ASL's.

O segundo discurso (DSC11) apresenta uma pequena face complementar, mas que não poderia deixar de ser abordada: a presença do processo de capacitação pedagógica que fornece o contato com a pedagogia da problematização que possibilita consequências no nível individual como a superação de conflitos e no nível social a cooperação na busca de soluções a problemas comuns(18), implicações estas, diretamente ligadas ao processo de planejamento. E por fim o terceiro aponta a falta da capacitação entendida como processo contínuo: DSC12- "O que falta é capacitação para desenvolver um planejamento com a equipe".

Dentro desta lógica, a experiência de São Paulo situa atenção especial para insuficiência de conteúdos da saúde coletiva nos cursos de graduação das diversas profissões, este fato limita os profissionais e esta restrição poderia ser superada por processos de capacitação em serviço e educação continuada(19).

O próximo DSC apresentado faz a citação: o perfil particular das ASL's é determinante para um planejamento local. Nesta fala apresenta-se a primeira alocução antagônica: o DSC13 refere que a capacitação poderia ajudar, mas o que interfere mesmo é a postura pessoal frente ao papel de gestor. Os dois outros discursos, apesar de diferentes, apresentam certa complementaridade quando mencionam o envolvimento pessoal na condução da Unidade de Saúde e a naturalidade para direção da equipe: DSC14- O perfil da ASL facilita, a equipe tem a cara da pessoa que está na frente..

DSC15- O planejamento para mim é uma coisa natural....obviamente você vai passando essa experiência para tua equipe.

O estilo administrativo dos gerentes da área foi historicamente determinado pela dinâmica do mercado e o padrão hegemônico, onde o que se priorizava não era a experiência, capacidade técnica ou organicidade com a saúde, mas sim o seu "grau de confiança" ou subordinação ao modelo do mercado(20). Cabe ressaltar que novos paradigmas estão oferecidos dentro do contexto saúde e planejamento como a horizontalização de estruturas e descentralização de funções que oferecem incentivos à criatividade(21), portanto o perfil do gerente deve proporcionar coerência com tais princípios.

Os DSC's construídos a partir da idéia sobre: a agenda da ASL é lotada de problemas emergenciais, que não sobra tempo para o planejamento local possuem características que devem ser apontadas. Os três discursos, apesar de compreendidos como antagônicos na sua constituição, contém a presença constante da expressão "demanda externa". O primeiro discurso apresenta uma queixa sentida pelas ASL's de que o planejamento é necessário, foi "deixado de lado" e tem-se enorme dificuldade para operacionalizá-lo devido ao "gerenciamento de incêndios" - é o discurso da prioridade: DSC16- Eu tenho desistido do planejamento....somos atropelados por uma série de coisas pra fazer, uso meu tempo apagando incêndios, gerenciando problemas e isso complica a vida da gente...hoje a programação é o que bate na porta e para dar conta da assistência tenho que deixar algo pra depois, então o que eu deixo? O planejamento....

O segundo refere existência limitada da prática do planejamento pela sobrecarga sentida devido às solicitações da Secretaria - é o discurso da dupla função: planejar localmente e seguir condutas e solicitações do nível central: DSC17- O excesso de demanda que vem da secretaria é limitante... Não que o meu planejamento esteja fora daquilo que é solicitado, mas os tempos são diferentes....Será que vale a pena centrar meus esforços em fazer o que vem da secretaria e deixar de lado o planejamento local?...

E o terceiro apresenta uma faceta relacionada com o planejamento de eventos e a percepção de que o planejar em conjunto facilitaria o processo local: DSC18- O Planejamento de eventos da secretaria é diferente do meu, que é diferente do distrito e assim vamos a partes....poder planejar em conjunto ia facilitar muito, eu poderia remanejar o meu trabalho.

Matus(22) ao referir-se ao "triângulo de ferro" formado pelo sistema de cobrança e prestação de contas, sistema de gerência por operações e sistema de configuração da agenda do dirigente, apresenta este vértice com importância vital para o direcionamento do foco de atenção sobre temas importantes apoiados pelo plano. Portanto a afirmação de que sem a agenda e o plano os temas importantes serão dominados por casos de urgência e principalmente a apropriação do pressuposto: "o predomínio do planejamento, ou da improvisação, decide-se na agenda do dirigente,....a agenda administra os dois recursos mais escassos: tempo e foco de atenção" é supostamente admitida no DSC das ASL's.

Pode-se ainda apresentar a complementação às agendas lotadas de problemas emergenciais que "não podem ser deixados para depois", de modo que não sobra tempo para planejar(23).

Os DSC's da"participação da comunidade é elemento central no planejamento local" são adversos em sua configuração, fazendo-nos pressupor que diferentes níveis de participação comunitária estão acontecendo na cidade. O primeiro refere-se a um sonho de mobilização da comunidade rumo ao processo de planejamento: DSC19- Dizer que a comunidade está trazendo o que precisa no local, isso aqui na minha unidade ainda não ocorre, ainda não chegamos .

Nós temos uma parcela de participação legitimados no conselho local legitimados pelas conferências, mas eu sei que elas saem porque puxamos para sair: Pelo amor de Deus, vem participar gente!!..

O segundo (DSC20) apresenta um convívio comunicativo com o CLS para priorização e participação no plano, apontando a importância das lideranças comunitárias e o terceiro (DSC21) a importância da comunidade no planejar, mas apresenta um discurso baseado na presença de dois grupos distintos: o que não participa e o que participa com bandeiras político-partidárias. O que é comum a todos estes discursos é a importância inferida ao ator social - população na composição do planejamento local.

Viana(24), ao discutir a descentralização das políticas sociais afirma que as experiências mais bem sucedidas, neste sentido, foram as que tiveram amparo na mobilização popular, não apenas no controle social, mas na criação de "cooperação social" através de uma cidadania ativa e responsável. Esta afirmativa pode ancorar o DSC22 que aponta a necessidade da apropriação do conceito de cidadania. Por outro lado, salienta-se o imperativo resgate do compromisso do profissional com o usuário, que demanda diálogo constante resultando em estabelecimento de responsabilidades reais(25); fato este que pode ser apreciado quando lemos o segundo discurso ancorado no compartilhamento de responsabilidades e construção conjunta do planejamento. Por fim, devemos citar a comparação entre o planejamento estratégico e o participativo: as implicações de haver um sem o outro é que um planejamento estratégico sem a participação popular tornaria um governo fechado, e, desta maneira, se correria o risco de não atingir os objetivos da sociedade.... e a participação sem o lado estratégico, fica prejudicada, pois ela poderia ser considerada como uma "massa amorfa" de pessoas movidas muito mais pela emoção do que pela razão(26).

Os DSC's que faziam referência ao planejamento local é fruto de uma cultura institucional apresentaram divergências, apesar de proporcionar um discurso hegemônico de que o processo de planejamento é fruto de uma tradição da instituição e, portanto, consolidado na atuação da ASL, presença de outros DSC's, com menor intensidade, mas com várias implicações neste tema: DSC22- O início do planejamento local na SMS aconteceu porque era uma linha estratégica, se queria o espírito de organização...temos acúmulo profissional e o planejamento está incorporado na cultura...faz parte do meu discurso pensar planejando...eu teria dificuldade de trabalhar e gerenciar sem planejar, sem estabelecer prioridades e não consigo entender como um gerente local consegue atuar sem base num planejamento. Planejamento que é uma grande responsabilidade nossa.

O segundo (DSC23) presencia um planejamento descendente a partir do plano municipal que é visto como direcionador de demandas - é o discurso da resposta às demandas do nível central focalizado e amparado anteriormente pela configuração da agenda da ASL. O terceiro (DSC24) discute a presença do apoio distrital para consolidação do plano local - é o discurso do espaço para criatividade; e o quarto (DSC25) apresenta o ponto de vista do valor dado ao processo de planejamento - é a fala da obrigação do planejar.

O discurso hegemônico é ancorado por pressupostos da prática do PES em Curitiba que estabeleceu raízes naqueles que são parte do corpo gerencial da SMS. O modelo de planejamento ascendente deve ter claro, entre outros pontos, a organização de um processo de trabalho que se paute na gestão coletiva, estimulando a criatividade das equipes para responder aos problemas apresentados pela comunidade(27) e essa afirmativa pode levantar a questão apresentada pelo segundo e terceiro discurso, alertando para a construção do planejamento com a presença contínua e efetiva do ator social - gestor do sistema local. Por fim o quarto discurso nos remete ao estabelecido que "planejar é uma atitude permanente da organização e do administrador", portanto não é uma mera ferramenta de trabalho, mas um "processo político de busca de pontos comuns das distintas visões de futuro e de acordos" estabelecidos(4), tendo necessidade de incorporação deste pressuposto à vivência da ASL.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Cabe destacar que apesar das ancoragens apresentadas nesta discussão terem sido buscadas na literatura lida e pesquisada durante o decorrer do estudo, a metodologia utilizada permite outras considerações ancoradas no que chamamos de "senso comum" embutido no pensamento coletivo, portanto não temos a pretensão de esgotarmos neste artigo a discussão sobre o tema proposto e, a cada releitura do material produzido, poderemos encontrar novas facetas e novas visões ao objeto estimulando novas pesquisas. Importante ponderar que na construção dos DSC's pôde-se resgatar o conceito de representação social quando se concretizou sua unicidade, complementaridade ou antagonismo(28).

Podemos concluir que o planejamento local da SMS de Curitiba contém caminhos diversos, o desenvolvimento de metodologias e de enfoque de planejamento, bem como as posturas e condutas deverão enraizar solidariedade e compromissos "num permanente aprender a aprender"(29) e isto é pressuposto do grupo gerencial da Secretaria, refletido nos discursos apresentados. O nível local lutou por maior autonomia, aprimorou-se e assumiu novos encargos - sendo um deles o essencial processo de planejar em saúde de forma ascendente, participativa, comunicativa e estratégica - e isso não é uma tarefa simples.


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