Motivos de licenças médicas em um hospital de urgência-emergência
PESQUISA
Motivos de licenças médicas em um hospital de urgência-emergência
Reason of medical licenses in an emergency hospital
Razones de licencias médicas en un hospital de urgencia-emergencia
Marília AlvesI; Solange Cervinho Bicalho GodoyII; Daniela Moreira SantanaIII
IDoutora em Enfermagem. Prof.Adjunto ENA/Escola de Enfermagem da UFMG. Líder do
NUPAE marilix@enf.ufmg.br
IIMestre em Enfermagem. Prof.Assistente ENB/Escola de Enfermagem da UFMG
ange@enf.ufmg.br
IIIBolsista de Iniciação Científica CNPq. Aluna da Graduação em Enfermagem da
Escola de Enfermagem da UFMG ddannisantana@yahoo.com.br
1. INTRODUÇÃO
Muito se tem escrito sobre a singularidade das organizações de saúde. Os
hospitais diferem de outras instituições pela marcante complexidade e
peculiaridade dos serviços prestados que precisam responder às necessidades
individuais dos clientes. No entanto, a literatura pouco discorre sobre os
serviços de urgência/emergência, que constituem referência hospitalar
especializada.
Devido as atividades que devem ser realizadas com rapidez e qualidade
adequadas, pois influenciam no prognóstico e podem comprometer a vida do
paciente, o serviço de urgência/emergência gera situações de desgaste físico e
emocional do trabalhador.
Além disto, a peculiaridade das relações de trabalho, colocadas em prática no
hospital afetam diretamente a moral das equipes de trabalho, que pode ser
percebida nos baixos níveis de satisfação e motivação dos empregados e nos
elevados níveis de absenteísmo e rotatividade(1).
Boller(2) refere-se ao estresse proveniente do ambiente de trabalho como um
fator para o absenteísmo no setor de emergência. Conhecendo um pouco da relação
existente no ambiente de trabalho de um hospital de urgência/emergência, sabe-
se que não apenas o estresse, mas a somatória de fatores é responsável pelo
surgimento de absenteísmo-doença em trabalhadores dessas instituições. 1
Tendo em vista estes fatores de agravo à saúde dos trabalhadores destaca-se a
importância de discutir a questão do absenteísmo-doença nesses serviços.
1.1 Referencial Teórico
As relações entre trabalho e saúde do trabalhador conformam um mosaico que se
caracteriza por diferentes formas de organização e gestão, relações e formas de
contrato de trabalho, que refletem sobre o viver, o adoecer e o morrer do
trabalhador. Considerando o processo de reestruturação produtiva a partir da
década de 90, pouco se sabe sobre a influencia da adoção das novas tecnologias
e métodos gerenciais sobre a saúde do trabalhador. Estes facilitam a
intensificação do trabalho que, aliada à instabilidade no emprego, traz
modificação no perfil de adoecimento e sofrimento dos trabalhadores, podendo
ocorrer aumento da prevalência de doenças relacionadas ao trabalho e elevado
índice de absenteísmo por doença(3). O trabalho deveria ser considerado como
uma atividade criativa e prazerosa na vida dos indivíduos, o qual poderia
favorecer o desenvolvimento das habilidades físicas e mentais, além de melhorar
a qualidade de vida com base em uma remuneração adequada. Espera-se também que
horário seja compatível com a saúde do trabalhador e que proporcione
tranqüilidade e alegria para a sua vida e a de sua família(4). A realidade se
concretiza de forma muito diferente, o ambiente das organizações de trabalho
apresenta, em seu cotidiano, trabalhadores que vendem o único bem disponível, a
sua força de trabalho, em troca de sobrevivência e, com isso, constituindo um
cenário privilegiado para a observação de conflitos gerados no interior desses
ambientes(5).
Pouco se sabe sobre como o trabalhador se sente frente ao trabalho em si, suas
relações com colegas, chefias, sistemas de salários e benefícios. Certamente a
compatibilização destas expectativas com as necessidades organizacionais,
torna-se um desafio diante de obstáculos que se apresentam como longas jornadas
de trabalho, condições de insalubridade do ambiente de trabalho; baixa
remuneração; duplo emprego e tensão emocional. Estes obstáculos podem
desencadear o absenteísmo. Esta situação é preocupante, uma vez que desorganiza
o serviço, gera insatisfação e sobrecarrega os trabalhadores presentes,
diminuindo a qualidade da atividade realizada(6).
De acordo com a OIT(7) "o absenteísmo-doença abrange 75% ou a totalidade das
ausências na indústria e é justificado por atestado médico segundo as normas
legais da Seguridade Social" . Segundo Alves5, "o principal tipo de absenteísmo
apresentado pela literatura está relacionado à incapacidade por doença e
acidentes de trabalho". Para Chiavenato(8), "absenteísmo, absentismo ou
ausentismo é uma expressão empregada para designar a falta do empregado ao
trabalho". Pode ser visto como a soma dos períodos em que o trabalhador se
ausenta do trabalho, a ausência não é motivada por desemprego, doença
prolongada ou licença legal.
A organização hospitalar difere de outras instituições por sua complexidade
considerando que as demandas e necessidades dos clientes não podem ser adiadas
e não permitem padronizações excessivas, em vista das exigências de tratamento
personalizado e efetivo integração entre os diversos serviços. A intensificação
do trabalho organizacional ocorre em todos os ramos de atividades, em
particular a empresa hospitalar que apresenta uma especificidade e
complexidade, o qual gera, de acordo com os estímulos ambientais, aumento da
carga de trabalho e condições desfavoráveis de trabalho. Esta situação
interfere na saúde do trabalhador ao extrapolar os seus limites físicos e
emocionais, e conseqüentemente, adoece e se ausenta no trabalho5. Os
trabalhadores no ambiente hospitalar estão sujeitos a condições inadequadas de
trabalho, provocando agravos à saúde, que podem ser de natureza física ou
psicológica, gerando transtornos alimentares, de sono, de eliminação, fadiga,
agravos nos sistemas corporais, diminuição do estado de alerta, estresse,
desorganização no meio familiar e neuroses, fatos que, muitas vezes, levam a
acidentes de trabalho e licenças para tratamento e saúde(9).
Muito tem se falado e publicado a respeito das condições inadequadas de
trabalho vigentes em grande parte dos ambientes hospitalares, que expõem seus
trabalhadores a riscos de ordem biológica, física, química, ergonômica,
mecânica, psicológica e social. A instituição hospitalar caracteriza-se como
local de aglutinação de pacientes/clientes acometidos por diferentes problemas
de saúde. Dentre estes se destaca problemas administrativos, prejuízos à saúde
física e mental dos trabalhadores, quando expostos a prolongadas jornadas de
trabalho; ritmo acelerado de produção, por excesso de tarefas; automação por
realização de ações repetidas com parcelamento de tarefas e remuneração baixa,
em relação à responsabilidade e complexidade das tarefas. A além de refletir
conflitos nas relações de trabalho, interfere na satisfação do trabalhador,
eleva os custos e contribui para o declínio da qualidade de assistência,
afetando, a organização, trabalhadores e clientes(10).
As causas do absenteísmo podem estar relacionadas tanto ao próprio trabalho
como também, organização, supervisão deficiente, empobrecimento de tarefas, a
falta de motivação e estímulo, condições desagradáveis de trabalho. Entre
outras causas, doenças efetivamente comprovadas como motivos familiares,
atrasos involuntários, faltas voluntárias, dificuldades em relação ao meio de
transporte, redução da motivação para trabalho, supervisão precária e política
organizacional imprópria(8). O hospital deve ser necessariamente um local onde
as atitudes positivas relacionadas à manutenção de saúde e melhoria das
condições de trabalho, devem ser programadas e enfatizadas. Compreende-se que a
manutenção em um elevado nível de bem estar físico e mental para os
trabalhadores no ambiente hospitalar favorece diretamente na melhoria na
assistência prestada aos pacientes(11).
Tendo em vista que a organização hospitalar tem como missão básica prestar
assistência ao paciente, esta instituição conta com a atuação de trabalhadores
para a produção da saúde, o combate à doença, o prolongamento da vida, e até o
acompanhamento daqueles que morrem. As unidades de atendimento de urgência e
emergência apresentam na sua rotina situações que expõem os trabalhadores à dor
e sofrimento; carga horária semanal de trabalho superior a 40 horas; trabalho
nos finais de semana; trabalhos noturnos; exposição a produtos químicos e
radiações ionizantes; movimentação de cargas, entre outros. Estas condições de
trabalho apresentadas são adversas e variáveis podem provocar alterações no
equilíbrio psicológico do trabalhador que, muitas vezes, ao tentar adaptar-se
aos inúmeros agentes estressantes vivenciados no cotidiano laboral podem lançar
mão de mecanismos de fuga como o absenteísmo, a fim de buscar uma solução
provisória para o seu conflito com a organização no seu trabalho.
Neste contexto , propomos pensar a respeito das causas de absenteísmo-doença em
um hospital de atendimento de urgência e emergência de Belo Horizonte,pois
encontramos neste ambiente fatores desencadeantes de afastamento do trabalho.
Para tanto, este trabalho teve o seguinte objetivo geral: Analisar o
absenteísmo-doença entre os trabalhadores do hospital João XXIII atendidos no
Departamento de Atendimento à Saúde do Trabalhador da Rede de hospitais FHEMIG
(DAST/FHEMIG). Como objetivos específicos: Identificar o índice de absenteísmo-
doença entre os trabalhadores do hospital; Identificar o risco relativo de
absenteísmo-doença por categoria profissional e Identificar o motivo-doença do
absenteísmo nos trabalhadores segundo categoria profissional e Identificar o
tempo de trabalho perdido por motivo-doença.
2. METODOLOGIA
Trata-se de um trabalho descritivo sobre absenteísmo-doença entre trabalhadores
de um hospital de urgência e emergência de Minas Gerais. "A pesquisa descritiva
tem como objetivo a caracterização de determinada população, ou fenômeno ou, o
estabelecimento de relações entre variáveis"(12). O presente estudo é de
natureza retrospectiva, com o objetivo de caracterizar o absenteísmo-doença
entre trabalhadores de um hospital público, identificando variáveis como cargo,
motivo e tempo de licença médica.
A pesquisa foi realizada em um hospital publico, especializado em atendimentos
de urgência e emergência pertencente à Fundação Hospitalar de Minas Gerais
(FHEMIG) que presta assistência de urgência e emergência 24 horas, sendo
reconhecido como um dos maiores hospitais neste tipo de atendimento da América
Latina. Atende uma média de 500 pacientes por dia e possui 297 leitos com uma
taxa de ocupação de 90,66%, acumulando 14.965 internações no ano de 2002. Conta
com uma força de trabalho de 2.500 servidores, sendo 1.080 profissionais de
enfermagem, 650 da área médica, 200 auxiliares administrativos e 570 serviços
de apoio. Os grupo pesquisado, corresponde ao quadro de trabalhadores do
hospital que procuraram o DAST/FHEMIG, no ano de 2002, para consulta e perícia
médica. Não foram incluídos no estudo dados de fichas incompletas, licença
maternidade e acidentes de trabalho. A variável dependente, absenteísmo-doença
foi caracterizada, através das ausências dos trabalhadores por motivo de doença
(CID 10) que geraram licenças no decorrer do ano da investigação. As variáveis
independentes:cargo, tempo de afastamento e motivo de licença.
A coleta de dados realizada utilizando os dados registrados nas fichas de
produção, do período de janeiro a dezembro de 2002, referente ao atendimento
médico feito aos trabalhadores que procuraram a Divisão de Atenção a Saúde do
Trabalhador/ FHEMIG / Belo Horizonte / MG. Análise dos dados: ao final da
coleta de dados as informações foram processadas e representadas em tabelas e
gráficos com distribuição de freqüência e razão de prevalência e aplicação de
Odis Raddio para avaliar as relações entre as variáveis, utilizando um programa
estatístico.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nas tabelas_1 e 2 estão apresentadas a relação de trabalhadores do hospital
segundo categorias profissionais. Aproximadamente 43% dos 2500 trabalhadores
dessa instituição pertencem a categoria profissional enfermagem, composta de
enfermeiros, técnicos, auxiliares e atendentes. Torna-se importante ressaltar
que a enfermagem possui um grande contingente de trabalhadores composto por
mulheres e profissionais de menor qualificação e que são responsáveis por
maiores índices de absenteísmo-doença na área hospitalar. Por outro lado, não
se pode desconsiderar a influência de questões específicas do processo de
trabalho de determinadas categorias, principalmente daquelas que cuidam
diretamente dos pacientes em situações de urgência/emergência ou de pacientes
críticos em regime de internação por tempo prolongado.
Na tabela_1, a distribuição de licenças médicas possibilitou o cálculo do
índice de razão prevalente na qual a categoria profissional de enfermagem se
destacou com aproximadamente 78% dos afastamentos. O índice de razão prevalente
compara a ocorrência de licenças médicas entre uma categoria de base e as
demais, considerando os diferentes grupos e tendo como produto dessa relação um
valor que corresponde a chance de ocorrência de licenças médicas para cada
categoria comparada à categoria de base. A categoria profissional escolhida
como base de comparação foi a medicina, pois esta obteve a menor relação entre
o número de profissionais e a ocorrência de licenças médicas. O hospital
apresentou o índice geral de razão prevalente igual a 4,7. Este índice foi
influenciado pela alta razão prevalente apresentada pela categoria profissional
de enfermagem ou seja, a enfermagem produz afastamentos 8,5 vezes mais que a
medicina. A mesma relação pode ser estabelecida para as categorias seguintes:
auxiliares administrativos (2,88) e com a menor relação, serviços de apoio
(2,41).
Na tabela_2, para o cálculo do índice de absenteísmo-doença foi utilizando a
distribuição do total dos dias de afastamento dos trabalhadores pertencentes ao
hospital pesquisado (13.128 dias). Segundo as categorias profissionais
apresentadas a enfermagem gerou cerca de 69% dos dias de afastamento. O índice
de absenteísmo-doença trabalha com a relação entre dias de licença médica por
número de trabalhadores considerando os dias de trabalho no ano. Os resultados
mostraram um índice de 2,06, que pode ser considerado elevado, de acordo com a
pesquisa realizada por Godoy(9), no qual que identificou um índice de
absenteísmo-doença de 1,53 entre funcionários de um hospital público de mesmo
porte. Observando na tabela_1 a distribuição do índice de absenteísmo-doença
nas diversas categorias profissionais estudadas, constatou-se um valor menor na
categoria médica (0,57), quando comparada com as demais.
Pode-se observar que a maioria das licenças médica concentrou nas doenças do
sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo (14,68%), seguido fatores que
influenciam o estado de saúde e o contato com serviços de saúde (13,59%),
doenças do aparelho respiratório e os demais constam na tabela_3.
Estudos(9-15)confirmam os dados encontrados, uma vez que apontam as doenças do
sistema osteomuscular como uma das principais causas de afastamento do
trabalhador ao serviço. Os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho
(DORT), anteriormente conhecidos como lesões por esforços repetitivos (LER) são
fenômenos mundiais, que trazem repercussões negativas para os trabalhadores,
empresas e sociedade(16).
O crescimento significativo dos distúrbios osteomusculares desde 1986, pode ser
explicado por vários fatores dentre eles, a modificação no processo de trabalho
decorrente da modernização e automação em grande parte dos setores da economia,
exigindo dos trabalhadores movimentos monótonos e repetitivos.
O Ministério da Saúde(3), considera que este distúrbio apresenta uma origem
multifatorial, onde os fatores causais são inúmeros que acabam se entrelaçando,
diante da exposição do trabalhador às condições de trabalho inapropriadas.
Pode-se pensar nas situações que favorecem o desencadeamento deste quadro, como
ações mecânicas repetidas por períodos de tempo prolongado, adoção de posições
forçadas e fatores relacionados à organização do trabalho, o qual cria
estratégias de intensificação do trabalho e controle excessivo dos
trabalhadores, sem considerar as características individuais, traços de
personalidade e história de vida.
Rocha e Ferreira Júnior(17) afirmam que a introdução de novas tecnologias, na
segunda metade deste século, provocou modificações dos equipamentos e das
técnicas organizacionais. Esta inovação favoreceu a automação, ocorrendo
intensificação do trabalho, onde um trabalhador passou a operar várias máquinas
simultaneamente. A disseminação do uso da informática e do computador aumentou
a incidência de problemas de saúde relacionados ao trabalho.
O motivo que desencadeou a afecção osteomuscular nos trabalha-dores da
enfermagem, auxiliar administrativo, serviço de apoio e medicina, pode estar
relacionado a, modernização e informatização no local de trabalho; fatores
biomecânicos (imobiliário inadequado, posturas viciosas, força e
repetitividade); fatores ligados à organização do trabalho (aumento do ritmo,
exigência do tempo, falta de autonomia, fragmentação das tarefas e relações com
chefias); novas técnicas gerenciais que assumem a forma de "just in time"
taylorizado ou seja, continuidade da divisão do trabalho, rotatividade da mão
de obra, intensificação do ritmo de trabalho e relações autoritárias de
gerenciamento(17). A LER/DORT traz conseqüências imediatas não só para os
trabalhadores que desenvolveram a patologia, mas também para a instituição onde
o trabalhador atua, no qual a falta será uma resposta a este quadro(16). A
ausência, seja por acidente de trabalho, doenças profissionais ou doenças
relacionadas ao trabalho, geram um absenteísmo, que interfere na perda da
produtividade e na qualidade do trabalho a ser realizado.
A enfermagem destacou como categoria de trabalhadores mais sujeita a LER/DORT,
isto se deve aos fatores de riscos ocupacionais presentes, que quando
associados, ao ambiente físico e a fatores organizacionais/psicossociais,
poderá determinar a carga osteomuscular e mental sobre o indivíduo. Segundo o
Ministério da Saúde(3), não está totalmente esclarecido esta associação, mas
estudos indicam que o limiar para a dor pode estar associado com o modelo de
exigência-controle-suporte social.
Vários estudos(13,18,19), reafirmam a influência das condições do ambiente de
trabalho e da precariedade dos equipamentos utilizados no trabalho cotidiano da
enfermagem, exigindo um aumento da capacidade física do trabalhador, o qual
acaba provocando lesões no sistema músculo esquelético- ligamentar.
A enfermagem é considerada como uma das profissões com risco de desenvolver dor
nas costas relacionadas com o trabalho, pois incluem entre as suas atividades,
a manipulação de cargas, freqüentes curvaturas do tronco e a manutenção por
longos períodos de posturas estáticas(13).
A elevada ocorrência da afecção osteomuscular na categoria de enfermagem pode
ser explicada considerando que o estudo foi realizado em um hospital que atende
em grande parte situações de urgência e emergência, onde as atividades
desenvolvidas por este grupo contribuem para o aparecimento de afecções
osteomusculares, uma vez que estes trabalhadores realizam técnicas de,
mobilização de doentes em situações de total dependência; transferência dos
mesmos das macas para o leito e vice-versa; além de atuarem em número
insuficiente e com uma exigüidade da área física. A adoção de posturas
corporais incorretas associado à exposição constante a, doenças, sofrimento e
morte, favorece, segundo Gaspar(20), ao aparecimento da fadiga e elevada
requialgia na equipe de enfermagem no ambiente hospitalar.
O motivo doença relacionado aos fatores que influenciam o estado de saúde e o
contato com serviços de saúde, de acordo com o CID-10(21), inclui pessoas em
contato com os serviços de saúde para exame e investigação; pessoas com riscos
à saúde riscos potenciais à saúde relacionados com doenças transmissíveis;
pessoas em contato com os serviços de saúde em circunstâncias relacionadas com
a reprodução; pessoas em contato com os serviços de saúde para procedimentos e
cuidados específicos; pessoas com riscos potenciais à saúde relacionados com
circunstâncias sócio-econômicas e psicossociais; pessoas em contato com
serviços de saúde em outras circunstâncias e pessoas com riscos potenciais à
saúde relacionados com história familiar e pessoal e algumas afecções que
influenciam o estado de saúde. Pelo fato desta categoria ser muito abrangente,
favorece o percentual encontrado na pesquisa, uma vez que grande parte dos
motivos apresentada pelos trabalhadores foi classificados na referida
categoria, sem apresentar a patologia de base que pode estar causando este
afastamento e busca por serviços de saúde. Em relação aos profissionais que
procuraram o DAST/FHEMIG e receberam licença médica gerando absenteísmo-doença,
a enfermagem foi representativa, isto ocorreu uma vez que esta equipe aponta
como o maior contingente de trabalhadores da saúde nesta organização
hospitalar.
Deve-se lembrar que esses profissionais atuam em uma unidade pública e são
amparados pela lei 3048- 6 de maio de 1999, que prescreve sobre o afastamento
durante os primeiros 15 dias consecutivos de ausência na atividade por motivo
de doença, e a garantia do recebimento do salário integral, pago pela
instituição. E esta deverá ainda, fornecer o exame médico e o abono de faltas
através de um serviço médico. Caso o afastamento ultrapassar os 15 dias
consecutivos, o assegurado é encaminhado a uma perícia médica para uma nova
avaliação clínica. Constata-se que este trabalhador tem o respaldo legal para
usufruir o afastamento ao trabalho sem prejuízo da sua relação institucional
com a unidade onde está inserido(22).
As doenças do aparelho respiratórias apresentaram como o terceiro acometimento
responsável pelas licenças concedidas pelo DAST/FHEMIG aos trabalhadores
pertencentes ao hospital estudado. Em pesquisas realizadas(9,23), com
profissionais que atuam na área hospitalar, verificou-se um alto percentual de
adoecimento por afecções do sistema respiratório nos trabalhadores.
No presente estudo pode-se observar que as doenças do aparelho respiratório
estão centralizadas na categoria profissional de enfermagem. Este quadro
traduz, de acordo com a OIT(7) e Reis(24), que o ambiente hospitalar apresenta
condições ruins de trabalho, destacando, má ventilação, aglomeração de pessoas
no mesmo local, o que possibilita o contágio e conseqüências para a saúde e
bem-estar do trabalhador.
As condições laborais da equipe de enfermagem freqüentemente são marcadas por
riscos, os quais repercutem em elevadas licenças médicas e absenteísmo. Estudos
(10,24) que caracterizavam os afastamentos entre trabalhadores de enfermagem no
setor hospitalar, identificando entre os principais agravos à saúde que geraram
licenças foi por doenças do sistema respiratório.
A equipe de enfermagem, conforme estatísticas observadas, é uma das principais
categorias profissionais sujeitas a exposições de material biológico. Este
quadro pode ser explicado, ao considerar o fato deste grupo ser em maior número
nos serviços de saúde, além de ter mais contato direto na assistência aos
pacientes e também ao tipo e freqüência de procedimentos realizados por seus
profissionais(25).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo possibilitou o cálculo, não só do absenteísmo, como também das
ausências provocadas por licença médica entre diversas categorias profissionais
atuantes na instituição, fornecendo para a administração hospitalar uma
informação fundamental no gerenciamento de recursos humanos no local
pesquisado. O índice de absenteísmo-doença encontrado na instituição pesquisada
foi de 2,06%, sendo possível determinar que este valor é considerado elevado
quando comparado com a pesquisa anterior realizada por Godoy(9), em uma
instituição pública o qual identificou um índice de 1,53%. Pode-se inferir que
as condições de trabalho oferecidas para os trabalhadores estão interferindo na
relação trabalho e vida dos profissionais na organização hospitalar. Convêm
ressaltar que a instituição pesquisada é um hospital de grande porte que se
caracteriza por desenvolver um atendimento de urgência e emergência, que de
acordo com Gaspar(19), apresenta um quadro peculiar que proporciona aos seus
trabalhadores, sejam eles ou não profissionais da saúde, condições de trabalho
precárias, reconhecidamente piores do que as verificadas das outras
organizações de saúde. Nessa situação, este serviço de saúde expõe o
trabalhador a uma agressão psíquica e física constante, não permitindo a ele a
elaboração de estratégias de proteção psicológica diante da complexidade das
ações que envolvem desde, responsabilidade, tomada de decisões em situações
graves e problemas relacionadas a questões como trabalho em turnos e a difícil
adaptação em uma área física inadequada. Considerando que os riscos para a
saúde relacionados com o trabalho dependem do tipo de atividade profissional e
das condições em que a mesma é desempenhada, pode-se justificar que o índice
elevado de absenteísmo-doença nos trabalhadores, inseridos numa instituição
prestadora de atendimento em urgência e emergência, esta diretamente
relacionado com a exposição freqüente a fatores de risco de natureza química,
física, biológica e psicossocial. O desenvolvimento desse estudo reforça as
análises sobre a prevalência do absenteísmo-doença na organização hospitalar,
onde a equipe de enfermagem destacou-se como uma categoria profissional com um
índice de licenças médicas concedidas pela Divisão de Atenção a Saúde do
Trabalhador/ FHEMIG. Ressalta-se que a equipe de enfermagem representou 43% do
corpo clínico que atua na instituição pesquisada, traduzindo um índice da
absenteísmo-doença elevado, quando comparado com outros profissionais. O nível
de formação da enfermagem concentra-se no ensino fundamental e médio Este grupo
é considerado majoritário nas instituições hospitalares e de acordo com Godoy
(9), o percentual elevado de licenças médicas prevalece nas categorias abaixo
do nível médio de formação educacional, confirmando que os grupos mais
qualificados, que possui o terceiro grau, estão menos expostos às más condições
de trabalho, ficando, menos doentes.
Em relação aos motivos apresentados pelas licenças médicas concedidas pelo DAST
aos trabalhadores identificou-se, que o maior percentual ficou para as doenças
do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo 162 (14,68%), seguido, dos
fatores que influenciam o estado de saúde e o contato com serviços de saúde 150
(13,59%), doenças do aparelho respiratório 147 (13,32%), entre outros. Na
literatura existem estudos(9,13,24,26)que confirmam os diagnósticos encontrados
nessa pesquisa, em relação às causas das licenças médicas que produziram os
afastamentos entre os trabalhadores da área hospitalar. Os valores encontrados
neste estudo em relação aos acometimentos na saúde do trabalhador que
desencadearam as licenças médicas, concentraram-se na categoria da enfermagem.
Esses trabalhadores, de acordo com Sena et al(27), permanecem um maior período
junto às pessoas adoecidas quando comparada às outras categorias da área. Esse
fato faz com que tais profissionais participem mais diretamente do impacto que
as alterações das condições de saúde podem ter sobre as pessoas hospitalizadas.
O ambiente de saúde cria também, situações desfavoráveis para este trabalhador,
gerando desgaste emocional e falta de reconhecimento, associado à restrição das
atividades profissionais e o convívio com pacientes graves em situações de
sofrimento e morte. A pouca valorização do trabalhador torna a relação
político-institucional pouco flexível colaborando para o adoecimento deste
dentro da instituição.
O conhecimento do absenteísmo-doença aliado a vontade política de se investir
na saúde dos trabalhadores, torna possível uma organização de serviços, voltada
para a realidade interna da instituição, analisando as condições reais de
trabalho oferecidas ao trabalhador e com isso favorecendo a uma maior
satisfação e motivação deste, dentro do ambiente hospitalar.