Prática do autocuidado vivenciada pela mulher hipertensa: um análise no âmbito
da educação em saúde
PESQUISA
Prática do autocuidado vivenciada pela mulher hipertensa: um análise no âmbito
da educação em saúde
Self-care practice lived by hipertensive woman: analysis on the health
education focus
La práctica del autocuidado vivenciada por la mujer hipertensa: un análisis en
el ámbito de la educación para la salud
Zélia Maria de Souza Araújo SantosI; Raimunda Magalhães da SilvaII
IDoutora em Enfermagem. Professora Titular do Curso de Enfermagem e do Mestrado
em Educação em Saúde da Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Enfermeira da Liga
de Hipertensão Arterial do Hospital de Messejana - LHAHM. zeliasantos@unifor.br
IIDoutora em Enfermagem. Professora do Curso de enfermagem e do Mestrado em
Educação em Saúde da UNIFOR. rmsilva@unifor.br
1. INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é caracterizada por aumento das cifras
de pressão arterial sistodiastólicas ou apenas sistólicas acima da considerada
normal para a idade, com prevalência em torno de 10% a 20% da população adulta
(1).
A prevalência da HAS aumenta com a idade. Com relação ao sexo, até os 55 anos a
prevalência é mais elevada no homem, e após essa idade, ela é igual para os
dois sexos, pois, na mulher, a prevalência aumenta com a instalação da
menopausa. No estudo de Santos(2) com 200 mulheres hipertensas, essa síndrome
foi diagnosticada em 43% das mulheres com idades entre 30 e 40 anos. Portanto,
constata-se que, mesmo com a proteção estrogênica, a mulher está exposta ao
risco desse agravo, conseqüentemente, aos danos cardiovasculares mediados por
esse.
A HAS constitui um agravo à saúde, e o seu aparecimento está relacionado aos
inadequados hábitos e estilos de vida. Contudo, não se pode desconsiderar os
fatores constitucionais, tais como: sexo, idade, raça, e história familiar.
De acordo com o Departamento de Epidemiologia da Secretaria Estadual de Saúde
do Ceará (DEPSESACE), ocorreram no Estado do Ceará, no ano 2003, 6.131 óbitos
por doenças do aparelho circulatório. Desses, 442 (8,1%) por hipertensão
arterial sistêmica e 2.658 (49,1%) por doença isquêmica do coração. Entre
esses, 1.142 (21,1%) aconteceram por infarto agudo do miocárdio, 479 (8,8%) por
doença cardiovascular secundária à hipertensão arterial e 2.552 (47,1%) por
doença cerebrovascular. Diante desses dados, observa-se que a hipertensão
arterial poderia ter sido responsável pela maioria dos óbitos, por ainda se
constituir um fator predominante às doenças cardiovasculares e
cerebrovasculares.
Com essa problemática relacionada à clientela hipertensa, que atualmente
envolve pessoas com idades inferiores àquelas que têm maior prevalência, e com
a estimativa do aumento significativo de pessoas idosas na população brasileira
em 2020, é possível constituir motivos significantes para uma atuação eficaz do
enfermeiro quanto à condução do cliente ao seguimento adequado do tratamento da
hipertensão arterial. Salienta-se ainda, a atuação do enfermeiro, priorizando
as atividades inerentes ao seu papel de educador, o qual tem relevante
importância no engajamento da clientela nas atividades de autocuidado,
principalmente, quando apresenta déficit de conhecimento e de habilidade para
cuidar de si mesma.
Optou-se por abordar neste estudo as mulheres, pois notificou-se a falta de um
programa de atendimento baseado nas particularidades relacionadas ao sexo e à
faixa etária dessas pessoas. A multiplicidade de atividades que atualmente
envolvem as mulheres no contexto socioeconômico e cultural, a incidência
elevada na morbimortalidade de doenças cardiovasculares associadas à
hipertensão, e a estimativa de predomínio da população idosa no século XXI a
qual provavelmente será composta, na maioria, por mulheres e, de modo geral,
com alterações de pressão arterial uma vez que a prevalência dessa síndrome
ascende com a idade são outros aspectos que levaram à escolha das integrantes
do sexo feminino como sujeitos de estudo dessa pesquisa.
Assim, procurou-se respostas para algumas questões, como por exemplo: em que
contexto social vivem as mulheres que recebem cuidados nessa Instituição de
Saúde? Em que condições desenvolvem as práticas para o autocuidado? Que tipo de
suporte essas mulheres recebem para enfrentarem as dificuldades relacionadas à
saúde?. Com essas indagações, pretendeu-se investigar sobre a prática do
autocuidado vivenciada pela mulher hipertensa.
2. METODOLOGIA
Trata-se de um estudo exploratório-descritivo, realizado em uma instituição
pública de saúde, com referência para o norte e nordeste no atendimento aos
clientes com doenças do coração e do pulmão, situada em Fortaleza-Ceará.
A amostra foi sistemática e constituída de 200 mulheres, maiores de 20 anos
independente do estado civil, escolaridade, procedência ou renda familiar que
apresentaram condições físicas e emocionais para responder aos questionamentos,
e que aceitaram participar da pesquisa.
Para a coleta dos dados, usou-se a entrevista com perguntas relacionadas às
características sociodemográficas, ao conhecimento da doença e das condutas
terapêuticas, e à prática das atividades de autocuidado a qual foi aplicada
durante às consultas de enfermagem no ambulatório de atendimento às pessoas com
hipertensão arterial. Os dados foram agrupados por convergência de
significados, apresentados na forma de tabelas e complementados por depoimentos
verbalizados pelas mulheres.
Nas falas selecionadas, procurou-se evidenciar a relevância atribuída pelas
mulheres às experiências vivenciadas com a prática do autocuidado em relação à
hipertensão em suas vidas. Foram organizadas duas categorias, contemplando
dados de identificação social, condições econômicas e educacionais; e dados
sobre as experiências vivenciadas com os transtornos da doença e relação dessas
com o auto-cuidado.
A interpretação dos dados se fundamentou na Teoria do autocuidado de Orem, que
é composta por três constructos: autocuidado, déficit de autocuidado e sistemas
de enfermagem. Essa teoria nos lembra que a pessoa deve se empenhar para
desenvolver atitudes coerentes com a saúde e bem-estar, individual e familiar,
mediante a intervenção do enfermeiro.
A aceitação da participação da cliente foi registrada em termo de consentimento
informado, de acordo com a Resolução 196/96(3), garantindo-lhe o anonimato e o
livre acesso para se desligar da pesquisa sem que houvesse prejuízo para a
continuidade do tratamento. Os dados foram coletados após parecer favorável do
Comitê de Ética.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Descrição socio-demográfica das amostra estudada
As mulheres tinham idade a partir de 20 anos, com predominância na faixa etária
de 40 a 69 anos. É nessa, que corresponde ao período das alterações gradativas
da produção do hormônio estrogênio, em que aumentam a prevalência da
hipertensão arterial e os riscos das doenças cardiovasculares e cerebro-
vasculares.
Evidenciou-se que a maioria das mulheres era casada, tinha quatro filhos ou
mais, e residia com a família, composta por marido ou companheiro e filhos. As
demais mulheres moravam com parentes, ou em lares para idosos. Quanto à
procedência, 180 (90%) moravam na capital e 20 (10%) em outros municípios do
Estado do Ceará. Essas últimas, mesmo com dificuldade de transporte,
compareciam mensalmente para o acompanhamento e controle da pressão arterial.
O somatório de mulheres com educação básica (ensino fundamental) totalizou 122
(61%), e 118 (59%) tinham renda familiar de 1 a 2 salários mínimos. As
ocupações predominantes tinham estreita relação com a escolaridade e com a
renda familiar. Essas ocupações eram "prendas do lar", costureiras, domésticas
e faxineiras.
O sobrepeso e a obesidade estavam presentes em 180 (90%) mulheres. A obesidade
predominou entre as idades de 40 a 59 anos e nas mulheres não brancas. Quanto a
cor(4) a prevalência é maior nas pessoas de pele escura, fato observado nesse
estudo. Entretanto, 20 (10%) entrevistadas apresentavam peso saudável (com IMC
< 24 kg/cm2).
Estudos realizados nos Estados Unidos mostraram que a hipertensão arterial é
mais freqüente em negros e as diferenças raciais são maiores para as formas
mais graves e para as complicações relacionadas à doença, particularmente,
insuficiência renal crônica, acidente vascular cerebral e hipertrofia
ventricular esquerda. Similarmente ao observado nos Estados Unidos, no Brasil,
a prevalência de hipertensão arterial é maior nos negros e as diferenças
raciais maiores para as formas graves de doença(5).
A pressão arterial é maior em negros, independentemente dos níveis de peso, e
que a associação entre sobrepeso ou obesidade, na hipertensão arterial, é mais
freqüente nessa raça. O excesso de tecido adiposo visceral está associado às
complicações metabólicas e hemodinâmicas envolvidas em mecanismos que levam à
doença cardiovascular arteriogênica e hipertensão arterial(6).
A obesidade visceral é um sério problema de Saúde Pública, fazendo parte da
síndrome cardiovascular dismetabólica, e geralmente, está acompanhada da
hipertensão arterial. A obesidade associada à dislipidemia e hipertensão,
constitui uma das causas mais importantes de morbimortalidade(4).
A obesidade é um problema de alta prevalência no Brasil, pois 25% da população
apresenta algum grau de excesso de peso. E a prevalência da hipertensão
arterial é aproximadamente três vezes maior em obesos, que em indivíduos com
peso situado na faixa de normalidade. A adiposidade aumenta com o
envelhecimento(7).
Entre as mulheres investigadas, observou-se a associação entre obesidade,
dislipidemia e hipertensão. Essas morbidades estão associadas ao estilo de
vida, inclusive ao hábito alimentar. Recentemente, estudos observacionais têm
evidenciado uma estreita relação entre características qualitativas da dieta e
a ocorrência de enfermidades crônico-degenerativas: como as doenças cardiovas-
culares, diabetes mellitusnão-insulinodependente, câncer e obesidade(8). O fato
é preocupante, pois, a saúde dessa clientela está exposta a um grave risco de
morbidade e mortalidade por doença cardiovascular.
Entretanto, esse risco poderá ser eliminado ou controlado através da abordagem
da educação em saúde, que deve estar voltada à conscientização dessas mulheres
para a tomada de condutas que visem controlar o peso, a pressão arterial e a
debelação da dislipidemia. Tudo isso, com adoção de estilo de vida saudável
intercedido pelo exercício eficaz das atividades de autocuidado. (9) Essas
atividades cobram a necessidade de saberes fundantes: como o conhecimento dos
problemas de saúde, formas de tratamento, medidas de promoção da saúde e
prevenção de doenças(10). E as orientações de enfermagem, através de uma
intervenção sistematizada possibiita às pessoas o engajamento no autocuidado.
Experiências vivenciadas pelas mulheres com a prática do autocuidado
Cerca de 172 (86%) entrevistadas souberam que eram hipertensas mediante
intercorrências clínicas, que, na maioria das vezes, estavam relacionadas às
complicações agudas da hipertensão arterial (acidente vascular cerebral,
infarto agudo do miocárdio, hemorragia nasal, crise hipertensiva e eclâmpsia),
2(1%) foram diagnosticadas durante uma campanha de prevenção e detecção precoce
da hipertensão arterial, e as demais em virtude de medidas casuais da pressão
arterial em Postos de Saúde.
Portanto, constatou-se que o diagnóstico da HAS se deu sem que as mulheres
tivessem um conhecimento prévio da alteração. Nesse caso, percebeu-se que as
entrevistadas não desempenhavam uma prática eficaz de autocuidado para manter
um melhor nível possível de saúde, ou seja, não se evidenciou comportamento de
manutenção da saúde, porque, as mesmas procuravam os serviços de saúde somente
quando tinham queixas, e dificilmente como medida preventiva.
Quanto aos antecedentes familiares, 150 (75%) mulheres tinham história de
hipertensão arterial, 98 (49%) de infarto agudo do miocárdio e 97 (48%) de
acidente vascular cerebral.
A existência de HAS nos pais demonstrou ter importantes implicações no
surgimento dessa condição nos filhos. Além da hipertensão, diversos outros
fatores de risco para o desenvolvimento das doenças cardio-vasculares se
agregam em famílias(11).
Ressalta-se que, a maioria das entrevistadas informou mais de um caso de
antecedentes patológicos na família, e esses indicadores deveriam ter
despertado a atenção delas para o cuidado preventivo com a saúde. Diante desse
fato, pode-se fazer várias interrogações: será que essas mulheres tinham fácil
acesso ao serviço de saúde? por que só procuravam o serviço quando estavam
doentes? será que as informações ou orientações sobre prevenção e promoção de
saúde estavam sendo captadas pelas mulheres, principalmente, por parte daquelas
que cuidavam do lar?
Relacionando o tempo e a idade em que a HAS foi diagnosticada, constata-se que
essa está surgindo nas mulheres a partir dos 20 anos, como mostram os dados a
seguir. Ou seja, se elas estavam com mais ou menos três anos de diagnóstico,
então, a hipertensão foi detectada na adolescência.
De acordo com a tabela_1, a hipertensão arterial foi diagnosticada na maioria
das mulheres em idades inferiores a menopausa, ou seja, 04 (2%) se tornaram
hipertensas até aos 20 anos, 15 (7%) entre 20 e 30 anos, 43 (21%) dos 30 aos 40
anos, e entre as 58, (30%), a maioria estava entre 40 e 47 anos. Portanto,
constata-se que, mesmo com a proteção estrogênica, a mulher está exposta aos
problemas circulatórios.
Nas mulheres com idade a partir de 60 anos, a doença hipertensiva foi
identificada na maioria, aos 50 anos. Provavelmente, essas ainda estavam sobre
a proteção do estrógeno, exceto aquelas que tiveram menopausa antes dos 45
anos, pois em cinco anos a produção desse hormônio declina gradativamente. A
privação desse último, predispõe a mulher ao risco de hipertensão arterial ou
de eventos cardiovasculares, igualando-se aos homens(12).
Apesar do aumento de doenças cardiovasculares em mulheres jovens devido,
principalmente, à maior participação no mercado de trabalho, à agregação de
hábitos nocivos à saúde como tabagismo e alcoolismo, e ao uso de pílulas
anticoncepcionais; a prevalência de hipertensão arterial sistêmica e outras
doenças cardiovasculares antes da menopausa entre elas é inferior à quota
registrada em homens na mesma faixa etária. Após a menopausa, a prevalência de
HAS entre mulheres e homens tende a se igualar, ou ser maior nas mulheres,
porém essas toleram melhor os níveis pressóricos elevados(13).
Constata-se que, além do fator constitucional (cor, idade e história familiar),
o estilo de vida contribuiu para a instalação da hipertensão arterial. A
maioria das mulheres referiu ter uma vida sedentária, sem incentivo social nem
financeiro para usufruir de medidas preventivas, assim como, uma falta de
motivação para buscar outros meios para manter a vida saudável. Associam-se a
esses fatores, outras práticas ineficazes de autocuidado, como: alimentação
inadequada, preocupações, precária higiene física e mental, bem como, o
relacionamento familiar e profissional conflitante.
Essas mulheres, cuja maioria tinha idade acima de 50 anos e já eram doentes há
mais de dez anos, precisavam urgentemente de uma maior atenção dos
profissionais de saúde, especificamente do enfermeiro, a fim de que podessem
sustentar suas vidas sem agravos e livres de riscos graves. As ações
terapêuticas e educativas de enfermagem poderão ser implementadas, acompanhadas
e avaliadas constantemente, mediante plano ou programa específico para essa
clientela.
De acordo com a tabela_2, a maioria das entrevistadas procurou tratamento
especializado logo que souberam do diagnóstico da HAS, pois freqüentemente, as
clientes, embora conhecedoras do problema de saúde que as acometeu, demoraram
um certo tempo para procurar tratamento adequado, e quando procuraram,
geralmente não era seguido adequadamente.
Esse fato se relaciona à ausência freqüente de manifestações clínicas que
caracterizam a HAS. Outro aspecto, é o comportamento inadequado para a
manutenção da saúde, visto que é uma prática cultural do nosso povo, estimulada
pela falta de informações e pela indisponibilidade de recursos financeiros e de
serviços de saúde.
Em decorrência da ausência de manifestações clínicas da hipertensão arterial, a
precocidade desse diagnóstico decorre da prática rotineira e eficaz do
autocuidado da cliente que a leva a ter um comportamento adequado de manutenção
da saúde. Conseqüentemente, o diagnóstico desse problema de saúde seria precoce
e isento de lesões em órgãos-alvo, permitindo à portadora um prognóstico
satisfatório.
Na prática, observa-se que a cliente resolve procurar e seguir o tratamento
indicado, quando apresenta intercorrências e quando surgem as primeiras
manifestações clínicas do climatério. Esse fato foi constatado quando as
mulheres revelaram:
Sou hipertensa há 15 anos, porém, há 7 anos sigo rigorosamente o tratamento. A
idade está avançando e as mazelas aparecendo (E 41)
Soube que era hipertensa há 10 anos. Não liguei. Porém, iniciei o tratamento há
4 anos, quando tive edema agudo de pulmão (E 101)
Constata-se que a aderência das entrevistadas não era influenciada pelo tempo
de diagnóstico e de tratamento. Então, não existe associação entre o tempo de
diagnóstico e o de tratamento, como mostra o "teste de qui-quadrado".
Afirma-se que a cliente adere ao tratamento, quando essa desempenha
eficientemente o autocuidado em relação às condutas para o controle da
hipertensão e prevenção de complicações. As condutas são orientadas e
supervisionadas pela equipe de saúde, cuja participação significativa é do
enfermeiro, devido ao atendimento regular e sistemático à cliente, pela
existência de conhecimento de educação em saúde, oriundo de sua formação
acadêmica e da experiência na prática de cuidar, visando a promoção e
manutenção da saúde.
Vale ressaltar que o tratamento da hipertensão é basicamente uma mudança do
estilo de vida, e exige da cliente uma participação responsável para o êxito,
pois só assim, ela vai usufruir de uma vida mais saudável. Logo, cabe ao
enfermeiro ajudá-la, orientá-la e acompanhá-la na prática de autocuidado, de
forma sistemática, usando tecnologias que favoreçam a absorção do conhecimento
e o desenvolvimento da consciência crítica e reflexiva do modo de viver da
mesma como cidadã partícipe da sociedade.
Quando a cliente desempenha eficientemente o autocuidado, torna-se mais fácil a
aderência ao tratamento farmacológico, como também, ao básico, ou seja, às
medidas higieno-dietéticas; e obter maior satisfação com a vida, melhoria da
auto-imagem, da auto-estima e do convívio familiar.
Autocuidado é o cuidado que indivíduos requerem a cada dia para regularizar
seus próprios funcionamento e desenvolvimento.(14)A prática desse cuidado pelo
cliente é possibilitada pelo enfermeiro por intermédio da educação em saúde,
que o conduz a aderência às condutas preventivas e terapêuticas, tornando-
o agente de autocuidado.
Dentre as mulheres entrevistadas, para 196 (98%) foi indicada a associação dos
dois tipos de tratamento (básico e farmacológico) e somente em 4 (2%) foi
recomendado exclusivamente o básico, ou medidas higieno-dietéticas.
O tratamento básico é indicado para todo cliente hipertenso, e o sucesso dessa
modalidade de tratamento depende muito do envolvimento dos profissionais com a
cliente, pois é um momento para aplicar a educação conscientizadora e
transformadora, que tem como meta essencial levar a cliente à prática eficaz do
autocuidado. Essa prática é imperante e permeia esse tipo de tratamento. A
cliente, mesmo sendo acompanhada, ainda apresenta grande resistência quanto à
aderência a essa modalidade de tratamento, como mostram esses depoimentos:
O tratamento da pressão tira o prazer de viver (E 98).
É difícil seguir o tratamento, pois a comida sem gordura e sem sal é
terrível (E 54).
A aderência ao tratamento tem sido um grande desafio para os clientes, em
decorrência da necessidade de mudança de hábitos e rotina de práticas
culturais, significando para muitos, perder o prazer da vida, principalmente,
quando se interfere no hábito alimentar, como está evidenciado nesses
depoimentos.
De acordo com a tabela_3, 125 (63%) entrevistadas se diziam aderentes ao
tratamento, e o número de aderentes é diretamente proporcional aos anos de
tratamento. Dentre as 196 (98%) mulheres que tinham indicação dos dois tipos de
tratamento, 123 (62%) informaram ser aderentes. Portanto, verifica-se que a
aderência às modalidades de tratamento variou de 50% a 62% para ambas.
Entretanto, não existe associação entre a aderência e o tipo de tratamento (c2
=0,009; r =1,0).
Esse percentual de aderência das entrevistadas era influenciado pela
preferência ao tratamento farmacológico. Fato também observado em um estudo
(15)sobre as preferências do cliente em relação ao tipo de tratamento.
Provavelmente, o fato deve-se à cultura do nosso povo, que reconhece o
tratamento somente quando está fazendo uso de medicamento, o que influencia
nessa aderência. Os depoimentos demonstram esse fato:
Não deixo de tomar o remédio da pressão, mas raramente sigo aquelas
orientações(E 88).
Tomo sempre o remédio. Porém, as vezes abuso do sal, para ter um
pouco de prazer na vida (E 86).
Nos finais de semana, como e bebo o que quero, mas o meu remédio é
sagrado. Não deixo de tomar (E 106)
É importante enfatizar que há dificuldade na prática do autocuidado em relação
ao tratamento farmacológico, porém é ínfima em relação ao básico. O fato é
decorrente da ausência de manifestações clínicas da hipertensão arterial, que
dificulta a precocidade do diagnóstico, o seguimento e a regularidade do
tratamento indicado. Geralmente, fazem uso regular do medicamento quando se
tornam sintomáticas, ou seja, quando existe lesão em órgãos-alvo. Essas
questões são evidenciadas nos depoimentos:
Tomo o remédio quando sinto que a pressão está alta (E 189).
Não sei porque tenho que tomar este remédio, não sinto nada (E 34)
Comecei a tomar o remédio quando apareceram essa dor no peito e essa
falta de ar (E29).
Vale ressaltar que entre as entrevistadas que vivenciaram o climatério, essas
associavam à hipertensão, as manifestações desse. Essa associação as levava a
procurar o serviço de saúde e a seguir sistematicamente o tratamento.
De acordo com a tabela_4, 58 (29%) entrevistadas conheciam as complicações da
hipertensão arterial. Dessas, 40 (20%) relataram que eram aderentes.
Entretanto, 142 (71%) as desconheciam, e dessas, 85 (43%) se diziam aderentes.
Cerca de 52 (26%) não conheciam as causas, e dessas, 36 (18%) se revelavam
aderentes. Portanto, a aderência não era influenciada pelo conhecimento das
causas e complicações. Então, não existe associação entre conhecimento das
causas e complicações e a aderência, conforme valor do "qui-quadrado" (c2=
0,99).
A prática do autocuidado constitui uma habilidade, que é condicionada pela
idade, estágio de desenvolvimento, estado de saúde, condições ambientais e
efeitos terapêuticos(14). Essa habilidade é desenvolvida através da educação em
saúde, que(16) é um componente essencial do cuidado de enfermagem, e é
direcionada para a promoção, manutenção e restauração da saúde e prevenção de
doença.
A educação do cliente tem como objetivo maior o engajamento desse para o
autocuidado, aderindo ao esquema terapêutico e preventivo, a fim de que ele
atinja o melhor nível de saúde e, conseqüentemente, a melhor qualidade de vida
possível(17).
4. CONCLUSÕES
As mulheres hipertensas vivenciavam seu problema de saúde com uma prática
ineficaz de autocuidado, desencadeada por um déficit de conhecimento sobre a
doença e condutas terapêuticas, baixa escolaridade, problema socioeconômico e
familiares, e ainda por conta de condutas inadequadas de promoção de saúde.
Além da HAS, a maioria apresentava sobrepeso ou obesidade, e referiam
antecedentes familiares de doenças cardiovascular e cerebro-vascular. Esses
fatos comprometem substancialmente o estado de saúde e bem-estar dessas
mulheres, inclusive, podendo conduzi-las à terceira idade com sérios problemas
de saúde, prejudicando a qualidade de vida de cada uma.
Diante do exposto, destacamos as seguintes sugestões a fim de favorecer o
engajamento desta clientela no autocuidado, que corrobora para a conquista de
melhor nível de saúde e bem-estar.
A consulta de enfermagem deve ser um espaço favorável à exposição de queixas da
cliente. O profissional a recebe numa abordagem holística e assim, pode
identificar as necessidades de autocuidado nos aspectos bio-psíquicos e socio-
espirituais e as capacidades da cliente para execução de atividades, para
cuidar de si mesma e de sua família.
Programação de oficinas e palestras, destinadas à clientela e familiares,
abordando assuntos relevantes sobre a hipertensão arterial, e sobre a
associação com as manifestações do climatério.
Programação de um atendimento multiprofissional voltado especificamente para a
mulher no climatério, enfatizando os aspectos biopsíquicos e socioespirituais,
por meio das atividades integradas desses profissionais, objetivando o
atendimento globalizado da clientela e promovendo uma prática eficaz de
autocuidado.
Promover a saúde mediante estratégias educativas em saúde, principalmente numa
base dialógica, a enfermagem respeita os preceitos éticos e legais
internacionais, constitucionais e de sua profissão, bem como, a pessoa humana
em sua dignidade, liberdade e autonomia, concorrendo, assim, para a observância
e garantia dos direitos de cidadania, adquiridos através de lutas sociais
históricas, e para humanização dos espaços nos quais se desenvolvem os serviços
de saúde prestados à população brasileira(18).