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BrBRCVHe0034-71672014000200195

BrBRCVHe0034-71672014000200195

variedadeBr
ano2014
fonteScielo

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Mortalidade neonatal precoce relacionada a intervenções clínicas INTRODUÇÃO A mortalidade infantil refere-se aos óbitos de menores de 1 ano de vida, subdividindo-se em mortalidade neonatal (óbitos de 0 a 27 dias de vida) e mortalidade pós-neonatal (óbitos de 27 dias até 364 dias de vida). a mortalidade neonatal também é dividida em dois períodos, neonatal precoce (0 a 6 dias de vida) e neonatal tardio (7 a 27 dias de vida).

De 1930 a 2009, a mortalidade infantil no Brasil caiu de 162,4 para 22,5 óbitos por mil nascidos vivos (NV), resultando em uma diminuição de 86%. Contudo, a mortalidade neonatal, principalmente a neonatal precoce, passou a constituir, desde a década de 1990, o principal componente dos óbitos infantis, correspondendo a cerca de 70% da mortalidade infantil atual(1-2).

Esse panorama é decorrente da redução mais acentuada dos óbitos no período pós- neonatal, que reflete as desigualdades sociais, a cobertura e a qualidade da assistência à saúde. os óbitos neonatais possuem relação estreita com a assistência de saúde dispensada à gestante e ao recém-nascido durante o pré- parto, parto e atendimento imediato à criança no nascimento(3).

Outra situação relevante é a alta proporção de óbitos neonatais no primeiro dia e na primeira semana de vida, o que demonstra a relação da mortalidade neonatal com a assistência de saúde dispensada à gestante e ao recém-nascido e a necessidade de se considerar as ações dirigidas à melhoria dessa assistência (4),(2).

Estudo realizado em Cuiabá, em 2010, que analisou os óbitos neonatais de 2007, encontrou em seus resultados que a maioria dos óbitos neonatais era evitável (82%), sendo que (44%) seriam reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação e no parto; (38%) por adequada atenção ao recém-nascido e (18%) são as demais causas não claramente evitáveis(5). Essa realidade evidencia a necessidade de planejamento, implementação e monitoramento de ações voltadas para a melhoria da qualidade da assistência obstétrica e neonatal, em todos os níveis de atenção, com o acompanhamento em todo o ciclo gestacional até o pós- parto.

Ressalta-se que políticas de saúde com o objetivo de qualificar a assistência obstétrica e neonatal existem, entretanto, ineficiência de planejamento, execução e avaliação das ações propostas, resulta na falta de qualidade das consultas de pré-natal e da assistência ao parto, além da precariedade da estrutura física e tecnológica para o atendimento à gestante e ao bebê de alto risco, corroborando as altas taxas de mortalidade infantil e neonatal no país.

Um dos maiores desafios atuais para reduzir a mortalidade infantil em nosso país é o cuidado adequado do recém-nascido, além do acompanhamento de todo o ciclo gestacional até o nascimento do bebê, com atendimento de qualidade em todos os níveis de complexidade(2).

O acesso oportuno e efetivo aos cuidados obstétricos e neonatais de qualidade, desde o pré-natal, atendimento ao parto, pós-parto e aos cuidados recebidos pelo recém-nascido garantem a redução na incidência de agravos e, consequentemente, uma maior sobrevida de recém-nascidos, principalmente os recém-nascidos de risco(6).

Em Cuiabá, os óbitos neonatais reduziram em 68,8%, de 1997 a 2010, sendo que, do ano de 2009 a 2010, essa redução foi de 1,8 óbitos/1.000 NV. No entanto, no município, a mortalidade neonatal ainda é maior que a pós-neonatal(7), o que contribuiu para o índice elevado da mortalidade infantil em 2010 (13/1.000 NV).

Por isso, a mortalidade neonatal permanece como uma das metas estratégicas do atual Plano Municipal de Saúde 2010-2013, publicado em março de 2010 pela Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá, que propôs reduzir em 5% ao ano a taxa de mortalidade neonatal do município, passando de um coeficiente de 10,6 óbitos/1.000 NV em 2008, para 8,6 óbitos neonatais/1.000 NV até dezembro de 2013(7).

Nesse sentido, conhecer como se deu o processo de assistência hospitalar ao neonato, no nascimento e internação na UTI Neonatal (UTIN), poderá auxiliar na avaliação e monitoramento da qualidade das práticas assistenciais e oferecer subsídios para a efetiva redução da mortalidade neonatal. Assim, o presente estudo teve como objetivo identificar a influência das intervenções clínicas realizadas na sala de parto e UTIN no óbito neonatal precoce em Cuiabá-MT, no ano de 2010.

MÉTODOS Trata-se de um estudo transversal e descritivo, que se propôs analisar os óbitos neonatais de residentes em Cuiabá em 2010. Para isso, incluíram-se todos os recém-nascidos que nasceram em Cuiabá em 2010 e evoluíram para o óbito no período neonatal (até 27 dias de vida) no município no período de janeiro 2010 a 27 de janeiro 2011, cujas mães eram residentes nessa localidade no decorrer desse período.

Em Cuiabá, no ano de 2010, nasceram 9.177 crianças de mães residentes no município e, destas, 77 foram a óbito no período neonatal, resultando num coeficiente de mortalidade neonatal de 8,4 óbitos/1.000 NV.

De acordo com os registros do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES) e informações da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá, até dezembro de 2010 existiam 13 instituições que prestavam assistência hospitalar ao neonato no município. Destas, dois (16,7%) hospitais eram públicos, sendo um municipal e outro federal, seis (50%) privados não conveniados ao SUS, quatro (33,3%) privados conveniados ao SUS e um filantrópico(8).

As fontes de dados utilizadas no estudo foram: Declaração de nascidos vivos (DN), Declaração de óbitos (DO) dos recém-nascidos e Prontuário hospitalar da mãe e do recém-nascido da sala de parto e das UTIN de cada hospital.

As variáveis relacionadas a intervenções clínicas na assistência ao recém- nascido na sala de parto foram: reanimação cardiopulmonar, intubação, uso de surfactante e cateterismo umbilical. Por sua vez, as variáveis envolvidas no processo assistencial na UTIN foram: reanimação cardiopulmonar, intubação, ventilação mecânica, uso de surfactante, oxigenoterapia, cateterismo umbilical, nutrição parenteral, dissecção venosa, antibioticoterapia, hemotransfusão e cateter central de inserção periférica (PICC). As demais variáveis assistenciais analisadas foram: setor de internação do RN e do óbito; em relação à mãe, foram consideradas as condições de saúde materna na internação e motivo de indicação de cesárea.

A coleta dos dados foi realizada em duas etapas com auxílio de um formulário elaborado pelas pesquisadoras. Primeiramente, identificaram-se todos os óbitos dos nascidos vivos no ano de 2010 através das DO, e posteriormente localizaram- se as DN dos recém-nascidos que evoluíram para o óbito. A segunda etapa foi a identificação do hospital de ocorrência do nascimento, internação e óbito do recém-nascido para a coleta de informações nos respectivos prontuários. Os dados foram coletados no período de janeiro a fevereiro de 2011.

Para tratamento e análise dos dados, empregou-se o software aplicativo Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) para Windows, versão 15.0.

Utilizaram-se cálculos de frequência absoluta e relativa para descrever as principais características e sua constância nos óbitos precoces. Os cálculos estatísticos realizados foram o teste Qui-quadrado (Χ2) ao nível de significância igual a 5%, para verificar a possível associação entre as variáveis independentes e a presença do óbito neonatal precoce; e o Teste de Fischer para determinar o valor de p, quando o valor das variáveis era inferior a cinco. Calculou-se também a Razão de Prevalência, para verificar quantas vezes a prevalência do fator de risco nos casos (óbitos precoces) era maior que a prevalência do fator de risco nos controles (óbitos tardios) e o Intervalo de Confiança (95%) para verificar a significância estatística a um nível de 5%.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Júlio Müller sob protocolo 968/CEP-HUJM/2010, conforme as diretrizes da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS O coeficiente de mortalidade neonatal em 2010, de mães residentes em Cuiabá, foi de 8,4 óbitos/1.000 NV, com maior concentração dos óbitos no período neonatal precoce (6,1 óbitos/1.000 NV) em detrimento do período neonatal tardio (2,3 óbitos/1.000 NV) e do período pós-neonatal (4,6 óbitos/1.000 NV).

Em relação às características dos recém-nascidos, 61,0% era do sexo masculino; 74,7% era da raça parda, 21,3% da raça branca e, ainda, 2,7% da raça preta e 1,3% indígena. A média de duração da gestação foi de 30,8 semanas (mínimo de 19 semanas; máximo de 42,1 semanas), sobressaindo os neonatos prematuros (idade gestacional <37 semanas), com 75,3%, com predomínio dos prematuros extremos (idade gestacional de 22 a 32 semanas) com 50,6%; os recém-nascidos a termo (idade gestacional de 37 a 40 semanas) corresponderam a 22,1% e, ainda, os pós- termos (idade gestacional >40 semanas) a 7,8%. A média do peso ao nascer foi de 1.662 gramas (mínimo 375 gramas; máximo 4.140 gramas), com maior frequência dos neonatos de baixo peso (<2.500 gramas) com 72,8%, sendo que, dentre esses, percentual considerável era de extremo baixo peso (500 a 999gramas) (31,2%) e, ainda, 7,8% tiveram peso inferior a 500 gramas. Os recém-nascidos de peso adequado (>2.500 gramas) corresponderam a 27,2%. O tipo de parto predominante foi o cesáreo, com 51,9%, sendo que desses recém-nascidos, 76,9% morreram na primeira semana de vida.

Quanto ao local de nascimento, 97,4% dos neonatos nasceram no hospital e 2,6% na residência da mãe. A maioria dos neonatos, 72,7%, nasceu com quadro de asfixia (Apgar <7 no minuto). E entre os que morreram na primeira semana de vida, 78,57% tiveram Apgar menor que 7 no minuto e 80,6% Apgar menor que 7 no minuto.

Ao considerar as principais intervenções clínicas na assistência imediata aos recém-nascidos na sala de parto e sua associação com o óbito neonatal precoce, verificou-se que 72,2% dos neonatos, que morrem na primeira semana de vida, necessitaram de reanimação cardiopulmonar, com risco de 1,47 vezes maior em relação aos que não foram reanimados. E o teste Qui-quadrado mostrou-se significante estatisticamente (p= 0,02 IC95%[0,97;2,23]). Além disso, a maioria das crianças que foi a óbito precoce foi intubada (61,11%), com risco 1,35 vezes mais do que os demais e o valor do teste Qui-quadrado também mostrou relevância estatística (p= 0,04 IC95% [0,97;1,87]) (Tabela_1).

Tabela 1 - Principais intervenções clínicas na assistência imediata aos recém- nascidos na sala de parto e sua associação com o óbito neonatal precoce, Cuiabá-MT, 2010  Variáveis   Óbito precoceTotal N = 72* Valor-p** RP*** IC%95**** RCP Sim 42(80,7%) 52(72,2%) 0,02 1,47 [0,97;2,23]   Não 11(55,0%) 20(27,7%)       Intubação Sim 36(81,8%) 44(61,1%) 0,04 1,35 [0,97;1,87]   Não 17(60,7%) 28(38,8%)       Surfactante Sim 7(63,6%) 11(15,2%) 0,31® 0,84 [0,53;1,35]   Não 46(75,4%) 61(84,7%)       Cateterismo Sim 11(64,7%) 17(23,6%) 0,25® 0,85 [0,58;1,24] umbilical   Não 42(76,3%) 55(76,3%)       *5 recém-nascidos excluídos, informações em branco; **Valor do teste qui-quadrado; ***Razão de prevalência; ****Intervalo de Confiança a 95%; ®Valor do Teste de Fisher; Reanimação cardiopulmonar.

O uso de surfactante e cateterismo umbilical não demonstrou associação estatisticamente significativa com a mortalidade neonatal precoce. Entretanto verificou-se que entre os neonatos que morreram na primeira semana de vida a maioria não usou surfactante (RP=0,84 p=0,31 IC95%[0,53;1,35]) e cateterismo umbilical (RP=0,85 p=0,25 IC95%[0,58;1,24]) (Tabela_1).

Após os primeiros cuidados depois do nascimento, 81,8% dos recém-nascidos foram encaminhados à UTIN e, destes, 6,5% foram transferidos a outro hospital por falta de leitos ou do serviço no local de nascimento. Ainda, 9,1% dos recém- nascidos foram a óbito em sala de parto; 6,5% foram conduzidos da sala de parto para o alojamento conjunto e dos neonatos internados em UTIN, 6,5% chegaram a receber alta do hospital.

No momento da internação na UTIN, 60,0% dos neonatos estavam em estado clínico grave, 3,0% em parada cardiorrespiratória, 26,2% em estado moderado/regular e 10,8% em bom estado clínico.

Em relação às principais intervenções durante internação na UTIN e sua associação com o óbito neonatal precoce, verificou- -se que a hemotransfusão (RP= 0,71 p=0,04 IC95%[0,50;1,02]) e o PICC (RP=0,44 p<0,0001 IC95%[0,25;0,77]) configuraram-se como fatores de proteção para o óbito precoce e o teste Qui- - quadrado mostrou significância estatística (Tabela_2).

Tabela 2 - Principais intervenções clínicas durante a internação dos recém- nascidos na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e sua associação com o óbito neonatal precoce, Cuiabá-MT, 2010  Variáveis Óbito precoceTotal N = 64* Valor-p** RP*** IC%95**** RCP Sim 37(71,1%) 52(81,2%) 0,50® 1,07 [0,69;1,65]   Não8(66,6%) 12(18,7%)       Intubação Sim 34(69,3%) 49(76,5%) 0,52® 0,95 [0,66;1,35]   Não11(73,3%) 15(23,4%)       Ventilação mecânicaSim 39(69,6%) 56(87,5%) 0,55® 0,93 [0,60;1,44]   Não6(75,0%) 8(12,5%)       Surfactante Sim 29(69,0%) 42(65,6%) 0,75 0,99 [0,69;1,32]   Não16(72,7%) 22(34,3%)       Oxigenoterapia Sim 39(68,4%) 57(89,0%) 0,32® 0,80 [0,56;1,13]   Não6(85,7%) 7(10,9%)       Cateterismo umbilical Sim 34(75,5%) 45(70,3%) 0,15 1,31 [0,86;1,98]   Não11(57,8%) 19(29,6%)       Nutrição parenteral Sim 33(66,0%) 50(78,1%) 0,13® 0,77 [0,57;1,03]   Não12(85,7%) 14(21,8%)       Dissecção venosa Sim 5(55,5%) 9(14,0%) 0,25 0,76 [0,42;1,40]   Não40(72,7%) 55(85,9%)       Antibioticoterapia Sim 34(66,6%) 51(79,6%) 0,17® 0,79 [0,58;1,07]   Não11(84,6%) 13(20,3%)       Hemotransfusão Sim 16(57,1%) 28(43,7%) 0,04 0,71 [0,50;1,02]   Não29(80,5%) 36(56,2%)       PICC Sim 8(38,1%) 21(32,8%) <0,0001 0,44 [0,25;0,77]   Não37(86,0%) 43(67,2%)       *13 recém-nascidos foram excluídos pois não ficaram internados; **Valor do teste qui-quadrado; ***Razão de prevalência; ****Intervalo de Confiança a 95%; ®Valor do Teste de Fisher; Reanimação cardiopulmonar; Cateter central de inserção periférica.

Por sua vez, entre os recém-nascidos que foram a óbito precoce, a maioria foi submetida ao cateterismo umbilical (RP=1,31 p=0,15 IC95%[0,86;1,98]) e a reanimação cardiopulmonar (RP=1,07 p=0,50 IC95%[0,69;1,65]) (Tabela_2).

DISCUSSÃO Apesar de a mortalidade neonatal estar relacionada a uma série de fatores de origem biológica (condições antenatais da saúde materna), social/ambiental e assistencial (qualidade do pré-natal), o óbito neonatal, especialmente o precoce, resulta dos cuidados neonatais imediatos na sala de parto e em unidades de terapia intensiva neonatal(3).

A sala de parto e de recepção do recém-nascido é um setor imprescindível para o nascimento saudável do bebê, pois é nesse local que são realizados os primeiros cuidados, voltados principalmente para a manutenção do padrão respiratório e controle térmico. É, portanto, de extrema importância que sua estrutura ofereça condições para se prestar um atendimento de qualidade com consequente impacto na redução da mortalidade neonatal.

Em relação ao parto, ainda existe despreparo para o cuidado imediato das complicações do parto/nascimento, como a reanimação e estabilização materna e neonatal, condição sine qua non para o funcionamento de qualquer serviço, dada a imprevisibilidade das complicações que são esperadas para os partos, mesmo na gestação de baixo risco. Ressalta-se, também, o número elevado de mortes por asfixia intraparto, sobretudo de crianças com peso adequado ao nascer e em gravidez de baixo risco, demonstrando o grande potencial de evitabilidade dessas mortes, além de que muitas vezes, mulheres e crianças em situações clínicas graves, são transferidas sem sequer receber o primeiro atendimento recomendado, comprometendo seriamente o resultado final(4).

Esse despreparo é evidente ao constatarmos que apesar de 97% dos partos no País acontecerem, predominantemente, em ambiente hospitalar e com assistência médica, a grande maioria das mortes maternas e neonatais é decorrente de causas evitáveis no período periparto( 9). Neste estudo, mais de 90% dos nascimentos ocorreram no hospital com assistência do médico pediatra, entretanto, a maioria dos neonatos nasceu com quadro de asfixia (Apgar no e minuto menor 7).

O índice de Apgar menor que 7 no e minuto é considerado um fator de risco para a mortalidade neonatal. Por isso a relevância de uma assistência obstétrica e neonatal de qualidade, a fim de amenizar os fatores que podem levar à hipóxia perinatal e consequentemente ao óbito neonatal(10). Neste estudo verificou-se que entre os neonatos que morreram na primeira semana, mais de 70% tiveram Apgar menor que 7 no e minuto, sendo que a maioria foi reanimada em sala de parto, se revelando como fator de risco para o óbito precoce.

Resultado semelhante foi encontrado no estudo realizado em Londrina, Paraná, em 2007, que destaca a importância do preparo da equipe para o atendimento na reanimação cardiopulmonar em sala de parto. Essa prática é utilizada para prevenção de asfixia/anóxia perinatal com comprometimento cerebral irreversível, dentre outros, além de ser considerada uma ferramenta importante para a redução da mortalidade neonatal(11).

No presente estudo, mais de 60% dos recém-nascidos foram intubados. A intubação neonatal é uma ferramenta importante para a manutenção das vias áreas e oxigenação, principalmente nos recém-nascidos prematuros que necessitarão de ventilação mecânica e administração de surfactante pulmonar. Alguns serviços preconizam intubar os recém-nascidos com peso menor que 1.000g ainda na sala de parto, devido sua imaturidade pulmonar(12).

Nas últimas décadas, as inovações tecnológicas na assistência neonatal intensiva, bem com seu uso adequado, interferiram drasticamente na sobrevivência dos neonatos. Assim, na atenção neonatal, especialmente no setor de terapia intensiva, a qualidade deve ser uma preocupação diária, que ela é fundamental para se alcançar níveis satisfatórios de assistência e contribuir na diminuição dos índices de mortalidade neonatal(13).

Algumas variáveis relacionadas à assistência na sala de parto e internação do recém-nascido, têm sido descritas como fatores de risco tanto para o baixo peso ao nascer e prematuridade, como para a mortalidade neonatal precoce(14-15). No entanto, o presente estudo encontrou associação apenas para a reanimação cardiopulmonar e intubação, que por sua vez configuraram-se como fatores de risco para o óbito precoce; a hemotransfusão e o PICC, que também apresentam associação estatística significativa, mostraram-se como fator de proteção para o óbito na primeira semana de vida.

O PICC é um procedimento extremamente benéfico em recém-nascidos prematuros extremos que necessitam de hidratação venosa e nutrição parenteral por mais de sete dias e com manuseio restrito, evitando assim a prática desnecessária e dolorosa das punções periféricas de repetição, tricotomia do couro cabeludo e dissecção venosa(12). Desta forma, a instalação e manutenção adequada do PICC aumentará a mobilidade do recém-nascido, amenizará o desconforto/dor e o risco de infecção sanguínea.

A ventilação mecânica, o surfactante e os corticosteróides antenatais foram descritos como fatores importantes associados ao risco de morte em algumas pesquisas(14-15). Todavia neste estudo essas variáveis não apresentaram associação estatística significativa com o óbito precoce, assim como intubação, oxigenoterapia, cateterismo umbilical, nutrição parenteral, dissecção venosa e antibioticoterapia, talvez pelo tamanho pequeno da amostra.

No entanto, verificou-se que entre os recém-nascidos que morreram na primeira semana de vida, a maioria não usou surfactante e cateterismo umbilical em sala de parto. Por sua vez, durante a internação, entre os óbitos precoces, a maior parte dos recém-nascidos necessitou de cateterismo umbilical e reanimação cardiopulmonar.

O cateterismo umbilical é utilizado em recém-nascidos em estado clínico grave que, na maioria das vezes necessita de reanimação cardiopulmonar e drogas vasoativas. Por isso, recomenda-se a cateterização ainda em sala de parto para todos os bebês que nascem em estado grave(12), e quando esse procedimento é feito somente na internação, supõe-se que esse recém-nascido teve uma piora do seu estado de saúde.

Com o surgimento do surfactante, o uso do corticóide antenatal e pós-natal e de técnicas ventilatórias, tornou-se possível controlar a insuficiência respiratória da maioria dos recém-nascidos. No entanto, tais práticas devem ser usadas em momentos oportunos e adequadamente associadas às demais técnicas, para se ter resultado satisfatório. Por isso, intervenções para minimizar a insuficiência respiratória e lesão pulmonar devem iniciar-se no período gestacional, administrando corticóide antenatal em todas as gestantes com risco para parto prematuro e, na sala de parto, com o uso do surfactante antes que o recém-nascido chegue a UTI(16-17).

O uso do surfactante diminui o risco de óbito por estabilizar os alvéolos, aumentando a capacidade residual funcional do pulmão, melhorando a relação ventilação-perfusão e, consequentemente, corrigindo a hipoxemia(18).

Em estudo realizado em Fortaleza-CE, sobre a morbimortalidade hospitalar de recém-nascidos de muito baixo peso foi observado pequeno percentual de intervenções perinatais, como controle pré-natal, uso de corticóide antenatal e parto cesáreo nos casos de indicação benéfica. Na sala de parto e na UTIN predominou um padrão mais intervencionista como maior uso de intubação e ventilação mecânica. Foi detectado também o uso de terapêuticas utilizadas em momento inapropriado, como o surfactante e a indometacina(14).

Outra pesquisa realizada em 11 unidades de terapia intensiva neonatal da América do Sul que avaliou os fatores de risco para morte neonatal revelou que a variação das taxas de mortalidade entre UTI neonatais pode ser explicada pela falta de implementação de terapias de baixo custo e comprovadamente benéficas, como a administração de corticóide antenatal(19). Os neonatos expostos ao uso do corticóide antenatal apresentam melhores condições de nascimento, com menor necessidade de intervenções agressivas, melhor desempenho respiratório, e redução do uso de surfactante exógeno, e permanecem por menos tempo em ventilação artificial mecânica(20).

Como se pode ver pelos resultados dos estudos, fatores de risco importantes associados ao óbito neonatal precoce são passíveis de intervenções, como a melhora das condições de vitalidade ao nascer e a redução da incidência e/ou gravidade da síndrome do desconforto respiratório com o uso otimizado do corticoide antenatal e do surfactante pós-natal(17). Diante desse fato, pode-se concluir que algumas práticas assistenciais desenvolvidas no pré-natal, parto e UTIN podem influenciar o desfecho estudado, mortalidade neonatal precoce.

Além disso, a maioria das causas dos óbitos neonatais são preveníveis por meio de condutas adequadas ao controle da gravidez (pré-natal) e de atenção ao parto e aos cuidados imediatos ao recém-nascido. Por isso, torna-se mister o monitoramento e entendimento dos fatores que agem como determinantes da mortalidade neonatal, para identificar grupos expostos a diferentes variáveis de risco e sua relação com a evolução para óbito, auxiliando no enfoque da evitabilidade(9).

Nesse sentido, é de vital importância a realização de intervenções intersetoriais, dirigidas à melhoria das condições de vida e de saúde das mulheres, tanto como um direito e necessidades das próprias mulheres, quanto para a garantia do nascimento seguro e sobrevivência dos neonatos.

CONCLUSÃO O presente estudo se propôs a identificar as intervenções realizadas na sala de parto e UTIN no óbito neonatal precoce em Cuiabá, no ano de 2010.

Quanto às principais intervenções clínicas em sala de parto e na UTIN e sua relação com o óbito neonatal precoce, na análise bivariada, o teste estatístico Qui-quadrado mostrou significância estatística entre o óbito precoce e a reanimação cardiopulmonar e a intubação em sala de parto, configurando-se como fatores de risco para o óbito precoce. Durante a internação na UTIN, o uso do PICC e a hemotransfusão mostraram-se como fatores de proteção para o óbito precoce.

Conhecer como se a prática clínica dos cuidados ao recém-nascido em sala de parto e durante a internação em UTIN e qual a suposta associação desta com a mortalidade precoce, pode oferecer subsídios aos profissionais e gestores de saúde para o planejamento das ações e controle da qualidade dos serviços obstétricos e neonatais, de modo a reduzir os fatores de risco que prejudicam a saúde do neonato, culminando com o óbito.

Apesar da utilidade dos sistemas de informações (Declaração de óbitos, Declaração de nascimentos) para pesquisas nos serviços de saúde, especialmente da mortalidade neonatal, o uso de dados secundários muitas vezes, por problemas no preenchimento e informações incompletas, não permitem a verificação de algumas variáveis e tampouco o seu controle. Essa foi uma limitação do presente estudo.

Nesse sentido, a realização de mais estudos utilizando esses bancos de dados, citados acima, pode apontar além de vantagens, outras limitações que contribuíram para a melhoria do preenchimento e das informações desses sistemas.


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