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BrBRCVHe0034-71672014000400543

BrBRCVHe0034-71672014000400543

variedadeBr
ano2014
fonteScielo

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Alteração de taxa de filtração glomerular em pacientes hipertensos do município de Vitória-ES INTRODUÇÃO A hipertensão arterial (HAS) é uma das doenças cardiovasculares mais prevalentes, e estudos nacionais estimam que afeta entre 20% a 43,9% da população brasileira( 1 ).

Atinge mais de 30% na população adulta( 1 ) e uma das complicações da doença hipertensiva é a redução da função renal que, com o tempo pode evoluir para doença renal crônica (DRC) com necessidade de terapia renal substitutiva (TRS).

Acredita-se que apenas 50% dos brasileiros com DRC terminal tenham acesso a alguma modalidade de TRS( 2 ). Hoje, cerca de 35% dos doentes renais crônicos terminais em diálise no Brasil têm a hipertensão como diagnóstico de base( 3 - 4 ). Nesse senti-do, a hipertensão no Brasil ainda é a principal causa de doença renal crônica terminal, diferentemente do que ocorre nos EUA e em países da Europa, em que o diabetes mellitus é a causa mais comum, principalmente quando associada à obesidade, agravo esse que vem crescendo em vários países do mundo( 5 ).

Outros fatores que contribuem para diminuição da função renal de uma forma geral são obesidade, idade, história familiar de doença renal, glomerulopatias, doenças autoimunes, infecções urinárias de repetição, uropatias obstrutivas, litíase urinária, doenças cardiovasculares e de diabetes mellitus, doenças genéticas e neoplasia( 6 ).

A doença renal crônica pode ser definida como a perda progressiva e irreversível da função renal, caracterizada pela diminuição da filtração glomerular (FG). A melhor forma de quantificar a função renal é mediante cálculo do clearance, definido como a taxa na qual uma substância é removida do plasma por unidade de tempo( 7 ).

Usualmente, a creatinina sérica é o marcador endógeno para teste de função renal. Pode ser usada isoladamente ou compondo o cálculo do clearance de creatinina com amostra de urina de 24 ou 12 horas( 8 ).

O método de dosagem de creatinina sérica isolada não é mais considerado um bom parâmetro para avaliação da função renal, uma vez que seu resultado apresenta muitas variações de acordo com a idade, peso, sexo, massa muscular e tipo de dieta( 9 ). Por outro lado, o método de clearance apesar de ser o padrão ouro, apresenta como dificuldade a coleta de urina por 24 horas pelo paciente.

Considerando o tempo dispensado para a realização do clearance e as possíveis falhas na coleta da urina que podem comprometer o resultado tem sido utilizadas fórmulas para estimar a filtração glomerular. Elas são práticas e podem ser usadas por profissionais de saúde generalistas que atendem na rede de atenção básica à saúde( 1 , 3 , 6 ).

Utiliza-se e recomenda-se o uso da MDRD( 1 ), porém a fórmula de Cocrockft- Gault é o método de escolha do Ministério da Saúde nos protocolos de atendimento ao hipertenso na atenção primária para estimar a FG, mediante a depuração de creatinina sem coleta de urina 24 horas( 6 ).

A estimativa da função renal é muito importante, pois pode auxiliar no diagnóstico precoce de doenças renais e nas decisões para condutas preventivas e terapêuticas em paciente de risco, considerando que são doenças que decorrem de perdas progressivas e irreversíveis na funcionalidade do órgão, seja por hipertensão sistêmica a longo prazo ou outros agravos( 10 - 12 ).

A população adulta do município de Vitória-ES tem prevalência elevada de hipertensão de 38,2%( 13 ). Porém, ainda não foram encontrados estudos que descrevam a prevalência de filtração glomerular alterada em hipertensos atendidos em serviços de atenção básica. No Brasil, também poucos dados sobre a prevalência da doença renal na população( 13 - 14 ).

Este estudo parte da premissa de que os hipertensos se beneficiariam quando diagnosticada lesão renal em fase inicial, pois possibilitaria a proposição da equipe em monitorar a condição clínica no sentido de retardar a progressão da lesão renal.

O objetivo desta pesquisa foi avaliar, mediante a fórmula Cocrockft-Gault, a prevalência de filtração glomerular alterada e os fatores associados em hipertensos atendidos pela atenção primária no município de Vitória - ES.

MÉTODO Trata-se de um estudo epidemiológico, observacional, de corte transversal, com dados secundários, obtidos em prontuários de pacientes hipertensos atendidos nas Unidades de Saúde (US) do município de Vitória-ES, no ano de 2009.

O planejamento da amostragem considerou dois estágios e as US foram os conglomerados. Foi obtida, na Secretaria Municipal de Saúde de Vitória, a relação de hipertensos cadastrados nas US até o ano de 2009 e, a partir desses dados, criou-se o critério de inclusão para entrada das unidades, que foi possuir, no mínimo, 500 hipertensos cadastrados, entendendo-se que, por ser um maior número, a equipe de profissionais tivesse mais habilidade no manejo clínico e na solicitação de exames, conforme os protocolos.

Das 28 unidades existentes, 13 foram excluídas por não atenderem a esse critério e as 15 restantes tiveram representação em todas as seis macrorregiões de saúde do município. Quando havia em uma macrorregião duas a três US que atendiam o critério de inclusão, sorteava-se entre elas uma unidade. Quando havia mais de três US, eram sorteadas duas delas. Ao final, sete US foram selecionadas.

O número de hipertensos em cada US foi proporcional ao número de cadastros daquela unidade e foram selecionados os prontuários conforme a listagem dos pacientes hipertensos fornecida pelos serviços.

A partir desse momento, duas dificuldades surgiram: somente uma unidade disponibilizou a relação completa dos hipertensos e a inexistência de dados no prontuário, principalmente registros de creatinina sérica e do peso corpóreo, essenciais na avaliação da filtração glomerular pela fórmula de Cocrockft- Gault. Diante disso, todos os prontuários dos usuários existentes nas listas disponibilizadas foram avaliados até a obtenção do número esperado de sujeitos em cada US.

Para o cálculo da amostra, foi utilizada a fórmula para estudos transversais com populações finitas do programa estatístico Epi-Info e considerados os parâmetros: nível de significância de 95%; prevalência do agravo em saúde de 50%, pois não foram encontradas informações na literatura sobre a prevalência de doença renal crônica em hipertensos; tamanho da população de 18.788 hipertensos cadastrados no HIPERDIA no município; erro amostral de 5%. Para que a amostra fosse capaz de evidenciar a correlação/dependência existente entre os indivíduos de uma mesma US e também corrigir uma diferença no tamanho amostral (correlações introduzidas pelos conglomerados que são as US dentro de cada região), utilizou-se o efeito do desenho 2, com a amostra final de 754 prontuários.

Os critérios de inclusão foram: prontuários de pacientes com idade maior ou igual a 18 anos, com registro de pelo menos um resultado de creatinina sérica no ano de 2009, peso e altura do paciente. Os pacientes que, além de hipertensão, tinham diabetes foram excluídos da pesquisa por pertencerem a um grupo de risco maior para desenvolvimento de lesão renal.

Um roteiro foi utilizado para coleta de dados no prontuário, como data de nascimento, sexo, altura, peso, creatinina sérica, pressão arterial e número de consultas realizadas.

A função renal pode ser avaliada por diversos métodos e dentre eles temos a estimativa da filtração glomerular mediante o uso de equações utilizadas na prática clínica em todo o mundo.

A primeira a ser desenvolvida, em 1976, foi a fórmula de Cocrockft-Gault (CG) que, por incluir o peso no seu cálculo, tende a superestimar a FG, principalmente em obesos e em pacientes com edema importante( 11 , 15 - 16 ).

Na tentativa de minimizar a limitação da CG, outras pesquisas foram realizadas e, em 1999, foi criada a equação do Modification of Diet in Renal Disease Study (MDRD) que também tem limitações, pois considerou uma amostra muito específica com pacientes que apresentavam filtração glomerular alterada( 11 ).

Nesse sentido, ambas as fórmulas devem ser usadas com precaução, principalmente em subgrupos de pacientes que não foram incluídos nos estudos originais Cocrockft-Gault e MDRD), como crianças, idosos, obesos, desnutridos, gestantes, pacientes com doença hepática e aqueles que realizaram transplante renal.

Todavia, essas fórmulas são validadas e empregadas para identificar alteração da filtração glomerular, principalmente em pacientes com fatores de riscos para o desenvolvimento de doença renal, como os hipertensos( 17 ).

A filtração glomerular estimada foi calculada a partir do clearance de creatinina baseada na fórmula de Cockcroft-Gault: ClCr (ml/min/1,73m2) =(140- idade) x peso/ 72x Cr sérica (mg/dl) x (0,85) se mulher( 15 ).

Considerou-se o ponto de corte de FG 60ml/min para representar função renal normal e FG < 60ml/min para função renal reduzida, segundo os critérios adotados pelo Ministério da Saúde( 6 ).

Os parâmetros de pressão arterial utilizados foram: controlada, se pressão sistólica <140 mmHg e pressão diastólica < 90 mmHg; e não controlada, quando igual ou maior a um desses valores( 1 ).

Quanto ao IMC calculado a partir do peso e altura registrados em prontuário, utilizou-se a referência da OMS, que considera: baixo peso quando <18,5 (kg/ m2); peso normal quando 18,5-24,9 (kg/m2); sobrepeso: 25 a 29,9 (kg/m2); e obesidade 30(kg/m2). Paralelamente, utilizou-se também a classificação do IMC para idosos: magreza quando < 22 (kg/ m2); eutrófico de 22-27 (kg/m2); excesso de peso > 27 (kg/m2).

Em relação aos valores de creatinina sérica, foi utilizado, como referência, o laboratório central da Prefeitura Municipal de Vitória, uma vez que todos os pacientes atendidos pela rede básica de saúde tendem a fazer seus exames nesse laboratório. O método utilizado de dosagem foi o Jaffé modificado com ponto de corte de 0,5 a 0,9mg/dl para mulheres e 0,7 a 1,2mg/dl para homens.

Para análise dos dados, foi realizado o teste qui-quadrado, ou teste exato de Fisher, quando necessário, como medida de associação entre variáveis para estudos de prevalência. Foi considerado o nível de significância de 5% (p-valor < 0,05). Utilizou-se o pacote de dados SPSS versão 15.0.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Espírito Santo sob 018/10, em 24 de março de 2010.

RESULTADOS Foram analisados 2.551 prontuários, uma vez que a coleta foi interrompida mediante a meta da amostra de 754 pacientes.

A análise descritiva dos dados encontra-se nas Tabelas_1 e 2. Foram analisados 754 prontuários de hipertensos, dentre os quais 67,2% (507) eram do sexo feminino. A média de idade foi de 58,18 (±13,52) anos. Os idosos (60 anos ou mais) representaram 45,2% (341) da amostra.

Tabela 1 Medidas descritivas da idade, variáveis clínicas, número de aferições da pressão arterial e consultas (n=754). Vitória-ES, 2009  Variáveis MínimoMáximoMediana MédiaDesvio padrão Idade 18 91 57 58,2 13,5 Creatinina 0,3 4,8 0,8 0,8 0,3 Filtração glomerular 21 349,1 90,2 97,1 44,4 Pressão sistólica* 100 210 135 137,7 17,7 Pressão diastólica * 60 145 86,7 87,2 11,3 IMC* 15,4 54,1 28,1 28,9 5,9 Número de aferições da press? 0 6 3 2,8 1,3 Número de consultas 1 6 3 3,2 1,4 *Foi considerada a media das medidas e aferições no ano de 2009.

Tabela 2 Distribuição dos hipertensos, segundo características sociodemográficas, filtração glomerular, índice de massa corpórea e pressão arterial (n=754). Vitória-ES, 2009  Variáveis n % Total 754 100 Sexo      Masculino 247 32,8  Feminino 507 67,2 Faixa etária      18 a 59 anos 413 54,8  60 a 91 anos 341 45,2 Número de aferições da      Nenhuma/Uma 128 16,9  Duas/ Três 423 56,1  Mais de três 203 26,9 Número de consultas      Uma 66 8,8  Duas/ Três 406 53,9  Mais de Três 282 37,4 Pressão arterial (mmHg)      Não controlada 429 56,9  Controlada 315 41,8  Sem informação 10 1,3 Creatinina (mg/dl)      Normal 684 90,7  Elevada 70 9,3 FG - (ml/min)      ≥90 ml/min 379 50,2  60 a 89 ml/min 220 29,2  30 a 59 ml/min 143 19,0  29 a 15 ml/min 12 1,6 IMC para adultos (Kg/m2)      Baixo peso/Eutrófico 198 26,3  Sobrepeso 268 35,5  Obesidade 288 38,2 IMC para idosos (Kg/m2)      Baixo peso /Eutrófico 238 30,2  Excesso de peso 516 68,4 As médias de pressão sistólica e diastólica foram 137,7 mmHg (DP±19,58) e 87,2 mmHg (DP±11,25), respectivamente, compatíveis com pressão arterial controlada (Tabela_1). Porém quando foram avaliadas as médias das pressões sistólica e diastólica em conjunto, a maioria 56,9% (429) dos sujeitos estava com a pressão não controlada (Tabela_2).

Em relação à estimativa da FG, observou-se na Tabela_2 que 79,4% (599) da amostra tiveram clearance 60 ml/ min compatível com função renal normal (FG 90ml/min) ou lesão renal leve (FG entre 60-89ml/min) e 20,6% (155) tiveram filtração glomerular reduzida (FG < 60ml/min) indicando lesão renal moderada. A média da FG foi de 97,1ml/ min (DP±44,36).

Quanto à estatística inferencial, houve significância entre FG e as variáveis sexo (p 0, 001), faixa etária (p 0,000), creatinina (p 0,000) e IMC (p 0,000) (Tabela_3).

Tabela 3 Distribuição da prevalência de filtração glomerular (FG) alterada segundo características da amostra (n = 754). Vitória-ES, 2009  Variáveis FG (Cockcroft-Gault) p-valor* RP** IC 95%*** < 60 ml/min 60 ml/min Sexo     0,001      Masculino 68 (27,5%) 179 (72,5%)   1,60 1,15-2,23  Feminino 87 (17,2%) 420 (82,8%)   1   Faixa etária     0,000      60 ou mais 143 (41,9%) 198 (58,1%)   14,43 8,01-28,59  18 a 59 anos 12 (2,9%) 401 (97,1%)   1   PA (mmHg)     0,253      Não controlada 94 (21,9%) 335 (78,1%)   1,19 0,85-1,68  Controlada 58 (18,4%) 257 (81,6%)   1   IMC adultos     0,000*      Baixo peso 13 (92,9%) 1 (7,1%)   2,19 1,12-3,97  Eutrófico 78 (42,4%) 106 (57,6%)   1    Excesso de peso 64 (11,5%) 492 (88,5%)   0,27 0,19-0,38 IMC idosos     0,000      Baixo peso 38 (86,4%) 6 (13,6%)   2,30 1,51-3,44  Eutrófico 73 (37,6%) 121 (62,4%)   1    Excesso de peso 44 (8,5%) 472 (91,5%)   0,23 0,15-0,33 Creatinina (mg/dl)     0,000      Normal 103 (15,1%) 581 (84,9%)   1    Elevada 52 (74,3%) 18 (25,7%)   4,93 3,46-6,95 *Qui-quadrado **RP- Razão de Prevalência ***IC: Intervalo de Confiança Os dados antropométricos mostraram, segundo o IMC obtido, que 35,5% (268) apresentavam sobrepeso e 38,2% (288) obesidade. Uma vez que a amostra é composta de 45,2% de idosos, também foi utilizada a classificação do IMC para idosos segundo a Organização Mundial de Saúde.

Constatou-se que 68,3% (516) apresentavam excesso de peso. Destaca-se que essa última classificação não discrimina sobrepeso e obesidade, agrupando-os como excesso de peso.

Foi realizada a razão de prevalência para calcular a contribuição das variáveis na função glomerular reduzida. Observou-se que sua prevalência foi quase 15 vezes maior em idosos em relação aos não idosos, quase 5 vezes maior naqueles com creatinina elevada, 2,19 vezes nos hipertensos com baixo peso e 1,6 vez mais prevalente em homem.

O modelo de regressão não foi usado neste estudo, pois, das quatro variáveis que mostraram associação com FG, duas delas - idade e creatinina - são elementos da fórmula de Cocrockft-Gault e poderiam interferir nos resultados da associação.

Destaca-se que, dos 155 pacientes com filtração glomerular reduzida, 103 (66,4%) apresentavam creatinina normal.

DISCUSSÃO Destaca-se, como limitação, ser este um estudo transversal de dados secundários e, dessa forma, não ter sido possível estabelecer uma relação de causa e efeito entre FG reduzida e fatores associados, como idade, sexo e IMC.

Ainda houve dificuldade na obtenção de informações referentes à relação dos hipertensos atendidos nas unidades, de forma que pudesse ser acessado seu prontuário. Observou-se que esse é um trabalho manual e individual de cada equipe, o que dificulta a identificação dessa clientela.

Estudos brasileiros com hipertensos evidenciam a predominância de mulheres nos inquéritos e sugerem essa predominância à maior procura delas ao cuidado sistemático à saúde( 17 ). Com isso, o contingente de mulheres nos cadastros oficiais tipo Programa HiperDia é maior, como foi a amostra deste estudo e em outros que avaliam usuários da atenção primária( 14 ).

Pesquisas sugerem uma tendência de os serviços de atenção primária terem uma demanda espontânea grande de pessoas idosas, pois estão fora do mercado de trabalho, aposentadas e apresentam mais queixas e sintomatologia de doenças( 14 ).

Como o envelhecimento é um fator de risco para a diminuição da filtração glomerular, idosos, representando 45,2% da amostra, necessitam de melhor controle da função renal, principalmente se associado a outras comorbidades como a hipertensão e a obesidade( 6 ).

Todo hipertenso deve ter sua função renal avaliada, no mínimo, uma vez ao ano, segundo protocolo do Ministério da Saúde, para monitoramento da doença renal crônica, o que deverá ser feito mediante o cálculo da filtração glomerular estimada pela equação de Cockcroft-Gault( 6 ). Todavia, uma das dificuldades encontradas na coleta de dados foi que 70% dos prontuários no ano de 2009 não apresentavam algumas das informações necessárias ao monitoramento da função renal, como peso corporal e creatinina sérica.

A média do número de consultas ficou em torno de pouco mais de duas ao ano, e a maioria teve de duas a três consultas, sugerindo um intervalo entre elas de quatro a seis meses. Recomendações do protocolo do Ministério da Saúde( 6 ) (2006) para acompanhamento de hipertensos sugerem que a avaliação clínica deve ocorrer pelo menos duas vezes ao ano em indivíduos com a PA controlada, sem sinais de lesões em órgãos-alvo e sem comorbidades. Como a maioria dos sujeitos apresentou pressão arterial não controlada, esperava-se encontrar uma média mais satisfatória do número de consultas. Para os indivíduos que, mesmo apresentando controle das cifras pressóricas e da glicemia, tenham lesões em órgãos-alvo ou comorbidades, as consultas devem ser trimestrais( 1 , 18 ).

Um fato que deve ser destacado é o subregistro das pressões arteriais, pois o número médio de pressão foi menor do que o número de consultas em 2009 e, por vezes, não havia registro da pressão no momento da consulta, sugerindo uma dinâmica de trabalho de não priorização dos registros em prontuário, o que fragiliza o controle e o acompanhamento dos hipertensos pela equipe de saúde.

Outra possibilidade é da pressão não ser verificada em todas as consultas, principalmente quando o motivo não é o controle da hipertensão, mas outros agravos.

Reitera-se que, neste estudo, a prevalência de FG estimada estava reduzida para 20,6% dos participantes, sendo a FG 30 a 59 ml/min em 19,0% e a FG 29 a 15ml/ min em 1,6% da amostra compatível com lesão renal com insuficiência moderada e severa, respectivamente. Esses dados são semelhantes a estudo nacional( 17 ) que avaliou a FG, com método padrão ouro, em hipertensos, usando o clearance de 24 horas e mostrou prevalência de FG reduzida em torno de 24,6%.

No que diz respeito aos estudos internacionais, encontraram-se, de forma expressiva, pesquisas realizadas com a população espanhola, que mostraram prevalência de 30% e 20,3% em pacientes cardiopatas e em pacientes atendidos pela atenção primária, respectivamente, utilizando a equação do MDRD( 9 ). Em inquérito envolvendo população geral( 19 ), observou-se uma prevalência de 19,9% de FG reduzida, quando usada a equação de Cockcroft- Gault.

Dessa forma, fica evidente a dificuldade de comparação dos valores encontrados neste estudo devido à não padronização da metodologia utilizada ao avaliarem a prevalência de alteração da função renal, uma vez que as populações são distintas, e os métodos para estimativa da função renal usados também diferem.

Além disso, poucos foram os estudos encontrados de prevalência de filtração glomerular reduzida no Brasil, seja em população geral, seja em portadores de algum agravo( 14 , 17 ).

Autores questionaram o uso da fórmula Cockcroft - Gault para estimar a função renal, pois, como utilizam parâmetros antropométricos, ela tende a superestimá- la, principalmente em obesos( 12 ), e percebe-se que muitos estudos têm utilizado a equação do MDRD. Considerando a dificuldade de alguns profissionais, principalmente de generalistas na atenção primária, em utilizarem as fórmulas para o cálculo da FG sugeriu-se uma tabela para determinação instantânea do valor da FG estimada pela equação do MDRD. Todavia, no Brasil, a equação de Cockcroft-Gault é a recomendada nos protocolos do Ministério da Saúde para avaliação da função renal, principalmente por ser de fácil aplicabilidade, pouco custosa e também não depender da coleta de 24 horas da urina( 6 ).

Nesta amostra, houve associação da FG reduzida com sexo, faixa etária, creatinina e IMC. A FG reduzida foi significantemente maior em homens, resultado esse diferente de estudos tanto nacionais, com população semelhante, como internacionais que verificaram uma prevalência maior em mulheres. Não foi encontrada uma justificativa para este resultado, todavia especula-se que o homem, ao buscar menos o serviço de saúde, apresenta menor controle dos agravos à saúde( 9 , 14 , 17 ).

A prevalência de doença renal crônica aumenta nos idosos e a FG, fisiologicamente, diminui com a idade. Cerca de 17% das pessoas com mais de 60 anos apresentam FG menor que 60mL/min( 20 ). Essa associação, também encontrada em outros estudos, reforça a hipótese de que os idosos são pacientes de risco para o desenvolvimento de DRC, o que deve ser motivo de preocupação das autoridades e profissionais de saúde, uma vez que o envelhecimento da população é progressivo e é um desafio a ser enfrentado pelas políticas públicas no Brasil( 12 , 20 ).

No que diz respeito ao IMC, os dados mostraram que aqueles com excesso de peso apresentaram melhor FG, porém entende-se ser esse resultado uma distorção, pois as pessoas com sobrepeso ou obesidade têm maior quantidade de massa adiposa que por sua vez, não produz creatinina. Dessa forma, uma desprorpocionalidade na relação entre peso e creatinina com interferência no resultado da FG estimada calculada pela fórmula de Cockcroft-Gault, que considera esses parâmetros( 9 ).

As possíveis causas mais estudadas constituem aumento da proteinúria, existência da síndrome metabólica, desenvolvimento de comorbidades, como hipertensão arterial e diabetes mellitus.

Por outro lado, o uso da fórmula pode contribuir com esse resultado, uma vez que com a inclusão do peso na sua fórmula, a equação pode superestimar a taxa de filtração glomerular, principalmente em obesos, e dessa forma colocá-los em um padrão de função renal melhor do que eles realmente estão( 12 ).

Para minimizar a possível distorção do resultado da taxa de filtração glomerular estimada, mediante a fórmula de Cock-croft-Gault, quando utilizada em pacientes com sobrepeso e obesidade, foi proposto um fator de correção para reduzir a superestimação da filtração glomerular encontrada em obesos( 16 ).

Em estudo utilizando esse fator de correção ficou evidenciado que a aplicação da fórmula de Cockroft-Gault, sem o fator de correção para pacientes com IMC > 25Kg/m2, superestimava a FG em 8%. À medida que o IMC aumentava, essa porcentagem também aumentava, chegando a quase 30% pacientes com IMC>40 Kg/m2 12. Neste trabalho, não foi utilizado o fator de correção, uma vez que não é recomendado pelo Ministério da Saúde para avaliação da função renal pelos profissionais da atenção primária.

Portanto, é necessária a atenção particular a esse grupo de pacientes, no que diz respeito ao monitoramento da função renal, uma vez que projeções da Organização Mundial de Saúde indicam que, em 2015, aproximadamente, 2,3 bilhões de adultos estarão com sobrepeso e mais de 700 milhões serão obesos.

Em relação à associação entre baixo peso e filtração glomerular reduzida encontrada neste estudo, pode ser pelo fato de que aqueles com baixo peso têm diminuição do fluxo plasmático renal e, consequentemente, da taxa de filtração glomerular, sendo esse resultado esperado.

A porcentagem de pacientes que apresentaram creatinina normal com filtração glomerular reduzida reforça a idéia de que a medida da creatinina isoladamente é um parâmetro tardio para detecção de lesão renal precoce, que ocorre alteração quando o paciente perdeu mais de 50% da função renal. Na Espanha, os pacientes com FG < 60 ml/min e creatinina normal são considerados portadores de doença renal oculta (DRO), e alguns inquéritos mostraram uma prevalência de DRO em torno de 10% na amostra estudada( 9 ).

CONSIDERAÇÕES FINAIS A prevalência de filtração glomerular reduzida (FG < 60 ml/min) encontrada nesta pesquisa foi semelhante a estudos nacionais, seja com hipertenso, seja com a população geral, bem como a estudos internacionais, apesar dos distintos métodos de avaliação da filtração glomerular utilizados - Cockcroft-Gault, MDRD e Urina 24 horas.

Os grupos que tiveram uma prevalência maior de FG reduzida foram os homens, idosos e indivíduos com baixo peso, mostrando a necessidade de um monitoramento mais intensivo da função renal nesses subgrupos de hipertensos. A creatinina elevada também foi relacionada com a alteração da função renal reduzida, todavia 15% dos pacientes com creatinina normal apresentavam FG reduzida, evidenciando que, isoladamente, não foi um bom marcador na amostra estudada.

A importância da monitoração da função renal no hipertenso consiste na redução do risco da perda total do rim, à medida que é possível não rastrear, mas acompanhar a função renal e estabelecer condutas conservadoras para o controle dessa função, bem como o encaminhamento dos pacientes, quando necessário, para os serviços de referência, retardando, assim, a perda progressiva do rim e a necessidade de terapia renal substitutiva - diálise ou transplante.

Diante disso, os protocolos oficiais utilizados no acompanhamento do hipertenso orientam, sobre a investigação clínica e laboratorial anual, com a dosagem da creatinina sérica e o cálculo da FG com o uso da equação de Cockcroft-Gault, uma vez que é de fácil realização e utiliza informações usuais da prática clínica( 1 , 6 ). A partir dos resultados encontrados com esse método, a investigação dos pacientes com alterações deve ser continuada com métodos mais sensíveis à alteração da função renal, como a análise de urina de 24 horas mediante o clearance de creatinina.

Todavia, mesmo diante da importância da monitoração da função renal em hipertensos, ao coletar os dados, ficou evidente que um grande contingente de pacientes não tinha registro em prontuário de qualquer avaliação da função renal ou de dados necessários à sua realização, no ano do estudo. Isso evidencia a fragilidade no sistema de acompanhamento de pacientes hipertensos atendidos nos serviços de atenção primária do município, no que diz respeito ao monitoramento da função renal, apesar dos protocolos existentes. Apesar das limitações, trata-se de um estudo inédito no município e contribuiu com informações sobre a prevalência de filtração glomerular alterada em hipertensos atendidos nas unidades de saúde.


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