Fadiga em idosos em tratamento quimioterápico
INTRODUÇÃO
O avanço da tecnologia na área de saúde tem possibilitado o aumento da
longevidade, de maneira que, em 2009, os resultados da Pesquisa Nacional de
Amostra por Domicílio (PNAD) apontavam para um total de 11,3 milhões de pessoas
idosas no Brasil(1).
Na idade adulta, predominam as doenças crônicas não transmissíveis cuja
incidência e mortalidade se elevam à medida que aumenta a vida média da
população. Uma das doenças mais temidas é o câncer e, segundo os dados do
Instituto Nacional do Câncer (INCA), cerca de 75% das neoplasias são
encontradas em indivíduos com mais de 60 anos.. O aumento da expectativa de
vida não só eleva a exposição do indivíduo aos fatores de risco presentes no
meio ambiente e o tempo dessa exposição, como também o envelhecimento propicia
o surgimento de neoplasias genéticas cujo aparecimento é tardio(2).
As alterações da integridade física e emocional por desconforto, dor, fadiga,
desfiguração, dependência e perda da autoestima são relatadas pelas pessoas com
câncer, que percebem a qualidade de suas vidas profundamente alterada, num
curto período de tempo(3).
A fadiga é um sintoma prevalente na doença oncológica, manifestando-se entre
75% e 95% dos doentes. Ela compromete as atividades da vida diária, podendo
limitá-las e ocasionar prejuízos à qualidade de vida. Os sintomas depressivos,
por exemplo, também frequentes nos pacientes oncológicos submetidos à
quimioterapia, correlacionam-se com a qualidade de vida dos indivíduos
afetados, sobretudo com o domínio "humor" e com o domínio "fadiga"(4).
Fadiga pode ser definida como "uma sensação física desagradável, com sintomas
cognitivos e emocionais, descritos como cansaço, que não é aliviado com o
emprego de estratégias usuais de restauração da energia. A fadiga varia em
duração e intensidade, e reduz em diferentes graus a habilidade para
desenvolver as atividades da vida diária", conforme é revelado em estudo no
qual foram analisados os instrumentos comumente utilizados na literatura
internacional(5).
Nos clientes oncológicos, a fadiga tem sido atribuída a diversas causas, tais
como: estado hipermetabólico associado com o crescimento tumoral, competição
entre o organismo e o tumor por nutrientes, efeitos deletérios da quimioterapia
e da radioterapia, ingesta nutricional inadequada associada à náusea e vômitos
decorrentes da terapêutica antineoplásica, anemia, distúrbio do sono e a
incerteza e medo quanto ao futuro e a morte(6). Os efeitos terapêuticos e
tóxicos dos quimioterápicos dependem do tempo de exposição, da concentração
plasmática e da droga utilizada. Seus efeitos colaterais mais frequentes são:
mielodepressão, alopecia e alterações gastrintestinais(7).
Avaliar a fadiga "é crucial para identificação dos fatores preditivos, e
identificar pacientes fatigados é um desafio, pois fadiga é um sintoma
complexo, multidimensional e subjetivo". Depressão, capacidade funcional e
prejuízo do sono foram fatores preditivos da fadiga em um estudo realizado com
157 pacientes com câncer(6). Em outro estudo, cujas participantes foram 182
mulheres com câncer de mama, identificou-se a presença de fadiga em 94 mulheres
de acordo com a Escala de Fadiga de Piper(8).
Ressalta-se a importância da identificação da fadiga na prática clínica, a qual
constitui um diagnóstico de enfermagem encontrado na taxonomia da Nanda
International (NANDA-I) e, como tal, deve gerar intervenções de enfermagem que
possam auxiliar o paciente oncológico a enfrentar este sofrimento. Um estudo
nacional(9) mostrou que o enfermeiro está apto a reconhecer sinais e sintomas
de fadiga, os quais constituem as características definidoras propostas pela
NANDA-I. Mas, embora identifique tais características e as registre na
avaliação do paciente oncológico hospitalizado, o enfermeiro não consegue
traduzi-las na elaboração do correspondente diagnóstico de enfermagem e nem
gerar as desejadas propostas de intervenção(9). Esse fato pode estar ligado,
entre outros fatores, à escassez de estudos que discutam a prevalência desse
sintoma complexo em diferentes tipos de pacientes, com destaque para os
oncológicos, e que assim despertem reflexões sobre a responsabilidade do
enfermeiro no seu manejo. Portanto, estudos devem ser realizados no sentido de
alertar os enfermeiros para a identificação e o manejo deste desconforto tão
presente no paciente com câncer.
Autores apontam que as estratégias de intervenção para a fadiga podem ser
educativas e que há premente necessidade de pesquisas para se desenvolver uma
prática clínica baseada em evidências(10).
Deve-se considerar também que os estudos sobre fadiga são realizados, na maior
parte, com pessoas adultas, e muito menos frequentemente com idosos. Estes,
sabidamente, possuem singularidades inerentes à sua idade que devem ser
observadas e respeitadas pelos profissionais que os assistem.
Desta forma, este estudo teve como objetivo identificar a presença e
intensidade da fadiga em idosos com diagnóstico de câncer, em tratamento
quimioterápico ambulatorial.
MÉTODO
Pesquisa com delineamento transversal da qual participaram 140 idosos com
câncer que realizavam quimioterapia e que atendiam aos seguintes critérios de
inclusão: 60 anos ou mais, diagnóstico de câncer confirmado, tratamento com
quimioterapia em andamento e participação voluntária no estudo. Os critérios de
exclusão observados foram: câncer no sistema nervoso central ou metástases no
mesmo, índice de Karnofsky(11) inferior a 60, pós-operatório recente (até 30
dias), condições clínicas (tais como mucosite, dor intensa, dispnéia, náuseas,
vômitos) e emocionais (tais como choro, apatia excessiva, agressividade)
inadequadas para responder a uma entrevista.
O tamanho amostral foi calculado com apoio de profissional estatístico,
considerando-se o valor de 0,50 para o Coeficiente de Correlação de Postos de
Spearman, precisão da estimativa de 0,3 e nível de significância alfa de 5%
(12). Acrescentou-se a esta estimativa inicial cerca de 20% a mais de casos,
com a finalidade de prevenir eventuais perdas e obter maior poder para outras
análises não planejadas previamente. O número final desejado para a amostra foi
de 140 pacientes.
A coleta de dados foi realizada em dois Ambulatórios de Quimioterapia de um
hospital universitário do município de Campinas, interior do estado de São
Paulo, em dias e horários previamente agendados com os profissionais
responsáveis, de agosto a dezembro de 2010.
Os dados foram coletados durante a infusão da quimioterapia, após aceitação da
participação no estudo e assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade Estadual de Campinas, e foi homologado em agosto de 2009, pelo
Parecer 693/2009, CAAE n. 05540146000-09.
Dois instrumentos, apresentados a seguir, foram empregues na coleta de dados,
sob a forma de entrevista com cada participante. O primeiro deles, o
Questionário de Caracterização Sociodemográfica e Clínica, foi elaborado
especificamente para este estudo, com a finalidade de registrar os dados sócio-
demográficos e clínicos dos participantes, e foi avaliado por juízes para
validação de conteúdo. O segundo, a Escala de Fadiga de Piper-revisada é um
instrumento multidimensional para avaliação da fadiga, validado para uso no
Brasil(11). Esta Escala contém 22 itens distribuídos em três dimensões:
Comportamental (itens 02 a 07) relacionada à capacidade funcional, incluindo
questões pessoais, atividades sociais e relacionamento sexual; Afetiva (itens
08 a 12), que busca encontrar o significado atribuído à fadiga; Sensorial/
psicológica (itens 13 ao 23), que busca componentes da auto-percepção,
emocionais e cognitivos na presença da fadiga. Cada dimensão, assim como o
escore total, recebe uma pontuação que corresponde à média dos escores de cada
item, e varia de zero a dez. O ponto de corte adotado para considerar a
presença de fadiga foi o escore quatro (escore igual ou inferior a quatro, sem
fadiga; superior a quatro, com fadiga).
Na Escala de Piper-revisada, além dos 22 itens pontuados, há cinco questões
abertas (itens 1, e 24 a 27) que não são usadas para cálculo do escore do
instrumento, mas permitem obter dados adicionais como a duração da fadiga, o
que o indivíduo acredita causar a fadiga e a presença de outros sintomas,
enriquecendo a qualidade das informações. A composição desta escala com
múltiplas dimensões é uma característica importante, pois permite o
reconhecimento da expressão da fadiga na vida do indivíduo(11).
Conforme orientação obtida diretamente com a pesquisadora responsável pela
validação do instrumento, antes da aplicação da escala indagava-se se o idoso
sentia fadiga e lia-se para o mesmo uma definição padronizada do sintoma. Os
idosos que negaram sentir fadiga não responderam à Escala de Piper-revisada.
Os dados obtidos foram codificados e digitados em planilha do programa para
computador Excel for Windows (Micro-soft Inc.), e posteriormente transportados
aos softwares SPSS (versão 17.0) e SAS (versão 9.1.3, SAS Institute Inc., Cary,
NC, USA, 2002-2003), que foram utilizados na análise dos dados.
Os dados foram analisados com uso da estatística descritiva, sendo calculadas
frequências absolutas e proporções para as variáveis categóricas e medidas de
tendência central, posição e dispersão para as variáveis contínuas. Os dados
apresentavam distribuição diferente da normal ao teste de Kolmogorov-Smirnov,
portanto um teste não paramétrico, o coeficiente de correlação de postos de
Spearman, foi empregue para avaliar a correlação entre as dimensões e os
escores finais do instrumento de fadiga, estabelecendo-se o nível crítico de
5%.
A consistência interna da Escala de Piper foi avaliada pelo coeficiente alfa de
Cronbach. Nesse coeficiente, obter valores acima de 0,70 indica adequada
consistência interna do instrumento.
RESULTADOS
A caracterização dos 140 idosos participantes do estudo está apresentada na
Tabela_1, a seguir.
Tabela 1 Distribuição dos idosos segundo características sociodemográficas (n =
140). Campinas-SP, 2010
Variáveis n %
Sexo Masculino 67 47,9
Feminino 73 52,1
Cor da pele Branco 115 82,1
Não branco 25 17,9
Estado conjugal Casado 93 66,4
Viúvo 32 22,9
Separado 8 5,7
Solteiro 7 5,0
Anos de estudo completos Zero a menos de um 27 19,3
ano
1 a 3 anos 33 23,6
4 a 8 anos 60 42,9
9 ou mais 20 14,3
Situação de trabalho atual Aposentado e 118 84,3
inativo
Aposentado e ativo 10 7,1
Do lar 11 7,9
Com quem mora atualmente Cônjuge 56 40,0
Cônjuge e filhos 28 20,0
Filhos 26 18,6
Outros familiares 3 2,1
Instituição 2 1,4
Crença/ religião Sim 134 95,7
Carro do familiar 66 47,1
Transporte utilizado para chegar ao Ambulatório de Coletivo do 48 34,3
Quimioterapia governo
Coletivo público 17 12,1
Carro próprio 8 5,7
Outro 1 0,7
Renda mensal individual (SM)* Até 5 SM 124 88,6
6-10 SM 2 1,4
Acima de 10 SM 14 10,0
Renda mensal familiar (SM) Até 5 SM 107 76,4
6-10 SM 29 20,7
Acima de 10 SM 4 2,9
Notas:
*SM: salário-mínimo vigente de agosto a dezembro de 2010 (R$ 510,00). Lei
12.255, de 15 de junho de 2010. Disponível em http://www.planalto.gov.br/
ccivil/_Ato2007-2010/2010/Lei/ L12255.htm
Os dados clínicos e de estilo de vida e saúde apresentam-se na Tabela_2, a
seguir.
Tabela 2 Distribuição dos idosos segundo aspectos de saúde e estilo de vida. (n
= 140). Campinas-SP, 2010
Variável n %
Sofre de doença crônica 65 46,4
Tipo de doença crônica
Hipertensão arterial 58 41,4
Diabetes 25 17,9
Osteoporose 21 15,0
Outra 12 8,6
Consumo de álcool 15 10,7
Consumo de café 122 87,1
Hábito de fumar 16 11,4
Prática de atividade física 45 32,1
Quantidade de medicamentos em uso
Zero 31 22,1
Um 60 42,9
Dois 40 28,6
Três 9 6,4
Sintoma relacionado à menopausa (n = 73) 5 6,8
Dores nos últimos 30 dias 72 51,4
Sede intensa 93 66,4
Boca seca 93 66,4
Náusea 76 54,3
Vômitos 61 43,6
Diarreia 60 42,9
Ferida na boca e gengivas 42 30,0
Analisando-se o prontuário dos 140 idosos participantes quanto aos dados
clínicos de interesse, verificou-se que os diagnósticos mais freqüentes foram
os tumores do aparelho digestivo (52,1%) e ginecológico ou mamário (37,1%),
diagnosticados há, em média, 2,6 anos (desvio padrão 3,4 anos), zou ou realiza
radioterapia (52,1%) e foi submetido à cirurgia relacionada ao tumor (73,6%).
Dentre os 140 participantes, 64 (45,7%) responderam afirmativamente quando
indagados sobre a presença de fadiga e, portanto, responderam à Escala de
Fadiga de Piper-revisada. Aos 78 restantes (54,3%), a escala não foi aplicada.
A análise de confiabilidade da Escala de Fadiga de Piper-revisada foi realizada
com os dados dos 64 participantes que responderam a esse instrumento.
Verificou-se consistência interna adequada para a escala como um todo, bem como
para as três dimensões que a compõem. Estes resultados encontram-se na Tabela
3.
Tabela 3 Coeficiente alfa de Cronbach para a Escala de Fadiga de Piper-revisada
e suas dimensões (n = 64). Campinas-SP, 2010
Escala de Piper-revisada Coeficiente alfa de Cronbach
Dimensão comportamental 0,87
Dimensão afetiva 0,76
Dimensão sensorial/ psicológica 0,72
Escore total 0,84
A análise de correlação entre os itens da escala, e destes com o escore total,
segundo o Teste de Correlação de Postos de Spearman é apresentada a seguir na
Tabela_4.
Tabela 4 Correlação das dimensões da Escala de Fadiga de Piper-revisada entre
si e com o escore total n=64). Campinas-SP, 2010
Dimensões Dimensão afetivaDimensão sensorial/Escore total de fadiga
psicológica
Dimensão 0,211 0,347* 0,764*
comportamental
Dimensão afetiva - -0,018 0,363*
Dimensão sensorial/ - - 0,762*
psicológica
Notas:
*Resultados significativos (p<0,01) ao teste de Correlação de Postos de
Spearman.
Quatro participantes dentre os 64 que responderam à Escala de Fadiga de Piper-
revisada obtiveram escore total inferior a 4, sendo classificados como 'sem
fadiga'. Verificou-se, portanto, que a fadiga estava presente em 60 idosos
(42,9%) dentre os 140 estudados.
A média dos escores obtidos pelos 60 idosos com fadiga mostrou-se superior ao
valor médio (5,0 pontos) da escala. O escore mais elevado foi encontrado na
dimensão Afetiva. A análise descritiva dos escores total e de cada dimensão da
Escala de Fadiga de Piper-revisada encontra-se na Tabela_5.
Tabela 5 Análise descritiva do escore total e das dimensões da Escala de Fadiga
de Piper-revisada (n = 60). Campinas-SP, 2010
Escala de Fadiga MédiaDesvio padrãoMediana VariaçãoVariação possível
de Piper-revisada observada
Dimensão 5,9 2,5 5,7 1,0-10,0 0,0-10,0
comportamental
Dimensão afetiva 8,3 1,7 8,8 3,6-10,0 0,0-10,0
Dimensão
sensorial/ 5,9 1,4 5,6 3,6 - 9,0 0,0-10,0
psicológica
Escore total de 6,5 1,1 6,4 4,2 - 9,3 0,0-10,0
fadiga
Os 60 idosos que relataram sentir fadiga atribuíram a causa deste sintoma ao
câncer (64,1%), à quimioterapia (32,8%) e ao tratamento como um todo (3,1%).
Como fator de alívio, os idosos relataram: dormir (27%), rezar (17%) e morrer
(12%), sendo que alguns deles relataram mais de um fator. Uma parcela
considerável (45%) disse "não ter o que fazer", pois não há alívio para a
fadiga. Os idosos a descreveram como "cansaço", "corpo ruim" e "presença de
dor".
DISCUSSÃO
A amostra do presente estudo caracterizou-se por um discreto predomínio
numérico do sexo feminino (52,1%), assim como em estudo pregresso realizado com
pessoas com câncer, em que 54,9% eram mulheres(13). A incidência do câncer em
2010, para todas as faixas etárias, era estimada em 253.030 (51,7%) casos novos
nas mulheres e 236.240 (48,3%) nos homens(1).
Verificou-se que 78,6% dos idosos referiu residir com o cônjuge, os filhos ou
com ambos. Este arranjo familiar pode constituir um aspecto positivo, conforme
observado em um estudo cujos participantes eram enfermeiras com câncer
ginecológico ou mamário, em que aquelas que apresentavam maior apoio e
interação social mantinham práticas mais adequadas de cuidado à saúde(14).
Pode-se sugerir que o fato de 47,1% dos idosos vir para a quimioterapia em
carro de familiar reforça a presença do apoio da rede familiar.
Salienta-se a elevada prevalência de uma crença ou religião entre os idosos
deste estudo, referida por 95,7% deles. A literatura aponta que, se a força
poderosa da mente for invocada e esta estiver aliada à fé religiosa, com o
intuito de recuperar-se do agravo, o paciente se sentirá mais feliz e com
melhor disposição para enfrentar a doença(15).
Os efeitos adversos relacionados à quimioterapia, relatados pelos pacientes
como mais freqüentes (sede intensa, boca seca e náusea) são comumente
encontrados na literatura especializada. Tal fato pode ser explicado pela
toxicidade dos quimioterápicos administrados, relacionada à não especificidade
celular, que podem gerar efeitos como dor, cansaço, náuseas e vômito(16).
A Escala de Fadiga de Piper-revisada obteve, neste estudo, indícios de
consistência interna satisfatória, tanto no seu escore final como nas três
dimensões que a compõem, conforme estimado pelo coeficiente alfa de Cronbach.
Os resultados obtidos nesse coeficiente foram um pouco inferiores aos relatados
pelos autores que validaram o instrumento para uso no Brasil(11), mas ainda
assim sugerem que o instrumento mediu adequadamente o construto que se
pretendia avaliar.
Identificou-se a presença de fadiga em 60 idosos (42,9%), constituindo um
percentual elevado, embora inferior ao de outros estudos com pacientes
oncológicos. Em estudos pregressos a fadiga foi encontrada em cerca de 60% a
79% dos pacientes com câncer, sendo a queixa mais comum entre eles(17-18).
Em um estudo com 379 pacientes com câncer, cuja idade média era de 62 anos,
identificou-se que a fadiga foi o efeito colateral mais frequente relatado após
a quimioterapia(19). Estes autores encontraram relato de fadiga em 301
pacientes, pelo menos por alguns dias, mensalmente, durante a quimioterapia
(19), enquanto que, em um outro estudo com 199 idosos institucionalizados,
verificou-se que a fadiga foi relatada como 'um cansaço' por 98% destes(20).
Estudos realizados com idosos (idade média de 71 anos) com câncer em tratamento
quimioterápico ambulatorial revelou que 99% destes relatavam fadiga na semana
em que realizavam a quimioterapia(21).
Os idosos que, neste estudo, relataram sentir fadiga descreveram-na como
cansaço, corpo ruim e presença de dor. A causa atribuída foi o câncer (64,1%),
a quimioterapia (32,8%) e o tratamento como um todo (3,1%). Quando relacionada
ao câncer, a fadiga pode ser diferente daquela que ocorre como conseqüência do
exercício ou estresse; é um sintoma que se desenvolve ao longo do tempo e tem
implicações cognitivas, físicas e emocionais, incluindo a redução de energia,
aumento da necessidade de repouso, redução da concentração mental e desgaste da
motivação ou interesse em realizar atividades diárias(21).
Como fator de alívio, os idosos entrevistados relataram "dormir", "rezar" e
"morrer", enquanto que 45% deles disseram "não ter o que fazer", pois a fadiga
não poderia ser aliviada. Este resultado é corroborado pela literatura cujos
achados identificaram que a fadiga advinda do câncer não melhora nem cessa com
o descanso(21).
Em estudo pregresso realizado com pessoas com câncer e seus oncologistas
identificou-se que os profissionais acreditavam que a dor seria o sintoma
relacionado ao câncer que mais prejudicava a vida diária de seus pacientes. Os
pacientes, entretanto, apontaram a fadiga como o principal sintoma que
interferia negativamente em sua qualidade de vida. Além disto, os oncologistas
acreditavam que a investigação e o tratamento da fadiga eram negligenciados e
deveriam ser melhor conduzidos, enquanto que os pacientes relatavam que a
fadiga seria um sintoma a ser suportado. Em decorrência, 50% dos pacientes não
discutiam este sintoma com os profissionais e nem buscava opções de tratamento
(18).
Desta forma, é importante salientar que tanto as limitações dos profissionais
para identificação da fadiga quanto a relutância dos pacientes em expressarem
suas queixas resultam em subnotificação, que contribui para o desconhecimento
da sua prevalência(21).
Alguns autores estimam que até 50% dos idosos em geral sofrem de fadiga leve.
As causas variam, mas a teoria que predomina traz a fadiga como consequência
secundária à doença e à medicação. Devido ao seu potencial de comprometimento
negativo da vida diária e da qualidade de vida e bem estar do paciente, este
sintoma deve ser investigado e realizadas intervenções para minimizar seus
efeitos(21).
Neste estudo, a dimensão com escore mais elevado dentre as que compõem a Escala
de Fadiga de Piper-revisada foi a Afetiva, que é relacionada ao significado
atribuído pelo paciente à fadiga, em sua vida, no momento da entrevista. Outros
autores verificaram, nesse sentido, que a depressão mostrou-se um relevante
fator preditivo de fadiga em pacientes com câncer colorretal, aumentando em
quatro vezes o risco de apresentar o sintoma(11).
Deve-se considerar também que os resultados das dimensões Comportamental e
Sensorial/Psicológica foram superiores ao ponto médio da escala, indicando sua
relevância clínica(11). Estas dimensões podem sofrer o impacto de outros
sintomas físicos associados à fadiga, tais como dor, cansaço, náuseas e
vômitos, e anorexia, oriundos da toxicidade das drogas quimioterápicas
administradas(16), os quais reduzem a capacidade funcional e prejudicam a
qualidade de vida(16), com expressiva repercussão emocional.
É preciso estar alerta também para o fato de que, no Brasil, grande parcela das
pessoas com 60 anos ou mais relata a percepção de seu estado de saúde como
"muito boa" ou "boa", a despeito da presença de mais de uma doença crônica(22).
Ou, muitas vezes, o idoso não tem motivação ou coragem de relatar seus sintomas
considerando-os "normais", relacionando-os ao processo de envelhecimento e,
portanto, interpretados como inevitáveis. Essa postura deve ser desencorajada
pelos profissionais de saúde, destacando-se aqui, os enfermeiros que não devem
permiti-la se objetivam o alcance de um cuidado de qualidade e uma Enfermagem
de excelência. Estes pacientes devem ser estimulados a relatar fadiga caso a
sintam.
Algumas limitações deste estudo devem ser observadas. O delineamento da
pesquisa é transversal, com dados coletados uma única vez, impedindo o
acompanhamento do sintoma ao longo do tempo. As variáveis clínicas se detiveram
principalmente naquelas de natureza física, sendo que a literatura traz, em
pacientes com câncer, a relevância de variáveis psicológicas como a presença de
depressão, que interfere na presença de fadiga. Tais limitações podem ser
superadas em estudos futuros longitudinais. Salienta-se que os estudos com esta
casuística ainda são insuficientes no Brasil, destacando-se a necessidade de
pesquisas clínicas em enfermagem nesta área.
CONCLUSÕES
A prevalência de fadiga entre os 140 idosos com câncer, submetidos à
quimioterapia ambulatorial, participantes deste estudo, foi elevada, sendo
identificada em 42,9% da amostra. Os escores obtidos em todas as dimensões, bem
como o escore total da Escala de Fadiga de Piper-revisada são indicativos da
relevância da fadiga para esses idosos, pois mostraram-se superiores ao ponto
médio da escala. A dimensão Afetiva foi a que apresentou maior impacto, de
acordo com a pontuação obtida, implicando na interpretação negativa do idoso a
respeito desse sintoma.
A identificação da fadiga como problema relevante nos pacientes idosos
oncológicos deverá direcionar a atenção dos profissionais no sentido do seu
adequado reconhecimento, inclusive como um diagnóstico de enfermagem. A
interpretação negativa que o idoso atribui ao sintoma, embora nem sempre se
manifeste em forma de queixa espontânea, também deverá contribuir para a maior
preocupação com as intervenções de enfermagem que visem o adequado manejo desse
problema.