Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

BrBRHUAp0080-21072013000400003

BrBRHUAp0080-21072013000400003

variedadeBr
ano2013
fonteScielo

O script do Java parece estar desligado, ou então houve um erro de comunicação. Ligue o script do Java para mais opções de representação.

Gestão estratégica de pessoas e inovação: estudos de caso no contexto hospitalar

1. INTRODUÇÃO No âmbito internacional, observa-se um debate acirrado sobre as fragilidades do sistema de saúde dos Estados Unidos e suas causas. Desde 1999, relatórios do Institute of Medicine(Instituto de Medicina) nos Estados Unidos têm demonstrado ao público que o erro na atividade médica é uma das principais causas de morte naquele país, à frente de acidentes de carro e câncer de mama (Kohn, Korrigan, & Donaldson, 1999). Tais erros são atribuídos a problemas de qualidade, a dificuldades de implementações de inovações (Kahtri, Baveja, Boren & Mammo, 2006; Nembhard, Alexander, & Hoff, 2009) e a modelos organizacionais inadequados (Kahtri et al., 2006; Porter & Teisberg, 2004; Hwang & Christensen, 2008).

Desde que os problemas de qualidade foram identificados, organizações hospitalares investiram recursos financeiros e esforços organizacionais para melhorar a assistência prestada. Para tanto, adotaram uma série de inovações (Nembhard et al., 2009). Uma inovação pode ser definida como uma prática, política, ou tecnologia (por exemplo, procedimentos clínicos, política de remuneração ou tecnologias da informação) que seja nova para uma organização, ainda que seja utilizada por outras (Rogers, 2003).

No entanto, a adoção de inovações não resultou em aumento significativo de qualidade e segurança para os pacientes. A indústria da saúde nos Estados Unidos apresenta um progresso inferior ao de outras indústrias, como a da manufatura e serviços (Porter & Teisber, 2004). O número de erros continua sendo considerável e assustador. De acordo com Porter e Teisberg (2004), a adoção de inovações deveria ter gerado maior valor aos consumidores do sistema, por meio de melhorias de qualidade e redução de custos, mas esse não foi o caso.

No Brasil, uma preocupação dos setores público e privado com a incorporação de inovações tecnológicas associadas à área da assistência. Como exemplo, podem-se mencionar: novos medicamentos, mais eficazes e eficientes; novas técnicas cirúrgicas, que permitem intervenções menos invasivas; e procedimentos e medicamentos adequados para atendimento em domicílio, conforme algumas tendências da prestação de serviços. Todas essas inovações são acompanhadas e analisadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Ministério da Saúde por meio da Comissão para Incorporação de Tecnologias (Citec) (Malik, 2009). Por outro lado, poucos esforços têm sido realizados para implementar inovações de processo ou de gestão. De acordo com Malik (2009), estudos realizados durante o período de 2000 a 2008 evidenciam que as inovações e a adoção de processos de acreditação em organizações de saúde no Brasil resultam de mimetismo organizacional e modismo, e não de uma visão estratégica para fazer avançar a assistência e a segurança do paciente. Adicionalmente, a autora argumenta que o conservadorismo das organizações da saúde as impede de lidar com uma cultura avessa às mudanças, à distribuição de conhecimentos e à aprendizagem, vitais para os processos de inovações (por exemplo, Herzlinger, 2006).

Nesse contexto, que se questionar quais fatores podem contribuir para as dificuldades enfrentadas pelas organizações da saúde na adoção e implementação de inovações. Trabalhos recentes apontam para variáveis do contexto organizacional e sugerem que a literatura de teoria das organizações e gestão de pessoas poderá contribuir para elucidar essa questão (Nembhard et al., 2009).

Neste artigo, os principais objetivos foram analisar e comparar os aspectos organizacionais e de gestão de pessoas que têm contribuído para a implementação de inovações em três hospitais. As três organizações estudadas foram escolhidas por fazerem parte de um grupo de hospitais que têm demonstrado sucesso constante na adoção de inovações, entre outras características em comum. Dois deles estão no estado de São Paulo, Brasil, e um situa-se em Ohio, nos Estados Unidos. Adicionalmente, pretendeu-se demonstrar de que maneira a pesquisa em Administração poderá informar a implementação de inovações no setor da gestão da saúde. Até recentemente, esse fenômeno tem sido pouco explorado por ser considerado idiossincrático.

A seguir, no referencial teórico, serão apresentados os principais conceitos de inovação, modelos organizacionais inovadores e políticas e práticas de gestão de pessoas consideradas relevantes para este trabalho. Na sequência, serão apresentadas as características específicas das organizações da saúde.

Posteriormente, apresentar-se-ão a metodologia da pesquisa, os resultados e a análise dos dados.

2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1. Inovação: definições e conceitos Para muitos autores reconhecidos no campo da inovação, as organizações derivam o seu sucesso econômico, em maior ou menor grau, do sucesso em introduzir inovações em seus produtos e processos (Tidd, Bessant & Pavitt, 2005). A vantagem competitiva pode advir do tamanho da empresa ou de seus ativos, mas sem dúvida a habilidade para mobilizar conhecimento, tecnologia e experiência para criar novos produtos, processos ou serviços, vem adquirindo um lugar cada vez mais importante. Nesse contexto, a inovação pode ser definida como o processo pelo qual as organizações utilizam suas capacitações e seus recursos para desenvolver novos produtos, serviços, sistemas (operacionais ou de produção), formas de trabalho e tecnologias para melhor atender às demandas de seus consumidores (Moreira & Queiroz, 2007).

Uma das mais antigas classificações que se podem utilizar é apresentada por Knight (1967). Trata-se de um exemplo de classificação baseada no foco. Para esse autor, existem quatro tipos de inovação, todas elas altamente inter- relacionadas, de modo que a introdução de uma inovação de um tipo provavelmente causará mudanças em uma ou mais das outras categorias. Os quatro tipos são: Inovações no produto ou no serviço - dizem respeito à introdução de novos produtos ou serviços, de maneira a atender necessidades e desejos dos clientes.

Inovações no processo de produção - consistem na introdução de novos elementos nas tarefas da organização, no seu sistema de informação ou na produção física ou nas operações de serviços.

Representam avanços na tecnologia da companhia.

Inovações na estrutura organizacional- incluem mudanças nas relações de autoridade, nas alocações de trabalho, nos sistemas de remuneração, nos sistemas de comunicação e em outros aspectos da interação formal entre as pessoas na organização. Mudanças no processo de produção ou na prestação de serviços tendem a produzir concomitantemente inovações na estrutura organizacional.

Inovações nas pessoas - dizem respeito a inovações que podem mudar o comportamento ou as crenças das pessoas dentro da organização, utilizando técnicas como educação e treinamento.

As três primeiras categorias de Knight (1967) aparecem com frequência em outras classificações; as inovações nas pessoas, porém, tenderam, com o tempo, a ser incluídas junto às inovações organizacionais ou administrativas.

De acordo com as diretrizes estabelecidas pela Organisation for Economic Co- operation and Development (OECD) no Manual de Oslo (2005), as firmas podem fazer vários tipos de mudanças nos métodos de trabalho, no uso de fatores de produção e tipos de produtos e serviços que melhorem a produtividade e/ou o desempenho comercial. O manual define quatro tipos de inovações que contemplam uma gama de mudanças nas atividades das firmas: inovação de produto, inovação de processo, inovação organizacional e inovação em marketing. Retirou-se a palavra "tecnológica" das definições, pois entendeu-se que muitos setores de serviços poderiam interpretar a "inovação tecnológica" como equivalente ao "uso de novas tecnologias e equipamentos" e, assim, não seria aplicável a muitos de seus produtos e processos de inovação.

2.2. Modelos organizacionais inovadores e gestão de pessoas A literatura sobre novas formas organizacionais é muito ampla e diversa. A despeito disso, pesquisas recentes apontam para um consenso entre os autores de que as formas, os processos e o papel das organizações mudaram de maneira significativa no final do século XX (Fenton & Pettigrew, 2000). A existência de novas formas organizacionais justifica-se por: velocidade de mudanças, que exige capacidade de reinventar constantemente estratégias e estruturas; presença, em mercados altamente competitivos, dos recursos que geram valor dentro da firma. O que confere vantagem competitiva às organizações é a maneira como elas são organizadas; aumento da importância da capacidade de uma firma organizar e utilizar o conhecimento, na chamada era do conhecimento (Whittington & Melin, 2003).

Outro aspecto relevante diz respeito ao fato de que inúmeras pesquisas, realizadas com metodologias distintas, em momentos e locais diferentes, apontam para tendências similares quanto às características das empresas inovadoras (Vasconcellos & Hemsley, 2000; Pettigrew & Massini, 2003; Tushman & O'Reilly, 2004; Hargadon & Sutton, 2005). Essas características foram resumidas por Pettigrew e Massini (2003, p. 6): (1) descentralização radical da responsabilidade por resultados para as unidades operacionais; (2) redução no número dos níveis hierárquicos; (3) redução no papel dostaff corporativo: a alta cúpula passa a concentrar-se em criar e disseminar conhecimentos; (4) mudança no estilo gerencial, de "comandar e controlar" para "facilitar e autorizar"; (5) sistemas sofisticados de comunicação interna (tanto formal quanto informal), horizontal e vertical; (6) uso extensivo de grupos ad hoc (interdivisionais e interfuncionais) focados em forças-tarefa, ao invés de estruturas organizacionais departamentalizadas e rígidas; (7) uso deliberado dos recursos humanos internos para disseminação de conhecimento.

Pode-se observar que as características apontadas pelos autores assemelham-se ao modelo orgânico dos teóricos da contingência e à Adhocracia proposta por Mintzberg (2003). São organizações cujas fronteiras são permeáveis, cujos membros se agrupam temporariamente para atender necessidades do ambiente externo, onde a comunicação flui de maneira ágil e o conhecimento é adequadamente disseminado para os níveis em que agregam maior valor.

Independente de tamanho, essas empresas mantêm a ênfase em equipes autônomas de trabalho, que operam como pequenas empresas individuais. A lógica é manter grupos, de maneira que os colaboradores tenham um senso de propriedade e sejam responsáveis pelos resultados. Isso encoraja uma cultura de autonomia e tomada de risco, não compatível com o ambiente de uma grande organização verticalizada.

A flexibilização de estruturas e a criação de unidades autônomas de negócios geram, inevitavelmente, dificuldades de coordenação e controle para as organizações, aspectos esses identificados por Lawrence e Lorsch (1967). A transformação de estruturas verticalizadas e mecânicas em horizontais e orgânicas, mais aptas à criação e à adoção de inovações, não se sem transformações profundas no contexto sociocultural das empresas. Dessa forma, a eficácia dos modelos flexíveis é condicionada pela maneira como as lideranças lidam com aspectos de gestão de pessoas, tais como a cultura e políticas e práticas de Recursos Humanos que favoreçam trabalhos em equipes multidisciplinares, flexibilidade das funções, polivalência dos membros organizacionais, autonomia, comunicação e aprendizagem (Jimenez-Jimenez & Sanz-Valle, 2008).

Estudos recentes investigaram as relações entre as políticas e práticas de gestão de pessoas e as inovações nas organizações (Leede & Looise, 2005; Jimenez-Jimenez & Sanz-Valle, 2008; Parolin & Albuquerque, 2009). De fato, apesar de parecer existir uma relação próxima entre inovação e gestão de pessoas, poucos trabalhos têm investigado esse fenômeno.

Leede e Looise (2005) propuseram um modelo em dois níveis que visa integrar as duas perspectivas teóricas. O primeiro nível contempla ações de gestão de pessoas necessárias para a construção de um modelo organizacional inovador, similar à perspectiva apresentada por Tidd et al. (2005). Nesse primeiro nível, Leede e Looise (2005) ressaltam a necessidade de visão compartilhada e liderança de uma estrutura organizacional flexível e apropriada, indivíduos- chave, treinamento e desenvolvimento, alto grau de envolvimento e comprometimento por parte dos colaboradores, trabalho em equipes multidisciplinares e um clima que favoreça a criatividade. No segundo nível contemplam práticas de gestão de pessoas que apoiem os diversos estágios das organizações. Como exemplos, podem-se citar a liderança e o papel da média gerência para as inovações, os elementos de trabalhos em projeto e em equipe, a criatividade de colaboradores etc.

Mais recentemente, Jimenez-Jimenez e Sanz-Valle (2008) também propuseram um modelo que avalia as relações entre inovação e gestão de recursos humanos e de ambas no desempenho das inovações. Para os autores, a capacidade de inovação de uma empresa reside na inteligência, na imaginação e na criatividade de seus funcionários. Consequentemente, é necessário um conjunto de políticas e práticas de recursos humanos que possa identificar, desenvolver, avaliar e recompensar comportamentos de trabalho que sejam consistentes com objetivos organizacionais de inovação. Jimenez-Jimenez e Sanz-Valle (2008) entendem que esse conjunto de políticas e práticas de recursos humanos incluem: o desenho flexível das funções e o empowerment dos colaboradores; o trabalho em equipes multidisciplinares; o recrutamento de pessoas polivalentes e que se adequem à cultura organizacional; o treinamento extensivo e de longo prazo; amplas oportunidades de carreira; a avaliação de desempenho baseada em comportamentos alinhados à inovação; o sistema de remuneração orgânico, associado positivamente à inovação. Em estudo realizado com 173 empresas espanholas, os autores concluíram que esse conjunto de políticas e práticas de recursos humanos tende a incentivar a inovação nas organizações.

Apesar dos resultados positivos, os autores (Leede & Looise, 2005; Jimenez- Jimenez & Sanz-Valle, 2008; Parolin & Albuquerque, 2009) argumentam que a adoção de um conjunto de políticas e práticas de gestão de pessoas que tem o potencial de favorecer a inovação precisa estar alinhado a uma estratégia organizacional mais ampla que contemple a inovação como objetivo de longo prazo.

A abordagem estratégica para recursos humanos não é recente, surgiu no início da década de 1980 e ressaltou a importância de alinhar-se a gestão de pessoas à estratégia organizacional (Albuquerque, 1987; Anthony, Perrewé, & Kacmar, 1996; Ulrich, 1998). Albuquerque (1999; 2002) apresenta uma visão sistêmica do alinhamento da estratégia de gestão de pessoas aos objetivos organizacionais.

Para o autor, os diversos subsistemas - a estrutura organizacional, as relações de trabalho e as políticas de recursos humanos - compõem a gestão de pessoas. Esses subsistemas, compostos de políticas e práticas, podem ser combinados de forma a produzir diferentes estratégias.

2.3. Organizações hospitalares e suas características As organizações hospitalares estão inseridas em um setor que emprega grandes esforços e recursos no desenvolvimento de inovações tecnológicas para solucionar problemas de saúde ou de doença. Com o objetivo de reduzir os altos índices de chamados erros médicos (erros assistenciais), as organizações hospitalares aceleraram investimentos no desenvolvimento de novas tecnologias diagnósticas e terapêuticas. A despeito disso, não alcançam os resultados esperados em termos de melhoria de qualidade e redução de custos (Kahtri et al., 2006; Malik, 2009; Nembhard et al., 2009). Apesar de as inovações nas tecnologias médicas serem críticas para a assistência e a redução de erros na saúde, parece que não são suficientes para superar eventos adversos que emergem do contexto organizacional.

De acordo com Hwang e Christensen (2008), inovações trouxeram conveniência e redução de custos para consumidores de diversas indústrias. No setor da saúde, os serviços permanecem extremamente caros e inacessíveis a muitos consumidores.

Porter e Teisberg (2004) sugerem ainda que na indústria da saúde os custos são crescentes, a despeito dos esforços para reduzi-los. Os serviços são restritos e racionados, a maioria dos pacientes recebe assistência com padrões inferiores àqueles considerados desejáveis e persiste um alto índice de erros evitáveis nos processos. Para esses autores, à semelhança do que se encontra nos textos de Hwang e Christensen (2008), a solução reside na alteração do modelo de gestão e na forma de competição da indústria.

Trabalhos recentes têm investigado as variáveis organizacionais e de gestão de pessoas que compõem o modelo organizacional dos hospitais e que dificultam a implementação bem-sucedida de inovações (Weick & Sutcliff, 2003; Khatri et al., 2006; Malik, 2009; Nembhard et al., 2009). Os autores são unânimes em afirmar que os desafios das instituições da saúde residem não no desenvolvimento de inovações tecnológicas e sim na superação de aspectos organizacionais e culturais que se encontram profundamente arraigados na prática assistencial e impedem a adoção bem-sucedida de inovações. Esses aspectos podem ser resumidos conforme descrito a seguir.

A natureza do trabalho é incerta e arriscada, pois pode causar danos ao consumidor (paciente) e, em geral, está sob a responsabilidade de um único indivíduo, o médico, que é considerado o detentor do conhecimento necessário para indicar e conduzir os tratamentos. Nesse contexto, os profissionais tendem a ser avessos à tomada de risco e rejeitam inovações, pois temem que elas possam prejudicar seus pacientes no curto prazo. Adicionalmente, em muitas instituições, esses profissionais fazem parte de um corpo clínico aberto, em que os médicos são considerados clientes, o que lhes confere um grau de discrição no que diz respeito à adoção de inovações definidas pela organização.

Determinadascaracterísticas da força de trabalho, específicas do setor da saúde, contribuem de maneira negativa para a implementação de inovações. Observa-se, nos últimos anos, um aumento importante no grau de especialização (por exemplo, os médicos podem se especializar em mais de 120 disciplinas, os enfermeiros em mais de 50). Nesse contexto, a colaboração para realizar um tratamento de qualidade torna-se fundamental. No entanto, estudos do Institute of Medicine (2001; 2004) indicam que a interação entre profissionais da saúde é rara. Isso é atribuído à cultura hierárquica e individualista das profissões. Por exemplo, o processo de socialização dos médicos os ensina a serem atores independentes, autoritários, autônomos, competitivos, conservadores, reativos, rápidos e imparciais. A identificação profissional que resulta desse processo de socialização faz com que os profissionais da saúde, em especial os médicos, tenham baixo grau de identificação com a organização na qual trabalham, enfatizando o espírito de corpo. Dessa forma, é mais difícil estimular a colaboração e o aprendizado em grupo, essenciais para a inovação.

Os sistemas de controle e mensuração de desempenho são pouco desenvolvidos. Os profissionais da saúde tendem a acreditar que os sistemas de acompanhamento de desempenho não refletem a realidade corretamente e que os dados poderão ser utilizados contra eles. Como consequência, têm baixo grau de confiança, tanto nas organizações quanto em seus sistemas. Logo, dados críticos não estão disponíveis nem para gerar novos conhecimentos e inovações nem para acompanhá- los, quando em progresso. O acompanhamento contínuo de dados e a correção de ações são, idealmente, fatores relevantes para a implementação bem-sucedida de inovações.

A seguir será apresentada a metodologia utilizada para realizar os estudos de caso.

3. METODOLOGIA A escolha da metodologia para uma pesquisa depende de seu referencial teórico, bem como de seus objetivos. A pesquisa aqui relatada foi de natureza exploratória e descritiva. Dada a natureza deste trabalho, considerou-se a pesquisa qualitativa como a mais adequada para a investigação do problema em questão. Os estudos de caso são considerados a melhor alternativa quando o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos que estuda e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real (Yin, 2001), como é o caso da inovação, dos modelos organizacionais e da gestão de pessoas. Conforme descrito por Einsenhardt e Graebner (2007), o estudo de caso permite compreender e analisar a dinâmica presente em determinados contextos.

Os três estudos de caso exploratórios foram realizados no período de 2007 a 2010, baseados em entrevistas semiestruturadas, com membros da alta e da média gerências. Além disso, foram analisados documentos internos, relatórios das organizações e seus sites.

As organizações hospitalares estudadas foram escolhidas por fazerem parte de um seleto grupo de hospitais nos Estados Unidos e no Brasil que têm demonstrado esforço constante na adoção de inovações e são acreditadas pela Joint Commission(nos Estados Unidos) e pela Joint Commission International(JCI) (no Brasil), entidade estadunidense que acredita serviços de saúde. Esse fato permite afirmar que elas são pelo menos comparáveis em termos de condições para a prestação de serviços.

 A primeira dessas organizações, localizada em Ohio, Estados Unidos, é constantemente considerada uma das melhores instituições hospitalares desse país, recebendo décadas pacientes de todo o mundo. Recebeu o prêmio de primeiro lugar pelo American Group Medical Association, que reconhece desempenho excepcional em inovação e avanços na qualidade.

Foram ainda pesquisadas duas instituições em São Paulo, Brasil. Uma delas é um hospital geral, filantrópico e de grande porte, que se destaca pela adoção constante de inovações, tendo sido estudado nesse contexto (Queiroz & Vasconcelos, 2005). Ela ocupa posição de vanguarda entre as instituições hospitalares similares da América Latina, tendo sido, em 1999, a primeira instituição fora dos Estados Unidos a receber a certificação da Joint Commission International(JCI). Ela também tem sido a primeira classificada no rankingda América Economia (2012). Além disso, dispõe de certificações ISO em numerosas áreas. Esse patamar de excelência, documentado segundo parâmetros internacionais, é plenamente reconhecido pelos clientes. Pesquisa divulgada pela instituição em 2009 demonstrou que a instituição supera as expectativas de 98% de seus pacientes. Além disso, é conhecida no mercado por possuir as mais modernas tecnologias médicas, profissionais da saúde do mais alto nível e serviços de alta qualidade.

A segunda instituição nacional pesquisada é um hospital filantrópico de referência em cardiologia clínica e cirúrgica que, recentemente, se expandiu para incorporar novas especialidades com sucesso. Assim como as outras duas instituições, foi acreditada pela Joint Comission International(JCI) em 2006 e re-acreditada em 2009. Além disso, dois de seus programas de cuidados foram acreditados em 2012.

A primeira parte do roteiro de entrevista focalizou os dados específicos dos entrevistados (idade, formação profissional, escolaridade e especialidade, tipo de vínculo profissional com a instituição, tempo na instituição e no cargo atual, número de horas que dedica ao trabalho na organização por semana). Foram selecionados membros da alta e da média gerências envolvidos com decisões estratégicas, de inovações e/ou de gestão de pessoas. Na segunda parte, buscou- se compreender a atividade de cada entrevistado, o setor no qual atua e os principais órgãos internos ou pessoas da estrutura organizacional com os quais se relaciona. Finalmente, na terceira teve-se como objetivo levantar dados específicos sobre as inovações e os processos organizacionais que as permeiam.

Para tanto, perguntou-se quais foram as principais inovações desenvolvidas nos últimos cinco anos, quais os aspectos da estrutura organizacional favoreceram ou dificultaram as implementações de inovações, quais as políticas e práticas de gestão de pessoas são adotadas pela organização, quais os principais objetivos organizacionais, quais os principais valores organizacionais e quais foram as dificuldades enfrentadas na implementação das inovações.

Adicionalmente, foram analisados relatórios internos, relatórios anuais e informações dos sites das três instituições. Essas estratégias permitiram uma comparação contínua dos dados das diferentes fontes para a sua validação. As respostas às entrevistas foram cotejadas com os dados formais das organizações e foram analisadas em função da literatura considerada.

4. A PESQUISA 4.1. Breve histórico das organizações pesquisadas O primeiro estudo de caso foi realizado no Hospital A em São Paulo, Brasil, no ano de 2007. foram realizadas dez entrevistas com membros das alta e média gerências. Esse hospital nasceu da iniciativa de imigrantes no ano de 1955 e inaugurou sua primeira unidade hospitalar em 1971. Trata-se de um hospital geral, privado, sem fins lucrativos, que possuía, em 2009, aproximadamente, 500 leitos, 30 salas de cirurgia, 7.000 colaboradores e 6.000 médicos no corpo clínico aberto. O hospital oferece todo o tipo de serviço assistencial e de apoio. Em 2009, foram atendidos, aproximadamente, 160.000 pacientes por dia e realizadas 30.000 cirurgias por ano. A instituição gerou, nesse mesmo ano, uma receita de R$ 998,1 milhões.

A organização goza de excelente reputação no mercado, que resulta das ações empreendidas por seus presidentes ao longo dos anos. Depois de sua fundação e entrada em funcionamento, veio a fase de 1979 a 1985, caracterizada pelo desenvolvimento da estrutura física. Como exemplo, pode-se mencionar a construção de um segundo prédio, a fim de oferecer melhor suporte diagnóstico aos membros do corpo clínico e de despertar neles o interesse de vincular seus nomes ao do hospital. A fase seguinte, de 1986 a 1994, foi caracterizada pelas inovações tecnológicas. A instituição adquiriu a reputação de ser o hospital mais bem equipado, do ponto de vista tecnológico, e um centro de excelência em São Paulo, no Brasil e na América Latina. O período de 1994 a 2001 foi caracterizado pelo aumento da concorrência no mercado de hospitais privados em São Paulo e pelo incremento dos custos associados à assistência. Nesse contexto, a instituição decidiu estabelecer novos objetivos estratégicos.

Assim, enfatizou a qualidade dos processos e expandiu suas atividades diagnósticas para o público externo, visando crescimento econômico. Na fase atual (a partir de 2002 até, pelo menos, 2012), seu presidente busca a incorporação e a difusão de conhecimento para adotar as Best Practices for Patient Care (melhores práticas na assistência ao paciente).

A missão e a visão da organização reforçam os objetivos perseguidos: Missão -oferecer excelência de qualidade no âmbito da saúde, da geração do conhecimento e da responsabilidade social, como forma de evidenciar a contribuição da comunidade imigrante à sociedade brasileira.

Visão - ser líder e inovadora na assistência médico- hospitalar, referência na gestão do conhecimento e reconhecida pelo comprometimento com a responsabilidade social.

Valores - honestidade, verdade, integridade, diligência, justiça, altruísmo, autonomia, profissionalismo e trabalho em equipe.

O segundo estudo de caso foi realizado em uma organização hospitalar (Hospital B) localizada em Ohio, Estados Unidos, nos anos de 2008 e 2009. Nela foram realizadas 12 entrevistas com membros das alta e média gerências. Trata-se de centro médico e acadêmico, sem fins lucrativos, que integra atendimento clínico e hospitalar a ensino e pesquisa. Essa organização foi fundada em 1921 por quatro médicos renomados que tinham como objetivo criar uma instituição capaz de oferecer excelente assistência aos pacientes, baseando-se em princípios de cooperação, compaixão e inovação. Em 2009, o Hospital B possuía 1.210 leitos, recebeu aproximadamente 3,7 milhões de visitas, realizou 54.000 internações e 79.000 cirurgias. Nesse mesmo ano, a instituição possuía aproximadamente 7.200 funcionários, dos quais 2.000 são médicos e pesquisadores assalariados.

Essa organização foi considerada a quarta melhor dos Estados Unidos pelo relatório da 2010-2011 Best Hospitals da US News & World Report(2010).A publicação avalia 5.000 hospitais nos Estados Unidos para identificar os 16 melhores. Esse trabalho considera índices de mortalidade, segurança dos pacientes e reputação da instituição com mais de 10.000 especialistas em um período de três anos. O Hospital B possui o melhor serviço de cardiologia além de outras 13 especialidades classificadas entre as dez melhores. Uma pesquisa de satisfação realizada com pacientes que receberam alta demonstra que 79% indicariam o Hospital B para amigos e familiares, média acima da nacional (Estados Unidos) que é de 68%.

A missão do Hospital B é prestar assistência na saúde, com compaixão e dentro dos mais altos padrões de qualidade, em um contexto de ensino e pesquisa. Os principais valores que sustentam essa missão são: colaboração, comprometimento com a qualidade e inovação, integridade e comprometimento com os stakeholders.

O terceiro estudo de caso foi realizado no ano de 2010 em uma instituição na cidade de São Paulo. Nesse hospital, foram entrevistados 16 membros das média e alta gerências. O Hospital C iniciou suas atividades em 1976 e é uma instituição sem fins lucrativos e de referência em procedimentos de alta complexidade. Essa organização faz parte de um projeto mais amplo de uma comunidade imigrante, que se iniciou em 1918 com ajuda aos órfãos da Guerra Mundial e seguiu com a abertura de um hospital em Campos do Jordão, em 1947, para tratar a tuberculose. Recentemente, expandiu suas atividades para incluir novas especialidades, tais como ortopedia, oncologia, gastroenterologia, urologia, neonatologia etc. Esse hospital possuía, em 2009, 229 leitos, 1.930 colaboradores e 933 médicos do corpo clínico aberto. Nesse mesmo período realizou 11.298 internações e obteve uma receita de R$ 223 milhões.

Essa instituição tem como missão, visão e principais valores: Missão - promover com excelência e ética a recuperação da saúde, atuando com pioneirismo em cardiologia, compartilhando recursos tecnológicos e conhecimentos com outras especialidades, associando ensino e pesquisa clínica, valorizando a participação multiprofissional e multidisciplinar na assistência humanizada, visando à prevenção e ao bem-estar com qualidade de vida.

Visão - manter e ampliar o nível da instituição e os reconhecimentos nacional e internacional, identificando, atraindo e retendo profissionais com potencial técnico, científico e social.

Valores - valorização da vida, qualidade, ética, pioneirismo tecnológico, responsabilidade social e ambiental, ensino e pesquisa, humanização, valorização e integração profissional.

5. ANÁLISE DOS RESULTADOS Nesta seção, são apresentados os principais resultados da pesquisa de campo.

Primeiramente, são descritas as variáveis organizacionais e de gestão de pessoas que compõem os modelos organizacionais das três instituições pesquisadas. Posteriormente, apresentam-se considerações acerca das relações dessas variáveis com as inovações das organizações pesquisadas. Os dados foram analisados de maneira a permitir uma comparação contínua dos dados das diferentes fontes para a sua validação.

No que diz respeito às características dos modelos organizacionais, os hospitais pesquisados encontram-se em estágios distintos de desenvolvimento organizacional. O Hospital B possui uma estrutura matricial (Vasconcellos & Hemsley, 2000) consolidada, com políticas e práticas de gestão de pessoas alinhadas a esse modelo. O Hospital A, por sua vez, apresenta uma estrutura similar à burocracia profissional (Mintzberg, 2003) e, nos últimos três anos, buscou incorporar políticas e práticas de gestão de pessoas que focalizam a fidelização dos colaboradores, em especial do corpo clínico aberto, e o incremento no trabalho em equipes multiprofissionais. O Hospital C, apesar de apresentar uma evolução mais lenta, fez mudanças significativas em sua estrutura e gestão de pessoas nos últimos dois anos. Evoluiu de uma estrutura mecanicista (Mintzberg, 2003), com processo decisório centralizado, para um modelo funcional (Vasconcellos & Hemsley, 2000) e busca caminhos, por meio de políticas e práticas de gestão de pessoas, para melhorar a comunicação e a integração das áreas recém-estabelecidas. No Quadro_1 constam as principais características organizacionais das três instituições, apresentando-as em função daquelas atribuídas às organizações inovadoras.

O Hospital B possui um modelo organizacional baseado no conceito de equipes multiprofissionais (group practice). Os especialistas de todas as suas unidades (17 unidades de saúde da família, 8 hospitais comunitários e 1 centro de tratamentos de alta complexidade) colaboram para realizar o tratamento de um determinado paciente. Nesse contexto, os diversos departamentos de especialidades relacionadas organizam-se em institutos para oferecer um serviço integrado ao paciente (por exemplo, os institutos de cardiologia, oncologia, pediátrico etc.). Para integrar as diversas especialidades em institutos, a organização faz uso de sofisticados recursos da tecnologia da informação. O primeiro, e mais importante, é o sistema de prontuário eletrônico, que registra e distribui todas as informações dos pacientes, on-line e em tempo real. O segundo é um sistema denominado PACS (Picture Archiving System, sistema de arquivamento de imagens), que permite a rápida distribuição dos exames pela intranet.

Outro recurso de integração entre as especialidades é o médico da família/ cuidados primários. Esse profissional é responsável por desenvolver e compartilhar um conhecimento detalhado sobre os pacientes e direcioná-los internamente às equipes envolvidas no tratamento, desenvolvendo um processo de regulação interna. Finalmente, os diversos institutos mensuram e divulgam informações sobre o desempenho de suas atividades em Outcomes Booklets (livros de resultados), disponíveis no site da empresa. Os booklets trazem indicadores de qualidade, volume de pacientes, índices de mortalidade, técnicas e procedimentos médicos, serviços e inovações etc. para a comunidade de profissionais da saúde.

O Hospital A fez uma alteração relevante em seu modelo organizacional no ano de 2006, quando implementou a atual estrutura, que separou a Prática Médica da Prática Assistencial e designou o staff corporativo para disseminar e controlar novos padrões de assistência. O principal objetivo, de acordo com os entrevistados, foi a necessidade de descentralizar as decisões e torná-las menos dependentes do conhecimento médico. Desde então, observa-se aumento no trabalho em equipes multiprofissionais e na participação de seus membros, especialmente no que diz respeito a projetos especiais - como o da re- acreditação pela JCI, o da incorporação de novos processos de trabalho etc.

Outro aspecto relevante a destacar é o crescente investimento em treinamento e desenvolvimento em todos os níveis da organização. O Instituto de Ensino e Pesquisa (IEP) incentiva a realização de pesquisas e a participação em eventos científicos, desenvolve a educação continuada para as diversas profissões (privilegiando ainda as voltadas à saúde), promove seminários para disseminar conhecimento e organiza a Educação Médica Continuada (EMC) para os médicos do corpo clínico aberto. Essa última tem colaborado de maneira significativa para que os médicos do corpo clínico aberto aumentem seu grau de identificação com a organização e seu conhecimento em relação às práticas assistenciais estimuladas.

De acordo com Nembhard et al. (2009), a identificação profissional que resulta do processo de socialização dos profissionais da saúde, em especial os médicos, faz com que em geral tenham um baixo grau de identificação com a organização na qual trabalham, fortalecendo o espírito de corpo em detrimento da lealdade para com a empresa. Dessa forma, é mais difícil estimular a colaboração e o aprendizado em grupo, essenciais para a inovação. O Hospital A tem adotado algumas políticas e práticas específicas de gestão de pessoas para aumentar a identificação dos médicos com a organização, tal como treinamentos, avaliação de desempenho, processos formais de feed-back e remuneração variável alinhada aos objetivos de desempenho.

O Hospital C iniciou a descentralização de seu processo decisório recentemente (2009), com a alteração de uma estrutura mecanicista para uma estrutura funcional. Como se pode observar pelos dados apresentados na seção "Breve histórico das organizações pesquisadas", essa organização é menor do que as outras duas. Por esse motivo, pode ter demorado a realizar um movimento formal em direção à descentralização, por falta de necessidade. Até recentemente, o presidente da organização, apoiado pelo conselho consultivo, tomava todas as decisões - desde compras básicas de medicamentos e materiais até decisões relacionadas à introdução de inovações tecnológicas. De acordo com os entrevistados, a queda em faturamento, ocorrida em função do aumento da concorrência na área de cardiologia (na qual a instituição é referência), resultou em mudanças importantes para a organização. Foi feito um esforço deliberado para descentralizar as decisões, teve início a busca pela acreditação pela JCI e o hospital estimulou o desenvolvimento de novas especialidades médicas (ortopedia, oncologia etc.) em coerência com a Cardiologia. Recentemente, observa-se a incorporação de novas políticas e práticas e gestão de pessoas, entre as quais o estimulo aos trabalhos em equipes multiprofissionais, o recrutamento de profissionais qualificados, a avaliação de desempenho por competências (ainda restrito aos níveis gerenciais).

A seguir, no Quadro_2 apresentam-se as principais políticas e práticas de gestão de pessoas adotadas pelas três organizações pesquisadas.

No que tange à inovação e ao modelo organizacional, as três organizações pesquisadas são reconhecidas pela capacidade de incorporar inovações. O Hospital B pode ser considerado o mais inovador, por ter um histórico de desenvolvimento de novos produtos e serviços de impacto significativo na área médica, internacionalmente. Como exemplo, a primeira angiografia coronária (1958), o primeiro transplante de rins realizado pelo umbigo do paciente (2007), a primeira cirurgia de transplante quase-total de face dos Estados Unidos (2008) e o primeiro transplante de coração e rins em paciente com coração artificial (2009). Em 2009, foram investidos cerca de US$ 300 milhões em pesquisa e desenvolvimento.

O Hospital A é reconhecido na América Latina por possuir os mais modernos e sofisticados equipamentos para tratamentos de doenças de alta complexidade.

Adicionalmente, tem realizado várias inovações em processos, como a incorporação dos equipamentos Pyxis para controle de dispensação de medicamentos, o prontuário eletrônico e a implementação do PACS (Picture Archiving System, sistema de arquivamento e distribuição de exames de imagem).

Em 2009, investiu cerca de R$ 20 milhões em pesquisa e desenvolvimento. Foi o primeiro no Brasil a implantar o equipamento Alpha-Omega, considerado o mais preciso para tratamento cirúrgico da doença de Parkinson, e o Aquilium One, a mais moderna tecnologia então existente em tomografia computadorizada.

O Hospital C tornou-se referência na área de cardiologia por ter adquirido competências similares às de hospitais reconhecidos nos Estados Unidos, inclusive comparáveis ao do Hospital A. Em 1985, foi o primeiro a realizar transplantes cardiopulmonares na América Latina. Inovou em serviços ao incorporar novas especialidades com sucesso, inclusive tornando-se referência em ortopedia e medicina esportiva. Esse hospital tem desenvolvido inovações significativas em processos, como a adoção de visitas interdisciplinares para acompanhamento dos pacientes e incorporação do PACS (Picture Archiving System, sistema de arquivamento de imagens).

Os dados coletados e analisados nesses três estudos de caso não permitem relacionar diretamente os aspectos organizacionais e de gestão de pessoas às inovações mencionadas pelos entrevistados. No entanto, ao comparar os três hospitais, dados suficientes para afirmar que a existência de determinadas variáveis organizacionais e de gestão de pessoas (Leede & Looise, 2005; Jimenez-Jimenez & Sanz-Valle, 2008; Parolin & Albuquerque, 2009) pode favorecer a inovação. Além disso, o alinhamento das políticas e práticas de gestão de pessoas aos objetivos e valores organizacionais, conforme sugerido por Albuquerque (1999; 2002), tem papel fundamental para a inovação nas organizações.

No Hospital B, as políticas e práticas de gestão de pessoas são reconhecidas e identificadas pelos entrevistados como relevantes para os processos de inovação. Essas políticas e práticas estão alinhadas a uma estratégia organizacional mais ampla que engloba e comunica, claramente, os objetivos de inovação e assistência com compaixão, estabelecidos na sua missão.

Adicionalmente, a identificação dos profissionais da saúde, em especial os médicos, com a organização é alta e favorece o trabalho em equipes multidisciplinares, no âmbito dos institutos existentes. De acordo com Nembhard et al. (2009), o trabalho em equipes multiprofissionais, a identificação do profissional da saúde com a organização e a adoção de sistemas de controle e mensuração de desempenho são fundamentais para a inovação nas organizações da saúde. No caso do Hospital B, todos esses elementos estão presentes.

Nos Hospitais A e C a relação entre os aspectos organizacionais e de gestão de pessoas e inovação não está evidente. Em primeiro lugar, os objetivos estratégicos não são claros no que diz respeito à inovação. Para o Hospital A, o objetivo estratégico é: ser o hospital mais bem equipado em termos de recursos tecnológicos e humanos na América Latina e ter excelência no atendimento médico-assistencial. Para o Hospital C, é oferecer aos pacientes uma assistência humanizada e de excelência. Em segundo lugar, observa-se que as inovações mencionadas pelos entrevistados dos hospitais A e C são novas para a firma, o que as distingue da maioria das inovações geradas no Hospital B, ditas novas para o setor. Finalmente, o volume de inovações no Hospital B é muito superior aos números dos Hospitais A e C.

Os dados coletados permitem afirmar que, nessas duas instituições, a adoção de modelos organizacionais mais flexíveis e de políticas e práticas de gestão de pessoas que estimulem a inovação são muito mais um reflexo das pressões de mercado e das exigências do processo de acreditação pela JCI do que de objetivos estratégicos relacionados à inovação. De fato, observa-se nesses hospitais a adoção de novidades (tanto tecnológicas quanto organizacionais) por modismo e mimetismo, em linha com outras pesquisas realizadas no setor no Brasil e apresentadas por Malik (2009).

Esse contexto, no entanto, não é desfavorável para essas duas organizações. A flexibilização das estruturas organizacionais, o incentivo ao trabalho em equipes multiprofissionais no âmbito de projetos especiais e a adoção de políticas e práticas de gestão de pessoas capazes de estimular a inovação, ainda que restritas a níveis gerenciais e a áreas específicas dos hospitais, têm contribuído para gerar mudanças na cultura rígida que dificulta a implementação de inovações de maneira regular. A percepção dos entrevistados é a de que avanços importantes a reconhecer.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Trabalhos recentes têm investigado as variáveis organizacionais e de gestão de pessoas que compõem o modelo organizacional dos hospitais e que dificultam a implementação bem-sucedida de inovações (Weick & Sutcliff, 2003; Khatri et al., 2006; Malik, 2009; Nembhard et al., 2009). Os autores são unânimes em afirmar que os desafios das instituições da saúde residem não no desenvolvimento de inovações tecnológicas e sim na superação de aspectos organizacionais e culturais que se encontram profundamente arraigados na prática clínica e impedem a adoção bem-sucedida de inovações.

Em primeiro lugar, a pesquisa aqui apresentada demonstrou que quando a estratégia organizacional contempla objetivos de inovação e quando as variáveis do contexto organizacional e as políticas e práticas de gestão de pessoas estão alinhados a esses objetivos, a organização da saúde é capaz de superar as limitações culturais e organizacionais inerentes à sua prática, como é o exemplo do Hospital B. É tentador, mas não é possível afirmar que nos Estados Unidos mais pressões para desenvolver inovações para o setor do que no Brasil, onde o fato de a firma ser inovadora é valorizado.

Em segundo lugar, é possível afirmar que as duas organizações brasileiras estudadas tendem a adotar modelos organizacionais mais flexíveis, em geral para responder a pressões externas, como o mercado de pacientes, o de operadoras de saúde e as agências de acreditação. Ambos os hospitais geram inovações tecnológicas que são novas para as firmas com o intuito de tornarem-se similares aos seus pares nacionais e internacionais. Esse processo não é ideal, mas tem proporcionado mudanças importantes na cultura e nas organizações, facilitando a colaboração, o compartilhamento de conhecimentos e o aprendizado, relevantes para os processos de inovação.

Tendo em vista as características da pesquisa realizada, suas contribuições apresentam limitações. Em primeiro lugar, o contexto das organizações estudadas é restrito. Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil (ou mesmo no estado de São Paulo) diversos outros hospitais com características diferentes, que também são inovadores, eventualmente em relação a outros objetos. Pesquisas futuras poderão analisar número maior de instituições da saúde para identificar, especificamente, as relações entre determinadas políticas e práticas de gestão de pessoas e as inovações adotadas.

Finalmente, considerando especificamente o aspecto gestão de pessoas, não necessariamente a percepção dos gestores representa a realidade organizacional.

Com frequência, aspectos identificados e valorizados pela gerência passam despercebidos ou são interpretados de forma diferente por atores com atividade mais técnica (mesmo que com formação equivalente). Em outras palavras, novos estudos também podem contrastar a maneira pela qual as inovações são percebidas.


transferir texto