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BrBRHUAp0080-21072013000400011

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variedadeBr
ano2013
fonteScielo

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Accountability em câmaras municipais: uma investigação em portais eletrônicos

1. INTRODUÇÃO As tecnologias da informação e comunicação (TICs), entre as quais se destacam a Internet, as redes de computadores, a transmissão via satélite e a telefonia móvel, criaram condições para o surgimento da sociedade do conhecimento.

O Estado, por intermédio do governo eletrônico (e-gov), representa um importante instrumento do qual os cidadãos dispõem atualmente para enfrentar os desafios impostos pela globalização, por meio de interações inéditas da sociedade, empresas e governos (Braga, Alves, Figueiredo & Santos, 2008).

Um dos mecanismos utilizados para operacionalizar o e-gov é a implementação de portais eletrônicos.

Parte-se do princípio de que, dependendo dos objetivos e da forma como são construídos, dos designs tecnológicos adotados, os portais eletrônicos podem contribuir efetivamente para a construção de accountability. No entanto, considerando-se que tanto a inserção da accountability na agenda política quanto a presença dos portais como arenas políticas são ainda recentes na realidade brasileira, tornam-se necessárias pesquisas empíricas que possam afirmar ou refutar os portais eletrônicos como aparatos tecnológicos de promoção de accountability.

É nesse contexto que se desenvolve a presente pesquisa, tendo como objeto de estudo os portais eletrônicos de câmaras municipais no estado de Santa Catarina, considerando que a maioria dos trabalhos até agora desenvolvidos normalmente abordam o Executivo. Parte-se do pressuposto de que os portais eletrônicos de câmaras municipais do estado de Santa Catarina são, atualmente, instrumentos com baixa capacidade no sentido de promover a construção de accountability, constituindo-se, em sua maioria, como murais eletrônicos.

Busca-se investigar o pressuposto apresentado por meio de pesquisa empírica, a partir da formulação da seguinte questão problema: Como estão estruturados os portais eletrônicos de câmarasmunicipais do estado de Santa Catarina enquanto promotores da construção de accountability? O estado de Santa Catarina divide-se em 293 municípios e não apresenta grandes concentrações populacionais. Distribuídas uniformemente, as cidades são majoritariamente de pequeno tamanho. Do total de municípios, apenas 27 têm mais de 50 mil habitantes. Mesmo Florianópolis distingue-se das outras capitais brasileiras por não apresentar grande concentração populacional. Além disso, o estado ocupa posições de destaque, tanto no Produto Interno Bruto (PIB) a preços correntes, quanto no PIB per capita, e em relação ao Índice de Desenvolvimento Humano Municipal posiciona-se entre as regiões consideradas de nível alto.

Assim, neste artigo tem-se por objetivo investigar a capacidade dos portais eletrônicos de câmaras municipais do estado de Santa Catarina para a construção de accountability. Para tanto, o estudo está organizado em cinco seções, iniciando com esta introdução. Após, fez-se uma incursão teórica sobre patrimonialismo/neopatrimonialismo, legislativo local, accountability e legislativo eletrônico. Em seguida, são apresentados os procedimentos metodológicos adotados na pesquisa e, posteriormente, expõem-se a descrição e a análise dos resultados. Por fim, são tecidas as conclusões.

2. CONSTRUÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO 2.1. Patrimonialismo/neopatrimonialismo Este artigo lastreia-se em Schwartzman (1988), que defende que a realidade brasileira pode ser melhor entendida e explicada a partir de um referencial weberiano do que de um marxista, pois no Brasil vigem componentes não baseados em relações de classe (base do referencial marxista) que são decisivos para o entendimento do poder. Entre elas encontram-se estruturas do poder local e regional assentadas em lideranças tradicionais, ainda poderosas, que se distanciam das estruturas de classe convencionais em sociedades modernas, industriais.

E o referencial weberiano parte de uma definição do patrimonialismo como uma das manifestações da dominação tradicional na qual a organização do poder político se de forma análoga ao poder doméstico do governante (Weber, 1999a). Despojado de sua dimensão pública, o poder, no arcabouço do patrimonialismo, expressa um direito do soberano apropriado por ele como qualquer outro objeto de sua propriedade. O patrimonialismo deriva do exercício do poder político, em um determinado território, por parte da autoridade senhorial, legitimada pela tradição, cujas características principais estão assentadas no poder individual do governante sustentado por um aparato administrativo formado a partir de critérios estritamente pessoais (Weber, 1999b).

Em Weber (1999a; 1999b), patrimonialismo expressa a incapacidade ou a relutância do príncipe em distinguir entre o patrimônio público e seus bens privados (Bresser Pereira, 1997). No patrimonialismo, o governante trata a administração política como seu assunto pessoal e igualmente explora o poder político como um predicado útil de sua propriedade privada (Bendix, 1986).

Trazendo essa discussão para o Brasil, é oportuno registrar que o Estado e, em particular, a administração pública brasileira sofreram em sua fundação a influência de um ethos fortemente patrimonialista, resultado da herança cultural lusitana (Martins, 1997). O Estado no período colonial brasileiro lastreou-se em um modelo patrimonialista e centralizador. Mais do que isso, sempre foi poderoso, autoritário, autolegitimado, conformando a sociedade em uma relação de tutela e subordinação. Nesse contexto, a administração praticada direcionou-se muito mais para a prestação de serviços aos governantes do que para a sociedade como um todo (Amorim, 2000).

Também Holanda (1969), baseando-se no referencial weberiano, assevera que durante e após a colonização não era fácil aos detentores das posições públicas de responsabilidade, formados nesse ambiente dominante, fazerem a distinção fundamental e necessária entre os domínios do privado e do público. Faoro  (2008) expressa que em algumas regiões do País, notadamente no Nordeste, onde os traços do patrimonialismo estão arraigados no cotidiano e no trabalho da sociedade, fomentou-se o surgimento de problemas e disfunções na administração de organizações públicas brasileiras dos diversos setores. O autor nota a utilização frequente dos poderes e das instituições públicas para o contínuo exercício da dominação acompanhado de um processo de enriquecimento da camada dirigente da sociedade.

Passados quatro séculos, Schwartzman (1988) faz uma atualização do conceito weberiano no Brasil, entendendo os regimes patrimoniais modernos como neopatrimonialistas. O neopatrimonialismo não é, defende o autor, simplesmente uma sobrevivência, um resíduo de estruturas tradicionais em sociedades contemporâneas, mas uma forma bastante atual de dominação política exercida por um estrato social sem propriedades, sem honra social ou mérito próprio, qual seja, a burocracia e a chamada classe política.

Parece haver uma resiliência do patrimonialismo, capaz de absorver mudanças modernizantes na sociedade brasileira e de se amoldar às novas situações, configurando um possível patrimonialismo camaleônico que consegue, pela adaptação, não sobreviver como se reforçar, mesmo a ordem econômica sofrendo mudanças modernizantes apreciáveis (Pinho, 1998). Para Pinho (1998), a ordem econômica muda e o patrimonialismo adapta-se a ela, não provocando, no entanto, alterações na ordem política, pelo menos não substancialmente. A nova ordem econômica é gerida basicamente pela mesma ordem política. A burocracia pode até ser weberiana, mas desde que não atrapalhe os interesses patrimonialistas fortemente enraizados e instalados na condução política da nação. Assim, o patrimonialismo continua não vivo, presente, mas também muito atuante nos processos políticos no Brasil.

2.2. Legislativo local A literatura política brasileira tem dado destaque às fragilidades do poder legislativo local no que se refere às alternativas de tomada de decisões políticas, principalmente a baixa capacidade de legislar das câmaras, decorrentes das prerrogativas fundadas pela Lei Orgânica dos Municípios, impossibilitando o legislativo local de elaborar leis que envolvem gastos. Eram mínimas as atribuições legislativas dos vereadores, comparadas à possibilidade quase ilimitada do prefeito de conduzir o processo decisório (Kerbauy, 2005).

Nesse contexto, o exercício da vereança acaba ficando confinado ao papel de atendente das necessidades individuais privadas, assentado em uma relação de clientela que desemboca em uma relação público-privada que circunscreve a forma como se estabelece o controle sobre os recursos políticos. O exercício da vereança, nesse estado da arte, acaba por criar vínculos, obrigações que lhe facilitam a prática do favor (Kerbauy, 1993). O vereador é permanentemente colocado de frente com uma escolha, referente à dinâmica relacional entre executivo e legislativo: apoiar o governo e o prefeito na expectativa deles corresponderem aos seus interesses, ou ser oposição e ter sua capacidade de atendimento às suas demandas cerceada (Lopez, 2004).

A limitada capacidade do legislativo de fiscalizar o executivo é resultado, entre outros aspectos, da dependência dos vereadores no tocante à capacidade de atendimento às demandas feitas pelos eleitores com recursos do executivo.

Sustentar a relação com o executivo é o que garante ao vereador o prestígio, junto aos eleitores, de agente da mediação (Kuschnir, 1993).

Para Silverman (1977), configuram-se relações de patronagem definidas como relações informais, em que assimetria de poder, prestígio ou status, com obrigações recíprocas e, na maior parte das vezes, personalizadas. Os vínculos criados entre as partes são relativamente contínuos, conquanto flexíveis. As relações emergem, sobretudo, em contextos em que controle rígido ou escassez na distribuição de recursos (materiais ou imateriais). O controle da distribuição é um dos elementos cruciais para a manutenção do poder social dos patrões em relação aos clientes.

Fica claro nas percepções de Silverman (1977), Kerbauy (1993), Kuschnir (1993) e Lopez (2004) que o legislativo local se estrutura em bases patrimonialistas.

Tudo exala um viés, um corte tradicionalista, nada impregnado de valores racionais, mas sim de interesses pessoais. As câmaras municipais mantêm estruturas patrimonialistas, neopatrimonialistas, ainda mais em municípios pequenos, e até médios.

2.3. Accountability Campos (1990) percebeu, ao tomar contato com o conceito de accountability, que ele não tinha uma expressão equivalente em português de forma direta e única que contemplasse o espectro de significados existentes no termo em inglês. A ausência do conceito de accountabilityno Brasil decorria da sua pobreza política, uma vez que as pessoas optavam por esperar que o Estado defendesse e protegesse os interesses não organizados em vez de atuar na organização para agregação de seus próprios interesses ou para enfrentamento do poder do Estado.

Uma noção mais restrita de accountability considera somente os mecanismos de controle formalizados e institucionalizados como capazes de exigir a responsabilização dos agentes públicos pelos atos praticados. Nesse escopo, mecanismos informais, como o controle exercido pela imprensa e pela sociedade civil, não são considerados (Kenney, 2003). Uma noção mais abrangente de accountability, considera, por sua vez, além dos mecanismos formais e institucionalizados, também mecanismos informais, desde que haja capacidade de sanção dos agentes públicos por parte das relações desenvolvidas a partir dos mecanismos. O exercício da accountability requer capacidade de resposta dos agentes públicos (capacidade de informar sobre os atos) e capacidade de sofrer sanções e perda de poder para aqueles que violaram os deveres (capacidade de punição) (Dunn, 1999). A noção mais ampla de accountability admite toda e qualquer relação de controle e monitoramento sobre agentes públicos como mecanismos capazes de exigir a responsabilização (Day & Klein, 1987; Paul, 1992).

Para Denhardt e Denhardt (2007), a visão normalmente associada à accountabilitye à responsabilização dos agentes públicos, como parte do modelo da Administração Pública Tradicional, refere-se a uma atuação focada nos padrões tradicionais de controle, restritos à verificação da conformidade das despesas públicas, que determina a atuação da maioria dos órgãos de controle.

Os autores entendem que o ser humano é um ser político que age na comunidade, que a comunidade politicamente articulada requer a participação do cidadão para a construção do bem comum e que o bem comum precede a busca do interesse privado. Dadas as características desse modelo, os administradores públicos devem ser responsáveis e obrigados a prestar contas. Entende-se que esse novo processo de governança é um ato democrático, de transparência e equidade social.

O termo accountability é utilizado no estudo conforme conceito colocado por Pinho e Sacramento (2009), cujo significado envolve responsabilidade (objetiva e subjetiva), controle, transparência, obrigação de prestação de contas, justificativas para as ações que foram ou deixaram de ser empreendidas, premiação e/ou castigo. Essa foi a visão de accountability selecionada para o desenvolvimento do empírico.

Assim, o exercício da accountabilityrequer condições para que haja a disponibilidade de informações sobre a atuação do poder público e seus resultados, ou seja, prestação de contas. Nesse contexto, a prestação de contas não deve se restringir a questões legais contempladas na Lei 101 (Brasil, 2000), de 4 de maio de 2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, na Lei 131 (Brasil, 2009), de 27 de maio de 2009, denominada comumente de Lei da Transparência, e na Lei  12.527 (Brasil, 2011), de 18 de novembro de 2011, conhecida como Lei de Acesso a Informações Públicas. A prestação de contas deve corresponder a uma etapa mais avançada de análise, na qual além de se verificar a disponibilidade de informações sobre as contas públicas, observa-se também a existência de justificativa, por parte da administração, das contas nas formas apresentadas. Além da prestação de contas em uma perspectiva legal, neste estudo persegue-se ainda uma perspectiva ampliada de prestação de contas, entendida como a disponibilização de versões simplificadas do conjunto de relatórios legais, com linguagem acessível, compreensível às diferentes camadas da sociedade (Prado, 2004).

Outra dimensão da accountabilitycapaz de despertar mais condições de confiança nos governados ante os governantes reside na transparência das ações governamentais. A transparência é vista como capaz de contribuir para reduzir a corrupção no espaço público ao tempo que estabelece relações entre o Estado e a sociedade civil mais democrática (Pinho & Sacramento, 2004). Buscar transparência significa desenvolver, implantar e disponibilizar mecanismos que permitam à sociedade o conhecimento oportuno e suficiente das ações adotadas pelos governantes, das políticas implementadas e dos recursos mobilizados (Albuquerque, Medeiros & Feijó, 2006).

A participação dos cidadãos no processo decisório do ente governamental é uma dimensão da accountabilitytão importante quanto a prestação de contas e a transparência. Porém, Santos (1993) localiza na realidade brasileira uma enorme massa urbanizada, incapaz de participação ou desmotivada para isso, além da baixa taxa de demandas, do descrédito por parte da sociedade tanto nas instituições quanto na eficácia do Estado, bem como uma permanente negação de conflito devido à incapacidade de, ao assumi-lo, encontrar respostas por parte do Estado a esse conflito. Na mesma linha, Pinho (2008) o Brasil em uma situação de fraca accountability, em que não participação por parte da sociedade no sentido de exigir mais transparência do Estado, comportando-se este de acordo com um modelo histórico implantado de insulamento ante a sociedade civil.

2.4. Legislativo eletrônico Pinho (2008) considera que o governo eletrônico, representado pela informatização de suas atividades internas e pela comunicação com o público externo cidadãos, fornecedores, empresas, ou outros setores do governo e da sociedade , tem se concretizado por meio da construção de portais governamentais. Por intermédio deles, os governos mostram sua identidade, seus propósitos, suas realizações, disponibilizam serviços e informações, o que facilita a realização de negócios e o acesso à consulta por parte dos cidadãos no sentido de buscarem suas necessidades.

O governo eletrônico comporta as seguintes possibilidades: foco para o segmento governo-fornecedor (Government to Business - G2B); voltadas para a relação governo-cidadão (Government to Cosumer - G2C); e referentes a estratégias governo-governo (Government to Government - G2G). O governo eletrônico, portador da capacidade de promover essas relações em tempo real e de forma eficiente, poderia ainda se tornar um potencializador de boas práticas de governança e catalisador de uma mudança mais profunda nas estruturas de governo, marcadas por mais eficiência, transparência e desenvolvimento (Ruediger, 2002).

Zurra e Carvalho (2008) diferenciam a utilização de sistemas informacionais, em especial a Internet, entre o executivo e o legislativo. Para os autores, o primeiro pode fazer uso desses sistemas para a prestação de vários serviços à sociedade, como a emissão de guias de pagamento, a matrícula na rede de ensino, o pagamento de multas, etc. a utilização da Internet pelo legislativo é eminentemente informativa, de controle e fiscalização. É imprescindível que os parlamentos utilizem de fato o e-legislativo como uma ferramenta de controle, fiscalização e divulgação dos seus atos e dos atos do executivo.

No caso brasileiro, o que se observa é que o País até caminhou de forma acelerada na implementação das ferramentas de e-gov e, no caso dos legislativos, esse processo deu-se pouco tempo depois. Percebe-se grande diferença entre os portais eletrônicos desse Poder no que se refere à disponibilização de informações, ou seja, não se tem um padrão do que deve constar nesses portais, ficando a critério do presidente do Parlamento escolher quais informações ficarão disponíveis ao público (Zurra & Carvalho, 2008).

Para Peixoto e Wegenast (2011), uma das funções centrais de um site legislativo é a de fornecer ao usuário, de maneira acessível e inteligível, a ação de cada parlamentar de maneira individualizada. Sabe-se, todavia, que grande parte da ação parlamentar se concentra no trabalho das comissões. As TICs têm papel preponderante para fornecer ao usuário diferentes recursos que permitam a transparência e o acompanhamento individualizado das comissões.

Atualmente, legislativos federal, estadual e municipal apresentam suas páginas eletrônicas, disponibilizando informações, tais como notícias diárias sobre as ações parlamentares, ordem do dia, relatórios semestrais e anuais das ações desenvolvidas pelos parlamentares e pelas comissões, execução orçamentária, entre outros assuntos. Contudo, a disponibilização dessas informações varia muito entre as diversas casas legislativas, havendo por parte de algumas a disponibilização de uma quantidade razoável de informação enquanto em outras a disponibilização ainda é incipiente (Zurra & Carvalho, 2008).

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O estudo empreendido é descritivo, realizado por meio de uma pesquisa survey com abordagem quantitativa. O objeto de análise refere-se às câmaras municipais do estado de Santa Catarina que possuem portal eletrônico. Na coleta de dados utilizou-se um protocolo de observação com o objetivo de identificar a ocorrência ou não dos indicadores do modelo de análise. Assim, foram feitas visitas aos portais eletrônicos seguindo-se os itens do protocolo de observação.

Algumas etapas foram realizadas durante a pesquisa e a sua explicitação tem a finalidade de demonstrar os procedimentos adotados. A apresentação das etapas considera o critério da ordem sequencial das atividades desenvolvidas, como apontado a seguir.

Primeira etapa - Identificação das câmarasmunicipais de Santa Catarina com portal eletrônico Nesta etapa, primeiramente fez-se uma consulta ao portal do governo do estado de Santa Catarina (http://www.sc.gov.br). Na consulta, realizada em janeiro de 2010, foram identificadas 37 câmaras municipais com portal eletrônico. Atentando para um número reduzido de portais, considerando o total de municípios do estado, fez-se uma busca no site Google (http://www.google.com.br), também em janeiro de 2010, na qual foram identificadas outras 56 câmaras municipais catarinenses com portal eletrônico. Nesse sentido, foram pesquisados 93 portais eletrônicos, representando 31,74% dos 293 municípios existentes.

Segunda etapa - Investigação de estudos anteriores sobre portais eletrônicos A investigação de experiências anteriores de diversos autores e instituições (Diniz, 2000; Akutsu & Pinho, 2002; Prado, 2004; Pinho, 2008) que pesquisaram portais eletrônicos foi necessária a fim de identificarem-se indicadores de prestação de contas, transparência e participação para a composição do modelo de análise. Essa investigação foi realizada em março e abril de 2010. A descrição sucinta desses modelos é apresentada no Quadro_1.

Terceira etapa - Observação dos portais eletrônicos das câmarasmunicipais localizadas nas dez maiores capitais brasileiras Além de experiências acadêmicas anteriores em estudos com portais, fez-se também a observação dos portais eletrônicos das câmaras municipais localizadas nas dez capitais brasileiras com o maior número de habitantes (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Belo Horizonte, Curitiba, Recife, Porto Alegre, Belém e Goiânia) para identificar outros indicadores de prestação de contas, transparência e participação. Os acessos foram realizados em novembro de 2010.

Quarta etapa - Observação dos portais eletrônicos das câmarasmunicipais de Santa Catarina O modelo de análise construído a partir dos indicadores observados nas segunda e terceira etapas foi utilizado na observação dos portais eletrônicos das câmaras municipais de Santa Catarina. As observações para verificar a prestação de contas, a transparência e a participação nos portais foram realizadas em dezembro de 2010 e janeiro e fevereiro de 2011. O modelo de análise é apresentado no Quadro_2.

Os indicadores de prestação de contas, transparência e participação identificados a partir de experiências acadêmicas anteriores em estudos com portais, bem como da observação dos portais eletrônicos das câmaras municipais localizadas nas dez maiores capitais brasileiras, foram agrupados em quatro níveis de capacidade: nula, baixa, média e alta. Portanto, a classificação de um portal em alta ou baixa capacidade, por exemplo, é embasada em estudos citados, como o de Diniz (2000), que considerou os níveis baixo, intermediário e avançado, e o de Prado (2004), que indicou as categorias alta, média, baixa e insuficiente.

De acordo com o Modelo de Análise, será considerado com nula capacidade em prestar contas o portal no qual for observada a inexistência de qualquer tipo de relatório e/ou a impossibilidade de sua localização. Caso haja divulgação parcial e/ou após o prazo do conjunto de relatórios legais dos gastos incorridos, o portal eletrônico apresenta baixa capacidade em prestar contas. A média capacidade do portal será indicada a partir da divulgação do conjunto de relatórios legais dos gastos incorridos no prazo. a alta capacidade será identificada se houver divulgação, além do conjunto de relatórios legais no prazo, de relatórios complementares dos gastos incorridos.

No tocante à transparência, o portal terá capacidade nula no caso de inexistência de qualquer tipo de indicador de publicização das atividades dos vereadores. A baixa capacidade será definida pela presença de pelo menos um dos seguintes indicadores: detalhamento das seções (ordem do dia, atas das seções), notícias da câmara municipal sobre as atividades dos vereadores ou disponibilização da legislação. a média capacidade será identificada nos portais que apresentarem, de forma cumulativa, pelo menos um dos indicadores de baixa capacidade e um dos seguintes indicadores: disponibilização de legislação com possibilidade de download ou vídeos das sessões legislativas. Enquanto a alta capacidade será identificada caso o portal apresente, de forma cumulativa, pelo menos um dos indicadores de baixa capacidade, pelo menos um de média capacidade e um dos seguintes: divulgação das matérias nas fases de tramitação, vídeos das sessões legislativas ao vivo, TV Câmara ou Rádio Câmara.

Em se tratando de participação, será considerado com nula capacidade o portal no qual for observada a inexistência de qualquer tipo de canal para a participação dos cidadãos. A baixa capacidade será identificada caso o portal apresente pelo menos um dos seguintes indicadores: e-mail da câmara, e-mail de setores da câmara, e-mail do vereador ou formulário eletrônico. Será considerado com média capacidade o portal que apresentar, de forma cumulativa, pelo menos um dos indicadores de baixa capacidade e um dos seguintes indicadores: homepage do vereador, Twitter, Vídeo YouTube ou monitoramento das ações dos usuários. Para que o portal tenha alta capacidade, deverá apresentar, de forma cumulativa, pelo menos um dos indicadores de baixa capacidade, pelo menos um dos indicadores de média capacidade e um dos seguintes indicadores: ouvidoria ou indicativo de retorno.

4. RESULTADOS DA PESQUISA Na análise dos portais eletrônicos de câmaras municipais de Santa Catarina, os dados foram organizados por faixas populacionais. A escolha pela apresentação dos resultados baseada no tamanho populacional levou em consideração três razões. Primeiramente, a divisão da análise em classes de população foi escolhida considerando as faixas de tamanho da população dos municípios brasileiros, definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Além disso, a expectativa de que à medida que a população cresce aumentam as condições de mais recursos tecnológicos, financeiros e humanos para construir os portais. Uma terceira razão é que municípios de um mesmo grupo populacional devem ter mais homogeneidade, gerando resultados mais próximos.

Foram analisados os portais das seguintes câmaras municipais: Agronômica, Água Doce, Anchieta, Araquari, Balneário Camboriú, Balneário de Piçarras, Barra Velha, Biguaçu, Blumenau, Bom Retiro, Bombinhas, Braço do Norte, Brusque, Caçador, Camboriú, Campo Alegre, Campos Novos, Canoinhas, Capinzal, Capivari de Baixo, Chapecó, Concórdia, Corupá, Criciúma, Dionísio Cerqueira, Ermo, Faxinal de Guedes, Florianópolis, Fraiburgo, Galvão, Garopaba, Gaspar, Grão-Pará, Guaramirim, Içara, Imaruí, Imbituba, Indaial, Iomerê, Irani, Itaiópolis, Itajaí, Itapema, Itapoá, Ituporanga, Jaraguá do Sul, Joaçaba, Joinville, Jupiá, Lacerdópolis, Lages, Laguna, Lebon Régis, Mafra, Maravilha, Massaranduba, Morro da Fumaça, Nova Veneza, Novo Horizonte, Orleans, Palhoça, Palmitos, Papanduva, Passo de Torres, Penha, Pinhalzinho, Pomerode, Porto União, Pouso Redondo, Rio do Oeste, Rio do Sul, Rio Negrinho, São Bento do Sul, São Bernardino, São Francisco do Sul, São José, São Lourenço do Oeste, São Martinho, São Miguel do Oeste, Schoroeder, Seara, Siderópolis, Sombrio, Taió, Tijucas, Timbó, Trombudo Central, Tubarão, Turvo, Urussanga, Videira, Xaxim e Xanxerê.

4.1. Contribuições da prestação de contas As ocorrências dos níveis de capacidade dos portais para a prestação de contas são sintetizadas no Gráfico_1, de acordo com o qual na síntese das capacidades dos portais uma concentração nos níveis nulo e baixo, com 50 e 35 ocorrências, respectivamente, no total de 93 portais pesquisados. Assim, 91,39% dos portais apresentam nula ou baixa capacidade, apresentando a sua nula utilização para prestar contas dos gastos incorridos pelos vereadores. O fato de se estar diante de um estado que ainda possui características patrimonialistas ajuda a explicar a ausência de prestação de contas. Para Akutsu e Pinho (2002), o estado com características patrimonialistas não viceja, em seu arranjo político, a ideia de uma cidadania plena, e os agentes públicos sentem-se desobrigados a prestar contas à sociedade.

Na análise por classes populacionais, percebe-se que não evolução na prestação de contas à medida que se consideram municípios com maior população.

O único grupo que não apresenta portais com nula capacidade corresponde à classe de 100.001 a 500.000 habitantes, porém contempla a segunda maior ocorrência de portais com baixa capacidade. Por outro lado, nas três primeiras classes não foram observados portais com alta capacidade.

Os achados da pesquisa evidenciam que a prestação de contas nos portais eletrônicos de câmaras municipais não abrange os "componentes essenciais", que permitem que os entes responsáveis pelos controles externo e interno acompanhem e fiscalizem aspectos orçamentários e financeiros (Silva, 2008). Além disso, não foi observada nos portais a iniciativa pessoal dos vereadores em publicizar os gastos incorridos pelo legislativo. Para Silva (2008), a partir da iniciativa pessoal, o responsável deveria comprovar o uso, o emprego ou a movimentação dos bens, numerários e valores que lhe foram adjudicados ou confiados.

Entende-se, portanto, que não construção de accountability por meio da prestação de contas, nem mesmo prestação de contas, pois, conforme Prado (2004), esse processo não deve se restringir a questões legais, mas ser constituído de uma etapa mais avançada de análise, na qual, além de verificar a disponibilidade de informações, se observa a existência de justificativa das contas apresentadas. Se nem mesmo aquilo que a lei exige é cumprido, está-se diante de uma realidade em que a prestação de contas não ocorre nas câmaras municipais de Santa Catarina.

A publicação da Lei de Acesso a Informações Públicas (Brasil, 2011) reforça a obrigação dos agentes públicos em utilizar meios eletrônicos na divulgação de dados acerca dos atos praticados na administração pública. Algumas das exigências estão contempladas na Lei de Responsabilidade Fiscal (Brasil, 2000), bem como na Lei da Transparência (Brasil, 2009).

Percebe-se que nem mesmo a exigência da legislação é cumprida, visto que algumas câmaras municipais pesquisadas estão enquadradas na Lei de Responsabilidade Fiscal (Brasil, 2000) e na Lei da Transparência (Brasil, 2009). Apesar de o estudo não ter contemplado o impacto da Lei de Acesso a Informações Públicas (Brasil, 2011) na construção de condições de accountability, não expectativas de que esse cenário tenha se modificado de forma expressiva com a entrada da Lei em vigor. Pondera-se que a Lei ainda é recente e que a adequação a ela pode levar algum tempo. Por outro lado, essa adequação não deve ser difícil do ponto de vista técnico. O problema da não adequação e do não efetivo atendimento à Lei pode ser explicado mais por componentes políticos históricos e de cultura política do que por técnicos.

4.2. Contribuições da transparência As ocorrências dos níveis de capacidade dos portais para a transparência são sintetizadas no Gráfico_2.

Observa-se predominância de portais com baixa capacidade em promover a transparência, representando 58,06% do conjunto analisado. Na sequência aparecem os com alta e média capacidades, com 22,58 e 17,20%, respectivamente.

Em razão desses índices, entende-se que não uma busca de transparência pelos vereadores que, conforme Albuquerque et al. (2006), significa desenvolver e implantar mecanismos que permitam à sociedade ter o conhecimento oportuno e suficiente das ações adotadas pelos governantes, das políticas implementadas e dos recursos mobilizados.

Tal processo não evolui com a mudança para classes populacionais maiores.

Porém, a mínima ocorrência de portais com nula capacidade somada às condições de alta capacidade pode indicar que se trata de um processo ainda em construção.

4.3. Contribuições da participação As ocorrências dos níveis de capacidade dos portais para a participação foram sintetizadas no Gráfico_3.

No tocante à participação, a maioria dos portais apresenta baixa capacidade, correspondendo a 60,22% do conjunto objeto de estudo. Do total de ocorrências, 22,58 e 12,90% aparecem, respectivamente, como portais com média e alta capacidades. A Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) existe, porém não foram observadas características que indicassem que a interatividade realmente ocorre.

Verifica-se, assim, participação bastante frágil nos portais analisados, sem condições de contribuir efetivamente para a construção da accountability. De certo modo, os resultados ratificam investigações anteriores (Santos, 1993; Pinho, 2008) que apontam a falta de participação política como o busílis do processo político brasileiro ou, pelo menos, um dos fortes obstáculos a uma democratização desse processo. A despeito dos resultados alcançados, a baixa capacidade dos portais de promover a participação converge com o identificado por Santos (1993) nos cidadãos brasileiros: apatia ou desmotivação.

As conclusões deste estudo com câmaras municipais do estado de Santa Catarina corroboram estudo de Cunha e Santos (2005), quando destacam as restrições ao uso dos meios eletrônicos por parte dos vereadores brasileiros. Conforme a pesquisa desses autores, os vereadores têm correio eletrônico, o endereço é divulgado e é possível obtê-lo facilmente, mas as mensagens recebidas não são respondidas, e algumas jamais chegam a ser lidas. Essa também é a realidade das câmaras municipais de Santa Catarina, em que não , nos portais analisados, construção da accountability por meio da participação.

4.4. Síntese da construção de accountability por meio dos portais A síntese das contribuições de prestação de contas, transparência e participação na construção da accountabilityem câmaras municipais, identificadas a partir da análise dos portais eletrônicos, é evidenciada na Tabela_1.

A maioria dos portais apresenta nula capacidade em prestar contas e baixa capacidade para promover transparência e participação, ou seja, não , no conjunto de portais eletrônicos observados, condições para a construção de uma efetiva responsabilização contínua dos governantes pelos seus atos praticados.

Se isolarem-se os níveis médio e alto, verifica-se que existem perspectivas positivas, com exceção de na prestação de contas, pois nas outras categorias desempenho menos ruim, mesmo predominando o nível baixo.

Os resultados demonstram ainda indicativos de que os portais eletrônicos funcionam como murais eletrônicos; eles existem porque devem existir, sem promover incentivos ao exercício da democracia local. É necessário lembrar que esse movimento depende também da organização e da pressão da sociedade civil, aspecto que neste estudo não se pesquisou empiricamente. A representação gráfica da síntese realizada é apresentada no Gráfico_4.

Os dados do Gráfico_4não ratificam a ideia de que quanto maior o tamanho populacional dos municípios, melhores condições (financeiras, recursos humanos) possuem as câmaras para construir portais mais desenvolvidos, contemplando, inclusive, o quesito accountability. O avanço para municípios com maior tamanho populacional não garante avanço nos níveis de capacidade dos portais para as dimensões de accountability.

5. CONCLUSÕES Na pesquisa aqui relatada teve-se como objetivo investigar a capacidade dos portais eletrônicos de câmaras municipais do estado de Santa Catarina para a construção de accountability. Para tanto, foram analisadas três dimensões do conceito de accountability: prestação de contas, transparência e participação.

Dos 93 portais analisados, 85 apresentaram capacidade nula ou baixa em possibilitar a construção de prestação de contas. Os dados demonstram a quase inexistência de utilização dos portais para prestar contas dos gastos incorridos pelos vereadores. Nem mesmo a exigência da legislação é cumprida, visto que muitas das câmaras pesquisadas estão enquadradas na Lei de Transparência (Brasil, 2009), que exige dos entes da Federação, incluindo o legislativo local, a disponibilização a qualquer pessoa física ou jurídica de informações referentes às despesas incorridas e às receitas auferidas. Percebe- se que o legislativo local não está reconhecendo a importância da dimensão de accountability. Ainda q ue a prestação de contas, segundo Prado (2004), não deva se restringir a questões legais, a divulgação de relatórios, quando ocorre, acontece de forma parcial e/ou fora do prazo legal. Se nem mesmo a Lei é atendida, poucas expectativas de que os parlamentares possam publicizar relatórios simplificados, fora das regras legais, cuja linguagem seja inteligível aos cidadãos.

Apesar de a transparência parecer mais ativa que a dimensão prestação de contas no conjunto de portais eletrônicos, predominância de portais com indicadores de baixa capacidade, representando 58,06% do conjunto analisado. Cabe ressaltar que a ocorrência mínima de portais com nula capacidade somada às condições de alta capacidade, que foi o nível com a segunda maior ocorrência, pode indicar que se está diante de um processo ainda em construção, com possibilidades de se apresentar mais aperfeiçoado no futuro próximo. Contudo, em relação ao estágio atual, conclui-se que não , de uma maneira geral, construção de accountability por meio da transparência.

Em relação à participação, a maioria dos indicadores observados nos portais concentra-se no extrato baixa capacidade, correspondendo a 60,22% do conjunto objeto de estudo. Os canais existentes constituem-se basicamente de formulários eletrônicos. A tecnologia existe, mas não é utilizada com o objetivo de interação entre o cidadão e o ente governamental. Os achados da pesquisa corroboram estudos como o de Cunha e Santos (2005), que destacam que os parlamentares possuem endereço de correio eletrônico, mas não respondem as mensagens a eles enviadas. Muitos dos sítios funcionam como santinhos eletrônicos, sem mecanismo algum de interatividade e limitando-se à biografia política do vereador. Os resultados ratificam ainda outras investigações (Santos, 1993; Pinho, 2008) que apontam a falta de participação política como um dos entraves ao processo político brasileiro. Essa também é a realidade das câmaras municipais de Santa Catarina, em que não nos portais analisados, de uma maneira geral, construção de accountability por meio da participação.

Conclui-se, pela evidência empírica coletada, que o conjunto dos portais eletrônicos de câmaras localizadas em municípios catarinenses mostra ausência de capacidade de viabilizar a construção das dimensões da accountability analisadas. E como resposta ao próprio pressuposto, os portais verificados assumem mais um perfil de murais eletrônicos do que espaços de construção da accountability. Eles respondem a um requerimento, um impulso da modernidade expresso por um imperativo tecnológico dominante, porém não contribuem para o desenvolvimento de transparência, prestação de contas e participação.

Essas localidades parecem se aproximar mais claramente do modelo patrimonialista: resistência aos impulsos modernizantes, da burocracia weberiana (profissional, meritocrática, impessoalidade), resistência à penetração do capitalismo e, consequentemente, manutenção de estruturas de poder conservadoras (clientelismo, populismo, patriarcalismo etc.). Por conseguinte, também resistem aos impulsos da accountability. Para Kerbauy (1993), a vereança, assumindo o papel de atendente das necessidades individuais privadas, faz emergir uma vínculo de clientela, criando uma relação público- privado que passa pela forma como se estabelece o controle sobre recursos políticos. É a condição de vereador que lhe permite exercer influência tanto junto a órgãos públicos quanto a instituições privadas. Essas relações clientelistas são incorporadas pelo meio presencial, não tendo sentido nas relações virtuais, de base impessoal. Fica claro nas percepções de Kerbauy (1993), Kuschnir (1993) e Lopez (2004) que o legislativo local no Brasil se estrutura em bases patrimonialistas. Portanto, o portal pode existir, mas não pode representar uma ameaça ao patrimonialismo.

Entende-se que a teoria, principalmente o patrimonialismo e/ou o neopatrimonialismo, que se constitui na corrente teórica predominante da pesquisa pode explicar parte do empírico encontrado. Não como afirmar que a falta de prestação de contas, de transparência e de participação nos portais eletrônicos é uma manifestação do (neo)patrimonialismo, contudo, acredita-se que as características (especificidades) do legislativo local brasileiro, discutidas na teoria, podem ajudar a explicar os inexpressivos incentivos para o exercício de accountabilitydos atos dos gestores públicos,haja vista que os governantes não se sentem obrigados a promover a prestação de contas e a transparência das ações praticadas durante o seu governo. Também não se verifica predisposição ao desenvolvimento de canais para a participação da sociedade civil na construção dos trabalhos do legislativo. Na proposta de Denhardt e Denhardt (2007), em que o ser humano é um ser político que age na comunidade, que a comunidade politicamente articulada requer a participação do cidadão para a construção do bem comum e que o bem comum precede a busca do interesse privado, os administradores públicos devem ser responsáveis e obrigados a prestar contas. Os autores propõem exatamente aquelas condições, aqueles pré-requisitos, que Campos (1990) notava que não existiam no Brasil e que Pinho e Sacramento (2009) mostram que passados mais de 20 anos ainda estão em lenta construção no Brasil, incluindo a participação do cidadão na vida política, o que levaria os administradores públicos a prestarem contas. Os resultados desta pesquisa indicam que as condições ainda estão longe de serem atendidas. Toda a potencialidade do legislativo eletrônico não foi observada no empírico. Os portais até existem, mas sua presença parece atender a um requisito da modernidade necessário para legitimar as câmaras diante do padrão tecnológico dominante.

Cabe lembrar que esse movimento depende também da organização e da pressão da sociedade civil, aspecto que neste estudo não se contemplou, mas que será objeto de investigação futura. Quem pressiona? A mídia, o Ministério Público, algumas Organizações Não Governamentais especializadas em levantar dados e questionar os governos? Em uma sociedade civil pouco exigente e incapaz de exercer pressão sobre seus dirigentes, sobre a classe política, não se pode esperar, em geral, muito mais do que a precária construção de condições de accountability.


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