Estrutura social e transmissão intergeracional de status: uma análise
hierárquica
Introdução
Investigar os mecanismos de mudança da transmissão de status tem correspondido
à grande parte dos esforços dos estudos empíricos dos sistemas de
estratificação. A modernização e a urbanização, bem como a expansão do ensino
público, incitam os estudiosos a interpretarem a relação entre estes fatores e
quais suas consequências na estrutura e no processo de estratificação.
O modelo pelo qual as unidades sociais diferenciam-se e correlacionam-se em
termos de poder, riqueza e prestígio, ou seja, a dimensão estrutural da
estratificação consiste em grande parte dos esforços da área.
No Brasil, têm sido realizados diversos estudos sobre mobilidade (Pastore,
1979; Pastore; Silva, 2000; RIBEIRO, 2007; SCALON, 1999), bem como sobre
realização de status educacional, ocupacional e de rendimentos (FERNANDES,
2005; NEVES et al., 2007; HELAL, 2008; VILELA, 2008, HALLER; SARAIVA, 1991).
Contudo, ainda poucos se dedicam aos estudos do efeito das estruturas
organizacionais no processo de realização de status. As diferenças
organizacionais presentes nos setores econômicos, bem como as diferenças de
desenvolvimento econômico entre regiões das sociedades modernas, são elementos
estruturais que determinam as desigualdades sociais (HELAL, 2008; NEVES et al.,
2007).
A ideia central é de que os mercados de trabalho regionais são caracterizados
por diferentes processos de recompensas de alocação de status e estes processos
estão relacionados ao nível de desenvolvimento econômico de cada região
(GRUSKY, 1983). Adicionalmente, as diferenças entre setores econômicos em cada
região também interferem no processo de realização de status, bem como o
momento da entrada do indivíduo no mercado de trabalho ' se em períodos de
crescimento, estagnação ou crise econômica.
Foi a partir de 1930 que começou o processo de modernização da sociedade
brasileira e a estrutura ocupacional foi transformada pelas mudanças nos planos
político e econômico. Mas foi no período pós-Segunda Guerra Mundial até 1960
que o país deu passos mais avançados para a industrialização moderna, na medida
em que fortaleceu as políticas protecionistas à indústria doméstica, com apoio
à substituição de importações, realizou investimentos estatais na
infraestrutura de energia, transportes e produção de insumos básicos,
fortaleceu os subsídios e incentivos fiscais, creditícios e cambiais ao
investimento privado da indústria e permitiu a entrada massiva de capital
estrangeiro na produção de bens manufaturados destinados ao mercado interno,
sobretudo a partir de 1950.
Se considerarmos que as mudanças estruturais são importantes para verificar o
modo pelo qual a origem social afeta o destino dos indivíduos (seja este
educacional, ocupacional ou rendimentos), então estes períodos precisam ser
incluídos nas análises das desigualdades. Assim, o principal objetivo deste
trabalho é investigar em que medida o status ocupacional atual dos indivíduos é
afetado pela sua origem social, levando em conta o momento em que estes
indivíduos se inseriram no mercado de trabalho e onde se inseriram (mercados
regionais e setoriais). Entende-se que a entrada no mercado de trabalho em
períodos diferentes em termos de crescimento econômico, bem como as diferenças
organizacionais e regionais deste mercado, pode ser compreendida como a
estrutura do sistema de status, cujas mudanças afetam o processo de aquisição
individual.
Este artigo é composto por nove seções, incluindo esta introdução. As três
próximas seções trazem a revisão de um conjunto de teorias que serviram de base
para a construção dos objetivos e hipóteses deste trabalho. Posteriormente, são
apresentados os dados utilizados, os modelos e as variáveis. Por fim, discutem-
se os resultados encontrados e são feitas as considerações finais.
Teoria da industrialização: para uma sociedade meritocrática
A teoria da industrialização, baseada na tradição funcionalista, estabelece que
com o processo de industrialização ocorra uma crescente redução da influência
das características atribuídas aos indivíduos (raça, gênero e origem de classe)
sobre a realização de status dos indivíduos, ou seja, um crescente predomínio
de critérios universalistas no sistema de estratificação social (PARSONS, 1970,
1974; DAVIS; MOORE, 1973; TREIMAN, 1970, 1994; BLAU; DUNCAN, 1967, 1994;
DUNCAN, 1966; FEATHERMAN; HAUSER, 1994).
Na explicação funcionalista, a necessidade universal das desigualdades é
aprioristicamente estabelecida, sendo um pré-requisito funcional para o
equilíbrio do sistema. O prestígio, o poder e as vantagens são prêmios
disputados que só os melhores alcançarão. Então, o funcionamento do sistema
depende do reconhecimento legítimo das desigualdades pelos menos privilegiados
e recompensados.
Blau e Duncan (1967, 1994) mudam o foco dos estudos de estratificação, buscando
compreender as relações causais da mobilidade. Os autores usam as categorias
parsonianas, que caracterizam a sociedade moderna (meritocracia), para
desenvolverem a hipótese de que a tendência dessas sociedades é sofrer um
aumento da influência do status adquirido sobre o status social do indivíduo e
uma queda do status atribuído.2 Além disso, o status principal dos indivíduos
na sociedade moderna deve-se àquele proveniente de sua posição nas atividades
profissionais.
Treiman (1970), em relação à forma pela qual os indivíduos são alocados em
diferentes posições, indica que, quanto mais industrializada é uma sociedade,
menor a influência do status ocupacional do pai sobre o do filho, menor a
influência da educação do pai sobre o alcance educacional do filho, maior o
efeito da educação sobre o status ocupacional, mais forte o efeito direto do
status ocupacional sobre os rendimentos individuais e, por último, mais fraco o
efeito direto da educação sobre os rendimentos. Em suma, menores são as
desigualdades de oportunidades.
Complementarmente, os setores econômicos modernos sofrem maior influência de
critérios universalistas de seleção, isto é, nesses setores (indústria
moderna), as características tais como raça, gênero e origem social possuem
menor efeito na realização de status dos indivíduos.
Featherman e Hauser (1994) também consideram que o desenvolvimento econômico,
promovido pela industrialização, permite a transição da realização de status
baseada na atribuição para aquela baseada em características adquiridas. Em
consonância com os outros autores da teoria da industrialização, eles acreditam
que as oportunidades para a aprendizagem de habilidades são equalizadas entre
as classes sociais à medida que o treinamento ocupacional passa a ser adquirido
via escola mais do que via relações de parentesco.
Assim, conforme a teoria da industrialização, foi construída a hipótese 1,
neste estudo, pela qual espera-se que a influência da herança de status, no
processo de realização de status ocupacional, diminua com o desenvolvimento
econômico e que esta influência seja menor nos setores mais modernos e nas
regiões mais desenvolvidas (PARSONS, 1974; TREIMAN, 1970).
Os limites da teoria da industrialização: reprodução e manutenção de status
Foi Sorokin (2001) o primeiro a analisar a reprodução ou manutenção de status
sem a influência da abordagem marxista. Segundo o autor, nas sociedades
ocidentais modernas, os grupos ocupacionais estão entrelaçados, fato que
contesta a posição dos defensores da teoria da luta de classes, os quais
concebem as classes como grupos fechados, esquecendo-se da composição fluida
dos atuais grupos ocupacionais. Contudo, apesar da dispersão dos indivíduos em
diferentes ocupações, a transmissão "hereditária" persiste, o que significa
que, na maioria das vezes, a ocupação do pai continua exercendo forte
influência na realização de status do filho. Ainda, Sorokin afirma que a
extinção de algumas barreiras à mobilidade vertical, tais como as jurídicas e
religiosas, características de um sistema de castas, tende a aumentar esta
mobilidade. Entretanto, a remoção dessas barreiras não significa a diminuição
absoluta dos obstáculos, mas apenas a substituição de uma série de impedimentos
por outros.
Em consonância com Sorokin, a tese da manutenção de status rejeita a visão
evolucionária unilinear da teoria da industrialização, uma vez que a expansão
escolar, por consequência o aumento do nível educacional, pode substituir o
mecanismo de atribuição de status de um caminho indireto mediado pela educação
para um caminho mais direto dessa atribuição, ou seja, o efeito direto da
herança familiar aumenta, enquanto o efeito mediado pela educação diminui. Isto
se dá porque os recursos, tais como os contatos profissionais dos pais e a
riqueza familiar, podem ser usados para que os filhos garantam empregos com
maior prestígio, quando a educação não fornece muita informação sobre a
produtividade futura (GRUSKY, 1983).
Além do efeito contraditório do declínio da atribuição educacional, a
modernização ocupacional é uma variável interveniente adicional que vai mediar
o efeito da industrialização nos parâmetros de realização de status. A
distribuição ocupacional é determinada por fatores organizacionais e
tecnológicos exógenos à oferta educacional (BOUDON, 1981; GRUSKY, 1983).
Ao contrário do que a teoria da industrialização poderia supor, a diminuição da
atribuição educacional e a modernização ocupacional podem limitar o
desenvolvimento da meritocracia (GRUSKY, 1983).
A formulação de capital cultural e reprodução social de Bourdieu (1998; 2001) é
uma ruptura com os pressupostos inerentes à visão de habilidades inatas. A
"aptidão" ou "dom", na verdade, são produtos do investimento em capital
cultural previamente realizado pela família e reforçado pelo sistema escolar. A
apropriação da cultura dominante dá-se pela classe dominante, à medida que os
códigos necessários à cultura legitimada são transmitidos pela família.
Portanto, o investimento dos pais na carreira dos filhos é um sistema de
reprodução. O mercado escolar, por sua vez, sanciona e reproduz a distribuição
de capital cultural segundo o legado da família em termos de sucesso escolar.
Quando o indivíduo é originário de uma família desprovida de capital econômico
e social, mais importante se torna o diploma para ele.
Essa perspectiva corrobora com a argumentação de Collins (1977; 1979),3 que
assinala que a escolaridade não confere ao indivíduo aumento de sua
produtividade, mas sim credenciais reconhecidas e legítimas na sociedade. Porém
Bourdieu se aprofunda no papel da reprodução social e do capital cultural para
as conquistas acadêmicas. Assim, a herança familiar possui grande importância,
pois é entendida como uma forma de reprodução de classe.
Conforme a teoria da reprodução social e a tese da manutenção de status,
construiu-se a hipótese 2 deste artigo, segundo a qual a origem social mantém
ou aumenta sua influência no processo de realização de status ocupacional
conforme cresce o desenvolvimento econômico (BOURDIEU, 2001; BOWLES; GINTIS,
2000; COLLINS, 1977, 1979; GRUSKY, 1983), bem como seu efeito é igual ou maior
nas regiões mais desenvolvidas ' regiões urbanizadas com maior expansão do
trabalho burocrático (GRUSKY, 1983; GUEST, 2005).
Diferenças entre regiões na transmissão de status: fronteiras de
desenvolvimento, industrialização e fluidez social
A grande hipótese de Turner (1920) é de que as fronteiras norte-americanas
foram um local de oportunidades sociais incomuns na maior parte da história do
país, ou seja, terras livres significam novas oportunidades. Estas
oportunidades que surgem nas fronteiras fortalecem e aumentam a crença na
existência de valores democráticos (GUEST, 2005).
Para aqueles que argumentam a favor da tese das fronteiras suscitada por
Turner, o desenvolvimento do oeste norte-americano estabeleceu novas
oportunidades de mobilidade ascendente sem paralelos em outras nações. Entre os
argumentos contrários a esta tese, a principal crítica é de que tal visão
romântica do oeste ignora que as grandes oportunidades realmente estão nas
cidades, dado que o rápido crescimento da indústria e do comércio nas cidades
promove a liberação da população rural excedente não para fixação no oeste. Um
terceiro argumento sublinha os erros e acertos da tese das fronteiras e propõe
uma hipótese mista. Segundo esta posição mista, as consequências das
oportunidades podem ter sido diferentes nas fronteiras, mas o status final não
foi necessariamente diferente. O oeste pode ter selecionado indivíduos bem-
sucedidos, tal como os migrantes, mas suas chances podem não ter sido afetadas
pela experiência no oeste (GUEST, 2005).
Guest (2005) analisa as diferenças geográficas de nove regiões norte-americanas
segundo o padrão de mobilidade em 1800 e 1900.4 Conforme os resultados, não há
evidências suficientes que confirmem a maioria dos argumentos da tese da
fronteira no que diz respeito às oportunidades ocupacionais. A diversidade da
estrutura ocupacional na maior parte das áreas urbanas está fortemente
relacionada à criação de uma força de trabalho de classe média, que, por seu
turno, está relacionada ao maior desenvolvimento e expansão dos trabalhos
burocráticos. As taxas de mobilidade ocupacional não variam entre as regiões
segundo o sexo ou crescimento populacional. Complementarmente, as maiores taxas
de mobilidade foram encontradas nas regiões mais urbanizadas e antigas dos
Estados Unidos. A tese de Turner, conforme Guest, pode estar correta não por
causa das oportunidades de mobilidade que surgem na fronteira, mas sim pela
crença dos novos habitantes de que realmente elas existem.
Outro estudo sobre as diferenças dos efeitos da industrialização entre regiões
foi realizado por Grusky (1983). Segundo o autor, o nível de industrialização
regional afeta o tamanho dos três parâmetros de realização de status:
atribuição educacional (medida pela trajetória entre a origem social e a
educação do indivíduo); atribuição de status (medida pela trajetória entre a
origem social e o prestígio ocupacional do indivíduo); e aquisição de status
(medida pela trajetória entre a educação e o prestígio ocupacional do
indivíduo). A ideia central é de que os mercados de trabalho regionais são
caracterizados por diferentes processos de recompensas de alocação de status e
estes processos estão relacionados ao nível de desenvolvimento econômico de
cada região.
Grusky (1983) analisa 12 regiões japonesas com diferentes níveis de
industrialização. No primeiro estágio da análise, o autor estima o alcance de
status dentro de cada região (trajetória entre origem social e educação e
prestígio ocupacional) e, no segundo estágio, correlaciona os parâmetros
estimados com variáveis regionais (nível de industrialização e de modernização
ocupacional). Os resultados encontrados sugerem que o mercado de trabalho opera
no nível local, mesmo em nações altamente industrializadas, como é o caso do
Japão. Os retornos ao capital humano estão condicionados ao contexto no qual o
indivíduo está localizado. Além disso, segundo o autor, com a industrialização,
os efeitos da aquisição de status não aumentam e o processo de atribuição não
diminui (este resultado dá suporte parcial à tese da manutenção de status); e a
modernização ocupacional também possui impacto moderado nos níveis de
atribuição de status. Considerando os achados, o autor conclui que o
desenvolvimento da organização burocrática é aparentemente ameaçado pelo
fracasso do avanço da industrialização em manter uma contínua expansão de
status.
Enquanto Guest (2005) preocupa-se com o nível de industrialização e urbanização
de cada região norte-americana no período de expansão da indústria no país,
sobretudo, identificando essas regiões como áreas de fronteira de
desenvolvimento, Grusky (1983) analisa o Japão da segunda metade do século XX,
discutindo a fluidez social e o processo de transmissão de status entre as
regiões do país, mas sem se dedicar ao teste da hipótese de Turner.
As análises empreendidas pelos autores suscitam a discussão das diferenças
regionais ainda em países, tal como o Brasil, que possuem áreas geográficas
mais industrializadas e urbanizadas e outras em desenvolvimento.
Neves et al. (2007) analisaram o processo de transmissão intergeracional de
status, segundo setores econômicos e áreas geográficas no Brasil. Os resultados
apontam que o desenvolvimento econômico afeta igualmente o processo de
realização de status, sendo que as regiões e setores econômicos não
apresentaram diferenças significativas quanto a este processo. Contudo, há um
padrão relativamente estável de reprodução social entre regiões e ao longo do
tempo. Especialmente em relação ao teste da teoria das fronteiras em
desenvolvimento, os autores ressaltam que não incluíram o setor agrícola na
análise, fato que deixa de considerar o peso da estrutura agrária das regiões
de fronteira, o que constitui um dos principais motivos das altas taxas de
desigualdade e impermeabilidade destas regiões (NEVES et al., 2007).
Conforme a tese das fronteiras em desenvolvimento, hipótese 3, espera-se que,
em regiões em pleno desenvolvimento (fronteiras flexíveis) ' Norte e Centro-
Oeste ', o efeito da origem social seja menor no processo de realização de
status ocupacional do que em regiões já consolidadas ' Nordeste, Sul e Sudeste
(TURNER, 1920).
Dados
Os dados a serem utilizados são provenientes da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios ' PNAD de 1973,5 1982, 1988 e 1996. A PNAD é um survey realizado
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ' IBGE, formado por um
módulo fixo básico e por módulos complementares que variam a cada ano. A
pesquisa é realizada em todos os anos não-censitários e constitui-se de amostra
estratificada por conglomerados em múltiplos estágios para todo o Brasil,
exceto para a região agrária do Norte do país.
Neste trabalho, as PNADs dos referidos anos foram escolhidas por conterem
informações sobre mercado de trabalho e escolaridade e, principalmente, pelo
módulo de mobilidade social. Este, em especial, fornecerá dados sobre a herança
familiar dos indivíduos (escolaridade e ocupação dos pais), cuja importância é
imprescindível para os estudos de realização de status.
Modelos e variáveis
Como estudar o processo de realização de status considerando os mercados
regionais e setoriais por coorte uma estrutura e, ao mesmo tempo, levar em
conta as características individuais dos sujeitos? Bem, se a pergunta de
pesquisa nos parece ter caráter multinível deve ser tratada como tal
empiricamente.
Normalmente a solução seria incluir as variáveis de contexto (os mercados
regionais e setoriais por coorte) como característica dos indivíduos num único
nível para a estimação do resultado do status por MQO. Alternativamente,
poderíamos estimar equações por MQO separadas para cada contexto e depois
comparar os coeficientes.
Entretanto, quando temos uma pergunta multinível e a tratamos com métodos de
nível único (MQO, ANOVA ou equações estruturais), encontramos três
dificuldades: viés de agregação; violação da suposição de independência entre
variáveis explicativas, ou seja, estimação incorreta dos erros-padrão das
estimativas; e heterogeneidade dos coeficientes da regressão (BRYK; RAUDENBUSH,
1992).
Estes problemas podem ser contornados pela aplicação de modelos que não
desconsideram a dimensão multinível dos dados. Os modelos hierárquicos ou
multiníveis surgem como alternativa aos modelos de MQO, motivados pelo problema
enfrentado pelos pesquisadores da área educacional em estimar adequadamente o
efeito das escolas sobre o desempenho escolar dos alunos (BRYK; RAUDENBUSH,
1992, p. 5).
Em suma, há três justificativas para o uso de modelos hierárquicos: a empírica;
a estatística e da propriedade estrutural dos dados; e a teórica. A primeira
refere-se à necessidade empírica dessa estrutura ao observarmos a variabilidade
da variável resposta por grupos. A maior chave dessa variabilidade é a
correlação intraclasse (ρ). A modelagem hierárquica relaxa o pressuposto da
independência dos resíduos e permite estrutura de resíduos correlacionados. Se
uma equação por mínimos quadrados ordinários é usada inadequadamente para dados
agrupados com erros correlacionados, o resultado dos erros-padrão será menor do
que deveria, resultando numa maior chance de cometimento do erro Tipo I. Aqui
reside a justificativa estatística para o uso de modelos hierárquicos. Por
último, teoricamente levantamos hipóteses compostas por construtos que operam e
interagem em múltiplos níveis. Há grande interesse, por exemplo, em saber como
características do nível coletivo ou estrutural influenciam o comportamento
individual (LUKE, 2004, p.19-23).
Unidade de análise do nível 1
As unidades de análise do nível 1 (i) são os indivíduos, chefes e cônjuges,
entre 15 e 65 anos, ocupados e que não estavam frequentando a escola na semana
de referência das PNADs) de 1973, 1982, 1988 e 1996, totalizando cerca de 400
mil unidades.
Construção das unidades de análise do nível 2
A princípio, considerar os mercados regionais e setoriais por coortes como
unidades de análise do nível contextual não é tão óbvio quanto considerar os
exemplos clássicos de alunos e escolas, trabalhadores e organizações e, mesmo,
escolas e regiões. Na maioria dos estudos sociológicos, tem-se buscado tratar a
estrutura do mercado de trabalho como um fator importante para alocação
ocupacional dos indivíduos e distribuição dos rendimentos do trabalho. Contudo,
esta estrutura é inserida no nível individual aplicando os modelos de mínimos
quadrados ordinários, sem inquirir se há ou não dependência das observações.
Analisando as diferenças de status ocupacionais pelo modelo hierárquico,
reconhece-se que há variabilidade entre os mercados regionais e setoriais por
coortes: pessoas semelhantes quanto às suas características individuais podem
possuir status ocupacional distinto por pertencerem a estruturas de mercado
diferentes. Observamos, assim, a variabilidade da relação entre status da
ocupação atual do indivíduo e status da ocupação do pai por estas estruturas
(XAVIER, 2011).
As unidades de nível 2 (j), para representar a estrutura dos mercados regionais
e setoriais por coorte, foram criadas pela combinação das regiões do país e
setores econômicos por coorte de entrada no mercado de trabalho, totalizando
160 observações neste nível.
Inicialmente, o objetivo era analisar o período entre 1930 (início da
modernização do Brasil) e 1989. Entretanto, o número de indivíduos dentro de
cada unidade de nível 2 de 1930 a 1949 não era suficiente para o número de
parâmetros a serem estimados no modelo. Optou-se, portanto, em analisar o
período com tamanho amostral suficiente, mas que ainda se refere ao período da
continuação da política de substituição das importações e aceleração do
crescimento (1946 a 1964), ampla expansão econômica (1964 a 1982) e recessão
econômica até antes do Plano Real (1982 a 1989).
Variáveis
A variável dependente (Yij) é o logaritmo natural do índice de status
socioeconômico da ocupação atual do indivíduo (PASTORE, 1979; PASTORE; SILVA,
2000). As variáveis explicativas, separadas por nível, são apresentadas nos
Quadros_1 e 2.
A média da variação do PIB per capita por coorte de entrada no mercado de
trabalho mede a taxa de crescimento econômico, enquanto a média do PIB per
capita mede o tamanho ou nível desse crescimento. Em termos restritivos, a
medida mais geral de desenvolvimento econômico é o aumento do PIB, porque ele
reflete a expansão geral da produtividade do país. Alternativamente, há o
Índice de Desenvolvimento Humano, que é muito mais que um índice de
desenvolvimento econômico como permitem os dados de renda per capita ou PIB,
pois inclui, além da renda per capita, a longevidade e a alfabetização,
buscando refletir o bem-estar social.
Para Bresser-Pereira (2007), o IDH é um índice muito mais de desenvolvimento em
geral do que de crescimento econômico. Para além da polêmica sobre a
equivalência ou não de desenvolvimento econômico e crescimento econômico, a
melhor maneira de medi-lo é pelo aumento da renda per capita. O IDH não pode
ser usado para medir a taxa de desenvolvimento econômico.
Não incluímos o IDH porque os dados do índice estão disponíveis apenas
decenalmente a partir de 1970. Dessa forma, não seria possível analisar as
coortes de entrada no mercado de trabalho aqui propostas (1950 a 1989).
Duas variáveis importantes não foram incluídas na análise de transmissão de
status: cor ou raça e migração. Mesmo que as variáveis adscritivas não sejam o
teste central deste estudo, elas deveriam estar incluídas porque explicam parte
importante da variância no status ocupacional e possibilitam uma medida líquida
das variáveis de teste mais confiáveis. Entretanto, antes da década de 1980, os
questionários do IBGE não incluíam os quesitos cor ou raça do indivíduo.
Migração, juntamente com educação e experiência, é considerada recurso
fundamental de capital humano (SCHULTZ, 1973). A migração significa
possibilidades de ascensão social e, dessa maneira, à medida que os indivíduos
percebem esse fato, a movimentação geográfica de mão de obra é substancialmente
ampliada (PASTORE, 1979).
Na base de 1973, a informação disponível sobre migração é a região do país de
nascimento do indivíduo, o que não fornece uma medida adequada de recursos e
motivação dos indivíduos quanto às possibilidades de mobilidade social
ascendente. Já a base de 1983 não contém esta variável.
Especificação dos modelos
Dois modelos foram estimados: o modelo de análise de variância (ANOVA) ou
modelo nulo, que permite verificar se há variação entre os mercados regionais e
setoriais segundo coortes de entrada no mercado de trabalho e, portanto, se é
possível estimar o modelo hierárquico; e o modelo do intercepto e da inclinação
como resposta (intercept and slopes-as-outcomes model), com variáveis de níveis
1 e 2, cujo interesse está na interação entre mercados e status da ocupação do
pai.
Modelo I ' ANOVA (modelo nulo)
Ln Yij =β0j + rij
B0j=γ00+ u0j
Modelo II' modelo do intercepto e da inclinação como resposta
Ln Yij =βoj +β1(sexo) +β2(1982) +β3 (1988) +β4(1996) +β5(experiência) +β6
(experiência ao quadrado) +β7(educação) +β8(ln do status da ocupação do pai)j
+β9(ln do status da primeira ocupação) + rij
B0j=γ00+γ01 (média da variação do PIB anual) +γ02(média do PIB per capita) +γ03
(média da taxa de urbanização) +γ04 (sul) +γ05(nordeste) +γ06(centro-oeste)
+γ07(norte) +γ08(tradicional) +γ09(flexível) +γ010(público) + u0j
B8j=γ80+γ81 (média da variação do PIB anual) +γ82(média do PIB per capita) +γ83
(média da taxa de urbanização) +γ84 (sul) +γ85(nordeste) +γ86(centro-oeste)
+γ87(norte) +γ88(tradicional) +γ89(flexível) +γ810(público) + u8j
onde:
Ln Yij = logaritmo do status da ocupação atual do i-ésimo indivíduo do j-ésimo
mercado regional e setorial por coorte;
i = 1,2,..., nj é o número de indivíduos do j-ésimo mercado regional e setorial
por coorte;
j = 1,2,..., l, onde l é o número de mercados regionais e setoriais por coorte;
rij = efeito aleatório do nível 1 (resíduos relativos aos indivíduos);
u0je u8j = efeito aleatório do nível 2 (resíduos relativos aos mercados);
Resultados
Pelo modelo nulo, observa-se que a média do status da ocupação atual dos
indivíduos é igual a 13,48 pontos6 (Tabela_1). Os efeitos aleatórios (Tabela_2)
fornecem as estimativas dos componentes de variância. No nível 1, a Vârrij=
σ2 = 0,424 e, no nível 2, a variância do status ocupacional médio (β0j) éτ00 =
0,473. A proporção da variância em Y entre os mercados é representada pela
correlação intraclasse (ρ) e pode ser calculada da seguinte forma:
ρ=τ00τ00+σ2
Pelo cálculo deρ, verifica-se que 52,73% do total da variação do status da
ocupação atual dos indivíduos ocorre entre as unidades de nível 2 (mercados
regionais e setoriais por coorte).
Em outras palavras, a variação total observada entre o status do indivíduo foi
igual a 0,897 (τ00+σ2), sendo que 57,73% do total da variação deve-se à
diferença das médias entre os mercados e 47,27% são explicados pela variação do
status dentro dos mercados. Este resultado confirma que há variabilidade entre
grupos e que podemos prosseguir com o modelo hierárquico, isto é, há
justificativa empírica para a aplicação do modelo hierárquico.
Pela significância deτ00, concluímos que todos os mercados regionais e
setoriais por coorte possuem médias diferentes (rejeitamos a hipótese nula de
que todas as unidades de nível 2 assumem a mesma média, H0:τ00=0).
As Tabelas_3 e 4 apresentam os resultados do modelo IV. Verifica-se que nem a
taxa de urbanização nem as regiões do país possuem efeito significativo sobre a
média do status da ocupação atual do indivíduo (γ03,γ04,γ05,γ06 eγ07). Já a
média da variação do PIB possui efeito negativo, enquanto a média do PIB per
capita tem efeito positivo (γ01 eγ02): a variação de 1% no PIB diminui em 4,5%
a média do status atual e o aumento de R$1,00 no PIB per capita eleva em
0,00004% o status. Os setores econômicos são todos significantes (γ08,γ09 eγ
010): os indivíduos do setor tradicional possuem a média do status 45,49% menor
do que a média dos indivíduos do setor industrial; os indivíduos do setor
flexível possuem a média 22,85% maior do que a dos indivíduos do setor
industrial; e os da administração pública possuem a média 68,87% maior do que a
daqueles do setor industrial.7
Nota-se também que não há interação entre o status do pai e a média da variação
do PIB, a taxa de urbanização e as regiões do país sobre o status da ocupação
atual do indivíduo (γ81,γ83,γ84,γ85,γ86 eγ87). Já a média do PIB per capita
(γ82) diminui o efeito do status do pai sobre o status da ocupação atual do
indivíduo em 0,18%. O setor tradicional aumenta o efeito do status do pai sobre
o status da ocupação atual do indivíduo em 3,95% (γ88), enquanto os setores
flexível e público (γ88eγ810) diminuem o efeito do status do pai sobre o status
da ocupação atual do indivíduo em 3,25% e 5,36%, respectivamente, comparados ao
setor industrial.
A tese da industrialização prevê um processo de "desestratificação" com o
avanço do desenvolvimento econômico: diminuição da influência da herança de
status e aumento do efeito da educação sobre o status ocupacional corrente do
indivíduo. Pelos resultados ora apresentados, tem-se a evidência de que a média
do PIB per capita (nível do crescimento econômico) diminui o efeito da origem
social (status do pai) sobre o destino ocupacional (status da ocupação atual do
indivíduo), influência esta que ocorre independentemente das regiões do país,
dos setores econômicos, da taxa de urbanização e da variação do PIB. Nesse
sentido, não foi confirmada completamente a hipótese 1: por um lado, como
previsto pela teoria, a herança de status diminui seu efeito sobre o status
corrente com o processo de industrialização e os setores mais modernos da
economia contribuem para a diminuição do processo de alocação de status, mas,
por outro lado, as regiões mais industrializadas (Sul e Sudeste) não diminuíram
o efeito de transmissão de status.
O nosso achado vai de encontro aos de outras pesquisas. Bills e Haller (1984)
não encontraram nenhum padrão significativo do PIB no efeito do status do pai.
Neves et al. (2007) também não observaram nenhum padrão sistemático do nível do
crescimento econômico (PIB per capita), o que levou os autores a concluírem que
não há decréscimo, ao longo do tempo, dos padrões de transmissão de status. Um
motivo para que nossos resultados em relação ao impacto do desenvolvimento
econômico sobre a transmissão de status tenham se dado em outro sentido pode
estar na inclusão do nível do crescimento econômico e da sua taxa de variação
por coortes. Assim, percebemos o impacto deste fator segundo as gerações,
traduzindo melhor as oportunidades da estrutura ocupacional.
Já a hipótese 2 afirma que não há perda da influência da origem social no
processo de realização de status ocupacional com o avanço do desenvolvimento
econômico e que o efeito da origem social não difere nas regiões mais
urbanizadas e com maior expansão do trabalho burocrático. Esta hipótese também
foi parcialmente confirmada. Por um lado, ao contrário do esperado, não se
observou nenhuma constância ou aumento no peso da origem social, pelo
contrário, foi verificada uma queda, indicando uma estrutura ocupacional menos
rígida com o aumento do nível de desenvolvimento. Por outro lado, nem a taxa de
urbanização nem as regiões do país apresentaram efeito significativo sobre o
impacto da origem no status corrente do indivíduo, confirmando o previsto pelas
teorias da manutenção de status e da reprodução social.
A tese das fronteiras flexíveis, defendida por Turner (1920) para os Estados
Unidos (hipótese 3), não foi confirmada para o caso brasileiro, uma vez que não
foi encontrado efeito significativo das regiões em pleno desenvolvimento
(Centro-Oeste e Norte) sobre o nível de transmissão de status.
Neves et al. (2007) também não encontram fortes evidências que dessem suporte à
tese das fronteiras em desenvolvimento, entretanto, como os próprios autores
ressaltam, o seu estudo engloba o Norte, mas não incluiu o meio rural do
Brasil. No nosso trabalho, torna-se mais claro que a transmissão
intergeracional de status não sofre impacto das regiões em pleno
desenvolvimento porque incluímos as cinco regiões do país.
Considerações finais
A rápida transição de uma sociedade agrícola para uma industrial modificou
profundamente a estrutura ocupacional brasileira, aumentando o tamanho das
classes manuais urbanas e, consequentemente, favorecendo as altas taxas de
mobilidade total.
Pastore (1979) afirma que os altos níveis de desigualdade na década de 1970 não
eram incompatíveis com a taxa de mobilidade brasileira, uma vez que esta era
causada pelas rápidas mudanças estruturais do país: transformações econômicas,
tecnológicas e demográficas. Os efeitos dessas mudanças verificadas entre 1973
e 1988 consistem na ampliação da ascensão social, especialmente, na base da
pirâmide social e na predominância da mobilidade estrutural e numa influência
relativamente pequena da herança social paterna.
Contudo, se a transição para uma economia industrial e de serviços possibilitou
aumento da mobilidade estrutural e ascendente entre 1973 e 1988, relativamente
o mesmo não ocorreu entre 1988 e 1996 (PASTORE; SILVA, 2000).
Os padrões encontrados por Ribeiro (2007) entre 1973 e 1996 indicam menos
mobilidade ascendente, menos mobilidade estrutural (efeito estrutural gerado
pela rápida industrialização no país) e mais fluidez (menores desigualdades de
oportunidades). A interpretação deste padrão foi feita pelo autor como
tendência de uma menor transmissão intergeracional de vantagens e desvantagens
e, consequentemente, de chances de ascensão mais condicionadas pelas
habilidades individuais do que pela origem social, isto é, as desigualdades de
oportunidades têm diminuído no Brasil, uma vez que um percentual maior da
população passou a ter mais acesso à educação média e superior e as classes de
origem possuem menos importância na determinação das chances de mobilidade.
Se, por um lado, tem-se aumento das desigualdades de renda, por outro, não
houve crescimento das desigualdades ocupacionais em geral, medidas pela fluidez
social. Mas vale ressaltar que as desigualdades de oportunidades ocupacionais
aplicam-se à população ocupada e diferem segundo os grupos por sexo e cor.
Todos estes estudos indicam que o efeito da herança de status depende de
fatores estruturais importantes que variam ao longo do processo de
industrialização no Brasil. Assim, partindo do pressuposto de que a entrada no
mercado de trabalho em períodos diferentes em termos de crescimento econômico,
bem como as diferenças organizacionais e regionais deste mercado, pode ser
compreendida como a estrutura do sistema de status, cujas mudanças afetam o
processo de aquisição individual, o presente estudo buscou investigar como se
dá a transmissão intergeracional de status dentro dessa estrutura de posições.
Foram propostas três hipóteses de trabalho, baseadas na diversa literatura
sobre o tema. A primeira hipótese, baseada na teoria da industrialização,
previa uma diminuição da transmissão de status com o crescimento econômico e
uma menor transmissão nas regiões mais industrializadas e nos setores
econômicos mais modernos. Em oposição, baseada na teoria da reprodução social e
na tese da manutenção de status, a segunda hipótese previa que a transmissão
intergeracional de status não seria menor com o crescimento econômico e nem nas
regiões mais industrializadas e urbanizadas, respectivamente. A terceira
hipótese, baseada na tese das fronteiras flexíveis, previa menor transmissão de
status nas regiões Centro-Oeste e Norte.
Foram encontradas evidências que confirmam parcialmente a primeira hipótese, já
que o nível de crescimento econômico e os setores mais modernos diminuem o
processo de transmissão intergeracional de status ocupacional.
A segunda hipótese também foi parcialmente confirmada, uma vez que nem a taxa
de urbanização nem as regiões do país apresentaram impacto significativo sobre
o efeito da origem no status corrente do indivíduo.
A terceira hipótese, por sua vez, não foi confirmada, pois não foi observado
efeito significativo das regiões em pleno desenvolvimento (Centro-Oeste e
Norte).
Em suma, o crescimento econômico reduz a transmissão de status: não há
diferença entre as regiões do país em termos de transmissão de status, mas há
entre os diferentes setores. Os setores flexível e público apresentam menor
reprodução social quando comparados ao setor industrial. Por sua vez, o nível
do crescimento econômico, calculado pela média do PIB per capita nas coortes de
entrada no mercado de trabalho, está negativamente correlacionado à transmissão
de status, mas esta não se correlaciona ao desempenho do crescimento, dado pela
média da variação anual do PIB nas coortes.
Este fato pode estar relacionado ao aumento das oportunidades ocupacionais pela
transformação da estrutura do mercado de trabalho e pela importância das
habilidades adquiridas pelo indivíduo, tal como a educação, na determinação do
alcance ocupacional.
Ressalta-se que esses padrões de transmissão intergeracional de status
demonstram efeitos setoriais, mas não regionais no período de 1950 a 1989. Não
é possível inferir uma tendência para as décadas de 1990 e 2000, quando
assistimos a um período de hiperinflação e estagnação (de 1986 a 1994), de
estabilidade monetária e estagnação (de 1995 a 2003) e depois de recuperação do
crescimento econômico (após 2003).
Grande debate tem sido feito sobre as desigualdades regionais no Brasil, no que
se refere seja às diferenças inter-regionais de renda per capita seja às
diferenças da mobilidade ocupacional. Pastore (1979) entende que o Brasil
possui disparidades regionais, porque as regiões possuem diferentes estruturas
de oportunidades e, portanto, níveis distintos de mobilidade inter e
intrageracional. O autor conclui que as taxas de mobilidade social no Brasil,
em 1973, estavam bastante associadas ao nível de urbanização e industrialização
das regiões de destino dos indivíduos.
As diferenças regionais no processo de realização de status ocupacional dos
indivíduos não são captadas pelo presente estudo, porque são obtidas pelo PIB
per capita e pelos setores da economia. Então, as diferenças de transmissão de
status traduzem-se melhor pelos distintos níveis de crescimento econômico e
pelos diferentes setores.
Finalmente, vale ressaltar que a principal contribuição do presente trabalho
foi analisar o processo da transmissão intergeracional do status socioeconômico
no Brasil, podendo controlar o crescimento econômico quando da entrada dos
indivíduos no mercado de trabalho. Isso representa uma abordagem ainda não
aplicada à análise de dados brasileiros e, o que é mais importante, permitiu
concluir que análises anteriores (BILLS; HALLER, 1984; HALLER, SARAIVA, 1991;
NEVES et al., 2007) podem ter se equivocado ao concluírem que o desenvolvimento
econômico não apresenta qualquer efeito de redução da transmissão
intergeracional do status socioeconômico no Brasil. Vale ressaltar que essa
análise só pode ser feita de forma adequada porque foram estimados modelos
hierárquicos que representam, para os estudos de transmissão intergeracional de
status, a possibilidade de um melhor controle de fatores estruturais, da mesma
forma que os modelos logísticos condicionais têm possibilitado às análises de
mobilidade social a incorporação de dimensões individuais.