Fatores que influenciam o compartilhamento da informação e do conhecimento
1 Introdução
O conhecimento sempre foi um fator importante nas organizações, porém só nos
últimos anos tem sido destacado na literatura (CHOO, 2003; DAVENPORT, 2000;
NONAKA; TAKEUCHI, 1997), sendo considerado um elemento para a inteligência
organizacional e, reconhecidamente, uma fonte para a vantagem competitiva. No
entanto, há muito ainda a entender e investigar sobre como o conhecimento é
criado, compartilhado e utilizado.
De acordo com Lin (2007), o compartilhamento do conhecimento pode ser definido
como uma cultura de interação social em que ocorre a troca de conhecimentos,
experiências e habilidades. O autor exemplifica esse processo com duas
situações, sendo que a primeira refere-se à vontade ou ao desejo da pessoa de
comunicar-se ativamente com seus colegas (doar conhecimento). Nessa situação a
pessoa sente prazer em compartilhar e ajudar os outros. A segunda situação diz
respeito à consulta ativa aos colegas para aprender com eles (colecionar
conhecimento).
No meio acadêmico a literatura tem demonstrado que o compartilhamento é um
método de aquisição da informação muito recorrente (ERDELEZ apud TALJA, 2002).
Muitos estudos realizados enfocam o sistema de informação disponível para
ajudar professores e pesquisadores na busca de informação, mas não abordam o
intercâmbio de informações entre eles, que pode ser tanto de referências sobre
documentos relevantes como de informações sobre novos métodos de estudo, e
também o compartilhamento da informação e do conhecimento em áreas correlatas.
Neste artigo apresentamos os resultados parciais do projeto "Redes Sociais e
Inteligência Local: Espaços da Informação". Esses resultados referem-se
especificamente a um dos objetivos do projeto, que diz respeito à verificação
da ocorrência do compartilhamento da informação, do conhecimento e da
experiência a partir das ligações dos atores. Assim, abordamos os fatores que
podem influenciar no processo de compartilhamento da informação no ambiente de
pesquisa e desenvolvimento (P&D).
2 Fatores que interferem no compartilhamento da informação e do conhecimento
A habilidade de identificar o conhecimento presente em uma organização depende
das pessoas dessa organização, que são as que criam, compartilham e usam o
conhecimento. Ipe (2003) diz que compartilhar conhecimento é basicamente o ato
de tornar o conhecimento disponível para outros. Entre indivíduos, o
compartilhamento é um processo que permite a uma pessoa transformar o
conhecimento para que possa ser entendido, absorvido e utilizado por outros
atores. Para Ipe, o uso do termo "compartilhamento" implica o processo de
disponibilizar o conhecimento de tal forma que ele possa ser utilizado. Para
que isso ocorra, requer-se uma ação deliberada da parte do indivíduo que possui
o conhecimento. Compartilhar não implica ceder a posse do conhecimento, e sim
usufruir dele juntamente com os pares.
As intenções e ações para o compartilhamento podem sofrer influências de
diferentes fatores. Baseando-se em estudos teóricos e relatos de pesquisa, Ipe
(2003) identificou os principais fatores que influenciam o compartilhamento do
conhecimento entre indivíduos: natureza do conhecimento, motivação para
compartilhar, oportunidades para compartilhar, e cultura do ambiente de
trabalho.
A natureza do conhecimento é classificada pela autora em dois sentidos. O
primeiro está centrado na natureza tácita ou explícita do conhecimento,
fundamentalmente nos aspectos cunhados por Polany (1983) e reforçados por
Nonaka e Takeuchi (1997), Davenport (2000), Choo (2003) e muitos outros
autores; enquanto o segundo está na valorização do conhecimento. O valor do
conhecimento é mencionado por Ipe, principalmente no aspecto comercial, ou
seja, o conhecimento como uma propriedade de valor monetário.
No fator motivação para compartilhar, o conhecimento está inserido, entranhado
nas pessoas e não flui facilmente por uma organização. De acordo com Stenmark
(2001), as pessoas comumente não compartilham conhecimentos sem uma forte
motivação pessoal e provavelmente não o partilhariam sem saber o que podem
ganhar ou perder com isso. Essa situação, para Stenmark, pode ser evitada se o
conhecimento for identificado e for disseminado dentro da organização como uma
atividade sistemática.
Fatores motivacionais que influenciam o compartilhamento de conhecimento entre
indivíduos podem ser divididos, de acordo com Ipe (2003), em internos e
externos. Fatores internos incluem o sentimento de poder, ligado ao
conhecimento e à reciprocidade que resultam do compartilhamento. Fatores
externos incluem o relacionamento com o outro (receptor) e com a recompensa por
compartilhar.
Dos fatores motivacionais internos, o sentimento de poder está vinculado à
idéia de que "conhecimento é poder", e o poder pode dificultar o
compartilhamento. Segundo Ipe (2003), se o indivíduo tem ciência de que o
conhecimento lhe confere importância, a tendência é acumular conhecimento. Por
outro lado, a reciprocidade facilita o compartilhamento, que pode ocorrer
quando os indivíduos vêem que o valor que agregam depende do quanto eles
compartilham seus conhecimentos com os outros. O aspecto negativo da
reciprocidade é o medo da exploração, que ocorre quando se percebe que
compartilham conhecimentos, mas não vêem nenhum retorno.
Complementando essa idéia, Cohen (1998) ressalta que, implicitamente ao ato de
compartilhar informações, encontra-se o sentimento de reciprocidade, ou seja,
os indivíduos só compartilham se recebem algo em troca. Também inerente ao
compartilhamento de informações encontra-se o fator que leva alguém a se sentir
parte integrante de uma comunidade; para que um indivíduo faça parte de uma
comunidade, ele deve compartilhar com os demais membros.
Em relação à reciprocidade existente no compartilhamento, Dyer e Nobeoka (2000)
dizem que esta pode apresentar-se de duas maneiras: a) direta - que ocorre
quando dois indivíduos exercem ao mesmo tempo os papéis de emissores e
receptores de informações; e b) indireta - que acontece quando um terceiro
indivíduo contribui sem a expectativa de receber algo em troca. Em relação ao
terceiro indivíduo, os autores destacam que, enquanto ele não tiver a certeza
de que receberá uma compensação direta em troca da informação compartilhada,
ele tenderá a zelar pelas informações que detém para um posterior
compartilhamento.
No que se refere aos fatores externos que influenciam a motivação para
compartilhar conhecimento, Ipe (2003) menciona o relacionamento entre o
fornecedor (transmissor) e o receptor do conhecimento. O relacionamento com o
receptor inclui os seguintes elementos: a confiança, o poder e o status do
receptor. A decisão de partilhar o conhecimento - no sentido de dar em troca de
algo recebido - é baseada na confiança. Na ausência da confiança as práticas
formais para o compartilhamento de conhecimento tornam-se insuficientes para
encorajar indivíduos a compartilharem seu conhecimento dentro do ambiente de
trabalho. No que diz respeito ao status, Nowak e Sigmund (2000) salientam que o
ser humano tem obsessão pela reputação, pelo statusque tenha adquirido ou que
poderá vir a alcançar em uma comunidade ou em um círculo social no qual está
inserido. O status pode ser um fator implícito para o compartilhamento de
informações, porquanto este poderá ser visto com bons olhos pelos demais
membros da comunidade.
Quanto a isso, Judge, Fryxell e Dooley (2000) dizem que a reputação que o
indivíduo pode vir a alcançar é um dos mais importantes fatores que motivam o
compartilhamento de informações, o qual pode ser intensificado no ambiente da
P&D.
As oportunidades para compartilhar integram também os fatores identificados por
Ipe (2003), os quais exercem influência no compartilhamento. As oportunidades
podem ser de natureza formal e informal. Para facilitar o compartilhamento do
conhecimento, as oportunidades formais incluem: programas de treinamento;
estruturação de grupos de trabalho; e sistema baseado em tecnologia. Bartol e
Srivastava (2002) denominam tais oportunidades de interações formais e Rulke e
Zaheer (2000) de Canais de Aprendizado Intencional (purposive learning
channels).
Os canais de aprendizado intencional incluem sessões de treinamento formal e
outros mecanismos, como boletins internos e benchmarking competitivo, pelos
quais o conhecimento explícito é compartilhado. Os canais de relacionamento
(Relational Channels), ao contrário, incluem com maior ênfase os mecanismos de
compartilhamento informal, como contatos sociais com os pares. Os autores
associam intensamente os canais intencionais à eficiência. Um outro fator
interessante é que o conhecimento operacional, de contextos específicos, é mais
bem disseminado por meio de mecanismos formais, como os treinamentos ou as
atividades de benchmarking(RULKE; ZAHEER, 2000).
Essas iniciativas, segundo Ipe (2003), propiciam uma estrutura ambiental que
favorece o compartilhamento. Os canais de aprendizado intencional são capazes
de conectar um grande número de indivíduos, considerando-se a velocidade da
disseminação do compartilhamento do conhecimento, especialmente por meio de
redes eletrônicas e outros sistemas baseados em tecnologia.
Sem desmerecer o papel das oportunidades formais no compartilhamento, as
pesquisas (BROWN; DUGUID, 1991; DOUGHERTY, 1992) indicam que a maior quantidade
de conhecimento é compartilhada informalmente, por meio de canais de
relacionamento e aprendizagem. Canais de relacionamento (relational channels)
facilitam a comunicação face a face, a qual permite a construção da confiança,
tão importante para o compartilhamento. As oportunidades informais para a
interação com outras pessoas ajudam indivíduos a desenvolverem respeito e
amizade, atitudes que influenciam seu comportamento.
Para Dougherty (1992), Brown e Duguid (1991), é por meio do compartilhamento
face a face que muitas ações são desencadeadas e podem resultar em um processo
de comunicação em que indivíduos se aproximam e criam hábitos comuns, como a
linguagem verbal e a não-verbal.
O processo de comunicação é inerente às atividades científicas, e o contato
entre os profissionais torna-se indispensável para desencadear o fluxo da
informação e do conhecimento.
Por fim, Ipe (2003) indica a cultura do ambiente de trabalho como outro fator
preponderante no compartilhamento do conhecimento, visto que muitos fatores que
possibilitam o compartilhamento do conhecimento são influenciados pela cultura
que predomina nas subunidades e/ou, de forma geral, na organização. A cultura
organizacional é reconhecidamente uma das maiores barreiras para a construção,
o compartilhamento e o uso efetivo do conhecimento.
Os quatro fatores identificados por Ipe (2003) são significativos, porém, se
empregados isoladamente, não exercem grande influência no compartilhamento do
conhecimento. A natureza do conhecimento, a motivação para compartilhar, as
oportunidades para compartilhar e a cultura do ambiente de trabalho, segundo a
autora, estão interconectados; cada fator exerce e recebe influência do outro
de forma não-linear. A FIG._1 representa um modelo de compartilhamento de
conhecimento entre indivíduos, modelo que apresenta os quatro fatores e ilustra
o relacionamento entre eles.
O modelo indica que os três primeiros fatores - natureza do conhecimento,
motivação para compartilhar e oportunidades para compartilhar - estão inseridos
na cultura do ambiente de trabalho, isto é, são parte integrante dela. A
cultura influencia os três fatores, comandados por ela, os quais concorrem para
a correta valoração do conhecimento. Desse modo, os tipos de relacionamento e
de recompensa podem ser encorajados, e as oportunidades formais e informais que
o indivíduo tem para compartilhar o conhecimento também podem ser mais bem
aproveitadas.
A ausência de um desses fatores não impede o compartilhamento. Entretanto, no
modelo de compartilhamento do conhecimento proposto por Ipe (2003), os quatro
fatores estão fortemente inter-relacionados e cada um deles contribui para o
compartilhamento, criando, juntos, o ambiente ideal entre indivíduos dentro de
organizações para o compartilhamento do conhecimento.
O compartilhamento do conhecimento é um processo complexo, valorizado e
induzido a um equilíbrio do poder dentro das organizações. O conhecimento é
dependente do relacionamento social entre indivíduos para sua criação,
compartilhamento e uso (IPE, 2003).
Ainda em relação aos motivos que podem aumentar o compartilhamento de
informações, Davenport e Hall (2002) destacam que alguns indivíduos sentem
prazer em relatar os resultados alcançados por determinados atos, sendo este
comportamento considerado altruístico e prosaico. Em outras palavras, o
compartilhamento da informação, neste caso, pode ser motivado pela satisfação
pessoal de divulgar suas próprias idéias e conhecimentos.
Dyer e Nobeoka (2000) dizem que, para que ocorra o compartilhamento de
informações em determinados ambientes, além das motivações existentes, a
interação social é primordial. Assim, para que esta integração ocorra, são
necessárias algumas ações ou técnicas, que, quando maximizadas, podem elevar o
grau de compartilhamento, entre as quais figuram:
Clareza dos objetivos da organização ou da comunidade em que o
indivíduo está inserido;
Uso de linguagens comuns para a classificação dos tipos e funções
que determinadas informações podem assumir em relação aos outros;
Participação em eventos sociais. Ou seja, com o aumento da
sociabilidade um indivíduo tende a maximizar a sua rede de contatos,
fato que o colocará em uma posição privilegiada em relação à
quantidade e à qualidade das relações que poderão vir a ser
desencadeadas, sejam elas formais ou informais;
Disposição estrategicamente geográfica do indivíduo. Esta
circunstância pode vir a aumentar o compartilhamento de informações
em uma rede, mas vale ressaltar que, atualmente, com o uso intensivo
dos meios de comunicação e das redes de informação eletrônicas, este
fator tende a ser minimizado.
Outra contribuição a respeito das influências sobre o compartilhamento é a de
Ardichvili et al. (2006), que, fundamentados na literatura, estudaram os
fatores culturais que influenciam as estratégias para o compartilhamento do
conhecimento em comunidades de prática virtuais e listaram potenciais
diferenças culturais nos padrões de compartilhamento de conhecimento.
Distinguimos as que julgamos mais importantes para o campo de ação deste
estudo:
Diferença entre gerações - pessoas mais velhas podem ser mais
sensíveis às mudanças de atitudes ou posições; pessoas mais novas,
especialmente as que estão expostas à influência global, podem ter um
nível mais alto de tolerância para situações inesperadas ou
ameaçadoras;
Em culturas mais hierárquicas ou verticalizadas, é mister que
gerentes, que estão no topo da hierarquia, controlem o fluxo da
informação e delimitem as permissões para o acesso a informações
críticas, situação que leva à criação de barreiras ao
compartilhamento do conhecimento. A partir da participação ativa em
grupos de discussão, as pessoas sentem-se à vontade para compartilhar
informações sem antes consultar seus supervisores, comportamento que
pode ser seriamente limitado em uma sociedade hierárquica. Para que
não ocorra esse erro, isto é, para não divulgar informações sigilosas
em grupos/listas de discussão, gerentes delegam essa atividade -
participação em grupos - para suas secretárias ou colaboradores;
Uma outra barreira à participação em comunidades on-line pode ser a
preferência cultural para a comunicação face a face; isso pode
depender da concepção cultural e da forma de comunicação que conduz e
estabelece a confiança.
Uma outra abordagem a respeito dos fatores que interferem no compartilhamento é
a de O'Delle e Grayson (1998). Esses autores identificaram as barreiras
existentes para o compartilhamento do conhecimento e das melhores práticas das
organizações. A maior barreira, segundo eles, é a ignorância, pois nem os
indivíduos que atuam como fonte de conhecimento, nem aqueles que poderiam ser
receptores, sabem o que é preciso partilhar e quem tem o que partilhar. Vencer
essa barreira é um desafio para a gestão do conhecimento. A segunda grande
barreira é a capacidade de absorção do receptor, isso porque, mesmo superada a
primeira barreira, o receptor pode não ter tempo nem recursos para implementar
uma prática assimilada. E, como terceira barreira, os autores mencionam a falta
de relacionamento entre a fonte e o receptor do conhecimento, ou seja, a falta
de vínculos pessoais entre ambos, falta de credibilidade e de esforço
suficiente para ouvir ou ajudar os outros.
Ponjuán Dante (2004) ressalta que o compartilhamento de conhecimentos
organizacionais é o processo mais importante relacionado ao conhecimento.
Porém, como os demais autores citados, ela afirma que o compartilhamento é o
processo que enfrenta as maiores barreiras nos planos cognitivo, afetivo e
organizacional. É difícil partilhar conhecimentos relacionados a pontos de
vista e conceitos ao responder a perguntas e demonstrar técnicas. Com relação
ao plano organizacional, os membros de uma organização não são recompensados
por ajudar os colegas na resolução de problemas. Além disso, a autora destaca
como obstáculos ao compartilhamento: falta de confiança, diferenças nos marcos
de referência, falta de tempo e de oportunidades, recompensas pouco
significativas para os que possuem conhecimento, falta de capacidade dos
receptores para absorver novos conhecimentos, entre outros.
Enfim, são diversos os fatores que podem dificultar ou motivar o
compartilhamento da informação e do conhecimento. Dessa forma, as organizações,
além de promoverem a cultura do compartilhamento, devem identificar os aspectos
que representam barreiras para a troca de informações, bem como fomentar ações
impulsionadoras dos fatores que influenciam positivamente as atitudes e os
comportamentos voltados para o compartilhamento.
3 Procedimentos metodológicos
Os procedimentos metodológicos para a realização da pesquisa foram efetivados
em duas etapas:
1. a primeira etapa teve como campo de pesquisa a Rede de Cooperação
e Inovação em Alimentos Funcionais do Estado do Paraná1. Essa etapa
compreendeu uma pesquisa exploratória - utilizando a metodologia de
"Análise de Redes Sociais (ARS)"2 - e o levantamento dos contatos
entre os pesquisadores cadastrados nessa rede por meio de um
questionário. Os resultados (TOMAÉL et al., 2007) revelaram que 32
atores são os que mais influenciam o fluxo de informação, sendo os
indivíduos mais centrais da rede;
2. a segunda etapa - entrevista (gravada) - envolveu 28 dos 32 atores
que se mostraram mais centrais na rede (mapeada na primeira etapa).
Quatro dos atores considerados influentes (resultados da primeira
etapa) não participaram dessa segunda etapa por estarem fora do país,
em capacitação ou licença sabática.
A entrevista seguiu um roteiro semi-estruturado, elaborado para levantar as
formas e as bases do "compartilhamento da informação, do conhecimento e da
experiência entre os atores" e outros pontos que não foram abordados neste
artigo. Dos 28 atores entrevistados, 21 são da UEL, três da UEM, um da UFPR,
dois da PUC-Curitiba e um da EMBRAPA-Soja. A maioria dos entrevistados está na
UEL, pelo fato de essa universidade manter o maior número de pesquisadores
cadastrados na Rede de Cooperação e Inovação em Alimentos Funcionais do Estado
do Paraná.
Após a coleta de informações, as entrevistas foram transcritas e analisadas
tendo-se como parâmetro a técnica de análise de conteúdo - temas e categorias.
A análise de conteúdo consiste em três etapas, destacadas por Bardin (1977):
1. Pré-análise - organização do material coletado;
2. Exploração do material - codificação, classificação e
categorização, ou seja, um estudo aprofundado do material coletado;
3. Tratamento dos resultados, inferência e interpretação - é a fase
de síntese e seleção dos resultados. Nessa etapa, a reflexão e a
intuição (baseada nos materiais) possibilitam estabelecer relações e
aprofundar as idéias.
No caso desta pesquisa, a pré-análise consistiu na transcrição direta dos dados
gravados durante a entrevista. Na segunda fase (exploração do material) foi
feita a categorização das informações coletadas, tendo-se como foco os
seguintes temas: a) motivação para compartilhar; b) barreiras no
compartilhamento; c) obrigatoriedade para compartilhar; d) formas e meios de
compartilhamento. Por fim, foram feitas as interpretações e inferências a
partir dos depoimentos dos entrevistados.
4 Análise dos resultados
Os fatores que interferem no compartilhamento da informação identificados neste
estudo estão apresentados de acordo com os quatro temas definidos para a
análise.
No decorrer da análise, incluímos parte dos depoimentos fornecidos pelos
entrevistados, com o objetivo de ilustrar e reforçar as interpretações. Optamos
por representar a autoria desses depoimentos com letras, para preservar o
sigilo dos dados.
4.1 Motivação para o compartilhamento
Um dos fatores que influenciam o compartilhamento da informação e do
conhecimento é a motivação. Podemos definir a motivação como aquilo que
impulsiona a pessoa a agir de determinada forma, a ter determinada atitude ou
comportamento diante de uma situação.
Analisando os resultados da pesquisa, foi-nos possível identificar alguns
elementos, como, por exemplo, a confiança, a amizade, a afinidade, a harmonia e
a doação, que podem interferir na motivação para o compartilhamento. A ação
relacionada a esses elementos tem algumas características que são de origem
interna; e é construída ao longo do tempo, uma vez que envolve valores,
crenças, sentimentos e interesses em comum. Vale a pena mencionar que, quando a
origem de uma ação é interna, as pessoas sentem-se mais autônomas e estabelecem
as próprias metas e ações. Nesses casos, as atitudes e as intenções para o
compartilhamento têm origem na própria pessoa, não dependendo de incentivos
externos. Dessa forma, a confiança, a amizade, a afinidade, a harmonia e a
doação podem ser consideradas elementos que promovem comportamentos motivados e
influenciam positivamente o compartilhamento da informação e do conhecimento.
A confiança quebra barreiras, possibilita a interação entre as pessoas e,
muitas vezes, pode ser um fator preponderante para que o compartilhamento de
informações e de conhecimentos ocorra de forma eficaz e satisfatória. Podemos
ilustrar isso com um dos exemplos mencionados por um dos pesquisadores
entrevistados, que tem na sua rede de relacionamentos uma parceria com um
pesquisador no Japão. Em algumas situações, esse pesquisador compartilhava os
resultados de suas pesquisas antes de publicá-los. É possível visualizar nesse
exemplo a importância da relação de confiança, que motivou o pesquisador a
comunicar suas idéias com seu par.
A seguir, na transcrição de um dos trechos da entrevista, também é apontada a
relevância da relação de confiança para o compartilhamento: "[...] este
processo, naturalmente, depende, como eu já disse, de relacionamento e de
confiança mútua, porque parceiros precisam ser parceiros na plenitude da
palavra, se não nada se desenvolve, é uma questão de cumplicidade [...]"(ISS).
De acordo com Ipe (2003), a decisão de compartilhar conhecimento depende da
relação de confiança. Além disso, quando não há confiança, as próprias práticas
formais para o compartilhamento podem ser prejudicadas, inibindo as trocas de
informação e conhecimento.
Um outro aspecto evidenciado quanto à confiança é a capacidade profissional do
parceiro, isto é, a pessoa com quem o pesquisador se propõe a compartilhar
informações precisa ter condições de dar respostas rápidas aos problemas
decorrentes de detalhamentos de produtos, procedimentos metodológicos, etc. Se
o pesquisador tiver uma dificuldade e o parceiro não conseguir ajudar, não "der
conta", a parceria se enfraquece e pode até ser extinta, porque, nesse caso,
rompem-se as relações de confiança. Aqui, especificamente, as parcerias
estabelecidas implicam realmente troca, ou seja, um deve oferecer ao outro
alguma coisa; e a confiança está relacionada à certeza que um tem do desempenho
e da capacidade de resposta do outro.
No que diz respeito à afinidade, à harmonia e à amizade, é importante dizer que
essas fortalecem o vínculo entre as pessoas. Quando os valores pessoais, as
crenças e as expectativas são semelhantes, cria-se um clima harmonioso, com
fortes tendências à comunhão de interesses e idéias. A importância da afinidade
ficou evidente na fala de um dos entrevistados que, ao ser questionado sobre o
motivo para a troca de informações, ressaltou que "[...] a afinidade também é
importante, porque você não vai trabalhar com uma pessoa que você não se dá
bem, só porque a temática é interessante, então a afinidade conta bastante"
(LAU).
Outra situação em que a amizade pode contribuir para o compartilhamento é
quando há o acesso a determinados recursos (por exemplo, para a manutenção de
equipamentos), o qual pode ser facilitado por intermédio de amigos. O acesso a
recursos físicos com a colaboração de amigos pode significar que, anterior à
obtenção dos recursos, houve o acesso à informação, por meio do
compartilhamento. Então, podemos inferir que as relações de amizade facilitam o
compartilhamento da informação pela presença da confiança na relação.
O último elemento, a doação, refere-se ao ato de doar conhecimento sem receber
nada em troca, comportamento que exemplifica a motivação intrínseca (disposição
natural e espontânea de realizar determinada atividade). Nesse caso, a pessoa
tem um sentimento de prazer em compartilhar suas idéias com os demais colegas,
em auxiliar o próximo sem receber nada em troca. Este processo pode ser chamado
de internalização, em que a pessoa já assimilou o valor e a importância do
compartilhamento. Essa situação pode ser visualizada quando um dos
entrevistados, ao ser questionado sobre a importância das trocas e parcerias,
ressaltou que nesse processo se aprende muito e que, muitas vezes, colaborou
com os pares, compartilhando seus conhecimentos e experiências sem nunca cobrar
nenhum retorno e que ainda, quando menos esperava, outros pesquisadores
contribuíram com informações para os seus estudos. Nesse caso podemos
estabelecer uma relação com a idéia de Lin (2007), que, ao definir o
compartilhamento, se reporta à cultura da interação social, em que o desejo ou
a vontade de comunicar-se é tão ativa que motiva a pessoa a doar conhecimento.
Dixon (2000) também assegura que as pessoas gostam de compartilhar o que sabem.
A autora afirma ainda que as pessoas se sentem valorizadas quando dividem as
suas experiências com as outras. Isso nos permite inferir que a valorização
pode contribuir para a superação de barreiras ao processo de compartilhamento.
4.2 Barreiras no compartilhamento
Embora o ser humano tenha uma tendência natural para compartilhar o que sabe,
existem fatores que contribuem para retardar e até impedir o processo de
compartilhamento da informação. Esses fatores podem ser de ordem estrutural,
logística, cultural e psicológica, inerentes aos indivíduos e à própria
organização na qual eles atuam.
Nas entrevistas realizadas com os pesquisadores, percebemos que um grande
obstáculo ao compartilhamento é a falta de confiança no outro, o que nem sempre
é um sentimento sem causa, pois alguns deles relataram episódios em que foram
"vítimas" da apropriação de idéias e produtos por parte dos parceiros.
Reportando-se a uma parceria com um órgão de pesquisa, um pesquisador relata
que o seu grupo de pesquisa desenvolveu sozinho um projeto de reator e, por
ocasião da instalação do reator, o órgão que financiou a pesquisa decidiu pela
sua implantação em outro local e não na cidade dos pesquisadores. Segundo o
pesquisador, esse órgão ganhou "pronto" o reator.
O medo da exploração nas relações de parceria é uma barreira para o
compartilhamento do conhecimento, e é citado por Empson (2001) como um aspecto
negativo da reciprocidade, negociada ou não, em tais relações.
É fato que as parcerias para pesquisas que envolvem ou não financiamento
possibilitam o acesso às informações provenientes da pesquisa a todos os
parceiros, inclusive as informações sigilosas, o que, dependendo da parceria,
pode resultar na apropriação da idéia e dos próprios resultados do projeto.
O pesquisador universitário tem uma cultura voltada para a disseminação dos
resultados da pesquisa e até do projeto, mas é preciso proteger a informação, o
que não significa necessariamente não compartilhar. É preciso estimular o
compartilhamento das informações, mas de modo a assegurar também a sua
propriedade.
Ainda com relação à confiança e ao sigilo, um dos entrevistados mencionou a
necessidade de assinatura do que ele chamou de carta de sigilo, porque, segundo
ele "[...] não tem crescimento se nós não dividirmos a informação [...]"(ISS).
Mas esse mesmo pesquisador relatou que, quando se reúnem para a assinatura da
mencionada carta, ninguém fala a verdade. Ainda, ele mencionou um outro
problema além dos parceiros quando se trabalha com inovação tecnológica: os
alunos, na universidade, são presença obrigatória nos projetos de pesquisa e
eles nem sempre têm maturidade suficiente para evitar o vazamento de
informações. Para esse entrevistado, as empresas não investem na universidade
porque conhecem a vulnerabilidade das informações geradas; afinal, o professor/
pesquisador é obrigado a publicar e nem sempre consegue fazer isso protegendo
as informações.
A desconfiança e o medo do plágio e do roubo das idéias e dos resultados estão
presentes na comunidade científica, e são fatores que retardam e impedem a
discussão de idéias e o compartilhamento das informações, tão importantes para
o avanço da ciência e da tecnologia. Isso nos remete ao antigo dilema:
compartilhar ou proteger?
Ainda com relação aos desafios relacionados ao compartilhamento da informação,
outro pesquisador admitiu não se tratar de um processo fácil, porque existe
muita competição entre os pesquisadores e interesses pessoais que interferem
nessa troca.
Infelizmente, em muitas situações ainda prevalece o sentimento do
reconhecimento individual em detrimento do coletivo, o que é um equívoco, pois,
se um determinado grupo se torna referência nacional e até internacional sobre
determinado assunto, a área se fortalece e todo mundo ganha.
É preciso lembrar ainda que nessas situações as pessoas podem, além do
reconhecimento individual, perceber o valor da informação que possuem. Essa
percepção passa a ser uma barreira porque, como afirmam Andrews e Delahaye
(2000), as pessoas podem clamar pela propriedade emocional do conhecimento e
esse senso de propriedade está relacionado, em muitos casos, ao status e às
possibilidades de avanço na carreira.
Essa idéia contraria a argumentação de Judge, Fryxell e Dooley (2000), para os
quais o compartilhamento oferece visibilidade para quem o faz e isso pode
angariar prestígio e reputação.
A interação social, que é um fator facilitador do compartilhamento da
informação, nem sempre ocorre nas universidades, pois os laboratórios isolam os
pesquisadores e contribuem para inviabilizar a troca, a conversa e o contato.
Esse isolamento contraria o que recomendam O' Dell e Grayson (1998) para
facilitar o compartilhamento de conhecimento, quando dizem que as organizações
devem assegurar condições logísticas, estruturais e culturais que estimulem a
troca de informações entre seus membros.
Se a desconfiança é um dos maiores obstáculos para o compartilhamento, a
interação social possibilita o desenvolvimento de vínculos entre os indivíduos
e, conseqüentemente, gera confiança; por isso deveria ser estimulada quando se
considera o compartilhamento necessário ao avanço da pesquisa.
Outro obstáculo ao compartilhamento da informação mencionado pelos
pesquisadores entrevistados pode ser considerado de ordem estrutural, pois não
existe uma escala de trabalho intermediária entre a de laboratório e a
industrial, o que dificulta o estabelecimento de parcerias com o empresariado.
Um pesquisador da área de biologia complementa que a universidade não dispõe de
mecanismos para atender à demanda da sociedade. É fato que essas instituições
não dispõem de mecanismos para que as atividades desenvolvidas no âmbito
acadêmico tenham um reflexo social rápido e efetivo. Por outro lado, há que se
considerar a falta de comprometimento dos gestores das universidades com
relação às demandas da sociedade, como também o desenvolvimento da pesquisa que
acontece dentro do academicismo, totalmente desvinculado de ações
empreendedoras. O que ocorre nesse caso é que, mesmo quando partilham com os
empresários os resultados de suas pesquisas, os pesquisadores não encontram
eco, ou seja, apoio, porque há um descompasso entre a academia e o meio
produtivo.
A literatura (PONJUAN DANTE, 2004; SELAMAT; CHOUDRIE, 2004) é unânime em
apontar dificuldades no compartilhamento do conhecimento. Essas dificuldades
nos parecem mais evidentes no caso do conhecimento tácito, muito rico em
organizações empresariais. No contexto estudado, essas barreiras poderiam ser
atenuadas, uma vez que a maior parte do conhecimento produzido é explicito, com
vistas à sua disseminação, o que é parte da cultura acadêmica, estimulada pela
obrigatoriedade da comunicação dos resultados de pesquisa.
4.3 Obrigatoriedade para compartilhar
Um dos elementos que impulsionam o compartilhamento da informação e do
conhecimento é a obrigatoriedade, que está relacionada à necessidade de
laboratório, de infra-estrutura, de resolução de problemas ou de conhecimentos
de especialistas.
Atualmente, o ambiente de pesquisa de alguns departamentos da universidade é
deficitário em laboratórios, equipamentos e tecnologias necessárias para o
processo de determinadas pesquisas, principalmente quando se trata de estudos
que demandam testes e experimentos. Assim, a solução encontrada pelos
pesquisadores é a utilização da infra-estrutura dos demais departamentos da
universidade e de outras instituições. E, nessa interação, podem surgir
necessidades e oportunidades para o compartilhamento da informação. A busca por
laboratórios mais bem equipados pode iniciar uma parceria que leva ao
compartilhamento. Inicialmente, pode ser uma parceria formal, uma troca formal,
mas depois pode transformar-se em relações informais.
No que diz respeito ao conhecimento de especialistas, vale mencionar que, em
determinados estudos, há a necessidade do conhecimento de um especialista de
outra área para complementar a pesquisa ou resolver algum problema. Nessas
situações, o pesquisador que solicita a ajuda pode compartilhar as suas
informações com o especialista e este compartilhar as informações que poderão
solucionar os problemas identificados.
É importante frisar que para o desenvolvimento de todo o processo de pesquisa
algumas etapas dependem de outras áreas, para isso o compartilhamento de
informações (sobre a pesquisa e seus delineamentos) é imprescindível. Esse tipo
de compartilhamento possibilita a complementação e a aproximação de
conhecimentos de áreas distintas.
Tratando-se da resolução de um problema no processo da pesquisa, podemos
ressaltar a motivação pela busca de informação por meio de canais formais, tais
como livros, periódicos, etc., e de canais informais, como, por exemplo, um
contato pessoal com um colega de departamento ou com outros pesquisadores que
trabalham com o mesmo tema. As oportunidades para o compartilhamento podem
ocorrer quando o pesquisador expõe ou relata ao seu colega o andamento daquela
atividade ou processo, com o objetivo de evidenciar o problema ocorrido. Nessas
ocasiões, ambos os pesquisadores podem trocar conhecimento e experiência, com
um objetivo comum: resolução dos problemas de pesquisa. No depoimento a seguir
podemos visualizar um exemplo de busca de informação para solução de problemas
de pesquisa:
[...] a gente busca informação na literatura, em contatos com outras
pessoas ou centros e em trocas de e-mails [...] você sabe de uma
pessoa que trabalha em outra instituição e que desenvolve alguma
coisa parecida, então a gente troca informação, [...] eu já busquei
solução de problemas com o pessoal da EMBRAPA, o pessoal da UNICAMP e
mesmo os professores daqui a gente busca essa interação, para solução
dos problemas (REN).
Outro entrevistado, quando questionado sobre como resolve os problemas que
surgem no decorrer da pesquisa, relatou que a solução vem a partir de muita
conversa, interação e troca de experiências com colegas de pesquisa. Destacou,
ainda, a importância de se buscar a experiência (metodologias, técnicas de
investigação e outras) de grupos de pesquisa que são referência na sua área de
atuação.
O cotidiano da pesquisa requer o compartilhamento freqüente, pois, muitas
vezes, o pesquisador não dispõe de tempo suficiente para buscar na literatura
respostas para as suas dúvidas, ou então busca e não as encontra. Além disso,
às vezes é necessário discutir muito para se chegar a uma reposta que seja
considerada de consenso para o grupo de pesquisadores.
Outros aspectos que podem ser considerados elementos da obrigatoriedade para o
compartilhamento são o reconhecimento e a avaliação do trabalho do pesquisador
pelos seus pares. Isso acontece quando o pesquisador apresenta sua pesquisa em
algum evento ou a publica em algum veículo informacional (livro, periódico,
etc.). A comunicação científica, por meio de canais formais, é uma forma de
compartilhamento que permite, desse modo, a avaliação do seu trabalho e,
conseqüentemente, a retomada do que eventualmente pode não estar dando certo. É
uma oportunidade para o crescimento.
Enfim, podemos afirmar que os aspectos que integram a obrigatoriedade - busca
de equipamentos, laboratórios, resoluções de problemas e conhecimentos de
pesquisadores ou especialistas da mesma área - podem converter-se em
oportunidades para o compartilhamento de informações. E esse processo,
inicialmente de natureza formal, pode fortalecer os canais de comunicação
informais, ou seja, as relações informais, em que a troca e o compartilhamento
de informações e de conhecimento podem ocorrer de forma mais natura.
4.4 Formas e meios de compartilhamento
Ipe (2003) considera que o compartilhamento do conhecimento individual é
imperativo para a criação, a disseminação e a gestão do conhecimento em todos
os níveis da organização. Corroboram essa argumentação Nonaka e Takeuchi
(1997), para os quais não é possível criar conhecimento sem as pessoas e,
principalmente, se não houver compartilhamento do conhecimento individual.
Para que ocorra o compartilhamento do conhecimento, seja ele individual ou
corporativo, assegurando assim a realização desse processo, é preciso a escolha
de um meio eficaz. Esses meios podem ser diretos ou indiretos. Nos meios
diretos, as relações para a obtenção de informação podem acontecer com as
pessoas que os próprios pesquisadores conhecem, com os colegas na universidade,
com antigos colegas de mestrado e doutorado, com professores, etc. No que diz
respeito aos meios indiretos, a busca da informação se dá por meio da
literatura; as leituras podem suscitar questões, que fazem os pesquisadores
buscarem o compartilhamento com o autor, que é, então, procurado tanto por seus
pares quanto pelas pessoas que leram seus artigos ou se interessam por eles.
Esse segundo tipo de compartilhamento configura-se no compartilhamento
unilateral, ou seja, quando se trata da relação entre um leitor e um texto de
seu interesse. O autor compartilha seu conhecimento quando escreve e o
pesquisador/leitor absorve a informação e o conhecimento disseminado pelo
texto. Ocorre nesse caso um diálogo entre o compartilhador/autor e o receptor
da informação. O sucesso desse diálogo como meio para o compartilhamento da
informação depende do compartilhador (principalmente da sua capacidade de
comunicação), mas depende também das condições cognitivas do receptor.
Nesta pesquisa constatamos que os entrevistados se utilizam tanto dos meios
diretos quanto dos indiretos como canais para o compartilhamento. As falas
transcritas a seguir, de dois dos entrevistados, exemplificam o uso do canal
indireto:
Com certeza na hora em que você tem uma idéia ou alguma coisa que te
chama atenção, de alguma forma eu poderia montar um projeto disso,
isso daí já leva você a ter que se informar, então você vai ter que
fazer muita leitura, dos artigos, mesmo de livros para se interar
mais naquela idéia, mas ao longo da pesquisa, você está continuamente
necessitando desse conhecimento (REN). [...] normalmente é com a
literatura científica, com os próprios resultados que a gente obtém
no laboratório, que a gente vai dando continuidade, e sempre
comparando com outros pesquisadores internacionais para ver o que
está acontecendo. [...] sempre a literatura científica e os pares
(LIA).
A informação obtida por meio de leituras é comum no ambiente de pesquisa, tanto
para a atualização, busca de novas idéias, respaldo científico, quanto para a
solução de problemas. O pesquisador é um leitor dos materiais de sua
especialidade, se tornando receptor de conhecimentos, e o autor, no processo da
leitura, é o especialista.
Já com relação aos meios diretos para a realização do compartilhamento,
verificamos serem muito comuns entre os entrevistados. Como exemplo, podemos
citar os e-mails, os contatos face a face, as listas de discussão e até mesmo o
telefone.
No que se refere à interação face a face, esta é considerada pela literatura
(DAVENPORT; PRUSAK, 1998; DIXON, 2000) como o meio mais eficaz para o
compartilhamento da informação. A proximidade física e a informalidade
existentes no contato face a face são fatores que influenciam positivamente a
troca de informações. A informalidade desse modo de contato não impõe tanta
censura quanto outros, como, por exemplo, a apresentação de trabalhos em
eventos. Os entrevistados desta pesquisa, em sua maioria, citaram a interação
face a face como o principal meio para a realização do compartilhamento, o que
é compreensível considerando-se as vantagens dessa opção de compartilhamento em
relação às demais. Ipe (2003) considera a confiança como fator de motivação
para o compartilhamento; e confiança é algo que exige proximidade, conhecimento
do outro e existência de vínculos.
Os eventos presenciais também contribuem para a preferência do compartilhamento
face a face, sendo este tipo de contato considerado mais eficiente quando
comparado com outros meios de comunicação.
O avanço das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC's) tende a aprimorar
e promover o compartilhamento de informações e conhecimentos, já que este pode
ocorrer através de diversos canais comunicacionais, mas ainda assim observarmos
a prevalência do contato face a face.
No que concerne ao papel das TIC's, em ser mais uma ferramenta de auxílio à
promoção do compartilhamento de informações e conhecimentos, destacam-se as
comunidades virtuais. Mas vale ressaltar a incipiência destas no Brasil, fato
este que se pode observar pelo conteúdo das mensagens que veiculam nestas
listas de discussão, majoritariamente comunicados, sendo que quase não se
observa a discussão sobre um tema. Em outros países esse é um meio em que o
compartilhamento de fato acontece.
Analisando os dados da pesquisa, podemos destacar também, como um grande canal
de compartilhamento, o uso de e-mail; porém estas mensagens geralmente são
curtas, objetivas e diretas, talvez por economia de tempo na comunicação. Em
alguns casos, a comunicação por e-mail pode conter a troca de arquivos de todos
os tipos - artigos, relatórios, trabalhos de alunos, etc.
Diante do exposto, podemos dizer que a interação face a face propicia o
desenvolvimento de vínculos que promovem a relação de confiança e permitem a
continuidade do processo de compartilhamento.
5 Considerações finais
O conhecimento necessário para o desenvolvimento de uma pesquisa é construído
durante o seu curso, e esse é um processo subsidiado por informação, desde o
início até a conclusão. Essa informação vem, primeiramente, da literatura, e em
seguida da experiência e do conhecimento detido pelos pesquisadores e
especialistas, além da relação com alunos e orientandos. Observamos, neste
estudo, que o compartilhamento entre pesquisadores permeia todo o processo de
pesquisa e lhe é imprescindível, visto que os efeitos do compartilhamento da
informação constituem-se elementos relevantes e, em muitos dos casos, de fácil
acesso.
As dificuldades encontradas no processo de pesquisa, como infra-estrutura,
conhecimento complementar de especialistas ou busca por soluções para problemas
encontrados, levam o pesquisador a compartilhar informações, conhecimento e sua
experiência. Essas dificuldades possibilitam a criação e/ou fortalecimento das
relações com pares e especialistas de áreas de interface, situação que permite
a construção do conhecimento de ambas as partes, tanto de quem busca a
informação quanto de quem a fornece.
O conhecimento que as pessoas possuem é o que atrai outros pesquisadores.
Quando cada um, com seu conhecimento e sua especialidade, se une a outros,
forma-se um todo. E é esse conhecimento coletivo, de que cada pesquisador detém
uma parte, que move as parcerias e promove o compartilhamento.
É importante também destacar que o compartilhamento de informações e de
conhecimentos entre diferentes pesquisadores e instituições, por meio da
complementaridade de conhecimentos, pode vir a gerar novas idéias de pesquisa e
também a formação de parcerias benéficas ao aprimoramento da P&D intra e
extra-institucionais.
Os dados analisados ainda revelam que os atores enfrentam barreiras quanto ao
compartilhamento da informação e do conhecimento, apesar do campo empírico do
estudo ser constituído por instituições de ensino e pesquisa, cuja produção
científica deve ser disseminada para ter seus resultados validados mediante
avaliações, discussões e análises. Portanto, o compartilhamento da informação,
do conhecimento e da experiência faz parte da cultura dessas instituições.
As barreiras identificadas são decorrentes da falta de confiança mútua, do medo
do plágio, do roubo das idéias e da própria estrutura das instituições, que
isola os pesquisadores em laboratórios. Além disso, a informação, o
conhecimento e a experiência, ao mesmo tempo em que conferem reconhecimento e
visibilidade a quem os detém, inspiram um sentimento de propriedade; sentimento
que, aliado à necessidade de proteção, resulta no comprometimento do processo
de compartilhamento.
A confiança também é um elemento que pode interferir na motivação para
compartilhar informação. A presença da confiança promove a interação e tende a
deixar as pessoas à vontade para compartilhar suas experiências e seus
conhecimentos. Podemos destacar ainda outros indicadores no que se refere à
motivação para o compartilhamento, como a amizade, a afinidade e a harmonia,
que se constituem em importantes elementos para o fortalecimento dos vínculos
entre as pessoas e propiciam um ambiente favorável ao compartilhamento.
Com relação às formas e aos meios de compartilhamento da informação e do
conhecimento, constatamos que os atores entrevistados utilizam todos os
recursos disponíveis abordados pela literatura - diretos e indiretos -,
inclusive aqueles propiciados pela tecnologia de informação e comunicação. No
entanto, os dados analisados evidenciam que o contato face a face é, também
entre os entrevistados, o preferido para o compartilhamento; o que reforça a
ênfase da literatura com relação a essa forma de compartilhamento, que, em
decorrência da proximidade entre os atores, favorece a criação de vínculos
importantes entre eles, como a amizade e a confiança, sentimentos que estimulam
naturalmente o compartilhamento.
São muitos os fatores que podem interferir no compartilhamento da informação e
do conhecimento. A análise desses fatores nos permite inferir que as intenções
e ações voltadas para o compartilhamento precisam ser estimuladas e valorizadas
constantemente, por meio de oportunidades formais e informais, elementos
motivadores, aspectos culturais e, principalmente, pela promoção da relação de
confiança.