Meio ambiente e relações internacionais: perspectivas teóricas, respostas
institucionais e novas dimensões de debate
Introdução
Há só uma Terra, mas não só um Mundo. Todos nós dependemos de uma biosfera para
conservar nossas vidas. Mesmo assim, cada comunidade, cada país luta pela
sobrevivência e pela prosperidade quase sem levar em consideração o impacto que
causa sobre os demais
Relatório Brundtland, Nosso Futuro Comum
A citação acima pertence a um dos mais impactantes relatórios já produzidos
pelas Nações Unidas, o Relatório da Comissão presidida por Gro Harlem
Brundtland, "Nosso Futuro Comum". Mesmo se a Terra fosse somente um pequeno
espaço ou se houvesse apenas um rio, uma árvore, ou um animal, haveria
infinitas formas de organizá-los e distribuí-los entre os homens, pois é
evidente que a pintura do espaço humano depende do desejo de ver este ou aquele
desenho sociopolítico. Entretanto, que colorações passariam a ter o espaço
físico caso uma das formas de organização sociopolítica fosse preponderante
sobre todas as outras e, progressivamente, esta forma de organização cedesse
lugar a todas outras possibilidades? Em outras palavras, que opções e
oportunidades emergem para a governança ambiental em um contexto de redefinição
da soberania estatal e do próprio sistema internacional?
Comumente, as análises de política ambiental internacional e governança global
ambiental trazem consigo uma distinção tripartite do meio ambiente em local/
nacional/global,1 transfronteiriço/bens comunais globais/patrimônio comum da
humanidade,2 ou ainda em natureza, demografia e tecnologia.3 A abordagem aqui
utilizada é aquela proposta na citação comentada anteriormente entre Terra e
Mundo, ou seja, entre o espaço "físico" e o "espaço humano". De fato, há de se
alertar que apesar desta divisão ser extremamente útil para fins didáticos, a
sua real operacionalização seria difícil, uma vez que o espaço "físico" pode
ser socialmente construído, ou melhor, o que se chama aqui de Terra e meio
ambiente depende fortemente de como os seres humanos os entendem. Contudo, o
objetivo aqui deve ser pavimentar uma nova ontologia para o debate, não prover
subsídio para o debate entre racionalistas e construtivistas.
Primeiramente, será necessária uma caracterização do que é o problema
ambiental, para que se possa revelar posteriormente os três mecanismos pelos
quais se entende o processo de gestão coletiva do meio ambiente. Em seguida,
serão discutidas as opções e oportunidades institucionais no contexto de
redefinição da soberania e surgimento de novos atores no sistema internacional.
A quinta seção trará duas breves discussões acerca da adequação dos ideais de
livre comércio e proteção ambiental e sobre a necessidade de redefinição do
papel da segurança no contexto da crise ambiental. A conclusão operacionalizará
toda a discussão exposta e apontará opções e oportunidades de diálogo futuro
entre as relações internacionais e o meio ambiente.
O que é o problema ou crise ambiental?
Esta pergunta é extremamente relevante, porque é a partir de sua resposta que
se pode construir uma ligação entre a área temática concebida como "meio
ambiente" e as relações internacionais como campo do saber. A ligação entre
ambas as áreas revela também uma perspectiva interessante relativa à
necessidade de gestão coletiva da crise ambiental, uma vez que os problemas que
constituem esta crise perpassam as tradicionais fronteiras territoriais dos
Estados nacionais e demandam uma ação conjunta de todos os atores envolvidos.
Como, então, pode ser entendida e definida a crise? Em adição, porque a gestão
deve ser coletiva?
Em primeiro lugar, considere que a realidade que cerca a todos seja uma
superposição de duas esferas. Uma denomina-se "Mundo", por cristalizar a gama
de interações políticas, econômicas e sociais entre os indivíduos do globo. A
outra será chamada de "Terra" pela capacidade de apreensão do conjunto das
coisas físicas ou naturais.4 Portanto, a crise ambiental será aqui definida
como a incongruência entre Terra e Mundo, ou seja, entre um espaço físico e
outro socialmente construído. Todavia, se a crise é baseada na incongruência
então, a sua solução, de forma geral, deveria estar baseada na convergência
entre ambos.
O exame do pensamento ambiental ou ecológico revela três estilos de pensamento,
implicando em diferentes caracterizações tanto para a crise ambiental, quanto
para suas soluções. Tanto a Bíblia,5 quanto a economia clássica de Thomas
Malthus são exemplos de um estilo de pensamento antropocêntrico que considera a
"Terra como um conjunto de recursos à disposição da sociedade. Tomadas as
constatações de Malthus,6 a crise ambiental poderia ser definida como recursos
finitos para uma população exponencialmente crescente. As soluções seriam o
próprio equilíbrio natural existente entre homem e "meio", a fome, ou controle
populacional. Por outro lado, há abordagens geocêntricas, como a hipótese de
Gaia elaborada por James Lovelock,7 ou melhor, a "Terra englobaria o "Mundo".
Neste ponto, deve-se notar que os antípodas aqui definidos anteriormente,
antropocentrismo e geocentrismo, são variantes de um discurso também presente
na ecologia entre conservação ou preservação.8
O terceiro modelo seria aquele que conciliaria as abordagens antropocêntricas e
geocêntricas. Especialmente após a tentativa de racionalização do problema
ambiental em 1972, com a publicação do Relatório do Clube de Roma, intitulado
The limits to growth, e a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o
Meio Ambiente Humano (UNCHE, em inglês), também em 1972, ficou claro que o
problema ambiental gravitava em torno de duas temáticas centrais, o crescimento
econômico ininterrupto e a exaustão dos recursos naturais. Também já havia sido
demonstrado por vários economistas, como Ezra Mishan e Arthur Pigou, por
exemplo, que o crescimento econômico, especialmente quando refletido pelo
Produto Interno Bruto (PIB), não era capaz de contabilizar determinados custos
oriundos do consumo e produção, as chamadas "externalidades negativas".9 Além
disto, o preservacionismo radical defendido por muitos ambientalistas, nas
décadas de 1970 e 1980, não era solução, porque impunha restrições ao bem estar
humano.10 O que estava em jogo era a inexistência de uma abordagem que pudesse
conciliar tanto a garantia de bem estar aos indivíduos, quanto a conservação e
utilização racional dos recursos naturais. Tal abordagem surgiu nos anos 80,
quando a International Union of Concerned Scientists (IUCS) lançou um documento
chamado World Conservation Strategy: Living Resource Conservation for
Sustainable Development, que trazia implicitamente uma sistematização da
relação entre crescimento econômico insustentável e recursos naturais em
exaustão, e o Relatório da Comissão Brundtland, Nosso Futuro Comum, reforçou e
politizou o termo "desenvolvimento sustentável", ou seja, "O desenvolvimento
que atende as necessidades do presente sem comprometer a habilidade das
gerações futuras de atender suas próprias necessidades".11
Se a possível solução para a crise ambiental caminha pela idéia de convergência
entre as esferas física e social, como e por que promover uma gestão coletiva?
Muitos analistas das relações internacionais relembram o papel das fronteiras
territoriais e dos Estados-Nação como possíveis forças beligerantes em um
sistema internacional carente de autoridade central. Outros analistas ressaltam
o porquê da necessidade de autoridade central para manutenção da ordem se o
sistema internacional é constituído de inúmeras regras e normas tácitas ou
informais que influenciam o comportamento dos Estados. Entretanto, é de menor
importância para a crise ambiental a lente pela qual se entende as relações
internacionais porque tal crise pertence ao mundo físico e ultrapassa tanto
fronteiras, quanto qualquer outro conceito assumido. O essencial para este
campo do saber são os conflitos, arranjos institucionais ' formais e informais
' e negociações que emergem da gestão coletiva da crise ambiental. Ou seja, a
crise é global no âmbito do problema da solução e da gestão. Três perspectivas
emergem, então, da gestão coletiva da crise ambiental: governança global,
regimes internacionais e as abordagens organizacionais.
Perspectivas teóricas da gestão coletiva do meio ambiente
"[...] nosso objetivo deve ser ajudar nossos estudantes, colegas, e o público
mais amplo a entender a necessidade de governança em um mundo parcialmente
globalizado e os princípios que fariam esta governança legítima."
Robert Keohane12
Abordagens organizacionais, regimes internacionais e governança global são as
três abordagens mais comuns para analisar o problema da gestão coletiva do meio
ambiente. Marie-Claude Smouts sugere que tais abordagens representam de fato o
movimento da cooperação internacional desde a instituição do sistema
internacional Vestfaliano no século XVII, rumo a uma possível governança
mundial.13 Entretanto, tais conceitos exibem uma tendência relativamente comum
nas ciências socais: a falta de refinamento teórico.
Entre as idéias de governança global e regimes internacionais há uma forte
complementaridade. Kratochwil e Ruggie, em seu estudo sobre as organizações
internacionais, fornecem um interessante ponto de partida: "O núcleo
substantivo em torno do qual as várias abordagens teóricas se agregaram é o
problema da governança internacional".14 Ou seja, a governança global/
internacional é o objeto de estudo do campo denominado "organizações
internacionais". Mais claramente, o objeto de estudo deste campo seria
verificar como pode existir governança na ausência de governo. Se ambos os
conceitos pertencem a um mesmo subcampo de estudo, o que estabeleceria uma
diferenciação entre eles?
Uma sugestão de diferenciação, que inclui a proposta de Kratochwil e Ruggie, é
fornecida por James Rosenau e Ernst-Otto Czempiel em Governança sem Governo,
uma das obras mais conhecidas sobre o assunto. Para estes autores, o
diferencial entre eles estaria no caráter de área temática dos regimes
internacionais, conforme a definição de Krasner.15 Ou seja, o conceito de
regimes internacionais seria menos abrangente que o de governança global, que
seria o conjunto de todos os regimes internacionais, conclusão similar a de
Olav Stokke: "[...] o conceito de governança implícito na análise de regimes é
mais estreito do que aquele pretendido pela governança global".16 O que seria,
então, uma definição para governança global?
Governança é para Rosenau e Czempiel "[...] um sistema de ordenação que depende
de sentidos intersubjetivos, mas também de constituições e estatutos
formalmente instituídos". Entretanto, se governança é um sistema de ordenação,
e daí não é estranho que a definição acima seja semelhante àquela de "ordem
mundial" proposta por Hedley Bull,17 então qual relação existe entre governança
e ordem? Os próprios autores respondem: "[...] governança e ordem são fenômenos
claramente interativos[...] a ordem é ao mesmo tempo uma precondição e uma
conseqüência do governo. Uma coisa ajuda a explicar a outra, e nenhuma aparece
em primeiro lugar".18 Se governança é um sistema de ordenação e não há
hierarquia entre ordem e governança, seja esta última com ou sem governo,
constituiu-se uma tautologia. A ordem é estabelecida por meio da governança,
que por sua vez é um mecanismo de ordem. Isto é, ordem explicando a ordem.
A exemplo da idéia proposta por Rosenau e Czempiel pode-se perceber a
dificuldade de precisão em relação tanto ao conceito de governança global, como
também às outras duas abordagens que vêm sendo utilizadas com freqüência na
área ambiental. Uma idéia que poderia apreender a relação entre os três
conceitos é aquela que remete ao status jurídico da instituição e ao grau de
inclusão dos atores na gestão coletiva do meio ambiente, de acordo com a figura
abaixo. Em relação ao jurídico entende-se a existência de: (a) associação
voluntária; (b) ato institutivo; (c) personalidade jurídica; (d) ordenamento
jurídico interno; (e) existência de estrutura própria; (f) exercício de poderes
próprios.19 Ou seja, o status jurídico remete ao grau de flexibilidade e
formalidade de uma instituição social e a participação dos atores à
legitimidade, cosmopolitanismo e democratização no processo de gestão coletiva.
A seguir as três abordagens serão analisadas separadamente.
Abordagens organizacionais
O desenvolvimento destas abordagens surgiria a partir da discussão de "governo
mundial" e da suposta necessidade de legalização das relações interestatais.
Estas foram idéias que tiveram grande impacto nos estudiosos de Relações
Internacionais, segundo Inis Claude Jr., escrevendo em 1962, não devido à
operacionalização de tal governo, mas sim à idéia de "ordem mundial" que vinha
incrustada em tal discussão.20 De fato, as primeiras abordagens para o estudo
das Organizações Internacionais (OI's) também exibiriam a proposição que o
mundo poderia caminhar para a centralização de poder, para uma organização ou
governo mundial.
Katzenstein et alii propõe a partir da análise do periódico mais consagrado no
estudo das Organizações Internacionais, que em suas duas primeiras décadas de
publicação, 1947-1967, a revista International Organization teve temas centrais
que gravitaram em torno da análise de organizações formais, em especial as
Nações Unidas (ONU).21 A categorização de Katzenstein et alii é similar às três
categorias iniciais do estudo das Organizações Internacionais (OI's) para
Kratochwil e Ruggie. A primeira, o estudo das instituições formais, buscaria o
que as OI's são, considerando-se que a governança internacional seria qualquer
coisa que estas organizações façam. A seguir, o estudo dos processos
institucionais das OI's buscava desvendar como estas se constituem e funcionam,
com atenção especial à ONU. Finalmente, a categoria "papel organizacional" é
exatamente aquela que cujos enfoques constariam a gestão de bens comuns e,
novamente, a tradição de "governo mundial" na roupagem dos estudos
funcionalistas e neofuncionalistas.
O ano de 1967 marcaria a aprovação da resolução anti-sionismo na Assembléia
Geral das Nações Unidas, fato que teria provocado o desinteresse norte-
americano na organização. Além disto, a détente américo-soviética, o processo
de descolonização afro-asiática, junto a emergência do Terceiro Mundo como uma
força contestadora da Ordem Econômica Mundial, as modificações estruturais
trazidas com a Terceira Revolução Industrial ' fazendo emergir centros de poder
alternativos no sistema internacional, como Alemanha e Japão ' e as crises
energéticas trouxeram profundas modificações às abordagens organizacionais
durante o período 1967-1969.22 Desta forma, Suhr coloca que:
Em reação ao papel exagerado das Organizações Internacionais nos
estudos em Relações Internacionais John Gerard Ruggie introduziria o
conceito de regimes. Ele proclamava uma mudança de foco para como a
resposta coletiva deveria ser analisada como padrões mais amplos e
informais de comportamento estatal. Portanto, ele buscou conceituar o
espaço em que as Organizações Internacionais operam.23
Ou seja, o declínio da hegemonia norte-americana aliado a um novo milieu
internacional impulsionou uma nova geração de abordagens e análises, dentre as
quais a de Regimes Internacionais, examinada na próxima seção.
Entretanto, o fim da bipolaridade trouxe conseqüências mais profundas para
estas abordagens. Se por um lado houve uma tendência de fragmentação entre
povos e dentro dos territórios nacionais, por outro houve também coesão e
integração, como demonstra o caso da criação da União Européia.24 De qualquer
forma, foi evidente que modificações profundas na ordem internacional
Vestfaliana estavam em curso, devido ao surgimento e consolidação de novas
identidades coletivas. As organizações internacionais, com atenção especial à
ONU, falharam na gestão destes novos problemas e questões globais,25 fossem
eles de segurança, como as sucessivas crises nas operações e de manutenção da
paz, em meio ambiente, vide os problemas de executabilidade (enforcement) dos
principais instrumentos oriundos da Conferência do Rio (1992) ou dos péssimos
balanços da Conferência de Joanesburgo (2002), ou na área de desenvolvimento,
como ficou evidente quando da publicação dos frustrantes resultados finais da
"Década do Desenvolvimento da ONU". Todos estes fatores contribuíram para a
caracterização da tão difundida "Crise do Multilateralismo" e para que se
buscassem abordagens mais flexíveis e novos conceitos operacionais.
Regimes internacionais
Com a definição do "paradigma" neo-realista por Kenneth Waltz, no início da
década de 1970,26 os estudiosos do campo das Relações Internacionais começaram
a questionar que apesar do sistema internacional carecer de autoridade central,
os Estados pareciam estar imiscuídos em uma rede institucional em um sentido
mais amplo, em regras implícitas e explícitas que contribuíam para a
modificação do comportamento estatal e eventualmente para a convergência com o
comportamento dos demais. Em outras palavras, "A análise de regimes tentou
preencher esta lacuna pela definição de um foco que não era tão amplo quanto o
sistema internacional, ou tão estreito quanto o estudo das organizações
internacionais".27 Martin Griffiths sugere uma razão semelhante para o
surgimento da Teoria de Regimes Internacionais. Segundo este autor, as
abordagens "realistas" das relações internacionais, com especial ênfase na
famosa "Teoria de Estabilidade Hegemônica", desenvolvida separadamente por
Stephen Krasner28 e Robert Gilpin,29 não eram capazes de explicar certos
acontecimentos da vida internacional. Assim, estudiosos de inclinação liberal,
como Robert Keohane, "[...] foram responsáveis pela popularização da idéia de
regimes como variáveis que interferiam no poder do Estado, de um lado, e nos
resultados internacionais, do outro".30
Seria exatamente como uma variável interveniente que os Regimes Internacionais
iriam ser definidos por Stephen Krasner, ou melhor, "Regimes internacionais são
definidos como princípios, normas, regras e procedimentos de tomada de decisão,
sobre os quais as expectativas dos atores convergem em uma determinada área
temática".31 Todavia, nem todos atores, entre eles alguns que contribuíram para
o próprio volume editado por Krasner, concordam com essa definição e de fato,
como Smouts et alii ressalta, a formulação da Teoria de Regimes foi abalada
pelo "modismo intelectual" e, naturalmente, pela imprecisão conceitual.32
Stephan Haggard e Beth Simmons propõem uma divisão em quatro correntes para a
Teoria de Regimes Internacionais: estrutural, estratégica ou teoria dos jogos,
funcional e cognitiva.33 Pode-se adotar ainda a divisão mais sucinta, embora
similar, proposta por Hasenclaver et alii entre neoliberais, realistas e
cognitivistas.34
De forma simples, a abordagem neoliberal tem tal nome porque se baseia
fortemente na teoria microeconômica e é funcional porque o Regime Internacional
surgiria para cumprir a tarefa de reduzir as incertezas entre os atores e fazê-
los caminhar para resultados "ótimos". Neste grupo se encaixariam tanto as
abordagens de "Teoria dos Jogos" quanto a funcional, cujo melhor exemplo é a
obra After Hegemony, de Robert Keohane. Já nas abordagens estruturais, ou
realistas, o poder é a variável central, uma vez que a sua distribuição entre
os atores do sistema internacional influencia fortemente na possibilidade de
formação e declínio dos regimes internacionais, como lembram Krasner e Gilpin
com a "Teoria da Estabilidade Hegemônica".35 Por fim, as abordagens rotuladas
como "cognitivistas" têm fortes raízes na filosofia da ciência, como uma
crítica ao racionalismo, e na sociologia, enfatizando questões de aprendizado,
percepções e identidades de grupo. Um exemplo desta última abordagem é
encontrado nas precisas críticas de Kratochwil e Ruggie à definição de Regimes
Internacionais proposta por Krasner.36 As escolas de pensamento para a Teoria
de Regimes Internacionais estão sistematizadas na tabela_1.
Governança global
Na citação que introduz a seção sobre perspectivas teóricas, Robert Keohane
salienta o caráter parcialmente globalizado do mundo e a necessidade de
governança efetiva. Por conseguinte, um enorme rol de questões emerge. Entre
elas, o que é governança? Ela é realmente global? A governança é efetiva ou é
apenas um ideal liberal?
De fato, a segunda pergunta já foi respondida pelo próprio Keohane. A
governança não é global, porque o mundo é parcialmente globalizado. Neste ponto
é necessária uma distinção entre globalismo e globalização, tal qual proposta
por Ulrich Beck. Globalismo pressupõe o estado pleno de globalização econômica,
quando a expansão dos mercados em seu grau máximo substitui a política. Por
outro lado, a globalização
[...] significa os processos, em cujo andamento os Estados nacionais
vêem a sua soberania, sua identidade, suas redes de comunicação, suas
chances de poder e suas orientações sofrerem a interferência cruzada
de atores transnacionais38 ou [...] o aprofundamento da distância em
escala mundial através da emergência e estreitamento das redes de
conexões ' ambientais e sociais, assim como econômicas.39
Assim, qualquer análise que leve em consideração a idéia de governança global
trará um forte grau de normatividade.
Em relação à definição de governança global há duas questões em ordem. A
primeira é relativa à idéia de governança global proposta pelo professor Craig
Murphy, onde esta seria a expansão do projeto liberal em escala global.40 Como
Beck relembra, esta discussão é de fato sobre globalismo e não globalização,
que pressupõe a idéia de governança global. Em segundo, há de se distinguir
entre as possíveis idéias de definição para governança. Marie-Claude Smouts et
alii propõe uma estrutura tripartite entre "Governança Corporativa", um
critério de boa governabilidade formulado pelo Banco Mundial (Bird) no fim dos
anos 80, "Governança Multinível", que diz respeito ao estilo de tomada de
decisão na União Européia, e finalmente a "Governança sem Governo", conceito
cunhado por Rosenau e Czempiel, que traz a idéia de que o mundo caminharia rumo
a uma poliarquia, no sentido proposto por Robert Dahl, relacionando o caráter
transnacional-estatal da política mundial e a idéia de globalização.41 Por fim,
há a abordagem de Robert Keohane, que entende a "Governança como um Dilema"
sobre como desenhar instituições para desempenhar funções desejadas e ao mesmo
tempo respeitar os valores democráticos em um mundo parcialmente globalizado.
De fato, qualquer idéia de governança sempre irá pressupor um alto grau de
capacitação dos indivíduos que estão sendo governados. Ou seja, qualquer
definição de governança passará pela idéia de democratização e legitimidade ou
de comunicação aberta e reflexividade coletiva. Mesmo que não haja uma
definição ideal para governança, uma vez que esta própria palavra pode ser
considerada um ideal, a proposta de agenda positiva de Robert Keohane é um
ótimo ponto de partida para uma definição de governança: analisar o papel do
processo de institucionalização na expansão dos ideais democráticos e no
fortalecimento das capacidades dos indivíduos em nível global. Esta proposta é
convergente com aquela de "Novo Multilateralimo", elaborada pelo professor
canadense Robert Cox, que pressupõe uma ordem mundial construída "de baixo para
cima" com objetivo de justiça, equidade e respeito ao outro, como bem sintetiza
a professora Marie-Claude Smouts.42
Respostas institucionais
As respostas institucionais são aqui entendidas não em função das teorias de
relações internacionais, mas em razão das iniciativas multilaterais já
estabelecidas ou em vias de debate. Elas foram divididas em quatro grandes
temas: o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma); a Comissão de
Desenvolvimento Sustentável (CDS) e a Organização das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (Onuma); as respostas regionais e as iniciativas das Organizações da
Sociedade Civil (OCS). Todas elas foram criadas para trazer respostas às crises
ambientais passadas (como a poluição e a maré negra) ou anunciadas, com vistas
ao estabelecimento de mecanismos de governança ambiental. Ademais, ressalte-se
que as últimas, principalmente as ONGs e as comunidades científicas43 foram
estabelecidas principalmente pela falta de capacidade do Estado de agir no
quadro analítico do interesse nacional e soberano, atestando a necessidade de
novos arranjos institucionais mais flexíveis, que englobariam atores
internacionais emergentes.44
O Pnuma foi criado após a Conferência de Estocolmo,45 mas revelou a crise
política entre Estados favoráveis à criação de uma verdadeira organização do
sistema ONU e aqueles opostos. Apesar de ter sido freqüentemente simplificada
pela clivagem Norte/Sul, tal controvérsia já demonstrava sinais de interesses
econômicos capazes de polarizar subgrupos nos dois campos. De fato, o debate
político havia sido colocado em termos equivocados, como se o desenvolvimento
dos países do Sul constituísse a grande ameaça ao meio ambiente, e os líderes
do Norte tivessem que fazê-los observar as normas ambientais tidas como
necessárias. Com o fracasso da iniciativa de criação da Onuma, criou-se apenas
um programa, com sede em Nairóbi.46 Os países nórdicos e os membros da atual
União Européia eram favoráveis a uma iniciativa institucional, mas o resto do
mundo via com desconfiança a criação de uma instituição com objetivos
ambientais construídos a partir da percepção do Norte.
Pelo fato do seu nascimento indesejado, mas principalmente por uma grande
inversão de tendências nas décadas seguintes, o Pnuma nunca teve o papel
importante no cenário internacional.47 Primeiro, passaram-se muitos anos até
que sua existência fosse reconhecida de fato. Segundo, alguns países do Sul,
principalmente africanos, começaram a usar o Pnuma como fórum de debate deles,
e a inversão foi que o Sul se pôs a militar por um papel de desenvolvimento
para o Pnuma, em sintonia com o contexto internacional da época, isto é, na
exigência por uma nova ordem econômica internacional pouco antes da chamada
"década perdida". Aos poucos, o Pnuma foi "colonizado" pelos países do Sul, e
foi literalmente "esvaziado" pelos países financiadores, como também ocorreu
com outras OI's, como a Unctac, Unido e Unesco. Além disso, a questão ambiental
foi adotada por várias outras OI's, com mandatos diferentes e, às vezes, até
programas concorrentes.48
No final da década de 1990, e com os resultados decepcionantes do pós-Rio 1992,
o debate sobre a necessária criação da Onuma foi retomado, por uma iniciativa
franco-alemã. Na verdade, a proposta é intimamente ligada à OMC. Primeiro, foi
apresentada como uma resposta institucional à poderosa Organização Mundial de
Comércio, para que as questões ambientais não fossem tratadas como uma
mercadoria. Segundo, tentou-se aproveitar a analogia da transformação do Gatt
em algo forte e institucionalizado, e fazer o mesmo com a regulação ambiental.
Terceiro, e mais sutil, foi a tentativa de esvaziar definitivamente a agenda da
OMC relativa à questão agrícola e ambiental, que constitui o maior ponto de
discórdia entre a União Européia e países com grande importância ambiental,
como o Brasil e a Índia. Além disso, há um paralelo incontornável da
convergência de regimes internacionais de proteção da pessoa humana e proteção
ambiental, que tornaram o contexto favorável a uma nova iniciativa do Norte.
Entretanto, a iniciativa, que foi debatida juntamente à questão do "moribundo
Pnuma, em Joanesburgo, 2002, na ocasião da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável, não obteve o apoio dos países do Sul, e muito menos do Brasil.
Dentre as diversas razões, entre elas algumas já expostas anteriormente, está o
fato que o Brasil demanda que as organizações já criadas se tornem realmente
operacionais, no sentido de que os membros cumpram os compromissos assumidos,
em especial no que concerne à transferência de tecnologia e à cooperação
internacional. Por isso, o Brasil defendeu a posição de fortalecimento da
Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável (CDS) no lugar da criação de mais
uma OI fraca e irrealisticamente ambiciosa, que seria a Onuma. O Sul em geral,
e para os brasileiros em particular, o que interessa é a promoção do
desenvolvimento para a garantia da proteção ambiental de maneira sustentada, e
não apenas a criação de mecanismos pretendendo contrabalançar o poder da OMC e
menos ainda de mecanismos repressivos e orientados, como um suposto Tribunal
Penal Internacional Ambiental.49 Em suma, existe uma grande crise do
multilateralismo contemporâneo, pois as OI's criadas não reagiram às mudanças
internacionais recentes, como o multilateralismo à la carte de George W. Bush e
a sua política externa unilateral/bilateral, e a preponderância da política
econômica acima de todos os outras, mesmo quando o tema é normativo demais,
como no caso da política ambiental.
Uma das melhores soluções apontadas em fóruns internacionais50 tem sido a
abordagem regional, ou em blocos, para evitar os entraves e impedimentos
encontrados na cooperação internacional para a governança ambiental. Esta idéia
faz sentido, uma vez que a dinâmica regional tem sido privilegiada em outros
campos da política, com um sucesso relativamente muito maior do que em outros
níveis de análise. No caso da União Européia, a regulação ambiental tem
evoluído consideravelmente, com a doutrina, servindo de inspiração para as
outras partes do mundo. Para o "continente" norte-americano, a questão
ambiental é tratada claramente em segundo plano, ou ao menos, tem o mérito de
se evitar discursos retóricos para encobrir políticas econômicas agressivas. Na
América do Sul, encontrou-se respaldo em iniciativas menores, como a Estratégia
Regional de Biodiversidade, dos países andinos, sem resultar, todavia, em
iniciativas concretas. Na questão do controle das mudanças climáticas, por
exemplo, o diálogo no continente é muito superficial. Nas questões de acesso a
recursos genéticos, não há nada além da ERB andina. No caso dos transgênicos,
se não existe nem políticas nacionais claras, o que dizer das regionais? A
Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, infelizmente, também parece ter
o mesmo destino do tratado que lhe deu origem, isto é, ficar no papel. Com
relação aos regimes do mar e da pesca de uma maneira geral, pouco avanço foi
observado na última década. Finalmente, no futuro regime de florestas, as
negociações atuais não permitem augurar nenhum progresso significativo dentro
do velho debate. Contudo, a fragilidade política e institucional instalada no
continente de uma maneira geral, faz com que a grande parte dos temas sociais
sejam paradoxalmente fortalecidos no discurso e fracassados na sua
implementação.
É justamente esta incongruência, que não é apenas específica do nosso
continente, mas também marca o mundo inteiro, o que contribui para a emergência
das ONG's e demais atores da sociedade civil organizada como peças importantes
do debate internacional.51 Assim, as comunidades científicas também foram
fortalecidas pela mesma dinâmica, principalmente caso se parta de uma
perspectiva de civilização do risco de Patrick Lagadec, ou sociedade do risco,
como colocam Ulrich Beck, François Ost e Olivier Godard.
Em fato, as grandes ONG's internacionais (OING's) têm um papel cada vez mais
importante no cenário internacional. Todavia, nota-se que muitas delas deixaram
de exercer a função de oposição ao Estado e passaram a desempenhar outras, em
parceria com ele, angariando um crescente reconhecimento institucional.52 Esta
transição do "confronto à colaboração", definida no Brasil por John Garrison,
não é uma tendência linear e absoluta, mas crescente. É ponto pacífico que
apenas protestar não garante mais a sobrevivência de nenhuma ONG, as quais
precisam participar mais ativamente das soluções para os problemas
socioambientais, e com isso elas se profissionalizam gradativamente.
Se esta evolução foi vista como positiva por muitos analistas, outros alertam
para o fato de o Estado delegar funções para atores do setor privado, ou
ignorar suas obrigações para com os cidadãos, porque existem ONG's que estariam
desempenhando tais funções, como a implantação e monitoramento de projetos.
Além disso, há o risco de atores da sociedade civil organizada agirem por
interesses próprios, e não em nome de um suposto interesse geral. Por exemplo,
atores do mercado que realizam programas sociais têm normalmente interesses
comerciais ou de imagem de marca por trás de suas ações, e a maioria dos
Estados não consegue canalizar estas "forças emergentes" com vistas a uma
verdadeira justiça distributiva. No caso das comunidades científicas, o grande
desafio é o uso político do conhecimento gerado como fundamento para a ação
política ou o seu adiamento. Em outros termos, a autoridade que os peritos ou
cientistas detêm tende a ser reconhecida como justificativa política, mas eles
são cidadãos e têm interesses específicos, sem terem, no entanto legitimidade
para falar em nome do interesse geral da sociedade, pois não foram eleitos por
ninguém. Assim, não é raro ver cientistas, como Veit Koester, negociando
acordos ambientais em nome da sua delegação, como se ele fosse um diplomata. Em
suma, a autoridade que lhes cabe na nossa sociedade da informação não foi
delegada por ninguém, e o resto da sociedade civil tende a ser excluída do
debate quando este se torna técnico e complexo demais.
Novas dimensões do debate
Comércio e meio ambiente
Após os anos noventa, uma nova dimensão jurídico-política emerge em alguns
ramos do direito e da política internacional. Houve uma explosão de negociações
e de normas com maiores graus de cogência, especialmente em se tratando de
direitos internacional humanitário, econômico e ambiental. A legitimação e o
aumento do número de ingerências humanitárias, com mais de mil resoluções
aprovadas no Conselho de Segurança da ONU e centenas de outros atos desta
natureza marcam o primeiro ponto. A criação da Organização Mundial do Comércio
(OMC) e do conjunto normativo sob sua égide, com elevados níveis de cogência
demonstra o segundo. A explosão de normas ambientais, com a realização de mais
de dez grandes conferências-quadro, nos anos 90 e início do novo século,
mostram o crescimento da importância da questão ambiental.
No entanto, há um acúmulo de lógicas distintas, onde as diretrizes que guiam a
questão ambiental são muitas vezes antagônicas àquelas que guiam as questões de
ordem econômica. A oposição ou conjunção de interesses de diversos tratados
multilaterais ambientais ao direito da OMC, neste sentido, é uma característica
que limita ou potencializa a eficácia do direito internacional ambiental.
O direito internacional econômico é marcado por um conjunto de regras sob a
égide de três grandes organizações internacionais com poder: o Banco Mundial, o
Fundo Monetário Internacional e a Organização Mundial do Comércio. Trata-se de
um sistema normativo, com uma lógica própria e autonomia perante os demais.
Estas organizações não têm qualquer relação de dependência jurídica em relação
à ONU. A OMC foi criada apenas em 1995 e traz um conjunto normativo extenso que
pretende abranger a maioria dos temas ligados diretamente ou indiretamente ao
comércio mundial. A eficácia do direito internacional econômico de caráter
comercial está no Organismo de Solução de Controvérsias do OMC, que prevê
sanções econômicas aos países que não cumprem com os acordos pré-estabelecidos.
Neste sentido, o Organismo de Solução de Controvérsias condena os países-membro
da OMC a alterarem suas normas internas ' mesmo que seja sua constituição ' sob
pena de sanções econômicas. O nível de cumprimento das decisões da OMC é
elevado, tendo em vista os impactos do descumprimento para os atores tanto do
ponto de vista de perda de legitimidade de um instrumento internacional
desejado, quanto da característica das sanções impostas.
O direito internacional ambiental, ao contrário do anterior, é marcado por um
conjunto de tratados internacionais, criados no contexto de regimes diferentes,
com diversificados níveis de cogência. Enquanto determinados temas evoluíram
bastante em função dos interesses dos atores, como mudanças climáticas,
proteção da camada de ozônio, restrições à pesca de baleias, outros não
conseguem atingir níveis de compliance e enforcement suficientes para se
tornarem eficazes, a exemplo do controle do acesso aos recursos genéticos e
repartição de benefícios. O direito internacional ambiental está presente,
sobretudo nas discussões realizadas no âmbito da ONU, mas também em diversos
outros centros de realização de política e produção do direito internacional,
como nas instituições irmãs do direito internacional econômico ou em normas de
caráter militar ou humanitário.
Por serem edificadas sobre lógicas distintas, diversas normas ambientais se
contrapõem expressamente ao direito da Organização Mundial do Comércio.53 Entre
os principais pontos de conflito percebe-se:
* A extraterritorialidade das medidas ou sua aplicação a Estados não-
contratantes de acordos ou não-membros da OMC, permitida em certos
acordos ambientais, mas proibidos pela OMC. As normas americanas para a
proteção das tartarugas e dos golfinhos, com a promoção de restrições aos
mecanismos de pesca de camarões e de atum demonstraram o uso de normas,
regulando a pesca em outros países, o que foi objeto de um painel na OMC,
mas foi possível em função de tratados ambientais.54
* A designação de certos produtos não-comerciais ou a proibição de certos
métodos de produção, permitida por certos acordos ambientais, mas
proibido pela OMC.55 A Cites prevê, assim, condições estritas,
regulamentando a exportação ou importação destas espécies, subordinando
seu comércio a uma série de exigências que normalmente são contrárias à
liberdade comercial.56 O comércio destas espécies exige estudos de
impacto, condições especiais de transporte, parecer de técnicos e
utilização do princípio da precaução. As partes são incitadas a tomar
medidas de retaliação contra os Estados que não estão de acordo com as
normas da convenção, como por exemplo, o confisco das espécies
comercializadas. Nos últimos 15 anos, o Comitê da Cites recomendou de
forma não obrigatória a suspensão do comércio com El Salvador, Itália,
Grécia, Granada, Guiana, Senegal e Tailândia. Ele também determinou que
controles rigorosos fossem feitos para as exportações da Bolívia.57 O
Protocolo de Montreal, sobre a proteção da camada de ozônio; a Convenção
sobre a Proteção da Natureza e a Preservação da Vida Selvagem no
Hemisfério Ocidental, de 1940; a Convenção sobre a Proteção dos Pássaros,
de 1950;58 o Acordo sobre os Ursos Polares, de 1973; a Convenção sobre a
Conservação do Pacífico Norte e a e a Convenção sobre a Proteção das
Peles de Focas, de 1976, também prevêem normas semelhantes.
* A diferenciação de produtos quimicamente equivalentes, em virtude do
princípio da precaução, previsto por certos acordos ambientais, mas
debatido no âmbito da OMC, como nas diferentes abordagens entre o
protocolo de Cartagena, sobre organismos vivos modificados e os acordos
sanitário e fitossanitários e de barreiras técnicas, ambos da OMC.
* A obrigação de cooperar antes da implementação de qualquer medida de
sanção, obrigatória na OMC, mas desnecessária em certos acordos
ambientais, como a Cites.
* A escolha da entidade responsável para a solução de controvérsias, que
nos tratados multilaterais ambientais podem variar desde instrumentos de
solução arbitral, até a Corte Internacional de Justiça e na OMC são
sempre em última instância o Órgão de Solução de Controvérsias.
Por se tratarem de conjuntos de normas autônomas, que não guardam relação de
hierarquia entre si e não se submetem a lógica do direito doméstico, os
instrumentos de solução de conflitos de normas não são operacionais para dizer
qual o direito aplicável. O problema se agrava com o acúmulo de lógicas
distintas entre os dois conjuntos normativos.
Na prática, a solução se dá com a maior eficácia no conjunto normativo mais
forte, ou seja, aquele que aplica sanções econômicas: a OMC. Neste sentido, os
tratados multilaterais ambientais, quando em conflito com o direito da OMC,
dificilmente terão eficácia. No entanto, alguns outros tratados, pouco
eficazes, podem ter sua eficácia catalisada pelo direito da OMC. O caso da
positivação do princípio da precaução59 é o exemplo mais marcante nos últimos
anos: enquanto desconsiderado pela Corte Internacional de Justiça, no
julgamento Gabcíkovo-Nagymaros, era reconhecido pela Organização Mundial do
Comércio.
Segurança e meio ambiente
A passagem da sociedade moderna para aquela que Anthony Giddens e Ulrich Beck
denominam "modernidade tardia",60 trouxe consigo uma modificação social
fundamental: uma profunda possibilidade de mudança na concepção de bem-estar.
Tal modificação tem amplas implicações para a relação entre meio ambiente e
segurança, uma vez que possibilita uma transição entre a tradicional abordagem
de "guerra por recursos"61 para outra aqui definida como "segurança ambiental",
ou seja, quando a relação entre homem e meio ambiente deixa de ser um problema
de escassez e satisfação material, para tornar-se uma questão reflexiva62 sobre
a vida e as condições que a permitem. Em outras palavras, há uma grande
transformação do espaço físico natural paralela à outra modificação profunda
que diz respeito às identidades coletivas (soberania, sistema internacional,
sociedade, sexualidade, etc.). Neste contexto de dupla transformação, ambiental
e social, "[...] há algumas coisas dignas de serem seguradas; as dificuldades
emergem da incerteza sobre o que estes objetos da segurança são no mundo pós-
Guerra Fria, e quais meios justificam os fins".63 Portanto, quais são os
"riscos" ambientais na sociedade pós-moderna? Quem é culpado? Enfim, quais são
os objetos da segurança em um contexto de transformação ambiental global?
Em primeiro lugar, deve-se ter em mente que tanto para o meio ambiente, quanto
para segurança a abordagem preponderante é a prevenção ou a precaução. Por
precaução a Declaração do Rio (1992) determina que, em casos de danos
ambientais irreversíveis, a falta de certeza científica não deve ser utilizada
como razão para postergar medidas que previnam a degradação do meio ambiente.64
Ou seja, o consagrado princípio da precaução dá a política e ao direito
ambientais um caráter pró-ativo, onde o objeto da proteção passam a ser os
riscos ambientais socialmente criados. 65 Da mesma forma as abordagens
tradicionais de segurança internacional são calcadas na definição das
potenciais ameaças ' riscos ' e elaboração de estratégias. Portanto, tanto a
segurança quanto o meio ambiente estão apoiados na idéia de gestão de riscos e
elaboração de respostas antecipadas, embora a primeira dê maior ênfase à idéia
de prevenção ' quando os riscos são conhecidos ' em detrimento da precaução '
falta de certeza, científica ou não, sobre a existência de riscos.
Neste sentido duas questões estariam em ordem: quais as ameaças e riscos
oriundos da degradação ambiental e por que as abordagens tradicionais de
segurança são incapazes de incorporar questões relativas à transformação global
do meio ambiente em seus cálculos? Com efeito, estas duas questões estão
intimamente interligadas a uma simples constatação: os problemas e os riscos
ambientais são globais. Quem seria o culpado ou o "inimigo", por exemplo, nos
casos do aquecimento global ou o buraco na camada de ozônio? A Terra? O CO2? Os
CFC's? As indústrias que produziram estes gases? Os países-sede destas
empresas? O Direito Internacional Ambiental, por exemplo, tem trabalhado para
consagração da responsabilidade civil em casos de dano ambiental, que pressupõe
a exclusão do dolo e a obrigatoriedade da reparação.66 Ou seja, cada vez mais
se exclui a idéia do "culpado" no que concerne à crise ambiental global. Se há
riscos, mas não há culpados, qual o papel reservado à segurança ambiental?
Primeiramente, deve ficar claro que por mais preventivas ou precaucionárias que
sejam as ações no contexto dos riscos ambientais globais produzidos "[...] não
á apenas o impacto da futura mudança ambiental global sobre os conflitos que
necessita de atenção".67 De fato, além do impacto inverso, dos conflitos sobre
o meio ambiente, Homer-Dixon & Levy ressaltam que as questões de escassez
direcionam em maior grau a conflitos sub-regionais difusos e persistentes do
que à guerra por recursos entre Estados.68 A partir desta figura não é estranho
que haja carência de estudos e abordagens que privilegiem o global em favor do
regional, uma vez que a primeira perspectiva leva necessariamente a uma baixa
correlação entre guerra e recursos, conforme foi concluído anteriormente. Dois
exemplos ilustrativos, que podem vir a ser duas das questões mais problemáticas
no contexto da redefinição da idéia de segurança ambiental, são os "refugiados
ambientais" e o impacto da guerra no meio ambiente. Segundo o Alto Comissariado
das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), a questão de criação de novas
classificações para determinadas migrações internacionais é central.69 No caso
dos "refugiados ambientais" a migração poderia ocorrer tanto como resultado da
degradação das regiões de origem do migrante, quanto devido ao impacto deste
último no meio ambiente do país alvo da migração. Em relação ao impacto da
guerra no meio ambiente, episódios como a utilização o agente laranja durante a
Guerra do Vietnam (o ano de introdução do agente da guerra foi exatamente em
1962) e a queima de poços de petróleo, durante a primeira Guerra do Iraque
(1990) exemplificam a gravidade da questão.
A identidade mais provável para a segurança em nível global e preventivo
gravitaria em torno da criação de condições para a gestão coletiva do meio
ambiente, bem como a implementação das opções coletivamente aceitas, ou seja,
trabalhar para a ampliação, efetividade e legitimidade da governança ambiental.
Entre as opções neste nível analítico estariam a criação de planos emergenciais
em contextos de crise ' casos de vazamentos de resíduos tóxicos, químicos e
radioativos, queimadas, enchentes; o auxílio na implementação de medidas
sanitárias e fitosanitárias; a fiscalização em portos, estradas e aeroportos,
com o objetivo de impedir o contrabando de animais e plantas, bem como o
monitoramento de parques, reservas e outros locais de potencial acesso a
recursos genéticos.
Para uma agenda de pesquisa mais objetiva, o conflito e a degradação ambiental
aparecem como as duas variáveis centrais. Perguntas como: o que são os
problemas ambientais e os de segurança?; quais são os atores envolvidos neste
processo e como eles perdem ou ganham com mudanças específicas?; como elaborar
soluções interdisciplinares? e, quais destes problemas e soluções podem ser
antecipados?, são imperativas. Finalmente, é preciso que haja mais pesquisa
empírica que correlacione as duas variáveis acima em níveis analíticos menores
que o Estado, como o regional ou local.
Conclusões
Este artigo teve como objetivo analisar as opções e oportunidades que emergem
para a governança ambiental a partir da definição de crise ambiental global. Em
primeiro lugar, é necessário frisar que se por um lado a crise ambiental é de
fato global, por outro a gestão coletiva, seja ela entendida pelas lentes de
instituições ou por arranjos mais flexíveis, não o é. A governança ambiental
não é global. Ela transita entre o global e o local em um sistema internacional
decadente. Como Lorraine Elliott nota "[...] há uma incongruência entre os
problemas que se originam da natureza interconexa do ecossistema global e as
soluções que são buscadas dentro do quadro de um sistema geopolítico baseado no
Estado".70 Ou seja, há uma incongruência entre "Terra, o conjunto das coisas
físicas e naturais, e "Mundo, o conjunto das coisas sociais, políticas e
econômicas."
Se a governança ' em um "Mundo parcialmente globalizado ' não é global, então
qual o limiar que distingue o normativo do ontológico no diálogo entre relações
internacionais e o meio ambiente? Uma abordagem inicial poderia revelar que o
problema é de fato deste campo do saber, uma vez que a ontologia e a
epistemologia são interativas no sentido da "Hermenêutica Dupla" proposta por
Anthony Giddens, ou melhor, "Como nós entendemos e interpretamos o mundo é
parcialmente dependente de como nós definimos o mundo que nós estamos tentando
entender e interpretar".71 Entretanto, a normatividade na discussão acerca da
gestão coletiva do meio ambiente global parece estar melhor relacionada com o
caráter global da crise ambiental, cuja resposta demandaria um processo de
gestão inclusivo, tanto na tomada de decisão, quanto na implementação. Assim, a
governança global seria muito normativa no sentido proposto por Rosenau &
Czempiel e positiva em demasia na proposta de Keohane. A governança ambiental
precisa de um conceito que seja o ponto médio entre as duas propostas
anteriores e inclua o caráter fragmentário e excludente do globalismo
"econômico".
Com relação ao papel dos atores, é de bom alvitre ressaltar a crise ambiental
que se está gerando, além da grande crise institucional que abarca outros
campos, e principalmente o da segurança coletiva. Desta feita, o discurso do
multilateralismo, da reforma do sistema ONU e da governança global revelam alto
grau de normatividade e baixo grau em termos de operacionalidade, engendrando
uma forte decepção por parte da sociedade civil organizada. A partir deste
contexto, e da evolução do cenário internacional, que permitiu a maior
participação e atores não-estatais, como as ONG's e as comunidades científicas
nos processos decisórios, nota-se o reconhecimento institucional de "forças
emergentes" capazes de trazer renovado impulso à governança ambiental, do nível
global ao local. No entanto, a irrupção de atores tão assimétricos e diversos
também traz novos desafios no estabelecimento das regras do jogo internacional,
que sempre foram pouco claras para as questões ambientais.
Na questão da interface entre o regime comercial da OMC e os regimes
ambientais, é preciso enfatizar que mesmo tendo sido construídos com lógicas
distintas e sem uma hierarquia no direito internacional, o primeiro tende a
prevalecer, por ter mostrado, em menos de dez anos de existência, que a
regulação comercial por meios multilaterais institucionalizados é desejável. A
clareza (precisão) das normas estabelecidas, e a sua observância, bem como o
nível de delegação por parte dos membros são suficientemente assegurados para
que o regime seja forte, o que não ocorre na maioria dos regimes internacionais
ambientais. Porém, não obstante tantas diferenças, não se pode concluir que são
necessariamente regimes contraditórios, uma vez que algumas decisões da OMC
privilegiaram a dimensão ambiental de maneira surpreendente.
Por fim, é imperativa a reformulação do papel da segurança no contexto da crise
ambiental global. O meio ambiente não deve ser entendido apenas como um
conjunto de recursos que devem ser protegidos para assegurar o bem estar do
homem. Ao contrário, uma nova abordagem para a segurança deve garantir a vida,
a participação e a legitimidade, não exclusivamente a satisfação pessoal por
intermédio do consumo descontrolado, pois como lembra Karl Marx, o capitalismo
é uma via irracional para dirigir o mundo moderno, porque ele substitui a
satisfação controlada das necessidades humanas pelos caprichos do mercado.
Outubro de 2004
1 PORTER, Gareth & BROWN, Janet. Global environmental politics. Boulder:
Westview, 1991, 208 p.
2 ELLIOTT, Lorraine. The global politics of the environment. New York: New York
University Press, 1998.
3 THEYS, Jacques. Les grands problèmes d'environnement: la vision dês
scientifiques. Cahiers Français, Enjeux et politiques de l'environnement.
Paris: La Documentation Française, 2002, 3-8 p.
4 Natureza é de fato um conceito impreciso. Esta palavra abrange essencialmente
três significados: índole, marco inicial e conjunto de seres vivos.
Sucintamente, natureza não determina uma relação, mas sim a definição da
essência ou condição de grupo de um determinado organismo vivo. Quando se volta
para a palavra meio ambiente, encontra-se também um problema, ainda que não
semelhante ao da palavra anterior. Meio ambiente é comumente definido como "o
que está em volta de algo" e "o que circunda o objeto sob análise". O conceito
de meio ambiente aqui adotado será o exposto por Lynton Caldwell: "Uma relação
entre o que ambienta e aquele que é ambientado". Ver: CALDWELL, Lynton K.
International Environmental Policy: from the Twentieth to the Twenty-First
Century. Dur0ham: Duke University Press, 1996, 13 p.
5 "E disse Deus: façamos o homem a nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e
domine os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda
a Terra, e sobre todo réptil que se move sobre a Terra." (Gênesis, 26), ou
ainda: "E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e
enchei toda a Terra, e sujeitai-a, e dominai sobre os peixes do mar, e sobre as
aves dos céus, e sobre todos animal que se move sobre a Terra." (Gênesis, 28).
6 Ver: An essay on the principle of population as it affects the future
improvement of society, with remarks on the speculations of Mr. Godwin, Mr.
Condorcet, and other writers.
7 Além do livro de James Lovelock, A new look at life on Earth, há uma
excelente revisão da teoria de Gaia em MIDGLEY, Mary. Individualism and the
concept of Gaia. In: Review of International Studies, n. 26, p. 29-44.
Massachusetts, 2000.
8 Sucintamente, "conservar" significa manter a reprodutibilidade dos recursos
com o objetivo de exploração para fins econômicos e "preservar" denota a
intocabilidade de determinados recursos naturais.
9 Ver: PIGOU, Arthur. The economics of welfare. 4 ed. Londres: MacMillan, 1948,
837 p, e MISHAN, Ezra. He costs of economic growth. Nova
Iorque: Praeger, 1971, 190 p.
10 LEIS, Hector Ricardo. A Modernidade Insustentável: As Criticas do
Ambientalismo a Sociedade Contemporânea. Florianópolis: Editora da UFSC &
Editora Vozes, 1999, 261 p.
11 CMMAD (Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento). Nosso Futuro
Comum. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1988, 9 p.
12 KEOHANE, Robert. "Governance in a partially globalized world: presidential
address, American Political Science Association, 2000." In: American Political
Science Review (APSR) 95, 1, March 2001, 11p.
13 SMOUTS, Marie-Claude. "La coopération internationale: de la coexistence à la
gouvernance mondiale". In: SMOUTS, Marie-Claude (Ed.) Les nouvelles relations
internationales: pratiques et théories. Paris: Sciences Po, 1998. p, 135-159.
14 KRATOCHWIL, Friedrich & RUGGIE, John G. "International Organization: a
state of art on an art of the state". In: International Organization 40, 4.
Cambridge: MIT press 1986, 754 p.
15 ROSENAU, James & CZEMPIEL, Ernst-Otto. Governança sem governo: ordem e
transformação na política mundial. Brasília: UnB, 2000, 21 p.
16 STOKKE, Olav. "Regimes as governance systems". In: YOUNG, Oran (Ed.) Global
governance: drawing insights from the environmental experience. Cambridge: MIT
press, 1997, 30 p.
17 Por 'ordem mundial' entendemos os padrões ou disposições da atividade humana
que sustentam os objetivos elementares ou primários da vida social na
humanidade considerada em seu conjunto. Em: BULL, Hedley. A sociedade
anárquica. Brasília: UnB, IPRI, 2002, p. 26.
18 ROSENAU, James & CZEMPIEL, Ernst-Otto. Governança sem governo: ordem e
transformação na política mundial. Brasília: UnB, 2000.
19 Ver: SOARES, Guido F. S. Direito internacional do meio ambiente: emergência,
obrigações e responsabilidades. São Paulo: Ed. Atlas, 2001; MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional
Público. 14 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002; REZEK, J. F.
Direito Internacional Público: Curso Elementar. 8 ed. São Paulo: Ed. Saraiva,
2000.
20 CLAUDE, Inis. Power and international relations. New York: Random House,
1962, p. 209-210.
21 KATZENSTEIN, Peter; KEOHANE, Robert & KRASNER, Stephen. International
Organization and the study of world politics. In: International Organization
52, 4. 659-660 p. Cambridge: MIT press, 1998.
22 SARAIVA, Flávio (Org.). Relações Internacionais ' Dois séculos de história.
Volume II. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IBRI);
Funag, 2001.
23 SUHR, Michael. "Robert Keohane: A contemporary classic". In: NEUMANN, Iver
& Wæver, Ole. The future of international relations. London; New York:
Routledge, 1997, 95-96 p.
24 Sobre o assunto ver: LESSA, Antônio. A construção da Europa: A última utopia
das Relações Internacionais. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações
Internacionais (IBRI); Funag, 2003, 191p.
25 MURPHY, Craig. Global governance: poorly done and poorly understood. In:
International Affairs 76, 4. 2000, 790-792 p.
26 WALTZ, Kenneth. Theory of international politics. 2 ed. New York: Mcgraw-
Hill, 1979. 271 p.
27 HAGGARD, Stephan & SIMMONS, Beth. Theories of international regimes. In:
International Organization 41, 3. 492 p. Cambridge: MIT press. Summer; 1987.
28 Ver: KRASNER, Stephen. State Power and the structure of international trade.
In: World Politics 28, 1976, 317-346 p.
29 Ver: GILPIN, Robert. War and change in world politics. Cambridge: Cambridge
University Press, 1981 & GILPIN, Robert. Economia política
das relações internacionais. Brasília: EdUnB, 2002.
30 GRIFFITHS, Martin. 50 grandes estrategistas das Relações Internacionais. São
Paulo: Contexto, 2004, 57-8 p.
31 KRASNER, Stephen. "Structural causes and regime consequences: regimes as
intervening variables". In: KRASNER, Stephen (Ed.). International regimes. 8
ed. Ithaca: Cornell University Press, 1995, 1 p. Ainda que a
definição mais utilizada para Regimes Internacionais encontre-se nesta obra
citada é importante levar em consideração que o conceito surgiu pela primeira
vez em um artigo de John Gerard Ruggie sobre as respostas institucionais para a
tecnologia, artigo que também trouxe a idéia de "comunidades epistêmicas",
outro conceito que viria a ser refinado por Peter Haas, em 1992, nas páginas do
periódico International Organization. Cambridge: MIT press. Ver: RUGGIE, John
G. International responses to technology: concepts and trends. In:
International Organization 29, 3, Summer 1975; HAAS, Peter.
Introduction: epistemic communities and international policy coordination. In:
International Organization v. 46, n. 1. Cambridge: MIT press. Winter 1992.
32 SMOUTS, Marie-Claude et alii. Dictionnaire des relations internationales.
Paris: Dalloz, 2003, 231 p.
33 Idem 17.
34 HASENCLAVER, A. Et alii. Integrating theories of international regimes. In
Review of International Studies (2000), 26, 3-33. Ou ainda:
HASENCLEVER, Andreas; MAYER, Peter & RITTBERGER, Volker. Theories of
international regimes. Cambridge: Cambridge University Press, 2001, 248 p.
35 Idem 18 e 19.
36 Para estes autores, a teoria de regimes internacionais, essencialmente a
definição proposta por Krasner, padece de vários males. O primeiro é que há uma
confusão entre ontologia e epistemologia uma vez que o comportamento é derivado
de uma construção conceitual (regimes) dada, não socialmente construída. Ou
seja, "[...] regimes become external constraints on actors, not intersubjective
frameworks". Se os regimes são conhecidos, ontologia, pelos entendimentos
compartilhados e desejados de determinado comportamento social e o método
positivista que é utilizado na construção do conceito não consegue captar este
caráter, definido por Kratochwil e Ruggie como intersubjetivo, então o que se
sabe contradiz aquilo que se analisa, em outras palavras, a epistemologia
(aquilo que se sabe) contradiz a ontologia (realidade ou aquilo que se definiu
como sendo ela). Além disto, a hierarquia entre normas, regras, princípios e
procedimentos de tomada de decisão não fazem sentido, segundo estes autores,
porque tanto os meios (normas e princípios) quanto os fins (regras e
procedimentos) são mutuamente constitutivas do resultado final (regimes
internacionais). Em outras palavras: "Actors not only reproduce normative
structures, they also change them by their very practice, as new constraints or
possibilities emerge, or new claimants make their presence felt". Ver:
KRATOCHWIL, Friedrich & RUGGIE, John G. International Organization: a state
of art on an art of the state. In: International Organization 40, 4. Cambridge:
MIT press. Autumn 1986.
37 Sobre metateoria e debates meteóricos nas Relações Internacionais ver:
ROCHA, Antônio J. R. Relações internacionais: teorias e agendas. Brasília:
Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IBRI), Funag: 2002; HOLLIS, Martin & SMITH, Steve. Explaining and understanding
international relations. Oxford: Claredon, 1991, 226 p.
38 BECK, Ulrich. O que é Globalização? Equívocos do Globalismo e respostas a
Globalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999, 27-30 p.
39 KEOHANE, Robert. Governance in a partially globalized world: presidential
address, American Political Science Association, 2000. In: American Political
Science Review (APSR) v.1, n.95, March, 2001, p. 1.
40 MURPHY, Craig. Global governance: poorly done and poorly understood. In:
International Affairs v.4, n.76, 2000, p. 789-803.
41 SMOUTS, Marie-Claude et alii. Dictionnaire des relations internationales.
Paris: Dalloz, 2003, 237-240 p.
42 SMOUTS, Marie-Claude. La coopération internationale: de la coexistence à la
gouvernance mondiale. In: SMOUTS, Marie-Claude (Ed.) Les nouvelles relations
internationales: pratiques et théories. Paris: Sciences Po, 1998, 154 p.
43 O conceito de comunidades epistêmicas de Peter Haas poderia ter sido usado
aqui, mas preferiram as comunidades científicas porque várias delas acabam
exercendo influência no processo decisório e legislativo independentemente de
um objetivo inicial de fazê-lo. Além disso, é difícil de estabelecer se têm
valores comuns, e a intersubjetividade que o autor definiu, como no caso da
Iucs. Finalmente, o próprio autor está testando o seu conceito, com a pergunta
se a comunidade de operadores e professores do direito internacional público se
considera parte de uma suposta "comunidade epistêmica". Para uma crítica
européia do conceito, ver Marc PALLEMAERTS, Toxics and Transnational Law,
Oxford: Hart, 2003.
44 CHURCHILL, R.; UFSTEIN, G. Autonomous Institutional Arrangements in
Multilateral Environmental Agreements/ a Little Noticed Phenomenon in
International Law. The American Journal of International Law, vol.94, 623-659
p. 2000. Washington. FISHER, D.; GREEN, J. Understanding
Disenfranchisment: Civil Society and Developing Countries; Influence and
Participation in Global Governance Influence for Sustainable Development.
Global environmental Politics, 4, 3, p. 65-84. Cambridge: MIT press. August
2004.
45 Nos termos de "urgent need for a permanent institutional arrangement within
the United Nations system for the protection and improvement of the
environment". Resolução nº 2.997 da Asembléia Geral da ONU de 1972.
46 A localização da sede na África foi fruto da reivindicação dos países do
Sul, intencionado manter controle sobre as atividades do programa. Ver Le
Preste, P. A Ecopolítica Internacional, São Paulo: SENAC, 2001.
47 DESAI, B. Mapping the Future of International Environmental Governance.
Ulfstein Yearbook of International Environmental Law, vol. 13, 2003. Paper prepared for the Global Environmental Governance: the Post-
Johannesburg Agenda, 23-25 October 2003, Yale Center for Environmental Law and
Policy, New Haven. Disponível em: www.yale.edu/gegdialogue/papers.htm. Também
von MOLTKE, K. The Organization of the Impossible. Global Environmental
Politics . v.1 n.1, p. 23 '8. Cambridge: MIT press, 2001.
48 TOEPFER , K. UN Task Force on Environment and Human Settlements, Report to
the Secretary-General, 15 June, 1998.
49 Apesar de a proposta do TPIA não ter sido formulada junto com a Onuma, uma
grande parte dos militantes pela Onuma defende um futuro tribunal específico,
principalmente os membros da sociedade civil organizada na Europa.
50 Yale (2003), Paris (2004) e Viena (2004) para citar apenas três.
51 ARTS, B. The Political Influence of Global NGOs: Case Studies on the Climate
and Biodiversity Conventions, International Books, Utrecht, 1998, 351 p. Também os trabalhos de SYGNA, L.; ADGER, W. Rural
Vulnerability to Global Change: the Role of Social Networks; AOKI INOUE, C. Global Regime for Biodiversity as an Approach to Study
Local Level Experiencies. The Mamirauá Case; e NOMURA, K.
Environmental Governance in Asia: blems aPrond Prospects ' Opinion Survey of
Major Environmental Actors, apresentados no "The 2003 Open Meeting on Human
Dimensions of Global Environmental Change". Disponível em: http://
sedac.ciesin.columbia.edu/openmeeting/ .
52 Há muita literatura sobre esta tendência, mas vale a pena ler o Relatório do
ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso para a ONU "We the Peoples:
Civil Society, the United Nations and Global Governance". Reporto f the Panel
of Eminent Personson the United Nations-Civil society Relations A/58/817 de 21
de junho de 2004. Disponível em www.un.org. Também KALDOR, M.; ANHEIER, H;
GLASIUS, M. (eds.) Global Civil Society, Oxford: Oxford University Press, 2003,
434 p. E TIMMER, V. Promote, Protest, Partner: The Diverse
Roles of Non-governmental Organizations in Addressing Global Environmental
Change. Paper apresentado no "The 2003 Open Meeting on Human Dimensions of
Global Environmental Change". Disponível em: http://sedac.ciesin.columbia.edu/
openmeeting/ .
53 Sobre este assunto, consultar GONZALEZ-CALATAYUD, Alexandra & MARCEAU,
Gabrielle. "The relationship between the Dispute-Settlement Mechanisms of the
MEA's and those of the WTO." In RECIEL 11, 3, 2002, 275-286 p. Ou o artigo do professor da London School of Economics (LSE), Eric
Neumayer em NEUMAYER, Eric. The WTO and the environment: it's past record is
better than the critics believe but the future outlook is bleak. In: Global
Environmental Politics 4, 3. Cambridge: MIT press, 2004.
54 Ver KACZKA, David. A primer on the shrimp-turtle controversy. In: RECIEL, 6,
2, 1997, 171-180 p.
55 Ver Lei Geral n° 101-162 (16 Código dos Estados Unidos (USC) parágrafo 1537,
artigo 609.
56 Sobre a relação entre as regras da OMC e do arcabouço normativo disposto na
Cites, favor consultar YEATER, Marceil & VASQUEZ, Juan. Desmistifying the
relationship between Cites and the WTO. In: RECIEL, 10, 3, 2001, 271-276 p.
57 CTE. Dispositions des accords de l'OMCet des accords environnementaux
multilatéraux relatives au respect des obligations et au règlement des
différendsGenève, OMC, 2001, 7 p.
58 Atualmente, os objetos destas duas últimas convenções são tratadas pela
Cites, que prevê também sanções comerciais.
59 Sobre o princípio da precaução ver: VARELLA, Marcelo Dias & PLATIAU, Ana
Flávia (Org.). O princípio da precaução. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, 415 p.
60 Sobre este tema ver: GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. São
Paulo: UNESP, 1991; GIDDENS, Anthony. A transformação da
intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. São Paulo:
UNESP, 1993; BECK, Ulrich. Risk society: towards a new
modernity. London: Sage, 1992.
61 Sobre a baixa correlação entre guerra e recursos naturais consultar ROSS,
Michael. How do natural resources influence civil war? Evidence from thirteen
cases. In: International Organization 58, Winter 2004, 35-67 p.
62 A reflexividade da vida social moderna consiste no fato de que as práticas
sociais são constantemente examinadas e reformadas a luz de informação renovada
sobre estas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter.
Em: GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. São Paulo: UNESP, 1991,
45 p.
63 DYER, Hugh. Environmental security and international relations: the case for
enclosure. In: Review of International Studies (2001), 27, 442 p.
64 De fato o Princípio da Precaução já é consagrado em inúmeros tratados
ambientais como na Declaração do Rio (Princípio 15), Convenção-Quadro das
Nações Unidas sobre Mudança do Clima (artigo 3[1]), Convenção da Biodiversidade
(Preâmbulo), Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (preâmbulo), entre
outros.
65 Risk may be defined as a systematic way of dealing with hazards and
insecurities induced and introduced by modernization itself. In: BECK, Ulrich.
Risk society: towards a new modernity. London: Sage, 1992.
66 Ver SOARES, Guido F. S. Direito internacional do meio ambiente: emergência,
obrigações e responsabilidades. São Paulo: Ed. Atlas, 2001.
67 NOORDUYN, Ruth & DE GROOT, Wouter. Environment and security: improving
the interaction of the two science fields. In: Journal of Environment and
Development 8, 1, 28 p. São Diego, março 1999.
68 Ver HOMER-DIXON, T. & LEVY, M. Correspondence: environment and security.
In: International Security 19, 1, 1995. Pg 189-198; HOMER-
DIXON, T. Environmental scarcitites and violent conflict: evidence from cases.
In: International Security 19, 1, 1994, 5-40 p; e LEVY, M. Is
the environment a national security issue?. In: International Security 20, 2,
35-62 p. Cambridge: MIT press, 1995.
69 Sobre a correlação entre migração e meio ambiente ver a edição especial da
revista Refugiados do Acnur (n.º 115, 2002).
70 ELLIOTT, Lorraine. The global politics of the environment. New York: New
York University Press, 1998, 97-98 p.
71 BROWN, Chris. Understanding International Relations. 2 ed. New York:
Palgrave, 2001, 1-2 p.