O referendo na Venezuela: um ato em um drama inacabado
Às vésperas do referendo de 15 de agosto de 2004, em que os venezuelanos iriam
votar pela revogação ou não do mandato do presidente Hugo Chávez, cada lado
nutria esperanças de obter uma vitória tão nítida e completa que silenciaria os
inimigos e conquistaria aprovação mundial. Na verdade, o referendo vencido
por Chávez em meio a intensas controvérsias e acusações de fraude foi apenas
a última cena do turbulento drama vivido por esse país rico em petróleo e com
uma população de 25 milhões de habitantes, que acredita estar engajado numa
"luta existencial" por valores e modos de vida essenciais2.
O referendo foi o ponto culminante de um movimento iniciado havia mais de dois
anos pelos oponentes do presidente com o objetivo de removê-lo do poder. As
ações anteriores incluíram inúmeras passeatas em massa para exigir a renúncia
de Chávez, um golpe de curta duração em abril de 2002, uma campanha para
alterar a Constituição a fim de antecipar as eleições presidenciais, protestos
públicos de oficiais militares da ativa e uma greve dos trabalhadores
petroleiros com duração de dois meses. Tudo isso fracassou, e a Venezuela
antes amplamente reconhecida como modelo de democracia consensual na América
Latina permanece rigidamente dividida, embora não mais com um claro pólo de
oposição ao governo.
O atual conflito remonta ao desenlace, a partir do final dos anos 1970, do
arranjo político e econômico iniciado em 1958 com o pacto firmado pelas elites
venezuelanas na cidade de Punto Fijo 3. Apesar da imensa reserva de petróleo do
país a sexta maior do mundo e a maior fora do Oriente Médio , no último
quarto de século os venezuelanos tiveram de enfrentar o crescimento da pobreza,
os dolorosos efeitos do ajuste à globalização, a crescente descrença da
população nos partidos políticos e as questões levantadas pela mobilização cada
vez maior dos segmentos há muito deixados à margem da sociedade.
Durante décadas o petróleo abasteceu o crescimento econômico e a classe média
prosperou, com pico de renda per capita em 1978. Sobrevieram então uma aguda e
persistente queda das receitas do petróleo, uma taxa de pobreza que saltou de
25% nos anos 1970 para 65% nos anos 1990 e um generalizado desapontamento das
aspirações da classe média. No entanto, nada disso impediu que muitos
venezuelanos continuassem a ver a riqueza petrolífera como um direito
hereditário do qual só não podiam usufruir em razão de roubo ou incompetência.
A classe política tradicional tornou-se o réu popular.
Nas eleições presidenciais de 1998 apenas seis anos após ter tentado encenar
um golpe militar enquanto servia como coronel pára-quedista , Chávez conduziu
com êxito essa onda de descontentamento. Aqueles que sempre haviam sido pobres
deram seus votos a uma figura carismática que parecia ser um deles. Os recém-
empobrecidos esperavam que Chávez mudasse o estado de coisas, e até as classes
profissionais e as elites empenharam algum apoio na mudança.
Durante o primeiro ano de governo o índice de aprovação de Chávez chegou a um
topo de 80%, mas ao longo dos quatro anos seguintes essa aprovação foi
despencando até chegar a 25% (de forma alguma, porém, o índice mais baixo entre
os presidentes latino-americanos à época). Essa cifra sugere o tamanho mínimo
do seu núcleo de apoio: os venezuelanos que pertenciam aos dois segmentos de
renda mais ricos tornaram-se inimigos convictos de Chávez, enquanto os três
segmentos mais pobres (um contingente populacional muito maior) se dividiram à
medida que alguns de seus componentes começaram a se desiludir com a
aproximação do presidente aos políticos e a ausência de melhorias materiais em
suas vidas.
Pesquisas de opinião mostraram a Venezuela como uma das nações mais polarizadas
do mundo, uma divisão particularmente evidente na tensão entre os residentes na
zona leste de Caracas, mais ricos e anti-Chávez, e na zona oeste, mais pobres e
pró-Chávez. O discurso público degenerou de todos os lados, com generalizada
troca de insultos entre o próprio presidente e seus oponentes. A mídia estatal
e suas concorrentes privadas pintavam retratos radicalmente diferentes dos
mesmos eventos.
Como um país que se orgulhava de sua política de consenso pôde chegar a tal
situação? A resposta está nas tendências descritas acima, na disputa pelo
controle da companhia estatal de petróleo, no influente papel da mídia privada
e no próprio estilo pessoal do presidente. A nova administração trouxe à tona
questões irresolvidas em torno de como distribuir as receitas do petróleo, como
gerenciar seu declínio relativo (e a correspondente necessidade de criar novos
impostos), como fazer crescer as indústrias não-petrolíferas e como enfrentar a
pobreza, o desemprego e a criminalidade, ao mesmo tempo dando voz aos que há
muito estavam fora do sistema, por exclusão ou por opção.
A REVOLUÇÃO BOLIVARIANA
Chávez buscou responder a essas questões conferindo ao governo maior controle
direto sobre a gestão das receitas do petróleo, impondo maior controle
partidário sobre as instituições governamentais e promovendo canais de
participação direta dos cidadãos nas políticas públicas, por meio de
plebiscitos, organizações comunitárias locais e programas sociais. Ao
implementar a agenda da autodenominada "Revolução Bolivariana", porém, sua
retórica governamental bombástica-radical e sua aproximação a Fidel Castro
apartaram as classes médias, os empresários e a hierarquia da Igreja Católica.
Muitos oposicionistas acusaram Chávez de querer transformar a Venezuela numa
outra Cuba um Estado autoritário com uma economia falida.
As metas da Revolução Bolivariana jamais foram articuladas precisamente, de
modo que é difícil classificá-las segundo conceitos tradicionais como um
programa socialista, populista, autoritário, esquerdista ou direitista. Não
obstante, podem-se inferir alguns de seus objetivos:
* Formação de uma nova classe governante para substituir aquela que
comandava o país desde o pacto de Punto Fijo de 1958.
* Criação de um novo modelo de participação militar no governo civil.
Chávez ampliou as funções das Forças Armadas em programas de
desenvolvimento locais e regionais e de ajuda humanitária; ex-oficiais,
muitos deles veteranos das tentativas de golpe de fevereiro e novembro de
1992, ocuparam importantes postos ministeriais; nas eleições regionais de
outubro de 2004, oficiais aposentados foram conduzidos ao governo de nove
dos 23 estados venezuelanos.
* Uma mudança no equilíbrio político para refletir o novo status
majoritário dos pobres. Os meios para isso incluiriam os mencionados
mecanismos de "democracia participativa" e uma maior ênfase no
majoritarismo, aplicados num contexto de tomadas de decisão cada vez mais
centralizadas no presidente e no governo central.
* Uso dos recursos econômicos para beneficiar os pobres, reduzir a
desigualdade de renda e prover assistência aos socialmente excluídos. A
afirmação do controle direto do governo sobre a companhia estatal de
petróleo seria um importante mecanismo para esse fim, permitindo
canalizar as receitas do petróleo para o custeio de programas populistas
de alfabetização e educação, atendimento médico e distribuição de
alimentos, com efeitos mais amplos que incluiriam a criação de novas
elites empresariais locais e a atração de investimentos estrangeiros.
* A busca de uma política externa de cunho nacionalista, capaz de
confrontar os Estados Unidos e mais genericamente o Ocidente, incitar a
Opep a maximizar os preços do petróleo e ressoar solidariedade com o
Hemisfério Sul e os povos marginalizados.
Ao implementar essas metas, a Revolução Bolivariana subverteu noções de
cidadania e pressupostos sobre a gestão e a distribuição dos recursos
nacionais.
Em 2000 a administração Chávez pareceu dar início a um processo de politização
das instituições jurídicas do país. Os oposicionistas denunciaram o expurgo de
juízes e sua substituição por juristas simpáticos ao governo, o qual alegou que
as mudanças visavam, ao contrário, despolitizar o sistema judiciário e
fortalecer sua integridade. Os venezuelanos continuavam a desfrutar de
substancial liberdade de expressão, o que permitiu à mídia privada assumir um
proeminente papel de oposição ao governo. Ao mesmo tempo, porém, vinham à tona
casos de perseguição a jornalistas, de sanções administrativas a emissoras de
televisão e de ameaças de prisão a oposicionistas. Os críticos de Chávez
passaram a temer que as salvaguardas dos direitos individuais e civis caíssem
em face de tribunais e órgãos de vigilância e fiscalização do poder público que
eles viam como pró-governo.
Com o aumento das receitas do petróleo em 2003 e 2004, a administração
bolivariana distribuiu benefícios à clássica maneira populista. Criou inúmeras
"missões" sociais (que receberam nomes de venezuelanos famosos e por vezes
contavam com consultores e outros recursos humanos de Cuba) para implantar
cursos de alfabetização e educação, postos de saúde e mercados a preços
subsidiados em bairros pobres. Foram organizados grupos comunitários de base
para dar apoio político à administração, os chamados "círculos bolivarianos"
(alguns dos quais também funcionariam como milícias armadas para cumprir
objetivos políticos, mas há poucas evidências sólidas sobre isso)4. Em paralelo
às missões e aos círculos, a administração criou escolas "bolivarianas" para
expandir as oportunidades educacionais e disseminar um currículo nacional
unificado. A idéia por trás de todas essas políticas era mobilizar um movimento
popular comprometido a defender a administração contra contestações.
Sob Chávez, a tradição venezuelana de governar mediante consenso entre as
elites mudou para a confrontação. A democracia adotada pelas elites no pacto de
1958 visava à sobrevivência do regime em face das incitações armadas da direita
e da esquerda. Os líderes políticos criaram mecanismos de busca de consenso
para compartilhar o poder político, formar coalizões e dar voz nas decisões às
"organizações de ponta" dos empresários e dos trabalhadores5. Esses líderes
haviam aprendido com uma tentativa de democratização e um subseqüente golpe no
fim dos anos 1940 que um esforço radical e unilateral do governo para mudar
rapidamente o estado de coisas correria o risco de excluir segmentos influentes
do empresariado, a Igreja e os militares.
A administração Chávez, em contraste, se pautou pela confrontação. Os
proponentes da Revolução Bolivariana acreditavam que a Venezuela só poderia
fazer as devidas mudanças mediante a substituição das velhas instituições
"elitistas" por sucessoras igualitárias. Nas eleições de 1993, 1998 e 2000 os
partidos tradicionais se viram desgastados e fragmentados, e as instituições
representativas passaram a ser dominadas pela coalizão de Chávez. No vácuo de
representação deixado por aqueles partidos emergiram proprietários de meios de
comunicação, organizações não governamentais, sindicatos de trabalhadores e
entidades empresariais. Em vez de tentar cooptá-los, a administração Chávez
optou por formar novas organizações de trabalhadores e empresários e da
sociedade civil que viessem a suplantar as antigas ou ao menos competir com
elas.
Em pelo menos um aspecto Chávez se mostrou tradicionalista. Por muito tempo
predominara na Venezuela uma tradição político-administrativa de centralismo.
Isso começou a mudar em 1989, quando segmentos da sociedade civil lograram
sucesso em seu lobby por eleições diretas para governador e prefeito, bem como
pela garantia de repasse de recursos federais a estados e municípios. A
administração Chávez pôs em risco essa tendência de descentralização: concedeu
a comandantes militares estaduais a gestão de fundos destinados a várias
localidades e assegurou que a nova Constituição previsse um Conselho Federal
para regular as relações entre o governo central e os estados. As tentativas
governamentais de exercer autoridade sobre os orçamentos subnacionais e as
forças policiais municipais provocaram ferrenha oposição e suscitaram
questionamentos sobre a proposição bolivariana de respeito às tomadas de
decisão locais.
Ainda que em 2002 os venezuelanos agissem como se estivessem engajados numa
luta existencial por valores e ideologias essenciais, a disputa se dava
sobretudo pelas vastas receitas do petróleo. Governo e oposição estavam
empenhados num jogo de soma-zero: a oposição queria Chávez fora do poder
imediatamente e por quaisquer meios ao alcance, enquanto o presidente estava
determinado a sobreviver a qualquer custo e a implementar a Revolução
Bolivariana a longo prazo. A questão era como ainda é se a Venezuela seria
capaz de retomar o toma-lá-dá-cá da negociação, do compromisso e do conflito
institucionalizado que normalmente caracteriza a vida democrática.
REVOGAÇÃO COMO SOLUÇÃO POLÍTICA?
Em maio de 2003 a oposição se aferrou no referendo revogatório como sua última
chance legal de destituir o presidente antes do fim de seu mandato, que iria
até o início de 2007. Em janeiro daquele ano o ex-presidente norte-americano
Jimmy Carter propusera uma negociação para o fim da greve nacional dos
petroleiros, que já perdurava por dois meses, e um acordo entre o governo e a
oposição sobre os procedimentos para a realização de um referendo revogatório
tal como previsto na Constituição venezuelana6. A proposta de Carter fixava a
data do referendo para 19 de agosto de 2003 (a mais próxima que a legislação
permitia) e previa um compromisso de todas as partes com a aceitação de
supervisão eleitoral internacional, salvaguardas dos direitos humanos e
nomeação de novos membros para o Supremo Tribunal de Justiça e os órgãos de
vigilância e fiscalização do poder público.
No acordo final, firmado em maio de 2003 sob os auspícios da Organização dos
Estados Americanos (OEA) e em meio a pressões internacionais, os dois lados
concordaram em que um referendo poderia ajudar a debelar a crise, mas não
chegaram a um consenso sobre o calendário e os procedimentos para a sua
realização. O acordo meramente reconhecia o direito à petição de um referendo
revogatório: não garantia sua efetivação nem endossava a proposta de Carter.
Entretanto, mencionava o compromisso com a não-violência e os direitos humanos
e admitia a oferta de apoio técnico e outras formas de assistência da OEA, do
Carter Center e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) 7.
Como meio de resolução do conflito, o referendo revogatório gerou expectativas
que jamais se cumpririam. Cada lado esperava obter a completa derrota do
oponente, enquanto muitos dos cidadãos venezuelanos, menos sectários, desejavam
simplesmente que dessa forma a crise se solucionasse. Mas um referendo "sim-ou-
não", inerentemente divisório, oferecia perspectivas muito precárias para a
resolução das questões mais profundas que inquietavam a Venezuela. Não
obstante, muitos observadores e cidadãos acreditavam que o referendo poderia ao
menos possibilitar que o país dimensionasse o apoio desfrutado por Chávez e sua
agenda e então, com base na evidência das urnas, seguisse em frente de modo
pacífico.
As maneiras diferentes pelas quais o governo e seus oponentes abordaram o
referendo refletiram seus diferentes horizontes temporais. O governo adotou uma
perspectiva de longo prazo, visando consolidar seu poder e resistir às
contestações a fim de ganhar sobrevida e fazer avançar a Revolução Bolivariana.
Já a oposição estava imbuída de um espírito de imediatismo, dando a perceber os
efeitos de uma abordagem da política influenciada pela televisão, em que a
instantaneidade comanda todas as atenções e o discurso político é moldado pela
mídia. Essa perspectiva mais imediata visava antes à destituição de Chávez do
que a uma organização de base capaz de conquistar a confiança do eleitor ou um
esforço para transformar as instituições reguladoras os tribunais, o Conselho
Nacional Eleitoral (CNE) e os órgãos federais de fiscalização do poder público
, cujos titulares eram percebidos como governistas.
As divisões políticas nacionais se refletiram nos desdobramentos no interior e
em torno do CNE. Ao longo de um ano de controversos preparativos para o
referendo esse órgão freqüentemente foi alvo de pressões de ambos os lados no
sentido de exercer influência e obter vantagens em suas decisões. A princípio,
a composição da sua diretoria deveria equilibrar as posições do governo e da
oposição, com quatro cadeiras para dois representantes de cada facção e uma
quinta supostamente neutra, com voto de desempate. Na prática, porém, as
decisões controversas quase sempre favoreciam as posições do governo por três
votos a dois.
O referendo só viria a ocorrer em agosto de 2004 um ano inteiro após a data
sugerida por Carter e apenas quatro dias antes de expirar o prazo em que um
referendo que revogasse o mandato presidencial implicaria uma nova eleição para
presidente (após esse período o vice-presidente completaria o mandato de
Chávez). Essa demora foi causada por diversos percalços.
Primeiro, o CNE se dissolvera em razão da aposentadoria dos seus diretores, e o
Congresso Nacional não conseguia alcançar a maioria de votos requerida para a
nomeação dos novos diretores. O Supremo Tribunal interveio e nomeou a nova
diretoria, que finalmente tomou posse em 29 de agosto de 2003. Segundo, o
Congresso não criou legislação regulamentar para o dispositivo constitucional
que previa o direito à petição de referendos revogatórios, de modo que o
próprio CNE teve de redigir essa regulamentação. Estabeleceu então um sistema
de coleta de assinaturas misto, que não era totalmente controlado nem por ele
nem pelos partidos, o que gerou confusões no subseqüente estágio de verificação
das assinaturas na petição do referendo.
Terceiro, o CNE implementou um processo de verificação de assinaturas
extremamente complexo, de modo que sua duração, prescrita para um mês, levou
cinco meses. Durante esse período houve disputas em torno das tentativas do
governo de impugnar assinaturas e das tentativas da oposição de validá-las. Os
oposicionistas denunciaram que os membros governistas do CNE estariam
invalidando assinaturas injustamente, a fim de manter seu número abaixo dos 2,4
milhões requeridos para a convocação do referendo. A missão de observação
internacional formada pela OEA e pelo Carter Center declarou que o respeito à
vontade dos eleitores deveria prevalecer sobre as incorreções técnicas e
contestou publicamente certas decisões pelas quais o CNE questionou mais de um
milhão de assinaturas.
Quarto, o estágio final de verificação foi prorrogado quando o CNE e os
partidos aceitaram a sugestão dos observadores internacionais de se abrir uma
rodada de negociações para obter um acordo acerca dos procedimentos para a fase
de "reparo", durante a qual os cidadãos deveriam confirmar ou retirar as
assinaturas questionadas. Essas tratativas se estenderam por várias semanas,
mas levaram a um acordo sobre um processo de reparo transparente. No final de
maio de 2004 chegou-se a um número de assinaturas válidas o suficiente para a
convocação do referendo, cuja data o CNE estabeleceu para 15 de agosto.
Essas delongas prejudicaram as chances da oposição. Com o fim da greve dos
petroleiros, em fevereiro de 2003, a economia venezuelana começou a se
recuperar de uma queda do PIB da ordem de 9%, decorrente da baixa do preço
mundial do petróleo. O governo Chávez usou os frutos dessa recuperação para
injetar mais recursos nas suas popularíssimas "missões"8. Por outro lado,
iniciou uma ampla campanha nacional para naturalizar imigrantes e conceder
carteira de identidade para aqueles (na sua maioria pobres) que ainda não a
possuíam, na expectativa de que muitos deles votariam a favor do presidente. Ao
mesmo tempo, essa campanha registrou novos eleitores por meio de um processo
"expresso" que contribuiu para aumentar a lista de eleitores de doze para
quatorze milhões de pessoas nas semanas que antecederam o referendo. Já a
coalizão de oposição denominada Coordinadora Democrática , ansiosa por
evitar rachas internos, resolveu protelar as eleições primárias para a escolha
do seu próprio candidato a presidente para depois da realização do referendo.
Assim, a oposição se viu sem uma clara alternativa a Chávez para apresentar aos
eleitores.
Com todos esses fatores em jogo, os índices de aprovação do presidente
cresceram continuamente, ao passo que a proporção dos que afirmavam às
pesquisas que votariam pela revogação de seu mandato caiu de 69% para 44% entre
julho de 2003 e a primeira semana de agosto de 2004. De forma correspondente, o
apoio a Chávez aumentou de 31% para 56%9. Diversos observadores previram que um
alto comparecimento às urnas favoreceria o governo, enquanto os oposicionistas
procuraram mobilizar várias interpretações das tendências mostradas pelas
pesquisas. Muitos deles acreditavam que havia um voto anti-Chávez "embutido" na
relutância das pessoas em admitir apoio à revogação nas declarações de intenção
de voto. Por fim, a grande passeata da oposição três dias antes do referendo
inflou o ânimo e as expectativas dos líderes oposicionistas. No entanto, o
resultado final da votação de 15 de agosto 59% a favor da permanência de
Chávez e 41% contra foi consistente com as tendências apontadas pelas
pesquisas.
O RESULTADO E OS DESDOBRAMENTOS DO REFERENDO
No dia do referendo verificou-se um alto comparecimento às urnas, da ordem de
70% dos eleitores registrados a média das três últimas eleições presidenciais
fora de 60%. Com o crescimento da lista de eleitores, os respectivos números
absolutos foram os mais altos já alcançados no país. A missão internacional da
OEA e do Carter Center concluiu que a despeito dos adiamentos e das
controvérsias a votação espelhou fielmente a intenção do eleitorado. Essa
conclusão se baseou na observação de simulações antes da votação, na aplicação
de três diferentes testes do novo sistema de voto eletrônico no próprio dia (e
num dos casos às vésperas) do referendo e na avaliação das acusações de fraude
após a votação.
No dia da votação, a missão fez uma projeção dos resultados com base em uma
amostra de votos aleatória coletada pelos observadores em centros de votação
logo após o seu fechamento. Os números da projeção coincidiram com os
resultados divulgados pelo CNE com uma diferença menor que 1% (dentro da margem
de erro). Em seguida a missão construiu uma maior amostragem dos resultados a
partir dos dados recebidos eletronicamente pela central de apuração e projetou
os resultados a fim de testar a exatidão dos computadores do CNE. Esse teste
confirmou que não houve manipulação da tabulação eletrônica ou dos resultados
transmitidos das máquinas de votação para a central do CNE.
O teste final consistiu em verificar se as máquinas haviam registrado os votos
com exatidão. Afortunadamente, as máquinas usadas na Venezuela emitiam uma
cédula de papel com a impressão do voto, que cada eleitor conferia e depositava
em urnas de papelão para o "sim" e o "não". A missão de observação havia
recomendado enfaticamente uma "auditoria a quente": uma contagem de certa
amostra das cédulas de papel imediatamente após o encerramento da votação. Na
última hora o CNE aprovou tal auditoria, mas demoras no encerramento da votação
(alguns centros ficaram abertos até tarde da noite em razão da alta afluência
de eleitores) e o despreparo dos auditores do CNE impediram que ela fosse
efetuada integralmente.
A OEA e o Carter Center propuseram então ao CNE uma segunda auditoria, a ser
realizada três dias após a votação, que verificaria uma amostra de cédulas
impressas. Os observadores internacionais primeiramente testaram o software que
o CNE utilizaria para construir uma amostra aleatória de 150 mesas eleitorais,
compreendendo um total de 359 máquinas de voto. Em seguida presenciaram a
elaboração dessa amostra e a testaram para confirmar sua aleatoriedade. Antes
da seleção da amostra os observadores estiveram presentes nas diversas
instalações militares onde as urnas estavam guardadas, prevenindo assim a
possibilidade de que as urnas selecionadas para a auditoria fossem manipuladas.
Eles acompanharam o transporte de cada urna a Caracas, observaram a contagem
das cédulas e compararam sua totalização com os resultados eletrônicos. Essa
segunda auditoria mostrou que o sistema eletrônico de votação havia sido
extremamente preciso: a variação entre os resultados foi de apenas 0,1% uma
discrepância que poderia ser explicada pelo fato de que alguns eleitores
levaram suas cédulas ou as depositaram na urna errada.
Apesar dessas verificações, a Coordinadora Democrática afirmou que tinha havido
fraude. Essa suposição foi fundamentada sobretudo numa pesquisa de boca-de-urna
que apontara uma forte virada anti-Chávez, a qual reforçou as suspeitas da
oposição quanto à atuação controversa do CNE durante todo o processo eleitoral,
envolvendo uma série de aspectos problemáticos10. Entre estes cabe destacar uma
inclinação a tomar decisões intransparentes, em alguma medida decorrente de um
forte sentimento nacionalista e de uma nítida postura defensiva. Num contexto
político em que a oposição contava com o suporte técnico de uma organização
civil aliada e a comunidade internacional se pautava pelas informações de
observadores não-venezuelanos, o CNE parecia se sentir enfraquecido e
desrespeitado. Ansioso por afirmar sua autoridade, o órgão deixou de informar
ou consultar os partidos adequadamente. Além disso, alguns membros de sua
diretoria tentaram restringir o raio de ação da missão de observação
internacional.
A decisão do CNE de adotar um novo sistema tecnológico de votação em meio a uma
campanha eleitoral veementemente contestada levantou suspeitas entre as
fileiras oposicionistas e até mesmo preocupou os partidos governistas. Foram
adquiridas máquinas de voto touchscreen de última geração, bem como novas
máquinas de impressão digital para identificar os eleitores nos locais de
votação e assim prevenir o voto individual múltiplo. Essas aquisições levaram
alguns a recear que funcionários do CNE pudessem manipular os resultados
eletronicamente e que as máquinas de impressão digital retardassem o andamento
da votação e assim desestimulassem a participação do eleitor.
A propensão do CNE a tomar decisões vagas, de última hora e ad hoc também não
ajudou a promover confiança em uma condução imparcial e competente do processo
eleitoral. A proposta de realização de uma auditoria logo após a votação foi
aceita pelo CNE apenas dois dias antes do referendo, e as respectivas
instruções a seus funcionários foram pouco claras. Também houve mudanças de
última hora na composição dos membros de mesas eleitorais nos locais de votação
e de juntas eleitorais municipais, bem como alterações de cobertura geográfica
de seções eleitorais, que confundiram alguns eleitores e provavelmente os
impediram de votar11. Para piorar as coisas, os diretores do CNE não se
coordenavam bem entre si e tenderam a expor suas divergências diante das
câmeras de televisão.
A rejeição dos eleitores à revogação do mandato presidencial impôs à oposição
um sério dilema. De um lado, a Coordinadora Democrática havia manifestado falta
de confiança na autoridade eleitoral e denunciado a ocorrência de fraudes, de
modo que retratara o processo eleitoral como duvidoso ou mesmo como uma
completa farsa. De outro, os oposicionistas agora precisavam motivar seus
eleitores a participar das eleições para governador, prefeito e assembléias
estaduais de final de outubro a fim de ressuscitar suas perspectivas
partidárias. Desse ponto de vista, atacar a credibilidade do processo eleitoral
não parecia uma boa idéia.
Acresciam-se a esse dilema as dificuldades das negociações políticas nas
fileiras da Coordinadora para formar alianças e nomear candidatos12. Alguns
partidos da coalizão viam as eleições subnacionais de 31 de outubro como uma
chance para trabalhar pela ampliação e o aperfeiçoamento de suas próprias
plataformas, enquanto outros continuavam a acreditar que apenas candidatos "de
unidade" teriam chances contra os competidores pró-governo. Além disso, os
líderes de alguns dos partidos oposicionistas menores queriam boicotar as
eleições de outubro a fim de protestar contra as alegadas fraudes no referendo.
No campo governista também houve algumas disputas internas tanto no partido
de Chávez, o Movimiento Quinta República (MVR), como em alguns dos aliados
bolivarianos mais independentes , nas quais acabaram por prevalecer os
candidatos favorecidos pelo presidente.
Uma vez escolhidos, os candidatos a governador e a prefeito da oposição tomaram
o lugar da Coordinadora nas tratativas junto ao CNE. As preocupações se
concentraram na lista de eleitores e no processo de auditoria. A oposição
contestou oficialmente e pela primeira vez em 10 de setembro que 1,8 milhão
de eleitores recentemente cadastrados (cerca de 12% do colégio eleitoral
registrado para o referendo, bem como para as eleições de outubro) não tinham
endereços apropriados e portanto estavam sob suspeita. O CNE declarou que essa
cifra na verdade correspondia a menos de 2% e não impugnava aqueles eleitores.
À medida que se aproximava o fim de outubro, a oposição pareceu aceitar a lista
de eleitores e direcionou seu foco para o processo de auditoria. O CNE aceitou
sua proposta de proceder à contagem das cédulas de papel correspondentes a uma
amostra aleatória de máquinas de voto uma por local de votação, o que
significava mais de cinco mil máquinas imediatamente após o encerramento da
votação. Em face dessa concessão, a maioria dos candidatos da oposição se
decidiu contra a campanha pelo boicote. Mesmo assim, os posicionamentos
desencontrados dos oposicionistas e a desconfiança geral quanto ao CNE13
parecem ter desencorajado os eleitores da oposição a comparecer às urnas, ao
mesmo tempo que aumentou a abstenção entre os eleitores situacionistas: apenas
45% dos eleitores cadastrados foram às urnas em 31 de outubro uma queda
acentuada em relação aos 70% que haviam votado seis semanas antes e mesmo em
face dos padrões de participação nas eleições subnacionais venezuelanas.
Os resultados da eleição foram devastadores para a oposição. Dos oito governos
estaduais que ela controlava num total de 23 esta- dos , ficou somente com
dois. Enrique Mendoza, um dos líderes mais proeminentes e incisivos da
Coordinadora Democrática, perdeu o governo do estado de Miranda, o que pode ter
refletido um descontentamento do eleitor com o seu posicionamento na campanha
anti-Chávez. Os candidatos da oposição venceram em apenas 65 das 335
municipalidades, das quais detinham duzentas. Os partidos governistas mais que
dobraram o número de prefeituras que controlavam, indo de 115 para 270.
Os maiores perdedores foram os partidos tradicionais Acción Democrática (AD),
Comité de Organización Política Electoral Independiente (Copei) e Movimiento al
Socialismo (MAS) , que passaram a controlar apenas dois governos estaduais
(por meio de coalizões) e um número de prefeituras consideravelmente menor. Os
dois partidos de oposição mais novos, Proyecto Venezuela e Primero Justicia,
que haviam emergido em 1998, permaneceram cada qual com quatro prefeituras.
Esses resultados sugerem que o realinhamento partidário ainda está em curso na
Venezuela, na medida em que os partidos tradicionais não conseguiram se
recuperar das acachapantes derrotas sofridas nas eleições de 1998 e os partidos
oposicionistas mais novos têm pela frente o considerável desafio de aumentar
sua presença no Congresso Nacional, por ocasião das eleições legislativas de
2005.
Apesar das contenções que marcaram o período de preparação para as eleições de
outubro, houve um evidente avanço em termos de transparência na condução do
processo eleitoral e de pronta aceitação dos resultados da votação. Foram bons
sinais disso a tranqüila elaboração do mecanismo de auditoria, seu
funcionamento relativamente regular e seu resultado positivo, já que não houve
discrepâncias entre as totalizações eletrônica e manual. Apenas um governador
da oposição e menos de dez candidatos a prefeito (incluindo alguns do partido
governista) contestaram suas derrotas.
PERSPECTIVAS POLÍTICAS
Após seis anos no poder, a Revolução Bolivariana de Hugo Chávez consolidou seu
controle sobre as principais instituições do país: a companhia estatal de
petróleo, as Forças Armadas, o Congresso Nacional, governos e prefeituras e o
Supremo Tribunal14. A forma como o governo exercerá esse poder irá determinar
quais "regras do jogo" prevalecerão na Venezuela, se a sociedade conseguirá se
reconciliar para que ao menos se forje o esboço de um novo consenso político e
social e se as iniciativas da Revolução Bolivariana irão criar raízes e se
sustentar.
A administração sobreviveu a mais de dois anos de ataques e agora enfrenta o
desafio de mostrar que pode conduzir bem o país sem a conturbação ou a desculpa
da interferência de inimigos internos. Nesse ínterim, a oposição teve de
reconhecer que exauriu suas estratégias para antecipar o fim do mandato de
Chávez e que uma maioria de venezuelanos apóia, numa ou noutra medida, seu
programa de governo e seu discurso.
Nos próximos anos a administração se sentirá fortemente tentada a usar sua
maioria e seu controle sobre as instituições públicas para prosseguir de
maneira irrestrita na implementação de sua agenda. No entanto, as recentes
estratégias do governo somente têm sido possibilitadas pelos altos preços
mundiais do petróleo. Programas que consistam meramente na redistribuição
dessas receitas se mostrarão insustentáveis. Além disso, há muitas decisões
importantes concentradas na figura carismática do presidente. A erosão dos
mecanismos de accountability e independência das instituições públicas afetará
a eficiência do governo e eventualmente sua legitimidade.
Esses elementos dependência dos altos preços do petróleo, accountability
precária e tomada de decisões altamente centralizada não pressagiam a
formulação de políticas sustentáveis, o combate à corrupção ou a flexibilidade
e a eficácia que a descentralização pode propiciar ao transferir serviços
públicos a estados e municípios. De resto, nenhuma dessas desvantagens é nova
na história da Venezuela, de modo que o atual governo deveria extrair uma lição
da forma como vulnerabilidades semelhantes minaram o sistema de Punto Fijo.
Para institucionalizar-se, a Revolução Bolivariana precisará de uma organização
partidária mais sólida, de capacidade governamental revitalizada para formular
e implementar políticas e de mecanismos de accountability vigorosos para conter
abusos de autoridade, buscando gerar confiança entre os 40% de venezuelanos que
votaram pela mudança. Precisará também enfrentar as contradições entre sua
demanda pela democracia participativa e sua tendência à tomada de decisões
hipercentralizada (inclusive no interior do MVR), entre sua pregação dos
direitos humanos e civis e sua prática de detenção de oponentes políticos 15 e
entre seu declarado compromisso com "o povo" e seu açodamento em envolver os
militares no exercício do poder político.
O realinhamento partidário no interior do campo oposicionista, em curso desde a
arrebatadora vitória do governo nas eleições de outubro, sugere que há uma
longa estrada a percorrer para esse enfraquecido segmento político. Uma ênfase
na organização de base e uma clarificação das prioridades de sua plataforma
política poderiam fortalecê-lo. Os resultados de outubro indicam que há pouco
espaço político disponível, de modo que para disputar competitivamente as
eleições para o Congresso Nacional de 2005 será necessária uma preparação
intensiva. A oposição também tem um importante papel a cumprir no sentido de
apontar os limites da riqueza petrolífera do país e apresentar programas
alternativos para estancar o desemprego, a pobreza e a desigualdade, bem como a
criminalidade e a violência que lhes são associadas.
A continuidade da polarização e das atitudes de soma-zero será prejudicial à
Venezuela. Seus cidadãos precisam restaurar a confiança interpessoal e sua
identidade comum como venezuelanos. Para reconhecer que a coexistência é tanto
possível quanto indispensável, ambos os lados precisam de garantias mútuas. A
oposição deve estar apta a valorizar eleições que transcorram legítima e
livremente, num clima em que sejam respeitados os direitos civis e individuais.
Mesmo o campo governista, por mais dominante que seja atualmente, precisa de
garantias de que seus apoiadores permanecerão protegidos pela lei e desfrutarão
de livre acesso ao espaço político se no futuro vierem a perder maioria.
Para resgatar um senso de identidade coletiva e diminuir a percepção de que seu
país está enredado numa inegociável "luta existencial", os venezuelanos
precisam acreditar que têm um futuro em comum. Construir um consenso social em
torno da redução da desigualdade, do combate à pobreza e do fim da violência e
da criminalidade pode ser fundamental para gerar tal visão compartilhada.
traduzido do inglês por Alexandre Morales
[1] Artigo originalmente publicado em Journal of Democracy, vol. 16, nº 1,
2005. Gostaria de agradecer a Francisco Diez, Rachel Fowler,
David Myers e Hector Vanolli por seus perspicazes e proveitosos comentários.
Evidentemente, a responsabilidade pela versão final é inteiramente minha.
[2] Essa expressão, cunhada por Carl Schmitt (The concept of the political.
Chicago: University of Chicago Press, 1996), foi usada por
Maria Pilar García, Ana Mallén e Maryluz Guillén para descrever o conflito
venezuelano (The multiple faces of Venezuelan Civil Society: politicization and
its impact on democratization. Paper para o encontro da Latin American Studies
Association, Las Vegas, outubro de 2004).
[3] Para uma reconstituição histórica do regime de Punto Fijo, cf. McCoy,
Jennifer e Myers, David (orgs.). The unraveling of representative democracy in
Venezuela. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 2004.
[4] Não há estatísticas confiáveis sobre os "círculos". Em 2003 seu coordenador
nacional estimava que havia 200 mil círculos com 2,2 milhões de membros, mas
reconhecia que muitos podiam estar inativos. Pesquisadores independentes
estimaram que em 2004 haveria entre 9,5 mil e 65 mil círculos, com algo entre
105 mil e 700 mil membros (Hansen, David, Kirk, Hawkins e Seawright, Jason.
Dependent civil society: the circulos bolivarianos in Venezuela. Paper para o
encontro da Latin American Studies Association, Las Vegas, outubro de 2004), e verificaram que suas principais atividades consistiam em
trabalho comunitário em programas governamentais de educação e saúde, formação
de cooperativas e militância política pró-governo. Ainda segundo eles, a
maioria dos círculos rejeitava a violência.
[5] Cf. McCoy e Myers (orgs.), op. cit.
[6] Na verdade, Carter fez duas propostas: uma para a convocação de um
referendo revogatório e ou tra para uma emenda constitucio- nal que anteciparia
as eleições presidenciais. A oposição afirmou que aceitaria qualquer uma das
duas, mas o governo rejeitou a idéia da emenda e declarou que reconheceria mas
não advogaria o direito constitucional de convocação de referendos
revogatórios. Cf. "A proposal to restore peace and harmony in Venezuela".
Disponível em: <www.cartercenter.org/doc1157.htme 1158.htm>. Acesso em:22/01/
2003.
[7] Cf. "Agreement of the forum for negotiation and agreement in Venezuela".
Disponível em: <www.carter_center.org/doc1338.htm>. Acesso em: 23/05/2003
[ STANDARDIZEDENDPARAG]
[8] No início de 1999, quando Chávez tomou posse, o preço do barril de petróleo
estava cotado em US$ 8. Em agosto de 2003 já estava em US$ 29 e em agosto de
2004, à época do referendo, saltara para US$ 41. Embora as cifras específicas
dos gastos nas missões sociais não estejam disponíveis, vários relatos estimam
que mais de US$ 1 bilhão teriam sido gastos durante o ano que precedeu o
referendo.
[9] Dados de pesquisas nacionais da empresa Datanálisis, de Caracas. Pesquisas
encomendadas pela oposição à firma norte-americana Greenberg, Quinlan, Rosner
encontraram números similares e apontaram as mesmas tendências. Os dados de
ambas as empresas nos foram fornecidos.
[10] Cf. o relatório do Carter Cen ter sobre o processo eleitoral:
<www.cartercenter.org/doc1838.htm>. A OEA também produziu relatórios, datados
de 15 e 21 de setembro, que à época da redação desse texto estavam disponíveis
apenas mediante requisição.
[11] As alterações nas seções eleitorais afetaram apenas 0,5% dos eleitores
cadastrados. Os diretores oposicionistas do CNE afirmaram às missões de
observação um dia após a votação que as mudanças nas juntas eleitorais
municipais haviam sido resolvidas satisfatoriamente.
[12] Na verdade os candidatos haviam sido nomeados em março, mas foi
estabelecido um prazo adicional para substituições. Assim, a mobilização dos
partidos em torno da unidade implicava a desistência de algumas candidaturas.
[13] Pesquisa de opinião realizada pela Datanálisis em outubro de 2004 revelou
que 48% dos entrevistados mantinham pouca ou nenhuma confiança no órgão
eleitoral.
[14] Em 2004 uma maioria simples do Congresso Nacional alterou a lei que
regulava o Supremo Tribunal e expandiu sua composição (com suposta divisão
igualitária em termos de simpatia partidária) de vinte para 32 membros, sob a
justificativa de assim se reduzir o acúmulo de casos no órgão. Questionou-se
então se uma maioria simples era suficiente para alterar a lei (a Constituição
de 1999 parece admitir isso) e para nomear novos magistrados (o que era de
costume e continuou a ser sob a nova lei). Os magistrados então nomeados eram
amplamente vistos como simpatizantes do governo.
[15] Em 2004 começaram a ser investigadas quatrocentas pessoas que supostamente
teriam apoiado o golpe de 2002. Durante aquele mesmo ano várias buscas
domiciliares e seqüestros visaram figuras da oposição, enquanto diversos
jornalistas e líderes de movimentos pelos direitos humanos e civis foram presos
ou ameaçados de prisão.