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EuPTCVAg0254-02232011000100001

EuPTCVAg0254-02232011000100001

variedadeEu
ano2011
fonteScielo

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Efeito da área foliar sobre a composição da uva e a qualidade sensorial dos vinhos da variedade Merlot (Vitis vinifera L.) cultivada em São Joaquim, SC, Brasil

INTRODUÇÃO A qualidade da uva é afetada por diversos fatores, como as condições edafoclimáticas, o sistema de condução e as práticas de manejo adotadas. Após a definição da área para a instalação do vinhedo, o manejo das plantas buscando o equilíbrio entre o crescimento vegetativo e produtivo tem grande importância para a obtenção de uvas adequadas para a elaboração de vinhos. Estudos aprofundados sobre este tema são encontrados na literatura ( Smart, 1985; Macarrone e Scienza, 1996; Howell, 2001; Hunter e Archer, 2002; Poni, 2005).

O crescimento vegetativo equilibrado e a produção controlada permitem às plantas, expressarem as características mais típicas de cada variedade, em uma determinada região onde é cultivada (Intrieri e Filippetti, 2007). O manejo do dossel tem um importante efeito no balanço área foliar/produção, possibilitando o desenvolvimento adequado das plantas e a maturação completa das bagas. Embora o conhecimento científico e as técnicas de manejo tenham avançado significativamente nos últimos anos, os trabalhos que estudam essa relação fonte/dreno parecem divergir na definição de índices adequados (Vasconcelos e Castagnoli, 2000; Hunter e Archer, 2002; Petrie etal., 2003; Kliewer e Dokoozlian, 2005; Intrieri e Filippetti, 2007; Intrieri etal., 2008).

Entre as estratégias que podem ser utilizadas para o controle do vigor da videira, a carga de gemas por planta apresenta efeito definitivo, sendo uma estratégia realizada na fase inicial do ciclo de crescimento (Santos, 2006). A regulação do equilíbrio das plantas realizada através do manejo do dossel é outra estratégia muito utilizada nas regiões vitícolas do mundo, durante o período vegetativo e produtivo (Poni, 2001). Este mesmo autor descreve que a época e a severidade desta prática afetam o processo de maturação e a composição final da uva. Entretanto, esta é uma prática paliativa, que visa ajustar o crescimento vegetativo de maneira mais limitada, quando o vigor não foi controlado por outras estratégias de manejo (Santos, 2006).

A composição química das bagas e as características sensoriais dos vinhos estão diretamente ligadas ao período de desenvolvimento e de maturação da uva (Conde etal.,2007). Esse balanço pode ser expresso em maior ou menor grau na composição química (Miele etal., 2009) e nos atributos sensoriais dos vinhos (Muñoz etal., 2002; Chapman etal., 2004; Kliewer e Dokoozlian, 2005; Miele e Rizzon, 2006). Nos Estados Unidos, Zoecklein etal.(2008) observaram efeito significativo da relação área foliar/produção sobre os atributos sensoriais dos vinhos, principalmente os aromáticos. Assim, as análises sensoriais podem contribuir para a seleção das práticas de manejo mais adequadas ao vinhedo, bem como auxiliar no ajuste dos índices de equilíbrio das plantas, buscando melhorar a qualidade da uva produzida (Chapman etal., 2004; Zoecklein etal., 2008).

No Brasil, os estudos que tratam deste tema ainda são recentes e escassos, além de utilizarem valores médios definidos para outras condições edafoclimáticas (Miele e Rizzon, 2006; Santos, 2006; Mota et al., 2008; Miele et al., 2009).

Desta maneira, é de fundamental importância a definição de variáveis locais para o estabelecimento de índices referenciais que auxiliarão na adequação das técnicas de manejo, visando à elaboração de vinhos de melhor qualidade.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência da área foliar sobre a evolução da maturação e a qualidade sensorial dos vinhos da variedade Merlot, cultivada em São Joaquim, SC, visando propor uma relação de área foliar/ produção mais adequada para o manejo dos vinhedos nas condições de maior altitude do Sul do Brasil.

MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado em uma área de produção comercial da empresa Villa Francioni Agro Negócios S.A., em São Joaquim, SC, Brasil. Foram estudados dois ciclos fenológicos: 2005/2006 (safra 2006) e 2006/2007 (safra 2007). O vinhedo foi implantado em 2002, a 1.293m de altitude, à latitude 28º15'13" S e longitude de 49º57'02" W. O clima é classificado como Cfb, segundo o sistema de Köeppen, e o solo é um Cambissolo, conforme o sistema brasileiro de classificação de solos (Embrapa, 1999), correspondendo à Cambisols segundo a classificação da FAO (FAO, 2006).

As plantas da variedade Merlot (clone 181), enxertadas sobre o porta-enxerto Paulsen 1103, foram conduzidas em sistema espaldeira, espaçadas em 3,0 metros entre linhas e 0,75 metros entre plantas (4.444 plantas/hectare), com orientação N-S. Este clone (181), do grupo A, apresenta fertilidade alta e produção limitada (ENTAV, 1995). As linhas foram protegidas por uma tela de polietileno anti-granizo e anti-UV com sombreamento de 9% (especificações Lahuman Ltda). O vinhedo foi conduzido em sistema de cordão esporonado unilateral, deixando-se 2 gemas por esporão. A carga de gemas foi definida pela empresa, objetivando limitar a produção, sendo mantidas cerca de 16 gemas por planta, em ambos os ciclos fenológicos 2005/2006 e 2006/2007. O ciclo fenológico iniciou em meados de setembro (brotação) e se estendeu até a primeira quinzena de abril (colheita). A poda foi realizada em 06/09/2005 e em 15/09/2006, para os ciclos 2005/2006 e 2006/2007, respectivamente.

A partir da brotação, os ramos foram conduzidos na posição vertical para uma melhor disposição do dossel. Os cachos ficaram a 1,20 metros do solo e o dossel vegetativo se desenvolveu por mais 1,60 m de altura, totalizando 2,80m. A desfolha na região dos cachos foi realizada durante a formação das bagas (antes da instalação do experimento).

Os tratamentos foram realizados através do desponte dos ramos e da retirada das brotações laterais ou secundárias (feminelas) durante o crescimento vegetativo.

A partir do estádio fenológico 73 (BBCH), ou seja, quando as bagas mediam cerca de 5 mm de diâmetro, a área foliar foi manipulada a partir da contagem do número de folhas no ramo (Quadro I). O tratamento testemunha (SP) não recebeu manipulação do dossel vegetativo (sem desponte dos ramos e com a manutenção das brotações laterais). O delineamento experimental utilizou 5 repetições, sendo cada repetição composta por oito plantas dispostas na fila, com 2 plantas de bordadura para cada lado e avaliadas as 4 plantas centrais.

QUADRO I Tratamentos de área foliar realizados nas plantas da variedade Merlot durante os ciclos vegetativos 2005/2006 e 2006/2007, em São Joaquim, SC. Florianópolis, SC, Brasil.

Leaf area treatments used in plants of the variety Merlot during vegetative cycles 2005/2006 and 2006/2007, in São Joaquim, SC.Florianópolis, SC, Brazil.

A área de cada folha (cm2) foi estimada utilizando a equação y = - 0,001x2+1,462x ' 13,551, definida por Borghezan et al. (2010), sendo x o quadrado do comprimento da nervura central (cm). O comprimento das nervuras foi avaliado, no final da maturação das bagas, em todas as folhas do ramo, sendo que 15 ramos foram selecionados aleatoriamente nas plantas de cada um dos tratamentos. A área foliar total por planta foi estimada a partir da área foliar de cada ramo, multiplicada pelo número médio de ramos por planta. No tratamento sem poda verde (SP), todas as folhas das brotações laterais foram avaliadas da mesma maneira, sendo a área foliar total do ramo resultante da soma da área das folhas do ramo principal e da área das folhas das brotações laterais ( feminelas). A produção de uvas foi avaliada durante a colheita, a partir da pesagem dos cachos (kg/planta).

A colheita foi realizada quando o teor de sólidos solúveis totais foi superior a 23ºBrix no ciclo 2005/2006 e a 21ºBrix no ciclo 2006/2007. A composição da uva foi monitorada semanalmente, a partir do estádio de mudança da coloração das bagas (véraison) até a colheita. Amostras de 200 bagas foram coletadas de forma aleatória em diferentes posições dos cachos. As bagas foram coletadas através de corte do pedicelo com a utilização de uma tesoura, sendo acondicionadas em sacos plásticos e transportadas em caixas refrigeradas até o laboratório. O mosto foi analisado com base na metodologia descrita em OIV (2009). Foi avaliado o teor de sólidos solúveis totais (SST) utilizando um refratômetro digital (Instrutherm, RTD 45), a acidez total titulável (ATT) e o pH avaliado em aparelho (ADWA, AD 1030).

Amostras com cerca de 20 kg de uvas de cada tratamento foram colhidas manualmente durante a safra 2006 e transportadas até a cantina da Estação Experimental da Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina) em Videira, SC. A uva foi separada da ráquis, sendo o mosto colocado em recipientes de vidro (20 litros), adaptados com válvula de Müller, adicionado 50 mg/l SO2 e inoculado com 20g/hl de leveduras AEB Group (Saccharomyces cerevisiae). O tempo de maceração foi de 13 dias, sendo que após a retirada das cascas, a fermentação alcoólica ocorreu em uma sala com temperatura de 24±1°C, por aproximadamente 10 dias. Após a separação da borra e a fermentação malolática (cerca de 20 dias), os vinhos permaneceram por 21 dias a temperatura de 1°C para a estabilização. Ao final, os vinhos foram sulfitados com 50 mg/l SO2 e em seguida engarrafados. Após o engarrafamento, os vinhos foram estocados durante 16 meses a temperatura de 15±1°C.

Para a realização das análises sensoriais dos vinhos foram convidados 12 julgadores (1 mulher e 11 homens) experts, com idade entre 30 e 59 anos e com mais de 10 anos de experiência. Optou-se pela análise descritiva quantitativa (ADQ), avaliando os atributos: cor, aroma frutado, aroma floral, aroma vegetal (herbáceo), gosto ácido, gosto amargo, adstringência, estrutura e apreciação global. O preenchimento da ficha de degustação foi feito anotando o código de cada uma das amostras em linhas horizontais de 100 mm de comprimento, ancoradas e com as descrições Fraco e Forte nas extremidades, para cada um dos atributos.

A análise sensorial foi realizada em sala climatizada (18°C), com boa iluminação, sendo os julgadores distribuídos ao acaso em cabines individuais.

As garrafas foram abertas 20 minutos antes do início dos testes, sendo os vinhos distribuídos em taças de cristal ISO com capacidade de 250 ml. Porções de 50 ml foram distribuídas nas taças 15 minutos antes do início da sessão.

Cada julgador recebeu 5 amostras contendo todos os tratamentos, sendo a ordem de apresentação aleatória e as taças codificadas com 3 números aleatórios.

Os dados foram analisados utilizando o software Statistica versão 6.0, através de análise de variância, teste de separação de médias de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade de erro e análise de regressão, conforme descrito em Steel et al. (1997). Para os dados da análise sensorial, também foi realizada a análise multivariada de componentes principais (PCA).

RESULTADOS E DISCUSSÃO A produção por planta não foi afetada pelos tratamentos de área foliar realizados. No ciclo 2005/2006, a média de produção por planta foi de 1,192 kg e no ciclo 2006/2007, este valor foi de 0,906 kg/planta (Quadro II).

QUADRO_II Produção e área foliar estimada para as plantas de cada tratamento de manejo do dossel da variedade Merlot, cultivada em São Joaquim, SC. Florianópolis, SC, Brasil.

Production and leaf area estimated for each treatment of plant canopy management of the variety Merlot, cultivated in São Joaquim, SC.Florianópolis, SC, Brazil.

Os tratamentos promoveram redução significativa da área foliar das plantas, em comparação com a testemunha (sem poda verde - SP), em ambos os ciclos de crescimento (Quadro II). No primeiro ciclo, o desponte dos ramos reduziu a área foliar em 71, 54 e 26% em relação ao tratamento onde o dossel foi mantido sem manejo (SP). Os tratamentos 12F, 20F e SD apresentaram redução da área foliar de 71, 57 e 42% respectivamente, durante o ciclo 2006/2007. O procedimento de manejo do dossel vegetativo realizado pela empresa se aproxima da situação observada entre os tratamentos 16F e 20F. As plantas dos tratamentos SD e SP apresentaram uma tendência de maior área foliar no ciclo 2006/2007 em comparação ao desenvolvimento vegetativo do ano anterior. A análise estatística demonstrou não existir diferenças significativas entre a área foliar dos ramos despontados em 16 folhas (16F) com os tratamentos 12F e 20F, em ambos os ciclos vegetativos avaliados. Porém, a área foliar do tratamento 12F é inferior à área foliar por planta no tratamento onde os ramos foram despontados deixando-se 20 folhas (20F).

A área foliar total foi de aproximadamente 7 m2/planta no tratamento SP, em ambos os ciclos estudados, o que corresponde a cerca de 31.100 m2/ha. No tratamento com desponte mais drástico (12F), a área foliar por planta foi próxima a 2 m2 (8.888 m2/ha). Este crescimento vegetativo (para o tratamento SP) é superior ao observado sob condições parecidas de condução e espaçamento para a variedade Merlot, na Itália (Barbagallo etal., 2004).

Em plantas cultivadas em casa de vegetação, a manutenção de no mínimo 12 folhas em cada ramo possibilitou condições adequadas de área foliar, que permitiram uma taxa fotossintética suficiente para o acúmulo de reservas e maturação da uva (Poni, 2001). Entretanto, as plantas de um vinhedo à campo podem necessitar de uma superfície foliar maior, como sugerem Hunter (2000) e Hunter e Archer (2002) que recomendam cerca de 16 folhas/ramo. Esta medida não é muito precisa, pois depende do tamanho das folhas, sendo que a relação entre a área foliar e a produção (AFT/P) pode fornecer melhores condições de comparação entre diferentes condições de cultivo. Assim, quando esta relação é inferior a 0,8 m2/kg, existe uma limitação fotossintética afetando o desenvolvimento e a composição da uva (Poni, 2005). quando os valores são elevados para esta relação (acima de 2,0 m2/kg), o processo de maturação pode ser afetado pelo excessivo vigor vegetativo ( Poni, 2005). Neste estudo, no tratamento com maior limitação da área foliar (12F), este índice foi de 1,7 e 2,3 m2/kg nos ciclos 2005/2006 e 2006/2007, respectivamente.

A relação entre a área foliar e a produção de uva apresentou variação de 1,7 à 5,7 m2/kg no primeiro ano de experimento e no ciclo posterior essa variação foi de 2,3 à 7,4 m2/kg. Intrieri e Filippetti (2007) relataram que em vinhedos bem equilibrados, este índice pode chegar até 4 m2/kg. Entretanto, todos estes autores relatam valores de produtividade superior (2 a 3 kg/planta) aos observados neste estudo, que foi de cerca de 4,5 toneladas/ha (1 kg/planta).

Assim, a restrição produtiva, ocasionada pela reduzida carga de gemas, foi o fator responsável pelo excessivo crescimento vegetativo, ocasionando o desequilíbrio deste vinhedo.

O teor de sólidos solúveis totais nas bagas da variedade Merlot foi acumulado de forma constante em ambos os ciclos avaliados. No entanto, no ciclo 2005/2006 (Figura 1A), os valores foram superiores em aproximadamente 10% (2,0 ºBrix) aos teores acumulados no ciclo 2006/2007 (Figura 1B). Em ambos os anos, observa-se que os tratamentos com maior área foliar apresentaram maior acúmulo de açúcares nas primeiras semanas após o início da maturação. A partir do terço final deste período, os teores de sólidos solúveis totais apresentaram diferenças menos evidentes. No primeiro ciclo de avaliação, os valores foram próximos a 24 ºBrix, enquanto que no ciclo posterior, este teor foi próximo a 22 ºBrix na data de colheita da uva (Figura 1).

Fig. 1 - Evolução do teor de sólidos solúveis totais, sob efeito de diferentes níveis de área foliar, durante a maturação da variedade Merlot, nos ciclos 2005/2006 (A) e 2006/2007 (B), em São Joaquim, SC. UFSC, Florianópolis, SC, Brasil.

Evolution of soluble solids content, in response to leaf area levels during ripening of the variety Merlot in cycles 2005/2006 (A) and 2006/2007 (B), in São Joaquim, SC., Florianópolis, SC, Brazil.

Os valores destes compostos observados na uva colhida em São Joaquim/SC são semelhantes aos índices relatados nas tradicionais regiões de cultivo da América do Norte, Europa e Oceania. Os resultados deste estudo também são superiores à concentração de açúcares encontrada em vinhedos da Serra Gaúcha, principal região de cultivo de uvas no Brasil (Rizzon e Miele, 2003; Mandeli et al., 2008).

O acúmulo de sólidos solúveis totais durante a maturação das bagas não foi negativamente afetado pela redução da área foliar, nem mesmo sob a maior limitação da área foliar (12F). Neste tratamento, a área foliar foi superior a 1,5 m2/kg de uva (Quadro_II) sendo superior à condição mínima necessária (0,8 m2/kg), como descrito por Poni (2003) e Kliewer e Dokoozlian (2005). De maneira geral, também no tratamento sem poda verde (SP), pode-se considerar que a relação entre o crescimento vegetativo e a produção não afetou esta variável. A escala de variação entre os tratamentos de área foliar deste estudo está de acordo com as observações de Brighenti etal. (2010), que avaliaram o efeito do desponte dos ramos sobre a maturação da uva Merlot em São Joaquim.

A acidez total apresentou diminuição de forma constante durante o período de maturação (Figura 2). Os valores observados durante a colheita foram cerca de 35% dos teores avaliados no início do período de maturação. No ciclo 2005/2006 (Figura 2A), os tratamentos com maior área foliar (SD e SP) apresentaram teores de acidez total mais elevados que os demais tratamentos. Em relação ao ciclo posterior, esta evolução foi mais equilibrada entre os tratamentos até a data da colheita (Figura 2B). Porém, os valores de acidez total titulável na data da colheita foram próximos a 80 meq/l durante o ciclo 2005/2006, e no ciclo 2006/ 2007, esta se manteve próxima a 100 meq/l para todos os tratamentos.

Fig. 2 - Evolução da acidez total titulável, sob efeito de diferentes níveis de área foliar, durante a maturação da variedade Merlot, nos ciclos 2005/2006 (A) e 2006/2007 (B), em São Joaquim, SC. UFSC, Florianópolis, SC, Brasil.

Evolution of total acidity, in response to leaf area levels during ripening of the variety Merlot in cycles 2005/2006 (A) and 2006/2007 (B), in São Joaquim, SC.UFSC, Florianópolis, SC, Brazil.

A presença de níveis adequados de ácidos orgânicos na uva é um fator determinante do potencial de qualidade e estabilidade dos vinhos (Conde etal., 2007). Estes autores relataram que a concentração ideal de ácidos orgânicos na uva madura deve variar entre 0,65 e 0,85 g/100ml (90-110 meq/l). Entretanto, as condições climáticas afetam a metabolização dos ácidos orgânicos durante a maturação, regulando a taxa de transformação do ácido málico em fontes de carbono para a respiração celular (Jackson e Lombard, 1993) ou a acumulação sob a forma de frutose e glicose (Conde etal., 2007). Os valores obtidos neste trabalho podem ser considerados adequados a elaboração de vinhos tintos e estão de acordo com outros estudos realizados na Serra Gaúcha/Brasil ( Rizzon e Miele, 2003; Mandeli etal.,2008), em Bordeaux/França (Leeuwen, etal., 2004; Pereira etal., 2005) e na Nova Zelândia (Friend e Trought, 2008). A colheita de uvas com teores inferiores de acidez titulável foi descrita por Fidelibus etal.

(2007) na Califórnia/EUA (0,4 g/100ml). Não foi possível evidenciar variação expressiva durante a evolução da acidez total entre os tratamentos de área foliar realizados, em ambos os ciclos estudados.

A evolução do pH não apresentou um padrão constante como o observado para os índices anteriores. Nos dois ciclos de monitoramento deste índice, os valores foram semelhantes desde o início da maturação até a colheita, quando se mantiveram entre 3,20 e 3,30 (Figura 3). Embora o pH do mosto seguisse a tendência de aumento após a mudança de cor das bagas, principalmente no ciclo 2006/2007, houve períodos de aumento e estabilização deste índice de forma irregular (Figura 3B).

Fig. 3 - Evolução do pH, sob efeito de diferentes níveis de área foliar, durante a maturação da variedade Merlot, nos ciclos 2005/2006 (A) e 2006/2007 (B), em São Joaquim, SC. Florianópolis, SC, Brasil.

Evolution of pH, in response to leaf area levels during ripening of the variety Merlot in cycles 2005/2006 (A) and 2006/2007 (B), in São Joaquim, SC.UFSC, Florianópolis, SC, Brazil.

Em relação aos tratamentos de área foliar realizados, as diferenças nos valores de pH em cada data de coleta, em geral, foram inferiores a 0,10. Os valores de pH observados em São Joaquim/SC se encontraram nos limites de variação definidos por Rizzon e Miele (2003) e Mandeli etal. (2008) para a variedade Merlot, na principal região vitícola do Brasil. Estes valores também estão próximos aos índices considerados adequados (3,3 à 3,7) por Mpelasoka etal.

(2003) e com valores médios obtidos em Bordeaux, na França (Pereira etal., 2005) e no norte da Itália (Stefanini etal., 2000). Em regiões com condições climáticas amenas, como é o caso de São Joaquim, as uvas podem apresentar maiores teores de acidez (principalmente do ác. málico) e pH menor (Jackson e Lombard, 1993). Os valores mais elevados de acidez total e menores de pH, observados na data de colheita deste estudo, sugerem que estas condições favoreçam a estabilidade das antocianinas, beneficiando a coloração dos vinhos (Conde etal., 2007).

Quanto à maturação da uva Merlot, os resultados das variáveis avaliadas no mosto não permitiram definir os melhores tratamentos de área foliar. Os resultados observados para o acúmulo de açúcares, a acidez total e o pH não foram afetados pela redução da superfície foliar em níveis que pudessem ser limitantes para a colheita. Resultados semelhantes foram descritos por Leeuwen etal. (2004), que não observaram efeito da relação área foliar/produção para a concentração de açúcares e os teores de antocianinas e polifenois totais.

Brighenti etal. (2010) observaram índices de maturação mais adequados quando as plantas foram mantidas com área foliar próxima de 3 m2/kg de uva, embora com produção por planta superior (9,0 ton/ ha) aos valores observados neste estudo.

A produção reduzida por planta ocasionou desequilíbrio de vigor vegetativo deste vinhedo, o que possivelmente limitou o efeito do manejo do dossel sobre a composição da uva, pois a área foliar mantida no tratamento com desponte mais intenso (cerca de 2,0 m2/kg) conseguiu manter a produção de fotoassimilados para atender a necessidade dos cachos e dos outros órgãos das plantas (estruturas vegetativas).

Os vinhos da variedade Merlot, utilizados na análise sensorial, apresentaram elevada graduação alcoólica (acima de 14 ºGL) e acidez em níveis adequados (Quadro III).

QUADRO III Composição química dos vinhos Merlot, safra 2006, de plantas com diferentes tratamentos de área foliar. UFSC, Florianópolis, SC, Brasil.

Chemical composition of wines Merlot, vintage 2006, of plants with different leaf area treatments.Florianópolis, SC, Brazil.

O manejo do dossel vegetativo afetou a intensidade dos atributos sensoriais dos vinhos Merlot produzidos com uvas colhidas em São Joaquim/SC. Destacam-se as avaliações de qualidade como a intensa coloração, boa estrutura e apreciação global dos vinhos desta variedade. Os aromas frutados e florais apresentaram média intensidade, enquanto que em geral o aroma vegetal foi presente sensorialmente em menor nível para a maioria dos vinhos avaliados (Figura 4).

Miele etal. (2009) observaram que a composição química dos vinhos, principalmente a concentração de compostos fenólicos e aromáticos, apresentou efeito significativo com a realização desta prática. Avaliando o efeito da produtividade para a variedade Merlot na Serra Gaúcha, Miele e Rizzon (2006) não observaram diferenças significativas entre as variáveis físico-químicas dos vinhos. Porém, os resultados da análise sensorial daquele estudo demonstraram haver variação em atributos visuais, olfativos e gustativos, principalmente em coloração, aroma vegetal e estrutura (corpo), o que está de acordo com os resultados observados neste trabalho.

Fig. 4 - Média dos atributos sensoriais avaliados em vinhos Merlot, safra 2006, de plantas com diferentes tratamentos de área foliar. UFSC, Florianópolis, SC, Brasil.

Average of sensory attributes evaluated in Merlot wines, vintage 2006, of plants with different leaf area treatments.UFSC, Florianópolis, SC, Brazil.

Os atributos aromáticos foram os que mais adequadamente permitiram diferenciar os vinhos resultantes de uvas colhidas de plantas com diferentes níveis de manejo da área foliar (Figura 4). Observou-se a tendência dos aromas frutado e floral apresentarem o mesmo padrão de percepção por parte dos julgadores, com elevado coeficiente de correlação (0,98; p=0,003). A análise dos dados demonstrou que os atributos sensoriais que melhor diferenciaram os vinhos foram o Aroma Vegetal (p=0,0110) e a Apreciação Global ( p>0,0000). Além destes dois, também pode-se considerar o Aroma Frutado (p=0,0557), sendo outro importante atributo adequado a diferenciação dos vinhos da variedade Merlot, nas condições estudadas. Os aromas frutado e vegetal apresentaram coeficiente de correlação negativo e elevado (-0,97; p=0,006), enquanto que para os atributos aroma floral e apreciação global, houve correlação positiva (0,93; p=0,024).

Os vinhos resultantes de plantas com valores intermediários de área foliar (16F e 20F) apresentaram marcadamente aroma frutado mais intenso e aroma vegetal menos pronunciado. Para os vinhos elaborados a partir de plantas que não receberam desponte e onde as feminelas foram mantidas (SP) este padrão de aromas foi inverso (Figura 5). No tratamento com o desponte mais intenso (12F), os vinhos apresentaram características intermediárias. Esta mesma afirmação pode ser feita em relação à apreciação global, onde os vinhos elaborados com uvas de plantas com área foliar intermediária (16F, 20F e SD) obtiveram uma melhor avaliação por parte dos julgadores (Figura 5).

Fig. 5 - Análise de componentes principais para os atributos sensoriais de vinhos Merlot, safra 2006, de plantas com diferentes tratamentos de área foliar. UFSC, Florianópolis, SC, Brasil. Distribuição dos atributos sensoriais avaliados (acima) e dos tratamentos de área foliar realizados nas plantas (abaixo).

Principal component analysis for sensory attributes of wine Merlot, vintage 2006, of plants with different leaf area treatments. UFSC, Florianópolis, SC, Brazil. Distribution of sensory attributes evaluated (above) and leaf area treatments performed in plants (below).

A análise de componentes principais representa graficamente esta variação, dispondo de forma oposta o aroma frutado e vegetal. Também, a apreciação global segue a tendência de acompanhar os vinhos com maior intensidade de aromas frutados (Figura 5). O fator 1 (PCA1) explicou 80,55% da variação dos dados, deixando o aroma vegetal no lado esquerdo e o aroma frutado e a apreciação global no quadrante direito. A estrutura também foi outro atributo que esteve ligado à apreciação global, diferindo os vinhos dos tratamentos de área foliar.

O fator 2 (PCA2) participou com 11,65% das alterações percebidas. Os dois fatores corresponderam a cerca de 92% das diferenças observadas nos atributos sensoriais dos vinhos da variedade Merlot deste estudo.

O vinho elaborado a partir de uvas cujas plantas não receberam manipulação da área foliar (SP) apresentou aroma vegetal mais intenso. Em oposição, os vinhos na faixa intermediária de área foliar apresentaram aromas marcadamente frutados e florais de maior intensidade (16F e 20F). A redução excessiva da vegetação (12F) resultou em vinhos com qualidade sensorial intermediária. A retirada das brotações laterais (SD) resultou em boa avaliação sensorial, porém com aromas frutados menos intensos em relação aos tratamentos 16F e 20F, indicando que o desponte dos ramos contribuiu para a qualidade dos vinhos. Em geral, os vinhos (safra 2006) do tratamento 16F obtiveram a melhor avaliação, apresentando intensa coloração, com atributos aromáticos mais desejáveis, boa estrutura e com preferência na apreciação global.

Diversos autores têm descrito a correlação entre a concentração de compostos aromáticos, dentre eles as metoxipirazinas, e a intensidade de aromas vegetais detectadas nos vinhos (Hashizume e Samuta, 1999; Chapman etal., 2004; Falcão etal., 2007). Neste estudo, foi observado que os vinhos resultantes de plantas que não receberam manejo do dossel vegetativo (SP) apresentaram elevada intensidade de aromas vegetais. Nesta mesma região, Falcão etal. (2007) registraram elevada concentração de 2-metoxy-3-isobutilpirasina (IBMP), o que corrobora os resultados observados. Hashizume e Samuta (1999) observaram que a concentração destes compostos é elevada durante a formação das bagas e com a evolução da maturação evidencia-se um declínio progressivo, sob condições de adequada exposição à luz solar e através da retirada das folhas na região dos cachos.

Em comparação com a testemunha (SP), a manipulação da área foliar resultante da retirada das brotações laterais (12F, 16F, 20F e SD) reduziu o número de camada de folhas e permitiu a passagem da radiação com maior intensidade.

Possivelmente, a maior abertura do dossel permitiu um balanço positivo entre a relação fotodecomposição:formação dos IBMP durante a formação da uva (Ryona etal., 2008). Além disso, estes tratamentos apresentaram em geral notas maiores em aroma frutado e apreciação global.

CONCLUSÕES A uva colhida atingiu elevado grau de maturação ao final do período de maturação. O manejo da área foliar apresentou efeito pouco evidente sobre a maturação da uva. Os vinhos elaborados a partir de plantas com níveis diferenciados de área foliar apresentaram diferenças sensoriais significativas.

Os aromas vegetais e frutados, além da apreciação global, foram os atributos sensoriais que melhor destacaram as diferenças entre os tratamentos. O manejo do dossel vegetativo propiciou melhora na qualidade sensorial dos vinhos nas condições avaliadas. Neste estudo, o nível intermediário de área foliar (16F ' 2,3 m2/kg) foi a intensidade de manejo mais adequada para a qualidade sensorial dos vinhos.


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