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EuPTCVAg0871-018X2008000200021

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variedadeEu
ano2008
fonteScielo

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Acerca de algumas das iniciativas empresariais e de I&D da cultura do algodoeiro em Portugal continental

O algodoeiro seria cultivado na Península Ibérica, na região de Córdova, em meados do século XI, não existindo no entanto notícia de que a referida cultura se tenha estendido ao território nacional (Pereira et al., 1976a). López-Bellido (2003) também situa as primeiras referências à cultura do algodoeiro em Espanha na época de dominação árabe, embora em tempos mais recuados, nos finais do século IX.

O primeiro passo que conhecemos para a introdução desta cultura em Portugal continental data do primeiro quartel do século XIX. Com efeito, por iniciativa do botânico Félix de Avelar Brotero, então Director do Real Museu e Jardim Botânico, foi inserto na Gazeta de Lisboa, de Janeiro de 1824, um anúncio dando conta da recepção de sementes de algodoeiro oriundas dos EUA, as quais poderiam ser utilizadas pelos agricultores interessados em experimentar esta cultura. Brotero (1824) refere que o algodoeiro é uma espécie que se em quase todos os tipos de terreno, sendo cultivado () em todas as quatro partes do nosso Planeta; cultivão-se na Europa, nas Ilhas do Archipelago, em Malta, Sicilia, Corsega, Italia, França meridional, e mesmo na Hespanha, principalmente no Reino de Valença, aonde, segundo attesta o Professor Ortega, a especie do Algodoeiro arbustivo, he cultivada em muitos campos, e a quantidade de algodão que annualmente se colhe da sua grande cultura, monta a quatrocentos quintaes: a analogia do clima indica, que esta especie de Algodoeiro, e não menos as que se dão bem na America septentrional, podem ser cultivadas tambem em Portugal, principalmente no Algarve, e sitios maritimos do Alemtéjo, em extensas culturas com igual feliz successo. Segundo Pereira et al. (1976a), em Faro (Algarve), no princípio do século passado, existiam algumas máquinas manuais de descaroçar algodão, pertencentes a Jaime Barrot, para tratamento da produção algodoeira obtida nos arredores daquela cidade.

Durante o século XX, embora o maior esforço de desenvolvimento da cultura do algodoeiro tenha sido dirigido para as antigas colónias ultramarinas, em particular Angola e Moçambique, países onde esta cultura atingiu uma expressão económica, técnica e social muito significativa, o objectivo macroeconómico de redução da saída de divisas, encorajado pelo interesse agronómico, económico e social de introduzir uma espécie de alto rendimento nalguns sistemas de cultura do sul do país, aliado ao facto de se cultivar algodão com êxito na Grécia, Espanha e outros países de latitude e características climáticas semelhantes às de algumas regiões de Portugal, motivaram, por diversas vezes, o interesse por esta cultura neste país.

A primeira acção oficial conhecida sobre a cultura do algodoeiro em Portugal data de 1952. Por despacho de 27 de Novembro desse ano, o Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria mandou proceder ao estudo da qualidade dos algodões produzidos e da viabilidade da sua utilização pela indústria têxtil nacional, aproveitando para o efeito algumas amostras colhidas em ensaios realizados por particulares. O relatório posteriormente elaborado veio a concluir rapidamente pela viabilidade técnica da cultura do algodão com possibilidade de aproveitamento económico pela indústria nacional (Duarte, 1978). Em 1953, a Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas levou a efeito ensaios de algodão, distribuídos por várias regiões do país, mas sem continuidade (Pereira et al., 1976a).

Solicitada a dar parecer sobre o assunto, a Comissão Reguladora do Comércio de Algodão em Rama (CRCAR) chamaria a atenção do Governo, em 30 de Janeiro de 1954, para o interesse ultramarino na cultura do algodão e referia que, para a Metrópole, apenas teriam interesse económico as variedades de fibra longa. Também por essa época a Fábrica de Óleos Vegetais de Santa Catarina (Setúbal), promoveu, sem êxito, a cultura da variedade Giza 7, de fibra longa (Pereira, 1977). Possivelmente outras tentativas isoladas terão surgido com o mesmo objectivo, mas sem resultados concretos.

A partir de 1962, a Empresa Fabril do Norte, associada à Companhia do Búzi (Moçambique), subsidiou trabalhos de sondagem e experimentação expedita para se avaliar das possibilidades da implantação da cultura do algodão em Portugal (Pereira et al., 1976a), nomeadamente realizando ensaios de adaptação em diversos pontos do país para determinação das possibilidades técnico-económicas da cultura e demarcação das regiões ecológicas mais favoráveis (Duarte, 1978). Após 3 anos de actuação, em resultado das boas perspectivas que se entreabriram, foi constituída a CAPOR Companhia dos Algodões de Portugal, S.A.R.L. De 76 toneladas produzidas em 1962, a produção de algodãocaroço atingiu 250 toneladas em 1964 e 430 toneladas em 1965, mantendo-se estável até ao final da década, e decrescido sensivelmente em 1970 e 1971 (Pereira, 1977). As variedades predominantes eram Carolina Queen (sinónimo de Coker 210), lançada nos EUA em 1965, e Acala 1517BR, lançada nos EUA em 1954 (Pereira, 1978; Smith et al., 1999).

Em Dezembro de 1967, com a presença de membros do Governo, foi inaugurada a primeira e única fábrica nacional de descaroçamento e prensagem de algodão, a 4 km de Beja, no sentido de Ferreira do Alentejo. Esta fábrica tinha uma capacidade instalada mínima de 4000 t ano-1, pelo que a área cultivada deveria crescer, no mínimo, até aos 2500 ha ano-1, devendo atingir, a médio prazo, o patamar de 4500 ha ano-1 para um pleno abastecimento da capacidade instalada da fábrica (Duarte, 1978).

Ainda segundo Pereira (1977) e Pereira et al. (1976a), a disparidade dos resultados obtidos durante o período de actividade da CAPOR ficou a dever-se à variabilidade dos anos agrícolas, à diversidade de solos e climas, e ainda às diferentes técnicas culturais utilizadas pelas duas centenas de agricultores envolvidos no processo algodoeiro (Quadro 1).

Também a assistência técnica, exclusivamente prestada pela CAPOR, padecia de naturais limitações, com um número reduzido de quadros técnicos cuja preparação se baseava, de início, essencialmente, na sua experiência africana ultramarina.

Numa área de 54 hectares, na Herdade de D.

Isabel, na região de Elvas, a CAPOR produziu algodão-caroço por conta própria, durante 4 anos seguidos, com uma produtividade média de 1951 kg ha-1. As produções unitárias distribuíram-se da seguinte forma (Quadro 2):

Em 1968, a CAPOR dirigiu uma carta ao Director-Geral dos Serviços Agrícolas, alertando que a existência de aspectos ligados à produção e ao fomento da cultura ultrapassavam a sua esfera de acção e de competência, como empresa privada, para se situarem a nível nacional. Sugeria a realização de ensaios nas Estações Experimentais existentes e o estudo da integração do algodoeiro nos sistemas de aproveitamento agrícola propostos para os regadios, em particular os regadios do Alentejo. Assim se vieram a estabelecer alguns campos experimentais nas zonas de Idanha-a-Nova, Elvas e Tavira, aos quais se acrescentaram os de exploração directa pela própria CAPOR, em Elvas e Quarteira. Os esquemas dos ensaios de variedades, fertilizações e análise estatística dos resultados foram assegurados pela Estação Agronómica Nacional (Duarte, 1978). Com base nos resultados obtidos, a Repartição de Culturas Arvenses, da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas, em 1970, informou o Secretário de Estado da Agricultura que: () A cultura do algodão deve ser incluída entre as consideradas como possíveis e vantajosas para o melhor aproveitamento dos novos regadios, tendo em atenção que: a) é susceptível de fazer parte de variadas rotações, adaptando-se com facilidade a diversos processos culturais; b) a fibra produzida reduzirá o dispêndio de divisas que anualmente necessidade de efectuar com a importação de uma matéria-prima em que o país é nitidamente deficitário, mesmo incluindo a produção obtida no Ultramar Português; c) do respectivo caroço se obterão óleos e bagaços de que a economia nacional tanto carece para satisfação de necessidades alimentares humanas e pecuárias, produtos que de igual forma se conseguem à custa de vultuosas e dispendiosas importações.

Embora em todos os países algodoeiros existissem diversas formas de apoio à cultura assistência técnica adequada, facilidades de crédito a curto prazo, garantia de preços mínimos sobretudo numa primeira fase do seu lançamento, em Portugal, por razões não totalmente evidenciadas, nunca houve qualquer acção de fomento ou medida de estímulo à produção algodoeira. A CAPOR propôs ao Ministro da Economia a criação de um prémio à produção de algodão, tal como então acontecia em Espanha, Grécia, Israel e EUA, países tradicionalmente produtores de algodão. O Director-Geral dos Serviços Agrícolas e os Secretários de Estado do Comércio e o da Agricultura consideraram necessário, em 1970, definir um programa de apoio do Estado à cultura do algodão. No entanto, entre relatórios, pareceres, informações e despachos, o fomento da cultura algodoeira acabaria por não se realizar, tendo a CAPOR cessado definitivamente a sua actividade fabril em 1971 (Duarte, 1978). O conceito vigente do mercado comum português (Metrópole e Províncias Ultramarinas), apontava para a intensificação da cultura do algodão em Angola e Moçambique (Pereira et al., 1976a).

depois da independência das ex-colónias, em 1975, o Presidente do Instituto Nacional de Investigação Agrária constituiu um grupo de trabalho com a incumbência de estudar a viabilidade da cultura do algodão em Portugal. Em síntese, o relatório produzido analisava a cultura do algodoeiro em países de condições ecológicas similares, a experiência portuguesa acumulada, no regadio e no sequeiro, os principais factores limitantes, a integração da cultura em alguns regadios do Alentejo e os projectos de investigação prioritários (Pereira et al., 1976a). Iniciaram-se trabalhos experimentais em Idanha-a-Nova, Santarém, Elvas, Alvalade e Silves, estudando variedades, fertilizações, regas e compassos, e foi concebido um Plano de Acção para o fomento da cultura do algodão (Pereira et al., 1976b, Pinto, 1977). As variedades em estudo naquela altura eram (Pereira, 1978; Smith et al., 1999): com origem nos EUA Acala 1517C, lançada em 1951, Acala SJ1, lançada em 1967, Coker 201, Carolina Queen e Coker 310, esta lançada depois de 1965, e, com origem na Bulgária, Chirpan 433 e Trakia 2. Pereira (1978) refere que as variedades búlgaras manifestaram maior precocidade, evidenciada pela proporção da colheita em relação à produção total, e pelo mais reduzido número de dias entre a emergência e a flor e entre a emergência e a cápsula aberta. Relativamente às variedades Coker, as segundas mais precoces, esta antecipação cifrava-se em 10-12 e 15-20 dias, respectivamente. No entanto, as variedades de origem búlgara, produziam fibras de menor comprimento e maior índice de micronaire (eram mais curtas e mais grossas) do que as de origem americana, as quais, também, registavam maior percentagem de fibra.

Face aos resultados das experimentações então realizadas, Pereira (1978) conclui que a variedade mais precoce, em particular Chirpan 433, deveria ser fomentada nas regiões do país com maiores limitações ambientais, enquanto que a variedade Coker 201, aquela que se revelou mais promissora de entre todas as variedades de origem Americana, um pouco mais tardia e com fibra de melhor qualidade, deveria ser fomentada na bacia do Rio Guadiana e no Regadio do Caia.

No fim do seu trabalho, Pereira (1977) impõe um corolário: () arrancar decisivamente para uma acção concertada de fomento, a fim de que, a médio prazo, a inserção da nova cultura no meio agrícola português se converta numa realidade palpável, contribuindo validamente para o desenvolvimento do país.

Entre esta data e o final da década de 90 do século XX, o desafio não foi ouvido.

no século XXI surgiu o arranque de uma nova iniciativa empresarial, sedeada em Ferreira do Alentejo COTFLAX, Actividades Agro-industriais, Lda. Esta empresa estabeleceu, para o ano agrícola de arranque, os seguintes quatro objectivos a testar (Mendes, 2002): área total e por exploração compatíveis com a mecanização da cultura, da sementeira à colheita, e posterior transformação industrial do algodão-caroço produzido; maior dispersão possível das explorações pela Zona de Influência da Barragem do Alqueva; confirmação de que seria possível produzir algodão com qualidade para fins industriais; a cultura poder constituir, do ponto de vista económico, uma alternativa interessante às culturas tradicionais.

Na campanha de 2001 cultivaram-se cerca de 213 hectares de regadio (34,3% com rega gota-a-gota e 65,7% com rega por aspersão), distribuídos por 6 Concelhos do Alentejo (Aljustrel, Beja, Castro Verde, Ferreira do Alentejo, Serpa e Vidigueira) e 13 explorações. Cerca de 80% da área foi semeada sob plástico. Produziram-se 576 toneladas de algodão-caroço, com produtividades médias compreendidas entre 2663 e 3145 kg ha-1. O apuramento dos resultados económicos operacionais médios revelou o seguinte (Quadro 3):

Entre os factores de produção intermédios, os materiais e o aluguer de máquinas representavam a maior fatia, atingindo os primeiros de 60 a 70% e os segundos 20 a 28% do total de custos. O factor trabalho representou 4 a 9% do total dos custos de produção. Entre os materiais utilizados, sobressaem sementes (7-13%), fertilizantes (25-36%), fitofármacos (25-30%), energia e água (13-25%), e o plástico (0-24%). A estrutura de custos referida por Ballesteros (2003), para a região da Andaluzia (Espanha), é muito semelhante a esta, embora a componente de mão-de-obra seja mais importante do que a registada em Portugal.

A variedade mais utilizada pelos agricultores portugueses foi La Chata, tendo-se também semeado pequenas áreas com Condor, Montana e Sorangela.

Nos anos seguintes, a cultura do algodoeiro em Portugal teve a evolução expressa no Quadro 4.

Todo o algodão-caroço produzido em Portugal foi escoado para empresas descaroçadoras espanholas.

Em paralelo com as iniciativas empresariais atrás referidas, entre 2001 e 2003, decorreram trabalhos de investigação e desenvolvimento experimental (I&DE) que visavam estudar a viabilidade da introdução do algodoeiro nos sistemas culturais da área de influência do regadio do Alqueva, financiado pelo Programa Específico de Desenvolvimento Integrado da Zona de Alqueva (PEDIZA), em que participaram a Estação Agronómica Nacional (EAN), o Centro Operativo e de Tecnologia do Regadio (COTR), o Centro Tecnológico das Indústrias Têxtil e do Vestuário (CITEVE) e a Direcção Regional de Agricultura do Alentejo (DRAAL) (Amaro, 2002 e 2003).

Os ensaios decorreram em Safara (38° 06 N), concelho de Moura (Alentejo), margem esquerda do Rio Guadiana.

No ano de 2001 foram ensaiadas as variedades Tauro, Tabladilla 16, Reina, Essa 101 e Essa 102, semeadas a 20 de Abril, sob e sem cobertura de plástico, e em duas densidades, 20 e 10 sementes por metro linear, com entrelinha de 80 cm (25 e 12,5 sementes m-2). Decorridos 13 dias após a sementeira (DAS), sob cobertura de plástico, verificaram-se emergências de 80-100% nas variedades Tauro e Essa 102, 60-70% nas variedades Tabladilla 16 e Essa 101, e 50-60% na variedade Reina. Na sementeira sem cobertura de plástico as percentagens de emergência foram muito inferiores e mais homogéneas entre as diferentes variedades, registando-se 15-20% na variedade Tabladilla 16, 10-15% nas variedades Tauro, Essa 101 e Essa 102, e 5-10% na variedade Reina. A cobertura com plástico foi retirada, aproximadamente, 1 mês após a sementeira. Aos 40 DAS) as diferenças de altura médias entre plantas semeadas com e sem plástico eram de 5 cm (25 e 20 cm de altura), e, aos 60 DAS, esta diferença aumentou para 20 cm (60 e 40 cm de altura). O início da floração verificou-se aos 80 DAS, e o início da abertura das cápsulas aos 139 DAS, notando-se adiantamento das plantas que haviam sido semeadas sob cobertura de plástico. As regas foram suspensas no dia 10 de Agosto (112 DAS). Efectuaram-se 3 colheitas, aos 160, 180 e 193 DAS. Não foi utilizado desfolhante. No que se refere à densidade final de plantas, a sementeira efectuada com metade do número de sementes por metro linear resultou numa densidade final significativamente inferior, tendo-se registado reduções de 29 a 41 pontos percentuais em todas as variedades. Não se registaram diferenças significativas entre as densidades finais de plantas semeadas com e sem cobertura com plástico. Também não se registaram diferenças significativas, nem entre variedades nem entre tratamentos (cobertura com plástico, sem cobertura e densidade de sementeira), no número de cápsulas por planta registado no início da maturação. Os respectivos valores médios foram de 14,3, 13,3 e 11,9 cápsulas por planta para os tratamentos com cobertura de plástico, sem cobertura, e densidade de sementeira, respectivamente. A média geral foi de 13,1 cápsulas planta-1. Quanto ao peso de algodão-caroço por cápsula, um dos mais importantes componentes da produção, apenas se verificaram diferenças significativas entre a sementeira sob plástico (5,6 g cápsula-1) e a menor densidade de sementeira (6,3 g cápsula-1). A massa por cápsula não foi significativamente diferente entre as 5 variedades. No que se refere à produção de algodão-caroço por unidade de área, verificaram-se diferenças significativas entre a sementeira sob plástico (452,9 g m-2) e a menor densidade de sementeira (360,3 g m-2). Também não se registaram diferenças significativas, entre variedades e entre tratamentos, na percentagem de descaroçamento (rendimento em fibra médio de 38,7%) (Amaro, 2002).

No ano de 2002 estudaram-se 3 factores em ensaios separados: variedades (Tabladilla 16, Reina, Tauro, Essa 101, Essa 102 e Essa 103), fertilização azotada (0 a 100 unidades de N em intervalos de 20, utilizando a variedade Essa 101), e rega (100, 70 e 50% da evapotranspiração da cultura, ETc). Devido à ocorrência de precipitações no início do ciclo, Amaro (2003) considera os resultados do ensaio de rega inconclusivos, pelo que apenas apresentou resultados relativos aos ensaios de variedades e de fertilização azotada. A sementeira fez-se a 14 de Maio, e a emergência decorreu entre 25 e 30 de Maio (11 a 16 dias). Aos 20 DAS as plantas tinham cerca de 10 cm de altura e ainda apresentavam, apenas, as folhas cotiledonares. A floração decorreu de 10-12 de Julho (59-61 DAS) até 11 de Setembro (120 DAS), data em que se procedeu à contagem do número de cápsulas por planta. As regas foram suspensas no final da semana de Agosto e a colheita efectuada entre 22 e 25 de Outubro. No que se refere ao número de cápsulas por planta, não se registaram diferenças significativas, nem entre as 6 variedades estudadas (média de 11,9 cápsulas planta-1), nem entre os 6 níveis de fertilização azotada aplicados na variedade Essa 101 (média de 7,0 cápsulas planta-1). Também não se registaram diferenças significativas entre as 6 variedades, no que se refere às produções de algodão-caroço por unidade de área (média de 19,2 g m-2) e às percentagens de descaroçamento (média de 36,5%). O mesmo se verificou com o ensaio de fertilizações, o qual conduziu a uma média de 23,5 g de algodãocaroço m-2 e de 35,3% de descaroçamento.

Durante o ano de 2002 verificaram-se, na quinzena de Setembro, condições ambientais muito desfavoráveis ao amadurecimento das cápsulas, tendo-se registado apenas 10% de cápsulas abertas. Face a estes resultados, Amaro (2003) concluiu que a variabilidade climática que se regista no nosso país, em particular a temperatura e a precipitação na época de sementeira e no período de amadurecimento das cápsulas e da colheita, coloca em risco, anualmente, o êxito da cultura.

Ainda no domínio das iniciativas de I&D levadas a cabo em Portugal Continental, Barradas (2004), nos anos de 2002 e 2003, estudou o crescimento, a produção e a qualidade das fibras produzidas por 6 variedades de precocidades distintas (Carmen, Celia, Crema, Flora, Lacta e Sonia) semeadas em 3 datas de sementeira separadas de 15 dias.

Este trabalho permitiu concluir que a evolução e valores absolutos das temperaturas, do solo e do ar, bem como número de horas o relativamente reduzido em que as plantas estão sujeitas a temperaturas dentro da janela de máxima cinética enzimática da espécie Gossypium hirsutum L. (Burke et al., 1988), constituem um factor limitante, com especial efeito negativo nas fases de germinação e crescimento inicial, e de crescimento e amadurecimento das cápsulas. Este resultados confirmam muita da investigação efectuada no interior sul de Portugal, e noutros locais da região norte da bacia Mediterrânica, remetendo a região do perímetro de rega do Caia para uma posição relativamente marginal no que se refere às condições climáticas mais adequadas para o ciclo produtivo do algodoeiro (Martins, 1990).

Neste condicionalismo ambiental, nomeadamente com temperaturas muito próximas do zero de crescimento na fase sementeira- square, e com temperaturas e durações do dia decrescentes na fase de amadurecimento das cápsulas, aliados ao desfasamento cronológico verificado entre o momento em que se atinge a máxima produção de assimilados (net assimilation rate) e de biomassa (crop growth rate), relativamente ao período de máximas necessidades inerentes ao crescimento reprodutivo, sobressaem como decisivos os caracteres de precocidade dos genótipos e as técnicas culturais com implicações na duração da estação de crescimento.

A variedade à partida qualificada como de ciclo mais curto (Celia), e aquela que no estudo de Barradas (2004) registou tendência a apresentar um maior conjunto de características de precocidade (nomeadamente no que se refere ao de inserção da primeira ramificação frutífera, menor número de dias até ao cutout (Nodes Above White Flower = 5), início da repartição de peso seco para as formas frutíferas, taxa de acréscimo diário de peso seco repartido para as cápsulas e índice de colheita) foi a que conduziu aos melhores resultados de produtividade de algodão-caroço (cerca de 2 t ha-1).

O retardar das datas de sementeira, de 2002 (Abril/Maio) relativamente a 2003 (Março/ Abril), e, em cada um dos anos, da para a data de sementeira, factor que se traduziu num desfasamento de datas de sementeira de 28 e 24 dias, respectivamente, teve um efeito negativo na produtividade de algodão-caroço (menos 0,3 a 0,5 t ha-1) , confirmando-se a hipótese de que a redução da duração total da estação de crescimento determina, normalmente, uma redução da produção. Este resultado também parece indicar que as consequências das temperaturas sub-óptimas no início do ciclo, que se fazem sentir mais intensamente nas sementeiras mais precoces e que resultam num relativo prejuízo da velocidade de emergência e da densidade de plantas produtivas, serão menos importantes para a produtividade de algodão-caroço que os efeitos negativos das condições ambientais menos favoráveis registadas durante o período de crescimento e amadurecimento das cápsulas.

A elevada perda precoce de squares e jovens cápsulas, provocada pelo complexo Earias sp. e Heliothis/Helicoverpa, remetendo as formas frutíferas restantes e formadas mais tarde para uma localização relativamente distal, numa perspectiva horizontal e vertical, e o seu crescimento e amadurecimento para um período no qual as condições ambientais e a capacidade de assimilação da canópia são francamente desfavoráveis, também terá contribuído para destacar os resultados mais positivos obtidos com a variedade de ciclo mais curto e com a data de sementeira mais precoce.

Nas condições ecológicas do perímetro de rega do Caia, e no conjunto das 6 variedades e 3 datas de sementeira estudadas, Barradas (2004) apurou também que, em média, as fibras produzidas eram do tipo Strict Low Middling, de finura normal a grossa, maturação muito alta, fibras longas de elevado grau de uniformidade e baixo índice de fibras curtas, muito fortes e com muito baixo alongamento.

No contexto de preços e ajudas em vigor na UE, antes do desligamento, e observando os custos de produção médios das contas da cultura do algodão no baixo Alentejo, nos anos de 2001 e 2002, apenas as produtividades das variedades Celia e Crema, no ano de 2003, atingiriam o limiar bruto de rendabilidade. No entanto, tendo em consideração as variedades e algumas das técnicas culturais adoptadas naquele trabalho, nomeadamente ao nível da precocidade dos genótipos, a sementeira em solo nu, a fertilização azotada, a dotação de rega, a protecção da cultura e a gestão do equilíbrio entre o crescimento vegetativo e reprodutivo, Barradas (2004) conclui que existe, ainda, uma grande margem de actuação que permitirá, com relativa facilidade, atingir produtividades bem mais elevadas e resultados económicos claramente positivos, mesmo num contexto ambiental sub-marginal para a produção de algodão como é o do perímetro de rega do Caia.

Aquele autor (Barradas, 2004) sugere algumas linhas de investigação a desenvolver, trabalhando com variedades de ciclo médio-curto e curto, de forma a encontrar os genótipos que se aproximem do seguinte ideotipo: germinação e crescimento inicial mais rápidos; maior tolerância/resistência às baixas temperaturas, nomeadamente no período sementeira-1º square e cápsula abertacolheita; início precoce da transição entre o período vegetativo e o período reprodutivo; menor duração do período de formação de um número mínimo de pontos frutíferos (intervalos horizontais e verticais de floração reduzidos e cutout); elevada percentagem de retenção nos pontos frutíferos localizados em zonas mais proximais ao eixo da planta; redução da duração e das exigências térmicas no período de crescimento e maturação das cápsulas.

No domínio das técnicas culturais Barradas (2004) sugere o estudo: da forçagem da germinação e do crescimento inicial (sob plástico); da utilização de reguladores de crescimento para assegurar um adequado equilíbrio entre o crescimento vegetativo e reprodutivo; da fertilização azotada e seu fraccionamento ao longo do ciclo; da dotação total de rega e os momentos da primeira e última rega; da protecção sanitária da cultura, em particular contra as pragas causadoras de danos nas formas frutíferas.

Podemos assim dizer que o interesse pela cultura do algodão em Portugal, em particular na região do Alentejo, renasceu no princípio do século XXI, através da concretização de iniciativas de I&DE e de natureza empresarial.

No âmbito da reforma intercalar da Política Agrícola Comum (PAC) o sector do algodão foi sujeito a uma integração parcial no regime de pagamento único (RPU). A partir de 1 de Janeiro de 2006, 65% do montante total disponível para o sector ficou afecto ao pagamento único por exploração (ajuda desligada da produção) e os restantes 35% para a ajuda à produção, a conceder por superfície cultivada, e limitada a uma superfície máxima garantida (SMG). Assim, tendo como base o (modesto) histórico do período de referência, Portugal ficou com cerca de 1000 por direito e apenas 357 ha de SMG. Isto é, opções de natureza política, neste caso a reforma intercalar da PAC, determinaram, mais uma vez, o abandono da cultura: em 2006 e 2007, 0 hectares. A História repete-se.


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