Educação sexual, conhecimentos, crenças, atitudes e comportamentos nos
adolescentes
Educação sexual
A Educação sexual é a mais importante forma de prevenção de problemas ligados à
saúde sexual e reprodutiva dos jovens. Constitui um processo contínuo e
permanente de aprendizagem e socialização que abrange a transmissão de
informação e o desenvolvimento de atitudes e competências relacionadas com a
sexualidade humana e, portanto, promove atitudes e comportamentos saudáveis 1-
3. O facto de os jovens terem actualmente muita facilidade em obter informação
não garante que estes escolham informação correcta e consequentemente que as
suas escolhas sejam as mais adequadas, por isso a educação sexual poderá
desempenhar um papel relevante na triagem desta informação, contribuindo para
que seja utilizada da melhor forma 4. A educação sexual não deve cingir-se a
informações sobre os aspectos físicos do acto sexual, é essencial a abordagem
de outros aspectos, como os sentimentos e os afectos 5.
Se considerarmos a educação sexual a principal forma de prevenir comportamentos
de risco, seja promovendo os comportamentos preventivos, seja alterando os
comportamentos iniciais de risco, deve-se ter em conta a) a importância da
aquisição das competências cognitivas e comportamentais necessárias (à
implementação desses determinados comportamentos - ou à capacidade de mudança
desses outros), b) a avaliação da vulnerabilidade ao risco e da motivação para
a mudança e, ainda, c) os factores situacionais que possam intervir na
implementação desse comportamento/mudança, como são as normas sociais, a
pressão dos amigos (grupo de pares) e a influência do parceiro.
Mas a educação sexual, no âmbito da educação para a saúde, implica, também, a
consciencialização do desenvolvimento dos jovens por parte dos agentes
educativos envolvidos (de forma directa ou indirecta), como são as famílias,
escolas, comunidades, instituições, organizações não-governamentais,
autarquias, institutos públicos e particulares, locais de lazer e diversão.
Em Portugal, a implementação da educação sexual nas escolas tem originado, nos
últimos anos, um grande debate.
Em 1978, 1981 e 1984, a questão da despenalização do aborto dividiu a população
portuguesa. Apesar de esta não ter sido aceite nessa altura, esta questão
justificou a primeira legislação sobre educação sexual nas escolas. Contudo, em
1985 a preocupação com a educação sexual voltou a sofrer uma estagnação 6. Em
1997, na sequência da identificação de vários problemas e necessidades não
resolvidos relativamente aos direitos sexuais e reprodutivos da população, a
educação para a sexualidade tornou-se obrigatória. Entre 1995 e 1998, o
Programa de Promoção e Educação para a Saúde e a Associação para o Planeamento
da Família criaram o Projecto "Educação Sexual e Promoção da Saúde nas Escolas
Um Projecto Experimental". Até 2005 pretendeu-se fazer uma generalização
gradual desta experiência nas escolas portuguesas no sentido da integração
regular de projectos e actividades de Educação Sexual nos vários níveis de
ensino 7.
Em 2000, os Ministérios da Educação e da Saúde produziram as linhas
orientadoras da educação sexual em meio escolar 8. Este documento foi crucial
pois apresentou, pela primeira vez, os valores essenciais que deviam (e devem)
orientar a educação sexual escolar em termos de política educativa, bem como os
principais objectivos da mesma, nos domínios dos conhecimentos, das atitudes e
das competências, potenciando a efectiva dinamização da educação sexual em meio
escolar.
Em 2005 foi criado um Grupo de Trabalho de Educação Sexual (GTES) que
determinou que a educação sexual seria abordada no âmbito de um programa de
promoção da saúde. De acordo com as recomendações deste grupo de trabalho, no
relatório final apresentado em 2007, os assuntos a abordar deviam envolver,
entre outros, o entendimento da sexualidade como uma das componentes mais
sensíveis da pessoa, no contexto de um projecto de vida que engloba valores e
uma dimensão ética, a compreensão dos aspectos relacionados com as principais
ISTs (incluindo o VIH/SIDA), a maternidade na adolescência e a interrupção
voluntária da gravidez, assim como aspectos relacionados com o uso de métodos
contraceptivos e preservativo para a prevenção da gravidez na adolescência e
das ISTs, respectivamente.
O Relatório final 3 das actividades deste grupo aponta para a existência de um
número significativo de escolas do ensino básico que já dedicavam uma das novas
áreas curriculares não disciplinares (Formação Cívica, Área de Projecto ou
Estudo Acompanhado) à Educação para a Saúde - e em que a educação sexual está
contemplada - e propõe a avaliação de um conjunto de conteúdos considerados
mínimos. Para facilitar a dinamização da educação sexual em meio escolar, é
proposto que o professor coordenador possa usufruir de uma redução de três
horas na componente lectiva. Mais recentemente o ministério criou legislação
(Lei n.º 60/2009) que estabelece a obrigatoriedade da aplicação da ES em meio
escolar, identificando uma carga horária mínima a ser aplicada a cada nível de
ensino, potenciando, assim, a implementação da mesma.
A promoção da saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes é um importante
contributo para a sua formação pessoal e social, e a sensibilização para a
importância da educação sexual como meio de promoção da saúde nas escolas tem
aumentado significativamente, dando origem à criação de um modelo de
intervenção para as escolas. É essencial que este modelo se desenvolva tendo em
conta as características próprias da adolescência e que se generalize às
escolas de todo o país, permitindo que se consigam obter ganhos na saúde dos
nossos adolescentes.
Estudo HBSC/OMS - Health Behaviour in School-aged Children: o Comportamento
Sexual dos Adolescentes Portugueses em 2006
O estudo dos comportamentos relacionados com a saúde dos adolescentes e dos
factores que influenciam esses comportamentos é essencial para o
desenvolvimento de políticas de educação para a saúde e para programas de
intervenção dirigidos a adolescentes, pais e profissionais na área.
O HBSC/ OMS (Health Behaviour in School-aged Children) é um estudo colaborativo
da Organização Mundial de Saúde, realizado de 4 em 4 anos por uma rede europeia
de profissionais ligados à saúde e educação. Portugal participa neste estudo
desde 1994 através da equipa do Projecto Aventura Social da Faculdade de
Motricidade Humana.
Método
Participantes
Como se pode ver na tabela 1, a amostra do estudo HBSC de 2006, realizado pela
equipa do Projecto Aventura Social, é constituída por 3331 adolescentes, dos
quais 47,4 % são rapazes e 52,6 % raparigas, com uma média de idades de 15 anos
(DP = 1,34). A maioria dos adolescentes é de nacionalidade portuguesa (96,5 %)
e apresenta um baixo estatuto socioeconómico (68 %). No que diz respeito ao ano
de escolaridade, 52,2 % frequentam o 8.º ano e 47,8 % frequentam o 10.º ano e
estão distribuídos proporcionalmente pelas 5 regiões educativas do Continente
(Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo, Algarve). A amostra foi
aleatória e tem representatividade nacional para os jovens que frequentam estes
graus de ensino, no ensino oficial 9.
Tabela 1 ' Características demográficas da amostra (N = 3331)
Medidas
O instrumento de avaliação utilizado no estudo português é o adoptado no estudo
Health Behaviour in School-aged Children 10. Do questionário, que engloba um
vasto conjunto de questões sobre comportamentos e estilos de vida na
adolescência, foram seleccionadas questões relacionadas com aspectos
sociodemográficos, comportamento sexual, e conhecimentos, crenças e atitudes
face ao VIH/SIDA.
Procedimento
A recolha de dados realizou-se em 2006, tendo sido seleccionados os 8.º e 10.º
anos de escolaridade, distribuídos por 136 escolas públicas do ensino regular.
No sentido de se obter uma amostra representativa da população escolar
portuguesa das idades indicadas no protocolo internacional, foram seleccionadas
aleatoriamente escolas da lista nacional do Ministério da Educação,
estratificada por regiões do país (cinco regiões escolares: Norte, Centro,
Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve). De acordo com o protocolo de
aplicação do questionário Health Behaviour in School-aged Children (HBSC), a
técnica de escolha da amostra foi a "cluster sampling" em que o "cluster" ou
unidade de análise foi a turma. A administração dos questionários realizou-se
no contexto da sala de aula. O preenchimento dos questionários foi
supervisionado por um professor, ao qual era dirigida uma carta relativa aos
procedimentos para a sua aplicação. Antes do preenchimento, os alunos foram
informados que a resposta ao questionário era voluntária, confidencial e
anónima. O tempo de preenchimento do questionário situou-se entre os 60 e os 90
minutos.
Resultados
As análises e procedimentos estatísticos foram efectuados através do programa
Statistical Package for Social Sciences (SPSS, versão 18.0) para Windows.
Comportamento sexual
A maioria dos jovens afirma que nunca teve relações sexuais (77,3 %). Dos
jovens que referem ter iniciado a sua vida sexual, 27,4 % são rapazes e 18,6 %
são raparigas (tabela 2).
Tabela_2 - Frequência de relações sexuais - Amostra (N = 3331)
Diferenças entre género para as questões relativas ao comportamento sexual -
Amostra que referiu já ter tido relações sexuais
Observou-se que, do total da amostra, 723 jovens já tinham iniciado a sua vida
sexual. Destes, 71,1 % referem ter tido a sua primeira relação sexual aos 14
anos ou mais tarde; 87,8 % usou contracepção na última relação sexual,
designadamente o preservativo (94,1 %), e a maioria mencionou nunca ter tido
relações sexuais sob o efeito do álcool ou drogas (85,9 %).
Os resultados mostraram que, apesar de, quer a maioria de rapazes (61 %), quer
de raparigas (83,8 %) terem tido a primeira relação sexual aos 14 aos ou mais
tarde, os rapazes (24,6 %) mais frequentemente que as raparigas (12,3 %)
iniciaram entre os 12 e os 13 anos; e as raparigas (83,8 %) mais frequentemente
que os rapazes (61 %) aos 14 anos ou mais tarde.
Quanto à utilização de método contraceptivo na última relação sexual, rapazes
(77,3 %) e raparigas (98,5 %) usaram-no, mas os rapazes (22,7 %) mais
frequentemente que as raparigas (1,5 %) não usaram.
Relativamente à escolha do método contraceptivo na última relação sexual,
rapazes (93,6 %) e raparigas (94,8 %) optaram pelo preservativo. No entanto, as
raparigas (55,1 %) mais frequentemente que os rapazes (36,8 %) optaram pela
pílula e os rapazes (6,5 %) mais frequentemente que as raparigas (0,8 %)
optaram pelo espermicida.
No que diz respeito às relações sexuais associadas ao consumo de álcool ou
drogas, existem mais rapazes (17,1 %) do que raparigas (10,4 %) a referir que
tiveram relações sexuais associadas ao consumo de álcool ou drogas (tabela 3).
Tabela_3 - Diferenças entre género para as questões relativas ao comportamento
sexual - Amostra que referiu já ter tido relações sexuais (N = 723)
Diferenças entre géneros para as questões relativas ao comportamento sexual
Mais de metade dos alunos refere que a maioria dos jovens da sua idade nunca
teve relações sexuais (55,1 %) e que os jovens costumam iniciar a sua vida
sexual com 14 anos ou mais (80,2 %). A maior parte dos adolescentes refere que
quando os jovens têm relações sexuais é o casal que decide quando é a altura
(57,2 %), e que têm relações sexuais porque querem experimentar (53,4 %) e
porque estão apaixonados (49,9 %), que as principais razões para o uso do
preservativo são evitar a gravidez (80,9 %) e a transmissão do VIH/SIDA (73,3
%) mas também de outras IST's (74,6 %). A maioria dos inquiridos refere que se
sentiria à vontade para conversar com o parceiro sobre o uso de preservativo
(75 %), convencer o parceiro a usar preservativo (76,5 %), recusar ter relações
sexuais sem preservativo (69,8 %) e recusar ter relações se não quisesse (75,4
%).
Quando comparados os géneros, constata-se que os rapazes referem mais
frequentemente que os jovens da sua idade não tiveram relações sexuais (58,9 %)
e que têm a primeira relação sexual porque querem experimentar (56,5 %). As
raparigas referem mais frequentemente que quando os jovens têm relações sexuais
decidem os dois quando acham que é a melhor altura (61,2 %), que têm a primeira
relação sexual porque estão muito apaixonados (54,2 %) e porque namoram há
muito tempo (34,1 %).
Quando questionadas sobre as razões para o uso do preservativo, as raparigas
referem mais frequentemente que serve para evitar IST's (78,2 %) e o VIH/SIDA
(74,8 %).
Por outro lado, os rapazes sentem-se mais à vontade para falar com o parceiro
sobre o uso do preservativo (79 %). As raparigas referem que se sentem à
vontade para recusar ter relações sexuais se não quiserem (83 %) e recusar ter
relações sexuais sem o uso do preservativo (76,6 %); no entanto, sentem-se
pouco à vontade para convencer o parceiro a usar o preservativo (12,1 %)
(tabela 4).
Tabela_4- Diferenças entre género para as questões relativas ao comportamento
sexual - Amostra (N = 3331)
Questões relativas à Educação Sexual
Como se pode observar na tabela 5, a maioria dos jovens refere que a educação
sexual serve para ajudar a ter mais informação (81,8 %) e tirar dúvidas (53,9
%). Estes jovens referem que se sentem à vontade para falar de educação sexual
com os amigos (85,4 %) e colegas (69,9 %), e pouco à vontade para falar com os
pais (61,5 %) e professores (73,3 %).
Tabela_5 - Diferenças entre género para as questões relativas à Educação Sexual
- Amostra (N = 3331)
Diferenças entre géneros para as questões relativas à Educação Sexual
As raparigas referem mais frequentemente que a educação sexual serve para ter
mais informação (83,4 %) e tirar dúvidas (59,5 %) do que os rapazes (80,1 % e
47,6 %, respectivamente). Quando questionadas sobre como se sentem a falar de
educação sexual, as raparigas referem mais frequentemente que os rapazes que se
sentem pouco à vontade para falar com os professores (75,3 %) e pais (65,3 %)
(71,1 % e 57,2 %, respectivamente). Os rapazes mencionam mais frequentemente
que as raparigas que se sentem à vontade para falar com os amigos (87,5 %) e
colegas (77,2 %) (83,6 % e 63,4 %, respectivamente).
Questões relativas a conhecimentos, crenças e atitudes face ao VIH
Relativamente aos conhecimentos face ao VIH, a maior parte dos jovens refere
que uma pessoa pode ficar infectada pela partilha de seringas (89,8 %), através
da transmissão mãe/feto (80,2 %), com relações sexuais sem preservativo (86,7
%) e transfusões de sangue (64,6 %). Sabem que uma pessoa aparentemente
saudável pode ser portadora de VIH (78,2 %), que não há transmissão do VIH
através de espirros (62,6 %), abraços (83,6 %), partilha de utensílios para
comer e beber (48,1 %) e que a pílula não previne a transmissão do VIH (67 %).
Quanto às crenças e atitudes face ao VIH, a maioria dos jovens menciona que não
corre risco de estar infectado pelo VIH (57,2 %), que não teve relações sexuais
sem usar preservativo (91,6 %) e não partilhou seringas (98,1 %). Grande parte
dos jovens concorda que deve ser permitido aos jovens infectados com VIH
frequentar a escola (69,3 %), que assistiriam a uma aula ao lado de um colega
com VIH (66,6 %) e que visitariam um amigo com VIH (80,6 %). Discordam que
deixariam de ser amigos de uma pessoa por esta ter VIH (74,5 %) e que as
pessoas com VIH deveriam viver à parte do resto da população (80,8 %).
No que diz respeito às fontes de informação sobre o VIH ou outras IST's, as
mais mencionadas pelos jovens são os programas de televisão (66,3 %), os
folhetos (65,8 %) e a Internet (65,8 %).
Diferenças entre géneros para as questões relativas a conhecimentos, crenças e
atitudes face ao VIH
No que se refere às diferenças entre os géneros, observou-se que as raparigas
apresentam mais conhecimentos, crenças e atitudes positivas face ao VIH, também
referem mais frequentemente que uma pessoa pode ficar infectada pelo VIH se
houver partilha de seringas (92,3 %), através da transmissão via mãe/feto (83,9
%), através de relações sexuais sem o uso do preservativo (91 %), transfusões
de sangue (68,5 %) e que uma pessoa aparentemente saudável pode estar infectada
com o vírus (81,7 %). Também são elas que afirmam mais frequentemente que uma
pessoa não fica infectada se abraçar alguém com VIH (87,2 %), que tomar a
pílula não protege a mulher de ficar infectada (69,2 %), e que não há
transmissão através de tosse ou espirros (65,4 %) nem através de partilha de
utensílios de comer e beber (51,6 %).
As raparigas mencionam mais frequentemente que visitariam um amigo infectado
com o VIH (85,5 %), que deve ser permitido aos jovens com VIH frequentar a
escola (73,8 %) e que eram capazes de assistir a uma aula ao lado de um colega
infectado (72,9 %) e discordam que as pessoas infectadas deveriam viver à parte
na sociedade (85,1 %) e que deixariam de ser amigas de uma pessoa por esta
estar infectada com VIH (81 %).
Relativamente à percepção de risco de infecção com VIH, as raparigas referem
mais frequentemente que não correm riscos (60 %) e que não tiveram relações sem
usar preservativo (93,7 %).
No que diz respeito às fontes de informação sobre o VIH, as raparigas recorrem
mais aos folhetos (71,9 %), aos programas de televisão (69,8 %) e à Internet
(67,7 %) como fontes de informação (tabela 6).
Tabela_6 - Diferenças entre género para as questões relativas a conhecimentos,
crenças e atitudes face ao VIH - Amostra (N = 3331)
Discussão
Os resultados obtidos permitem afirmar que a maioria não é sexualmente activa,
teve a sua primeira relação sexual aos 14 anos ou mais tarde, utilizou o
preservativo como contracepção na última relação sexual e nunca teve relações
sexuais associadas ao consumo de álcool e drogas. Na comparação entre géneros,
verifica-se que existe uma tendência dos rapazes para iniciar a vida sexual
antes das raparigas; são as raparigas quem mais refere ter utilizado
contraceptivos na última relação sexual e existem mais rapazes a referir que
tiveram relações sexuais associadas ao consumo de álcool e drogas (tabelas 2 e
3).
Quando questionados sobre se a maioria dos outros jovens já teve relações
sexuais, a maioria dos jovens considera que os seus pares iniciaram a vida
sexual aos 14 anos de idade ou mais tarde, e são os rapazes que consideram que
os outros jovens iniciaram a vida sexual mais tarde que as raparigas. Mais de
metade dos jovens considera que a decisão de ter relações sexuais cabe aos dois
elementos do casal. Existem mais rapazes do que raparigas que consideram que é
o rapaz que toma a iniciativa. Para a maior parte dos jovens, a primeira
relação sexual surgiu por vontade de experimentar e também porque estavam
apaixonados. Na questão sobre as funções do preservativo, mais de metade dos
jovens escolheu em primeiro lugar a opção "evitar a gravidez". Em segundo lugar
a opção escolhida foi "evitar outras IST" e em terceiro lugar "evitar o VIH/
SIDA". Tabela_4
Relativamente às diversas situações relacionadas com o uso do preservativo,
cerca de metade dos jovens da amostra refere que se sentiria muito à vontade a
conversar com o par sexual sobre o uso de preservativo; a convencer o par
sexual a usar preservativo; a recusar ter relações sexuais sem usar
preservativo se o par não quiser usar; e a recusar ter relações sexuais se não
quiser. Verifica-se que os rapazes sentem mais facilidade em conversar sobre o
uso do preservativo e as raparigas dizem sentir-se mais à vontade em recusar
relações sexuais sem preservativo. No que diz respeito à facilidade em recusar
relações sexuais se não quiser, são as raparigas que referem sentir-se mais à
vontade para o fazer. Tabela_4
Mais de metade dos jovens considera que a educação sexual serve para obter mais
informação. A maior parte dos jovens prefere falar sobre educação sexual com os
amigos e os colegas, mostrando dificuldade em conversar com pais e professores.
No que diz respeito às conversas sobre educação sexual com os amigos, são os
rapazes quem se sente mais à vontade. Quanto às conversas sobre educação sexual
com os pais, são as raparigas quem se sente menos à vontade. No que diz
respeito à facilidade em conversar sobre educação sexual com os professores, a
percentagem de rapazes é significativamente superior à percentagem das
raparigas. Tabela_5
Concluindo, grande parte dos jovens sabe identificar correctamente os modos de
transmissão do VIH. As raparigas têm mais respostas correctas. Quando
questionados sobre as crenças e atitudes face ao VIH/SIDA, a maioria dos jovens
apresenta crenças e atitudes positivas. As raparigas apresentam menos
preconceitos que os rapazes. Tabela_6
Uma das limitações deste estudo é o facto de se reportar a dados recolhidos em
2006. No entanto, é necessário ter em consideração que o mesmo é realizado de 4
e 4 anos, pelo que os dados apresentados são os mais recentes. Espera-se que os
dados recolhidos em 2010 possam vir a acrescentar mais conhecimento ao papel da
educação sexual na evolução dos conhecimentos, crenças, atitudes e
comportamentos nos adolescentes portugueses.
Acresce que não foi objecto de estudo as disparidades socioculturais da
população estudada, apesar da recolha ter sido efectuada em todas as regiões
educativas do Continente.
Comparação dos resultados do estudo do HBSC entre 2002 e 2006
No geral, comparando os resultados de 2002 e 2006 não se verificam alterações
significativas nos principais comportamentos sexuais de risco, ou seja, mantém-
se a média na idade de início das relações sexuais bem como a percentagem de
adolescentes que já iniciou a sua vida sexual.
No entanto, há duas alterações significativas a registar. Por um lado,
verifica-se uma grande diminuição no número dos adolescentes sexualmente
activos que não usam preservativo nas relações sexuais; por outro lado, há uma
diminuição dos conhecimentos dos adolescentes face aos modos de transmissão do
VIH /SIDA.
O primeiro dado - menos adolescentes não usam preservativo nas relações sexuais
- sugere uma melhoria em termos de saúde sexual reprodutiva pois há menos
jovens a indicar esse comportamento de risco. Talvez essa melhoria se deva à
concretização cada vez mais frequente e sistemática da educação sexual, uma vez
que o ministério da educação tem procurado implementá-la através de legislação
e de uma parceria eficaz com o ministério da saúde.Também os professores -
agentes cruciais deste processo - consideram o tema da contracepção e sexo
seguro como um dos mais importantes da educação sexual, e simultaneamente é dos
temas em que se sentem mais confortáveis para abordar, potenciando deste modo a
probabilidade deste tema ser abordado 11.
Quanto ao segundo dado - diminuição dos conhecimentos dos adolescentes face aos
modos de transmissão do VIH/ SIDA - este parece sugerir um retrocesso em termos
de saúde sexual reprodutiva. Este tópico refere-se não só ao uso do
preservativo em todas as relações sexuais (questão que suscitou menos dúvidas
aos respondentes) mas, também, a outros meios de transmissão, como a partilha
de seringas e a transmissão vertical.Para além de avaliar os conhecimentos
correctos, também questiona crenças como a tosse, os espirros e os abraços
poderem ou não facilitar a transmissão do VIH/SIDA, ou se a toma da pílula
contraceptiva protege a mulher de infecção, por exemplo. Também em relação a
este tópico os professores apontam grande importância e referem sentir-se
confortáveis 11, pelo que pode ter sido feito igual investimento em termos de
educação sexual. Apesar disso, reflecte um retrocesso em termos de saúde sexual
reprodutiva porquanto é comummente aceite pela comunidade científica que quanto
mais conhecimentos em relação aos comportamentos sexuais de risco, maior a
probabilidade de um indivíduo ter atitudes e comportamentos sexuais
preventivos. Contudo, no caso do VIH/SIDA em particular, alguns autores têm
avançado a explicação de que se está a generalizar a crença de que o
preservativo resolve tudo e que o seu uso não requer mais informações,
aceitando-se que seja esta a explicação da diminuição dos conhecimentos dos
adolescentes desta amostra face aos modos de transmissão do VIH/SIDA,
especialmente porque a maioria não usa substância injectáveis nem está grávida.
Quanto à atitude de discriminação face a portadores de VIH e SIDA, esta parece
aumentar em 2006, confirmando a associação, já encontrada em 2002, entre
ignorância e discriminação.
Quanto às fontes de informação sobre sexualidade e VIH/SIDA, destacamos um
aumento significativo dos utilizadores das informações encontradas na Internet.
Este aumento pode ser encarado como evidência da massificação desta (nova)
forma de difusão de informação, sendo essencial que se assegure que os jovens
sabem identificar a informação correcta.
Analisando os resultados deste estudo nacional, verificamos que existem
múltiplos factores de risco e protecção, que determinam os comportamentos
sexuais de risco dos adolescentes. São vários os autores que referem a
necessidade de realizar a prevenção dos comportamentos sexuais de risco o mais
cedo possível, uma vez que vários estudos mostram que o envolvimento em
comportamentos de risco aumenta com a idade 12,13.
Conclusão
A educação sexual é um processo contínuo e permanente de aprendizagem que
abrange a transmissão de informação e o desenvolvimento de atitudes e
comportamentos saudáveis 13. Enquanto processo de aprendizagem, a educação
sexual começa na infância, em família, mas uma vez que os jovens passam um
tempo significativo na escola, esta constitui-se como um lugar privilegiado
para a sua concretização.
Assim, envolver os pais e os professores poderá ser determinante na protecção
para o envolvimento em comportamentos sexuais de risco, uma vez que estes
constituem elementos fundamentais na vida dos adolescentes.
Relativamente aos pais, alguns estudos sugerem que muitos pais mencionam
precisar de ajuda, quando se trata de falar sobre sexualidade, pois não sabem o
que dizer 14; outros pais admitem não ter muitos conhecimentos teóricos sobre
este tipo de assunto 15.
No que diz respeito à influência da escola, estudos realizados com professores
do ensino básico e secundário 11,16 mostraram que a maior parte dos professores
(cerca de 72 %) referiu não ter prática em educação sexual em meio escolar,
apesar de considerarem que possuem conhecimentos e atitudes favoráveis à mesma,
formação complementar na área e um grau de conforto aceitável para dinamizarem
actividades. Um resultado extremamente relevante nestes dois estudos refere-se
ao facto de apenas uma percentagem inferior a um terço dos professores
avaliados relatar ter intenção de se envolver na educação sexual no futuro,
sugerindo a necessidade de se reavaliar as condições necessárias à
implementação de programas de educação sexual em meio escolar no nosso país.
Também os pares são identificados como muito influentes. Os estudos referem que
os amigos determinam as escolhas dos adolescentes no que diz respeito ao
comportamento sexual, à contracepção e ao uso do preservativo 17. Também a
percepção da idade de início das relações sexuais dos pares pode ser um factor
importante a ter em conta, dada a influência da percepção do comportamento dos
outros.
Sendo assim, é indispensável que sejam criadas condições para uma maior
implicação das famílias na educação e relação com a escola, que os professores
aumentem o seu campo de competências e, especialmente, de intervenção, e que os
amigos tenham mais informação e comportamentos preventivos. Deste modo, a
realização de cursos de sensibilização para pais, de cursos de formação para
professores e formação interpares pode ajudar a aumentar o campo de intervenção
e, consequentemente, a promover a mudança. A disponibilização, na comunidade,
de Gabinetes de Esclarecimento, com abrangência em vários locais (como as
escolas), constituídos por equipas multidisciplinares, com recurso às
tecnologias mais recentes (principalmente a Internet), pode ajudar a
implementação de campanhas de prevenção para o esclarecimento e orientação dos
jovens, nomeadamente facultando informação sobre os métodos contraceptivos,
entregando gratuitamente preservativos e pílulas.
As intervenções têm de ter uma abordagem sistémica e, portanto, devem abarcar
os diferentes contextos de vida do adolescente, tal como tem sido proposto
recentemente 1-3, em especial nas quatro áreas da saúde consideradas
prioritárias, que incluem a prevenção dos comportamentos sexuais de risco e das
IST's, VIH e SIDA.
Ao delinear possíveis intervenções, alguns autores apontam como estratégias
relevantes para o aumento da felicidade dos indivíduos e da percepção de
satisfação de vida a participação social activa, o aumento do número de
acontecimentos agradáveis na vida diária e o foco da atenção nos aspectos
agradáveis das vivências. Mais do que o número ou a variedade de actividades
agradáveis, é fundamental prevenir e acompanhar o adolescente; ajudá-lo a
descobrir-se, a conhecer-se e a comunicar; dotá-lo de competências para avaliar
o seu próprio desenvolvimento, os acontecimentos de vida, o contexto, a
sociedade e o mundo; trabalhar os seus recursos pessoais para lidar com os
desafios de uma existência indutora de stress; envolvê-lo em comunidades que o
integre, sejam criativas e promovam a saúde; despertar-lhe horizontes e ideais
de vida; acompanhá-lo nas opções e reflexões de vida; e desenvolver a sua
responsabilidade e solidariedade para com a comunidade.
É ainda importante o reforço da autonomia, responsabilização e participação
social do adolescente e da importância destes factores na promoção da sua
saúde.
O grande desafio para pais e professores é estar presente, estar atento, mas
actuar responsabilizando, dando e exigindo, facilitando as tomadas de decisão,
promovendo uma reflexão pessoal sobre a vida, expectativas de futuro e opções
de vida associadas ao bem-estar.
Parece igualmente importante considerar aspectos determinantes, como são as
diferenças a nível de grupo relativamente a crenças e valores, conhecimentos,
necessidades utilitárias e afectivas, que poderão, por sua vez, constituir o
resultado de diferentes processos desenvolvimentais, educacionais, culturais e
sociais e nesse sentido a intervenção tem de ser também mais específica para
não excluir esses grupos.
Sendo assim, é crucial que a educação sexual incida em intervenções do tipo
preventivo de carácter universal, abrangendo toda a população escolar e
respectivos contextos de vida: escola, família e grupo de pares; mas também
intervenções mais específicas em pequenos subgrupos identificados como
prioritários.
Neste momento decisivo é urgente a aplicação daslições retiradas dos estudos à
vida real, que se espera longa e feliz dos jovens portugueses.