Caso endoscópico
Uma menina com oito anos de idade foi observada na consulta de
Gastroenterologia Pediátrica para onde foi enviada pelo seu pediatra assistente
para rastreio de polipose familiar.
A Joana nasceu no final de gravidez de 30 semanas mal vigiada, após ruptura
prematura de membranas secundária a uma amniotite, com 1500 g de peso e com
índice de Apgar 4/8. Desenvolveu-se adequadamente nos primeiros dias de vida, o
seu rastreio séptico foi negativo, iniciou alimentação oral no segundo dia de
vida com boa tolerância.
Nos seus antecedentes familiares havia a salientar polipose intestinal na
família da mãe, com atingimento conhecido de quatro gerações e com prodomínio
do sexo feminino.
A criança estava clinicamente bem, sem sintomas digestivos. Apresentava, ao
exame objectivo, pigmentação melânica, em pequenas manchas de 3 a 5 mm, nas
conjuntivas, na mucosa labial e bucal, bem como na face palmar da parte distal
dos dedos das mãos. O exame abdominal era normal e tinha evolução estaturo-
ponderal no percentil 5.
O seu estudo analítico, hemograma, função hepática e renal e exame sumário de
urina eram normais e o exame ecográfico do abdómen não revelou quaisquer
alterações.
Tendo em consideração estes elementos, decidimos realizar exame endoscópico do
intestino delgado através do uso de cápsula endoscópica, que nos permitiu
observar as imagens que mostramos.
Recorrendo apenas a esta pequena informação, qual o diagnóstico que lhe parece
mais provável?
1 ' Polipose cólica familiar
2 ' Quadro de hiperplasia linfóide nodular
3 ' Polipose juvenil
4 ' Polipose hamartomatosa integrada no sindroma Peutz-Jeghers
COMENTÁRIOS
A história apresentada refere-se a uma criança de 8 anos que nasceu prematura e
tem desenvolvimento no percentil 5 mas que não apresenta qualquer
sintomatologia clínica. O seu exame objectivo evidencia pigmentação melânica
com localização não habitual e que frequentemente se associa a quadro de
polipose intestinal constituída por pólipos hamartomatosos e que tem como forma
de apresentação clínica mais frequente o quadro de oclusão ou suboclusão
intestinal. Acresce referir história familiar já longa de polipose. Este
conjunto de aspectos sugere estarmos perante um caso de sindroma de Peutz-
Jeghers, polipose familiar resultante de deleção do geneMKB1 com uma incidência
de 1/200000. Este poderá apresentar, já nesta idade, desenvolvimento de pólipos
intestinais, tendo 40% das crianças atingidas necessidade de cirurgia por
oclusão intestinal.
Decidimos efectuar o estudo com a cápsula para rastreio. Apresentamos as
imagens que recolhidas durante a realização do exame (figuras 1 e 2), que
mostram efectivamente diversas formações polipóides com o aspecto
característico dos pólipos hamartomatosos, apenas observadas no intestino
delgado e mais frequente na porção terminal. Não se verificou qualquer
dificuldade na progressão da cápsula ao longo do intestino delgado e não foram
observados pólipos na cavidade gástrica nem ao nível do duodeno. Tendo em
consideração a idade da doente, o facto de se encontrar sem sintomas e a
pequena dimensão dos pólipos observados, foi programa vigilância anual.
Figura 1
Figura 2