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EuPTCVHe0872-07542012000300005

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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Sequestro Vascular Intralobar: apresentação no primeiro ano de vida

INTRODUÇÃO O sequestro pulmonar é uma anomalia congénita rara, integrada no espectro de malformação broncopulmonares, cor-respondendo a 0,15-6,4% de todas as malformações (1,2,3). É ca­racterizado por uma massa de tecido pulmonar não funcionante que recebe a sua vascularização através de uma artéria sistémi­ca e não tem comunicação com a árvore traqueobrônquica(1,2). A localização mais frequente é nos segmentos basais medial ou posterior do lobo inferior esquerdo (LIE) (4). A etiologia dos sequestros pulmonares tem sido objecto de discussão.

A teoria mais amplamente aceite sugere que resulta da formação de um esboço pulmonar acessório em posição caudal com os esboços pulmonares normais, o que acontecerá entre a quarta e oitava semanas de gestação (5).

Tendo por base a relação com a pleura, são divididos em sequestros extralobares e intralobares. Os sequestros intralo­bares são os mais comuns e a malformação encontra-se incor­porada no parênquima pulmonar normal e recoberta por pleura visceral.

Os sequestros extralobares constituem 25% de todos os sequestros pulmonares.

Localizam-se exteriormente à pleura vis­ceral, acima do diafragma e em mais de 60% dos pacientes co­existem outras anomalias congénitas. São mais frequentemente diagnosticados no período neonatal, podendo ainda ser detecta­das através de ecografia realizada durante a gestação(2,5,6).

Nas duas formas de sequestro a vascularização arterial provém da circulação sistémica, mais frequentemente da aorta descendente. A drenagem venosa é, no caso dos sequestros in­tralobares para o território pulmonar e, no caso dos sequestros extralobares, para uma veia sistémica (ázigos, hemiázigos ou veia cava inferior) (2,3).

A história natural dos sequestros intralobares é variável. Raramente se manifestam clinicamente antes dos dois anos de idade. Apresentam-se sob a forma de pneumonia crónica ou re­corrente na criança e adolescente (2,3,6). Metade dos casos atinge os 20 anos de idade antes que o diagnóstico seja estabelecido (6). O diagnóstico preciso requer um elevado índice de suspeição associado à visualização de uma artéria sistémica anómala. O tratamento consiste na ressecção cirúrgica.

Descrevemos o caso clínico de um sequestro intralobar com apresentação sob a forma de insuficiência cardíaca con­gestiva nos primeiros meses de vida.

CASO CLÍNICO Lactente do sexo masculino, filho de pais consanguíneos (etnia cigana). A gestação foi de 36 semanas, sem intercorrên­cias e com ecografias pré-natais normais. As serologias mater­nas para grupo TORCH, VIH, e AgHBs não indicavam infecção activa. O parto foi eutócico, hospitalar, com Apgar de 9/10 ao e respectivamente e com uma somatometria adequada à idade gestacional. O período neonatal decorreu sem intercorrências.

Aos dois meses de idade foi referenciado à consulta de Cardiologia Pediátrica por apresentar um sopro cardíaco.

Ao exame objectivo apresentava um aspecto emagreci­do (peso=3400gr, P<5), palidez cutânea, fácies incaracterístico. SpO2 em ar ambiente de 100%, FC 156bpm, TA 60/37mmHg. Apresentava sinais de dificuldade respiratória ligeira com tiragem subcostal e polipneia; sem cianose. Na auscultação pulmonar os sons respiratórios eram presentes bilateralmente, sem ruídos ad­ventícios; auscultação cardíaca com S1 e S2 presentes e rítmicos e um sopro sistólico grau III/VI mais audível no bordo esternal es­querdo com irradiação para todo o precórdio. O bordo hepático era palpável 3cm abaixo do rebordo costal na linha médio clavicular direita. Os pulsos femorais eram normais e simétricos.

A radiografia de tórax (Figura 1) revelou cardiomegalia com hipervascularização pulmonar, associado à presença de uma hi­potransparência parahilar com extensão à região retrocardíaca esquerda. No ECG apresentava taquicardia sinusal. O ecocar­diograma bidimensional/Doppler (Figura 2) mostrava a presença de foramenoval patente, septo interventricular intacto, cavidades esquerdas dilatadas, função biventricular normal, válvulas aurícu­lo ventriculares e sigmoideias normais. Na parte média da aorta descendente torácica observava-se um vaso anómalo, que emer­gia da aorta para um circuito de baixa resistência com shunt con­tínuo, laminar compatível com colateral aorta-artéria pulmonar.

Figura 1 Radiografia de tórax antero-posterior. Cardiomegalia com hipervascularização pulmonar, associado à presença de uma hipotranspa­rência parahilar com extensão à região retrocardíaca esquerda.

Figura 2 Ecocardiograma. (a) Plano para esternal quatro câmaras: dilatação da aurícula e ventrículo esquerdo. (b) Plano supraesternal a nível do arco aórtico: vaso anómalo (seta), que emerge da aorta (Ao) para um circuito de baixa resistência com shunt contínuo laminar compatível com colateral aorta- artéria pulmonar. AE, aurícula esquerda; VE, ventrículo esquerdo; AD, aurícula direita; VD, ventrículo direito.

Foi medicado com terapêutica anticongestiva (diurético) tendo tido resposta clínica favorável.

O cateterismo cardíaco (Figura 3) realizado aos sete meses de idade confirmou a presença de colateral com 7mm de diâme­tro, com origem na porção inferior da aorta torácica, dirigindo-se para o LIE com drenagem para a aurícula esquerda (circulação venosa pulmonar). A arteriografia pulmonar (Figura 4) mostrou irrigação muito escassa para o parênquima pulmonar do LIE. Os aspectos descritos confirmaram o diagnóstico de sequestro pul­monar.

Figura 3 Angiografia na aorta descendente. Presença de colateral com 7mm de diâmetro, com origem na porção inferior da aorta torácica, dirigindo-se para o lobo pulmonar inferior esquerdo.

Figura 4 Arteriografia pulmonar. Irrigação muito escassa para o parên­quima pulmonar do lobo inferior esquerdo.

Aos sete meses e meio foi submetido a laqueação da cola­teral e lobectomia do LIE por toracotomia. A cirurgia e o período pós-operatório decorreram sem intercorrências, tendo tido alta ao sexto dia. Actualmente, com 14 meses de idade encontra-se assintomático e sem necessidade de terapêutica cardiovascular.

DISCUSSÃO O sequestro pulmonar é uma malformação congénita rara, caracterizando-se por uma massa de tecido pulmonar não fun­cionante, que recebe a sua vascularização arterial da aorta descendente. A drenagem venosa é feita através das veias pul­monares para a aurícula e ventrículo esquerdos. Deste modo, ocorre um shunt esquerdo-direito, que dependendo do calibre do vaso anómalo, poderá causar uma sobrecarga de volume nestas câmaras, cursando com dilatação e insuficiência (9,10).

Radiograficamente podem-se apresentar sob a forma de hi­potransparência homogénea com margens irregulares, ou sob a forma de uma massa uniforme com contornos lisos ou lobulados, localizada no segmento posterior do lobo inferior esquerdo. No entanto, pode ser de difícil visualização na radiografia de tórax.

O Ecocardiograma com Doppler aumenta a acuidade diag­nóstica, ao identificar ou elevar o grau de suspeição para a pre­sença de uma artéria de vascularização do sequestro com ori­gem sistémica, frequentemente a aorta torácica (2).

A angio-TC não foi realizada no caso clínico apresentado, mas reveste-se de grande importância para orientação diagnós­tica através da visualização das alterações do parênquima pul­monar e identificação do vaso arterial anómalo, auxiliando na planificação do tratamento cirúrgico. O cateterismo cardíaco com angiografia é um método de diagnóstico tradicional, que suporta o diagnóstico permitindo igualmente a planificação cirúrgica (1,7).

A terapêutica dos casos sintomáticos consiste na ressec­ção cirúrgica precoce de forma a controlar os sintomas e evi­tar as complicações (1). A lobectomia, ao contrário da ressecção segmentar, é o tratamento de eleição, e a identificação e laque­ação do vaso anómalo torna-se parte fundamental do procedi­mento. Deste modo, a ressecção pulmonar em combinação com a oclusão do vaso, são cruciais para o tratamento definitivo de um quadro de insuficiência cardíaca resultante do sequestro intralobar(2).

CONCLUSÃO O sequestro pulmonar intralobar é uma patologia congénita rara, com uma apresentação clínica pouco frequente no primeiro ano de vida. Acresce o facto de a forma de apresentação mais frequente ser a infecção pulmonar de repetição.

Neste caso clíni­co pretendemos realçar a necessidade um elevado grau de sus­peição perante uma criança com quadro clínico de insuficiência cardíaca congestiva, sem anomalias estruturais intracardíacas.


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