Da Classificação de Viena para a Nova Classificação de Montreal
Da Classificação de Viena para a Nova Classificação de Montreal
From the Classification of Vienna to the New Classification of Montreal
Fernando Magro
Serviço de Gastrenterologia Hospital de São João e Instituto de Farmacologia e
Terapêutica, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto. E-mail:
fm@med.up.pt.
A estruturação das doenças em geral, e da doença de Crohn(DC) em particular, é
fulcral ao permitir a classificação apropriada dos doentes em grupos bem
definidos, possibilitando a inclusão homogénea de doentes em ensaios clínicos e
estudos comparativos.
Em 1998, em Viena, um grupo internacional classificou a DC de acordo com a
idade à data de diagnóstico (A), localização da doença no trato digestivo (L) e
comportamento clínico (B)2. Posteriormente, em 2005, esta classificação foi
revista, permitindo uma classificação fenotípica mais precisa3,4. O que trouxe
de novo a classificação de Montreal: 1) Individualização dum grupo pediátrico
(idade de 16 anos), 2) Envolvimento não restritivo do tracto digestivo superior
(TDS - L4), 3) individualização da doença penetrante anal da doença penetrante
abdominal e 4) definição temporal para classificação apropriada do
comportamento (5 anos).
Esta estratificação revelou-se mais adequada uma vez que o grupo pediátrico
caracteriza-se por serótipos e genótipos próprios4, são mais dependentes dos
corticosteróides, necessitam de mais imunossupressores5,6 e têm uma maior
prevalência de manifestações extra-intestinais5. Em oposição, os doentes com um
diagnóstico com idade superior a 40 anos são menos corticodependentes e
consequentemente necessitam de menos imunossupressores e terapêutica
biológica7. Com o reconhecimento da importância da idade no diagnóstico e
sabendo que a localização da DC varia minimamente no decurso da doença esta
classificação criou grupos mais apropriados, com possíveis implicações
prognósticas.
O grupo de trabalho da classificação de Viena classificou como L4 7% dos
doentes, contudo no estudo efectuado em Portugal5só 1% tinham envolvimento
exclusivo do TDS, estando em concordância com o estudo de Freeman et al8
(0,8%). A implicação desta alteração é de relevo uma vez que os doentes mantêm
a classificação prévia de localização ileal (L1), cólica (L2) e ileocólica
(L3), com os pressupostos inerentes, e a esta é acrescida a extensão ao TDS
(ex: L1 + L4). Esta nova estruturação vai de encontro com as recomendações da
European Crohn's and Colitis Organization(ECCO)9 que individualiza o
envolvimento do TDS como uma entidade associada a pior prognóstico,
beneficiando duma intervenção terapêutica precoce com imunomodulares.
O comportamento clínico da DC, ao contrário da localização, sofre flutuações
temporais em que cerca de 90% dos doentes com vinte ou mais anos de evolução
progridem para formas mais graves (estenoses e acontecimentos
penetrantes)11,12, necessitando, por conseguinte, dum tempo mínimo para
classificação ' 5 anos. Acresce o facto, de a doença penetrante anal (fistulas
e abcessos) ter sido incluída no grupo penetrante (B3), na classificação de
Viena, e existir evidência que esta doença (penetrante anal) não está
necessariamente associada com doença penetrante abdominal11. No estudo
Português5 4% dos doentes tinham atingimento anal isolado, sem nenhum evento
penetrante abdominal.
Fruto desta estruturação e planificação, reconhecemos, hoje, grupos de pior
prognóstico como: 1) Diagnóstico anterior a 40 anos, 2) necessidade de
corticosteróides aquando do diagnóstico, 3) existência de doença anal e 4)
doença estenosante com emagrecimento associado.
O artigo Da classificação de Viena para a nova classificação de Montreal:
caracterização fenotípica e evolução clínica da Doença de Crohn de Ana Rebelo
e colaboradores, publicado no GE1, contem alguns dos mais relevantes aspectos
da classificação de Montreal: 1) A localização da doença permaneceu estável, 2)
O comportamento clínico teve oscilações temporais (3 e 5 anos), 3) A
reclassificação maior foi constatada no grupo penetrante (14,8% dos doentes),
4) divergência clara entre as classificações no respeitante à cirurgia
abdominal (85% em Montreal para B3 e 64% para a Classificação de Viena). Em
resumo, maior valor preditivo da classificação de Montreal em relação a um
endpointcada vez mais valorizado ' cirurgia abdominal.