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EuPTCVHe0874-02832012000200011

EuPTCVHe0874-02832012000200011

variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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O valor dos cuidados de enfermagem: a consulta de enfermagem no homem submetido a prostatectomia radical

Introdução Nas últimas quatro décadas o cancro da próstata tornou-se numa grande complicação de saúde pública nas sociedades ocidentais. Indiscutivelmente, estamos perante um verdadeiro problema de saúde pública, sendo que atualmente o grande desafio é o diagnóstico precoce. O objetivo é assim a deteção numa fase inicial, na qual a doença se encontra confinada ao órgão, sendo portanto a probabilidade de cura substancialmente maior.

Claramente, constata-se que o carcinoma da próstata é, ainda, um tema pouco abordado pelos enfermeiros e, consequentemente, poucas vezes focado nas revistas da especialidade (Cardoso, Pereira e Borges, 2002, p. 60), o que conduz à necessidade do estudo do fenómeno de transição dos homens portadores de carcinoma da próstata submetidos a prostatectomia radical, considerando todas as potenciais mudanças provocadas pela doença e tratamento na vida da pessoa e família.

A Teoria das transições (Meleis et al., 2000) foi indispensável para se conhecer como é experienciado o processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical, questão essa que se tornou na pergunta de partida que conduziu toda a investigação. A investigação teve assim como finalidade conhecer o processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical, com o objetivo de descrever o processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical; compreender as necessidades do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical; descrever os recursos mobilizados pelo homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical e conhecer a perspetiva sobre o papel do enfermeiro do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical.

Assim sendo, com este artigo ambiciona-se, para de proporcionar uma visão geral de toda a investigação, focar a necessidade da implementação da Consulta de Enfermagem (que se encontra em curso) no pré e pós-operatório da prostatectomia radical, tal como foi relatado pelos participantes, bem como expor alguns conteúdos de materialização prática da mesma, consubstanciando a importância da Consulta de Enfermagem no contexto do valor dos cuidados de Enfermagem.

Enquadramento teórico O cancro é talvez a patologia mais temível do mundo atual. Para de um fator de mortalidade acentuado, carrega consigo uma componente de angústia e desespero, mesmo quando é potencialmente curável (Matos e Pereira, 2005). Neste sentido, o carcinoma da próstata é hoje consensualmente reconhecido como um dos maiores problemas de saúde a atingir a população masculina.

A próstata é o órgão masculino mais frequentemente atingido por neoplasias benignas ou malignas (Presti, 2007). Em termos epidemiológicos, a incidência do cancro da próstata tem aumentado rapidamente em muitas regiões do mundo e a mortalidade também se tem acumulado, todavia, de forma menos expressiva. Este é o tipo de cancro mais frequente no que concerne a órgãos internos, com cerca de 4000 novos casos por ano e aproximadamente 1800 mortes anuais em Portugal, com base nos dados do IARC (The International Agency for Research on Cancer) de 2002 (Barroso et al., 2010). Em termos nacionais, segundo a mesma fonte, o cancro da próstata é responsável por cerca de 10% da mortalidade por cancro, figurando como a segunda causa de morte por cancro no homem, logo depois do cancro do pulmão. Paralelamente, o cancro da próstata representa 11% de todos os carcinomas no sexo masculino e contribui com 9% das mortes por neoplasia na União Europeia (Reis et al., 2006).

A prostatectomia radical é um dos procedimentos mais indicados para o tratamento do carcinoma da próstata localizado, proporcionando uma sobrevida global e livre de doença aos 10 anos, de cerca de 90% (Rodríguez et al., 2006).

Atualmente, é declarado como o método curativo mais eficaz desta doença, quando limitada ao órgão, contudo, não é isento de complicações, que passam principalmente pela estenose vesico-uretral, incontinência urinária e disfunção erétil.

A Enfermagem, como disciplina, assegura a necessidade de compreender, estudar e investigar a pessoa na sua globalidade, considerando a sua dimensão biológica, psicológica, social e cultural de forma integrada e interativa. Para a investigação, o conceito de transição foi fundamental, sendo que de acordo com Meleis (2005) assistir o indivíduo, a família ou a comunidade a lidar com as transições que afetam a sua saúde surge como um desafio para os enfermeiros, antes, durante e após um evento produtor de mudança. Apesar de todas as transições implicarem uma mudança, nem todas as mudanças podem ser consideradas uma transição, que é uma passagem ou movimento de um estado, condição ou lugar para outro (Meleis et al., 2000). Assim sendo, uma transição ocorre quando a realidade atual é interrompida causando uma mudança forçada ou opcional que resulta na necessidade de construir uma nova realidade (Selder, 1989, cit. por Kralik, Visentin e van Loon, 2006, p. 323). Os acontecimentos que proporcionam modificações nos comportamentos, atividades e papéis de cada indivíduo são então considerados como circunstâncias de transição. Logo, a transição é o movimento e adaptação à mudança em vez do retorno a um estado pré-existente.

Metodologia A pertinência da realização desta investigação deriva da insuficiente sustentação teórica da temática exposta, num contexto em que o carcinoma da próstata é cada vez mais comum, com implicações claras e objetivas na qualidade de vida do indivíduo e família, na tentativa de contribuir para amplificar o conhecimento desta transição, ainda pouco divulgado na literatura.

Com vista a alcançar os desígnios propostos inicialmente optou-se por uma metodologia qualitativa, através de um estudo exploratório e descritivo. Neste sentido, decidiu-se eleger uma metodologia que, mais do que fornecer respostas capazes de predizer ou controlar o comportamento humano, concorra, através da riqueza e variedade de informação para uma visão compreensiva da própria realidade. Para isso tornou-se determinante a seleção de uma abordagem qualitativa, uma vez que a finalidade da investigação extensiva é fornecer uma visão da realidade mais importante para os participantes do estudo do que para os investigadores (Streubert e Carpenter, 2002, p. 18). Assim, observa-se que o poder e riqueza da pesquisa qualitativa estão na fertilidade da descrição e detalhes de experiências singulares, processos sociais, culturas e narrativas.

Concomitantemente, é uma investigação de caráter descritivo e exploratório, que visa denominar, classificar e descrever uma população ou conceptualizar uma situação. no que concerne ao seguimento da investigação, esta rotula-se como transversal na medida em que a recolha de dados foi executada num momento exclusivo, através da entrevista, sem contemplar a relação temporal entre os fatores estudados. O tipo de estudo foi perspetivado com o intento de explorar domínios desconhecidos, contribuindo, deste modo, para a compreensão da realidade.

Todos os tipos de investigação se baseiam na formulação de perguntas efetivas (Strauss e Corbin, 2008). Logo, a pergunta emerge do fenómeno de interesse e corresponde ao que o investigador quer saber acerca do mesmo, ou seja, a pergunta delimita e clarifica o fenómeno a ser investigado, elucidando o que o investigador quer conhecer acerca do assunto. Delinearam-se quatro grandes questões de investigação que derivaram diretamente dos quatro objetivos definidos inicialmente, ou seja, foram projetadas as questões a partir do conteúdo latente nos objetivos.

Considerando a diversidade dos pontos de vista, bem como da impossibilidade de entrevistar todos os sujeitos, ambicionou-se que a técnica de amostragem fosse capaz de garantir o acesso a fontes com perspetivas diferentes sobre o tema (Bogdan e Biklen, 2010). Deste modo, os participantes foram selecionados tendo por base algumas condições de interesse para os próprios, para o investigador e para o estudo, como: que aceitassem participar no estudo; serem indivíduos do sexo masculino; terem sido submetidos a prostatectomia radical por carcinoma da próstata mais de 2 meses e menos de 12 meses e serem seguidos na consulta externa de urologia do hospital onde decorreu o estudo. Strauss e Corbin (2008) suportam que a amostragem teórica é uma técnica adequada para investigar áreas pouco exploradas como esta.

A entrevista temática ou semiestruturada foi o instrumento de colheita de dados eleito, que proporciona flexibilidade ao pesquisador para conduzir o trabalho e permite que o entrevistado não se afaste do foco da pesquisa e tenha liberdade para se expressar. No estudo, realizaram-se 18 entrevistas temáticas, no período compreendido entre 15 de dezembro de 2009 e 30 de abril de 2010. Os dados emergiram da informação recolhida, através da técnica de análise escolhida para o efeito e de acordo com a natureza e objetivos do estudo.

Considerou-se pertinente usar como técnica de tratamento de dados a análise de conteúdo, que tem por finalidade efetuar inferências com base numa lógica, explanada sobre os discursos, cujas características foram inventariadas e sistematizadas. A partir da análise de conteúdo foi possível extrair o discurso do contexto de produção e, através da inferência, procurar o seu autêntico sentido. O processo de análise foi iniciado com a análise frase a frase, num processo próximo do que Strauss e Corbin (2008) denominam de microanálise, que é uma análise detalhada linha por linha, necessária no começo de um estudo para gerar categorias iniciais (com suas propriedades e suas dimensões) e para sugerir relações entre categorias; uma combinação de codificação aberta e axial (Strauss e Corbin, 2008, p. 65). Fazer microanálise sujeita o analista a ouvir cuidadosamente os discursos, procurando compreender como os participantes interpretam os factos, acautelando que se tirem conclusões teóricas precipitadas. Este processo foi conduzido ao longo do tempo com o auxílio do software informático NVIVO8®. o raciocínio utilizado para a construção deste estudo foi globalmente indutivo, que, a partir da escuta dos participantes, se chegou a aspetos e temas comuns que perspetivam a experiência e fornecem informações importantes sobre o fenómeno.

Por fim, a subordinação e obediência a padrões éticos foram uma preocupação constante e imutável, respeitando-se os direitos dos envolvidos ao longo de todo este estudo.

Resultados e discussão Ao longo de todo o percurso de investigação, descobrir significados para das evidências relatadas pelos participantes, impôs uma reflexão contínua, a partir do questionamento dos dados, que permitiu revelar os fenómenos emergentes, explorar as suas características e descrever o processo, depois de se terem identificado as relações entre os factos, reunindo-os em categorias e subcategorias. Deste modo, num procedimento gradual, com avanços e recuos constantes, os discursos dos participantes desapareceram progressivamente, produzindo uma nova apresentação, consubstanciando-se a partir de seis categorias, seguidamente apresentadas no quadro 1.

Quadro 1 ' Esquema representativo da categorização que emergiu da análise de conteúdo

Considerando os objetivos do artigo, passa-se agora a aclarar de forma mais detalhada a categoria "A perspetiva sobre o papel do Enfermeiro", onde são observados os discursos dos participantes relativamente ao papel do enfermeiro no processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical. Perante todos os pontos críticos, alterações, transformações e adaptações, decorrentes deste processo de transição, o enfermeiro e os cuidados de Enfermagem assumem uma importância central na resposta às necessidades de cuidados destes indivíduos. Depois da análise dos discursos dos participantes surgiu então esta categoria induzida dos relatos dos mesmos que se consubstancia através de duas subcategorias, como se observa no quadro 2.

Quadro 2 ' Esquema representativo da categoria "A perspetiva sobre o papel do Enfermeiro"

A importância da categoria "A perspetiva sobre o papel do Enfermeiro" manifesta-se de forma inequívoca através dos discursos dos participantes, bem como vai ao encontro dos objetivos delineados inicialmente de conhecer a perspetiva sobre o papel do enfermeiro dos homens portadores de carcinoma da próstata submetidos a prostatectomia radical.

A função de educador Nesta categoria os participantes mencionam o papel de educador desenvolvido pelos enfermeiros na sua transição, ilustrando como o fornecimento, ou não, de informação influencia o seu processo de transição, desde a preparação no pré- operatório até às estratégias adaptativas para lidar com as possíveis morbilidades cirúrgicas no pós-operatório. Neste contexto, para Patrão (2005) a informação deve ser concedida de acordo com as carências da pessoa, devendo ser realistas, considerando as capacidades das pessoas, de modo a acautelar problemas potenciais e facilitando um ambiente favorável. Neste processo, o enfermeiro deve considerar o tipo de informação a que as pessoas querem aceder, quais os fatores que possuem maior importância na sua tomada de decisão e como estas interpretam uma qualidade de vida aceitável, para que as decisões sejam tomadas de acordo com os seus objetivos. A informação referente à incontinência urinária e disfunção erétil adota um caráter decisivo, dado o forte impacto que estas colocam na qualidade de vida dos indivíduos. Neste sentido, o enfermeiro deve compreender a diversidade e individualidade das expressões da incontinência urinária e disfunção erétil, assim como a importância relativa das suas dimensões, que se diferenciam ao longo de todo o ciclo vital e de pessoa para pessoa, facultando um acréscimo de conhecimentos e o desenvolvimento de atitudes de aceitação das diferentes formas de ver e viver estes contextos muito particulares. Desta forma, é referido pelos participantes a necessidade dessa informação, que poderia ser materializada através de uma Consulta de Enfermagem, como explicitam nos seus discursos quando questionados acerca da pertinência da mesma.

Era necessário acompanhamento da vossa parte antes e depois, porque nós vimos às escuras, tanto é que eu fiquei sempre de atrás mesmo depois das explicações do médico (E1) ( ) para além de nos instruir muito sobre o que se está a passar connosco, começamos a aprender no dia-a-dia o que fazer [Consulta de Enfermagem]. Era algo que está a fazer falta acho eu (E3) Para os participantes, o provimento de informação acerca do seu estado de saúde e o modo como se desenrolará todo o processo subsequente ao diagnóstico, nomeadamente a cirurgia, bem como o esclarecimento das possíveis consequências da mesma é sem dúvida indispensável. Este processo poderia ser implementado através de uma Consulta de Enfermagem no pré-operatório, que seria muito importante e aprovada pelos participantes, como expõem nos seus discursos.

Pelo menos a pessoa vai com os olhos abertos e a cabeça muito mais leve; fica a saber o que lhe vai acontecer e a partir daí a pessoa tem de se preparar que a vida tem de ser assim e vai mudar a partir de agora [Consulta de Enfermagem pré-operatório]. (E3) Acho que ajuda muito uma consulta antes da cirurgia ajuda muito [Consulta de Enfermagem pré-operatório]. (E15) Concomitantemente, a importância da implementação de uma Consulta de Enfermagem no pós-operatório também é destacada. Aqui, é salientado o papel do enfermeiro no ensino e instrução de estratégias adaptativas para lidarem com a incontinência urinária e disfunção erétil, caso estas tenham sido uma morbilidade cirúrgica. Simultaneamente, os participantes relatam a necessidade de apoio de forma a integrarem estes novos contextos na sua vida, através de um processo adaptativo que se torne mais simples e eficaz.

( ) feita a cirurgia eu acho que o enfermeiro a partir dali deve acompanhar o doente muito melhor melhor que outro profissional porque está sempre connosco e sabe o que sentimos melhor que ninguém [Consulta de Enfermagem pós- operatório]. (E11) A sugestão que eu dava foi aquela que eu falei, acho que devia de haver no pós-operatório uma retaguarda, um apoio do enfermeiro mais efetivo [Consulta de Enfermagem no pós-operatório]. (E12) Santos (2006) refere que os estudos efetuados por Bishop, em 1994, declaram o benefício do suporte dos profissionais de saúde, uma vez que apesar de o suporte emocional familiar ser indispensável, as pessoas doentes esperam dos profissionais um suporte mais de tipo informativo. Posto isto, é extraordinariamente importante que os enfermeiros adotem, na sua prática quotidiana, esta função de educação, não como uma área complementar, mas integrada no cuidar em Enfermagem, onde a educação para a saúde se estabeleça como uma atividade de igual dimensão a qualquer outra realizada (Branco, 2005).

A Consulta de Enfermagem é uma atividade autónoma com base em metodologia científica que permite colocar em prática o processo de Enfermagem. Neste contexto, emerge como um lugar privilegiado para o enfermeiro desenvolver cuidados dirigidos ao homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical e às suas pessoas significativas, uma vez que este é um espaço excecional para incrementar uma postura ativa e autónoma na prestação de cuidados. O fornecimento de informação ajustada, nomeadamente através da Consulta de Enfermagem no pré e pós-operatório, possibilita então minorar as consequências do cancro e dos seus tratamentos, com uma melhor adaptação às mesmas, contribuindo forçosamente para isso a informação fornecida à medida de cada um (Patrão, 2005).

A função de ajuda A presença dos enfermeiros foi analogamente sentida e descrita pelos participantes de forma significativa, valorizando a disponibilidade que lhes foi proporcionada em momentos marcantes, de tristeza e angústia, evidenciando- se o auxílio dos enfermeiros como fundamental para a minimização das suas experiências negativas. Neste contexto, surge a subcategoria "A função de ajuda" enquadrada na categoria "A perspetiva sobre o papel do enfermeiro". Esta função de ajuda é um dos pilares básicos dos cuidados de Enfermagem, sendo recebida e reconhecida pelos participantes como essencial no seu percurso de transição. Assim, os seus discursos espelham esta realidade e a forma como a perspetivam.

Acho que o que os enfermeiros fizeram não vejo que possam fazer mais ajudaram-me imenso e isso foi muito importante para mim. (E9) Tanto no hospital como no centro de saúde senti-me bastante apoiado, foi tudo gente muito competente até mesmo a nível dos conselhos e tudo mais, foi tudo gente tive sorte com as pessoas que me apareceram pela frente e a ajuda que me deram. (E8) Paralelamente, outra dimensão importante foi a satisfação, expressa pelos entrevistados, com os cuidados recebidos. As pessoas ambicionam invariavelmente os melhores cuidados disponíveis, valorizando aspetos como serem cuidados com humanidade, dignidade e respeito, receberem informação clara acerca da sua doença e tratamento e alcançarem suporte técnico e psicológico quando necessitam do mesmo. Neste sentido, os seus discursos vão de encontro a esta realidade, como pode ser observado nos seguintes excertos.

( ) eu acho que fui muito bem tratado, muito bem recebido não tenho nada a dizer ou apontar tudo 5 estrelas. (E16) É assim, os cuidados de Enfermagem que eu tive foram no internamento espetaculares, aliás tive a oportunidade de deixar isso escrito. (E11) A prestação de cuidados de Enfermagem consolidados num processo de relação de ajuda, onde se estabelece uma comunicação autêntica capaz de auxiliar o indivíduo a encontrar outras possibilidades de perceber, aceitar e encarar a sua nova condição, constitui um dos aspetos fundamentais que contribui para o desenvolvimento da confiança necessária, estimulando assim uma interação mais positiva entre o indivíduo, os cuidados de saúde e os seus novos contextos. A função de ajuda foi então destacada pelos participantes como especialmente importante para a facilitação do processo de transição. Segundo Matos e Pereira (2005), o conhecimento atual indica que os níveis de satisfação da pessoa derivam de várias componentes, designadamente dos aspetos afetivos, como o apoio emocional e compreensão; dos aspetos comportamentais, como a prescrição e explicações adequadas e dos aspetos ligados à competência do técnico de saúde, como o encaminhamento apropriado, que foram aspetos identicamente relatados pelos participantes do estudo. Em todo este longo processo de transição, o enfermeiro tem inequivocamente um papel proeminente, uma vez que os conhecimentos que possui na área das ciências da saúde e humanas permitem-lhe compreender e avaliar os resultados das suas intervenções, acompanhando a forma como a pessoa experiencia o seu processo de transição.

A Consulta de Enfermagem A Consulta de Enfermagem, como atividade autónoma baseada em metodologia científica permite ao enfermeiro formular um diagnóstico de enfermagem, realizar um plano de cuidados e respetiva avaliação, assim como a reformulação das intervenções de enfermagem, no sentido de ajudar o indivíduo a atingir a máxima capacidade de autocuidado (Paixão e Valério, 2008). É um espaço onde se tenta obter o maior número de dados, mantendo a pessoa próxima do enfermeiro numa relação onde seja preservada a privacidade, onde se crie empatia, confiança, segurança e onde enfermeiro e doente definam, em conjunto, as estratégias para obtenção dos melhores resultados em saúde (Barcelos, 2005).

A consulta de enfermagem deve ter uma visão holística, captando toda a informação sensível aos cuidados proveniente da pessoa, possibilitando um diagnóstico preciso e um planeamento de cuidados de acordo com as necessidades de cada indivíduo para obtenção de ganhos em saúde. Perante a situação de cada doente, o enfermeiro cumpre um papel essencial na adaptação às limitações provocadas pela doença e tratamento (Medalhas, 2005). Estas consultas possuem o intuito de auxílio à pessoa em transição, utilizando um conjunto de competências que ao serem postas em prática permitem dar visibilidade à forma como o enfermeiro perfila o saber adquirido e o saber vivido (Barcelos, 2005).

Neste contexto, do ponto de vista educacional, o enfermeiro deve adequar o modelo de aprendizagem que mais se adapta ao doente, respeitando as necessidades e expectativas do mesmo em relação ao tratamento (Medalhas, 2005).

O enfermeiro tem igualmente um papel fundamental na melhoria da qualidade de vida do doente e por isso deve desenvolver competências para ajudar o doente a aceitar o tratamento e aderir com segurança ao plano de cuidados delineados, envolvendo-o no mesmo. Paralelamente, deve alargar o seu campo de competência, que ultrapassa a mera realização de técnicas segundo prescrição médica, que estas têm fundamento se forem inseridas na relação do conhecimento da pessoa a cuidar como base dos cuidados prestados (Medalhas, 2005). Deste modo, na Consulta de Enfermagem é indispensável propiciar momentos para que o doente verbalize os seus receios e problemas, procurando saber como o doente está a encarar a situação de doença, de forma a encontrar mecanismos de apoio e outros recursos que ajudem o indivíduo e a família a ultrapassar o momento delicado (Medalhas, 2005). Este é inequivocamente um grande desafio, tornando o indivíduo num sujeito ativo na estimulação das suas aptidões de forma a ultrapassar saudavelmente o seu processo de transição. Pela experiência empírica e profissional dos investigadores, suportada e baseada na evidência dos dados decorrentes do estudo de investigação patentes anteriormente, nomeadamente os relatos dos participantes, é notória a necessidade da implementação da Consulta de Enfermagem no pré e pós-operatório, bem como as suas vantagens e acréscimo ao valor dos cuidados de Enfermagem prestados, considerando o lugar privilegiado de intervenção autónoma e personalizada proporcionada pela Consulta de Enfermagem. Assim sendo, torna-se claro pelos relatos dos participantes neste estudo de investigação a necessidade de implementação da consulta e a figura central ocupada pelo enfermeiro neste contexto. Posto isto, a Consulta de Enfermagem no pré-operatório materializa-se através de uma adequada avaliação inicial, fornecimento de material informativo, preparação de todo o perioperatório e provimento de um contacto para esclarecimento de dúvidas. a Consulta de Enfermagem, no pós-operatório, passa pela promoção da adaptação do indivíduo/pessoa significativa a uma nova condição de saúde e pela readaptação funcional e psicossocial, considerando o novo contexto de saúde da pessoa.

Conclusão Investigar o processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical e analisar a pertinência da Consulta de Enfermagem pré e pós-operatória foi-se tornando cada vez mais clara com o decurso do estudo. É essencial para a prática da Enfermagem conhecer como o indivíduo experiencia esta transição, quais os recursos utilizados e as suas necessidades, e a sua perspetiva sobre o papel do enfermeiro nesta transição, de modo a desenvolver-se uma intervenção assertiva e eficaz por parte do enfermeiro.

Com a realização da investigação constatou-se que esta temática é pouco desenvolvida em estudos de investigação, nomeadamente em Enfermagem, o que consolida ainda mais a sua oportunidade, pertinência e atualidade.

Paralelamente, ocorreram ocasionalmente também dificuldades na análise de dados de um fenómeno tão complexo como a transição. A realização de um estudo transversal correspondeu assertivamente aos objetivos do mesmo, sendo que porventura um estudo longitudinal poderia permitir aclarar mais aprofundadamente alguns aspetos na sua relação temporal. Porém, não era possível a execução de um estudo dessa ordem neste contexto, o que não impede a sua produção futura.

O cancro é pela sua importância mediática e pelos efeitos nefastos que provoca, uma das doenças crónicas mais temidas e com maior impacto ao nível biopsicossocial. O seu passado de doença fatal e o seu presente dominado pela exuberância dos tratamentos e efeitos colaterais, conjuntamente com a imprevisibilidade que a caracteriza, contribuem para a sua conotação social verdadeiramente negativa.

Partindo agora para uma reflexão acerca dos resultados da investigação constata-se que o homem percorre um longo trajeto de transição que é principiado com o percurso até ao diagnóstico e impacto do mesmo. Depois do conhecimento da doença, o indivíduo avança até à cirurgia, numa fase que compreende consciencialização, envolvimento e preparação e conhecimento. A cirurgia emerge como um ponto de viragem, com a perceção no pós-operatório da possível disfunção erétil e incontinência urinária, que acarretam geralmente alterações ao nível da identidade e mudanças no quotidiano. Neste extenso percurso, o homem é envolvido por crenças acerca da doença, socorre-se de diversos recursos, apoia-se em estratégias de coping, é assolado por um vasto conjunto de sentimentos, deparando-se com preocupações e dificuldades, sem deixar de perspetivar o futuro. Posto isto, pode despontar uma reestruturação pessoal, através do novo domínio do autocuidado e utilização de novos padrões nas relações sexuais, com a adesão às terapêuticas, o que pode facultar o retorno do bem-estar. Finalmente, surge a perspetiva sobre o papel do enfermeiro, representada nos discursos dos participantes através da função de educador e da função de ajuda. Os participantes aludem ao papel de educador desempenhado pelos enfermeiros na sua transição, particularmente a partir do provimento de informação, surgindo aqui a importância da introdução da Consulta de Enfermagem de modo formal. A exigência atual dirigida aos profissionais de saúde é grande, pretendendo-se intervenções dirigidas aos processos educacionais e apoio psicossocial, à pessoa e família, com vista ao bem-estar e qualidade de vida dos indivíduos com doença oncológica (Pinto e Ribeiro, 2006).

Analogamente, a presença dos enfermeiros foi vivida e nomeada pelos participantes de modo significativo, através da descrição da disponibilidade total que lhes foi fornecida pelos mesmos em momentos importantes.

No que concerne às opções metodológicas, estas revelaram-se ajustadas aos objetivos, porque permitiram o despontar do indivíduo em toda a sua individualidade e singularidade. Assim sendo, considera-se igualmente que os objetivos do estudo foram atingidos uma vez que foi possível descrever o processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical, compreender as suas necessidades, descrever os recursos mobilizados e ainda conhecer a perspetiva sobre o papel do enfermeiro nesta transição.

O resultado deste estudo deve ser dissecado e enquadrado no contexto da sua realização. A sua efetivação possibilitou compreender uma realidade vivida por um grupo de participantes que tinham em comum algumas condições antecipadamente determinadas, sendo que por esse facto não se ambiciona extrair dados generalizáveis a outras populações. Todavia, os resultados obtidos podem constituir uma base sólida para futuras investigações. Resumindo, considera-se que esta investigação poderá assistir na construção de um entendimento sobre o processo de transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical, cooperando desta forma para a formalização do conhecimento em Enfermagem.

Hoje em dia, são inúmeros os aspetos a aperfeiçoar na prática diária dos enfermeiros, porém, importa salientar que o percurso profissional se edifica com base em aprendizagens constantes e que a mudança de comportamentos e atitudes por parte dos profissionais de saúde se declara de elevada importância, que é sempre possível contribuir para a excelência da qualidade dos cuidados prestados. Esta abertura para a mudança é um dos contributos mais evidentes para o desenvolvimento da qualidade dos cuidados em Enfermagem. A produção deste artigo tornou manifesto o processo de mudança que ocorre também nas vidas destes homens, deixando revelar o modo como experienciam o acontecimento e as consequências à mercê das suas capacidades, habilidades e competências. Aqui surge o papel do enfermeiro no auxílio a estes homens de forma a ultrapassarem este processo de transição de forma saudável, sendo que os resultados alcançados com esta investigação podem ser o mote para uma intervenção preparada, programada e com objetivos concretos, perspetivando-se ganhos em saúde efetivos, demonstrando o valor dos cuidados de Enfermagem e o seu impacto, formalizados através da implementação da Consulta de Enfermagem.

A Enfermagem é uma profissão centrada em interações onde cada pessoa, por vivenciar um projeto de saúde, se torna singular, única e indivisível num momento único de cuidado (Serrano, Costa e Costa, 2011, p. 16). Concluindo, fica patente neste artigo a importância da Consulta de Enfermagem no contexto da transição do homem portador de carcinoma da próstata submetido a prostatectomia radical.


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